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terça-feira, 10 de março de 2009

PARA A HISTÓRIA DO ASSOCIATIVISMO TORRIENSE - 1 - Algumas notas sobre a origem e volução da Associação dos Bombeiros Voluntários de Torres Vedras - 4

Na sessão camarária de 25 de Fevereiro de 1904 foi “lido um officio da Direcção da Associação dos bombeiros voluntários d’esta villa, fazendo sentir que não tendo aquella Associação casa apropriada onde installar o respectivo material d’incêndio e havendo no edifício municipal dependencias que a Camara não utilisa, lembrava e pedia para alli collocar o seu material”. Dando provimento a esse pedido o executivo municipal “concedeu auctorisação para que na loja e 1º andar onde antigamente foi cadeia e de que a Câmara se não serve, fosse, conjunctamente com o seu material d’incêndios, collocado o d’aquella Associação” (1).
Finalmente, em 26 de Junho, aquela associação instala o seu material naquele que foi o seu Quartel até à inauguração de novas instalações em 1934.
Compunha-se então o seu material “de uma bomba Jank, uma Guiot, uma bomba estanca-rios, um carro de material sistema Guilherme Gomes Fernandes, além de cintos, pás, achotes, baldes, espias, machados, picaretas, etc.”(2).
O primeiro serviço oficial em que o corpo de bombeiros torriense interveio “foi num incêndio ocorrido num prédio da rua Portela (ao Castelo) em 27 de Janeiro de 1905” (3).
Fora da vila, o primeiro serviço de socorro prestado teve lugar em Runa, em 28 de Novembro de 1908, “na casa do sr. Figueirôa Rêgo” (4).
O primeiro serviço registado fora do concelho teve lugar no Bombarral, num grande incêndio em 30 de Agosto de 1925.
Na década de 30 a Associação dos Bombeiros Voluntários de Torres Vedras conheceu um assinalável crescimento qualitativo e quantitativo.
Pela primeira vez o número de ocorrências ultrapassou as 10 anuais (em 1938) .
Por outro lado participou activamente nos grandes Congressos dos Bombeiros Voluntários (Estoril, em 1930, Setúbal, em 1931 e 1935, e Covilhã, em 1932) .
Na actividade destes congressos tiveram participação activa e de destaque os representantes da associação torriense, o inspector José Maria de Miranda, os comandantes José Joaquim de Miranda e Joaquim Paulino Pereira , os directores dr. Justino de Moura Guedes e Dr. Alberto Coelho Graça, e o tenente França Borges.
Mercê de tão meritória colaboração nesses congressos, o tenente França Borges foi nomeado para primeiro presidente da Liga dos Bombeiros Portuguesas e o comandante Paulino Pereira para o Conselho Administrativo e Técnico da mesma Liga. A Corporação de Torres Vedras tornou-se ainda o sócio nº1 da Liga.
O mesmo comandante Paulino Pereira teve ainda um papel determinante na organização de várias associações de bombeiros na região, tendo “prestado instrução a todas as Corporações das seguintes localidades: Alcobaça, S. Martinho do Porto, Sobral de Monte Agraço, Bombarral, Nazaré e Peniche”(5).
Também nessa década se introduziu uma novidade, a criação de postos rurais, com base numa ideia lançada pelo Tenente França Borges na comunicação que apresentou no congresso de Setúbal de 1935, intitulada “Bombeiros Voluntários, Agentes de Educação Social nos Concelhos Rurais”.
Defendia-se “que o material antigo da nossa Corporação fosse distribuído pelas freguesias rurais mais distantes”, (6) inaugurando-se em 1936, na Ribaldeira, o Posto Rural nº1 e, posteriormente, no Maxial em 1942, o Posto Rural nº2.
Mas o momento mais importante dessa década foi a inauguração do novo Quartel.
Em 17 de Maio de 1930, o executivo municipal deliberou “construir um edifício próprio para o Quartel dos Bombeiros de Torres Vedras” para cujo fim concedeu um empréstimo de 120.000$00 réis, subscrito por 6 anos sem juros “pelos srs. José António Vieira, Dr. Júlio César Lucas, José Eduardo César, Filipe de Vilhena, João Maria Castanho, José Anjos da Fonseca e José António Lisboa” (7).
Em 1931 estava concluída a planta do quartel (8). Iniciadas as obras as verbas do empréstimo revelaram-se insuficientes, pelo que “a Câmara Municipal foi reforçando sucessivamente as verbas para que o edifício se concluísse. Para ele contribuiu ainda o sr. Governador Civil com a verba de 10.000$00 réis”(9). O novo Quartel foi inaugurado em 1934, sendo baptizado por ocasião do 32º aniversário da corporação, “tendo como patronos respectivamente o sr. António Vitorino França Borges e o sr. Emílio Maria da Costa” (10).
Neste novo Quartel , além “dum excelente balneário e duma espaçosa e higiénica camarata,” existia “uma bem montada rede de alarmes anexa à cabina telefónica que permite, em caso de sinistro, chamar rapidamente ao quartel todos os bombeiros sem que a população da vila seja alarmada ou perturbada no seu descanso nocturno”. Possuía ainda “o mais moderno e eficaz sistema de arrumação dos equipamentos de combate em armários separados mas que se abrem simultaneamente”(11).
Foi no seio desse Quartel, até à inauguração do actual em 11 de Novembro de 1984, que os bombeiros torrienses mais tempo viveram a sua história e é a ele que está ligada a memória romântica que muitas gerações desta cidade guardam dos seus bombeiros.
Dessa memória não resistimos a transcrever uma saborosa descrição de alguém que viveu bem de perto essa realidade, o filho do comandante Paulino Pereira: “Quando pela noite dentro, a campainha retinia no quarto dos meus pais e se acendia uma luz vermelha, intermitente, todos nós ficávamos em sobressalto. Era chamada urgente vinda do Quartel. Se era durante o dia, alguém mais expedito corria à Igreja de S. Pedro ou da Graça para tocar a rebate, espalhando-se o som dos sinos por toda a vila: “Há fogo, há fogo!”... gritava-se. E sentia-se uma certa agitação entre as pessoas que, até aí, circulavam calmamente (...). O velho pronto-socorro “Fiat”, preenchidos os bancos com os primeiros bombeiros chegados ao Quartel, arrancava sem demora. (...) A sirene não se calava, E lá seguiam dispostos a tudo. No regresso, comentava-se então nas ruas, cafés e casas particulares a sua acção meritória” (12).
Da história desta centenária instituição e do muito que Torres Vedras lhe deve, muito ficou por dizer: os inúmeros louvores que recebeu; as muitas visitas ilustres que a homenagearam com a sua presença; a sua importante acção cultural, nomeadamente mantendo uma das mais prestigiadas bandas do país; os muitos torrienses, uns mais ilustres outros mais anónimos, que contribuíram para o seu engrandecimento; as grandes e pequenas histórias de heroísmo e abnegação que se viveram à sua volta.

(1) Lº ASCMTV nº 36 (1901-1909), sessão de 25 de Fevereiro de 1904, f. 94, AMTV.
(2) “Torres Vedras e os seus Bombeiros Voluntários – Passa amanhã o 30º aniversário da sua fundação – A sua vida e os seus serviços”, in Alta Extremadura, 10 de Outubro de 1933, p.2 (autor anónimo).
(3) “Torres Vedras e os seus Bombeiros Voluntários – Passa amanhã o 30º aniversário da sua fundação – A sua vida e os seus serviços”, in Alta Extremadura, 10 de Outubro de 1933, p.2 (autor anónimo).
(4) “Torres Vedras e os seus Bombeiros Voluntários – Passa amanhã o 30º aniversário da sua fundação – A sua vida e os seus serviços”, in Alta Extremadura, 10 de Outubro de 1933, p.2 (autor anónimo).
(5) “Torres Vedras e os seus Bombeiros Voluntários – Passa amanhã o 30º aniversário da sua fundação – A sua vida e os seus serviços”, in Alta Extremadura, 10 de Outubro de 1933, p.2 (autor anónimo).
(6) CARVALHO, Adão de, PAULO, Joaquim, ob. cit., p.24.
(7) “Torres Vedras e os seus Bombeiros Voluntários – Passa amanhã o 30º aniversário da sua fundação – A sua vida e os seus serviços”, in Alta Extremadura, 10 de Outubro de 1933, p.2 (autor anónimo).
(8) ROSA, Dr. António da Silva (síntese factual pelo), “Subsídios para a história dos 75 anos da Corporação dos Bombeiros Voluntários de Torres Vedras”, in “75º Aniversário dos Bombeiros Voluntários”, Suplemento especial do nº1188 do jornal Badaladas, 13 de Outubro de 1978.
(9) “Torres Vedras e os seus Bombeiros Voluntários – Passa amanhã o 30º aniversário da sua fundação – A sua vida e os seus serviços”, in Alta Extremadura, 10 de Outubro de 1933, p.2 (autor anónimo).
(10) ROSA, Dr. António da Silva (síntese factual pelo), “Subsídios para a história dos 75 anos da Corporação dos Bombeiros Voluntários de Torres Vedras”, ob. cit.
(11) GRAÇA, Alberto, “Bombeiros Voluntários de Torres Vedras”, in A Hora, nº 42, Lisboa 1936, pp.28 e 29.
(12) PEREIRA, J. Paulino, “Bombeiros: a corporação que eu conheci”, in Badaladas, 26 de Fevereiro de 1999, p. 18.

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