Pesquisar neste blogue

domingo, 25 de julho de 2021

OTELO – Revolução, Ilusão, desilusão


Goste-se ou não, apesar de todos os erros e do seu percurso controverso, devemos a Otelo a liberdade e a democracia.

Como todas as grandes personagens da história, existe um lado bom e outro menos bom na sua personalidade.

Personalidades como Otelo são raras, pela forma genuína como se afirmam na vida, pelo entusiasmo como assumem as convicções e pela forma como se retiraram do primeiro plano.


Para a história fica o Otelo militar da Guerra Colonial, o Otelo  do 25 de Abril, o Otelo da acção controversa  do Copcon  e o Otelo das FP “25 de Abril”, este o momento mais negro do seu percurso, apesar de ele sempre ter negado a ligação a este grupo terrorista , ficando sempre a dúvida sobre o seu real envolvimento nessa lamentável aventura.

Contudo, é bom recordar que, apesar de o negar, acabou condenado por essa eventual ligação ao grupo terrorista de extrema- esquerda, cumprindo 5 anos de prisão, antes de ser amnistiado.

O mesmo não se pode dizer dos terroristas da extrema-direita, do ELP e do MDLP, com acções bem mais violentas e prolongadas no tempo, acabando os seus actos por nunca serem julgados, continuando muitos dos seus membros  por aí, a vangloriar-se dos seus crimes, alguns bem instalados em partidos da direita e assumindo, até, funções de destaque na vida democrática.

Pessoalmente os meus sentimentos em relação a Otelo foram-se modificando ao longo do tempo.

 Primeiro vendo nele o líder carismático de uma revolução genuína e utópica, depois reconhecendo a ilusão dessa utopia e, finalmente, a desilusão pelo seu crescente radicalismo, que o terá, no mínimo, aproximado dos terroristas das FP-“25 de Abril”, acção que muito contribuiu para denegrir uma data libertadora.

De tudo, sem o esquecer os seus erros e as ilusões que alimentou, ficará sempre o Otelo do 25 de Abril, um dos muitos a quem devo a Liberdade e a Democracia

quarta-feira, 14 de julho de 2021

Cuba Livre


Hoje é o dia mundial da liberdade de pensamento.

Neste mesmo dia, em Cuba, o poder reforça a repressão sobre os que defendem essa liberdade de pensamento, prendendo e reprimindo manifestantes, impondo a censura, desligando a internet.

Não podemos defender a liberdade (ou as “liberdades”) em Portugal e tentar justificar ou defender que ela seja negada em Cuba, com as mais variadas desculpas.

Uma das desculpas é a defesa dos “feitos” do regime a nível social, principalmente na saúde e na educação, como contrapartida para uma “aceitável” falta de liberdade .

Por cá, vimos, recentemente, no “congresso das direitas”,  argumentos parecidos para desculpar o salazarismo, enaltecendo os seus “feitos” económicos.

Claro que não podemos negar o efeito nefasto de um criminoso embargo de 60 anos, imposto pelos Estados Unidos ao seu vizinho, embargo que, mais do que penalizar as elites dirigentes, penalizou o povo cubano, servindo ainda de alibi para a retórica do regime.

Sabemos que muitos políticos norte-americanos e ocidentais usam dois pesos e duas medidas, não negando o apoio a regimes autoritários e ditatórias, muitos deles bem mais sangrentos do que o Cubano, como aconteceu no passado com o apoio de Saddam Hussein ou a Ossama Bin Laden, antes de estes lhes fugirem do controlo, ou, actualmente,  à Arábia Saudita e a Israel, entre tantas outras “ditaduras convenientes”.

Também não podemos negar a falta de credibilidade de uma oposição dominada pelos extremistas de Miami, sedenta de vingança, muitos deles ligados ao crime organizado e entusiastas apoiantes de Trump.

Tudo o que essa gente tem para oferecer, como alternativa, é o apelo a uma intervenção militar norte-americana.

Esperamos que os Estados Unidos e o  “Ocidente” tenham aprendido com a forma desastrosa como intervieram militarmente do Afeganistão, no Iraque, na Líbia e na Síria, em nome da “defesa da democracia e da liberdade”. O resultado está à vista.

Esperamos também que a preocupação ocidental em relação aos cubanos, se o regime cair,  não seja a mesma que tiveram com a Rússia depois da queda da União Soviética, que foi a de humilhar os “vencidos” em vez de os ajudar, e, assim, “criaram” um Putin.  

Seja como for, têm de ser os cubanos, os que vivem em Cuba e os exilados, a resolver o problema do seu país, devendo o Ocidente, em vez de acicatar ódios, tentar mediar as partes, para conseguir ainda uma transição pacífica para a democracia, que salve as bandeiras sociais do regime, como a saúde e a educação, evitando uma política de “terra queimada”, o que conduziria Cuba a uma nova tragédia.

Mas nada disso desculpa a forma como o regime Cubano trata o seu povo, quando este exige liberdade, democracia e respeito.

Em último caso, a culpa pela desgraça de um povo ou de um país, é sempre dos seus governantes, sejam eles legítimos ou não.

Esperemos que, antes de agravar a repressão ou provocar um banho de sangue, o regime tenha um momento de discernimento para ouvir as justas reivindicações do seu povo, porque, apesar de tudo, Cuba não é a Coreia do Norte.

quarta-feira, 7 de julho de 2021

“Filas” e “Queixinhas”

 

Um dos desportos favoritos dos portugueses é fazer queixinhas, e, então, se lhes puserem um microfone à frente, é ver o entusiasmo com que se queixam, aproveitando bem os “15 minutos de fama” que as "queixinhas" lhes rendem.

Noutros tempos davam “bom uso” a esse “desporto”, transformando a “queixinha” em bufaria, nos tempos da Inquisição ou da PIDE.

Agora sobra-lhes o espaço que a comunicação lhes dá, até porque a “queixinha” dá audiência.

A mis recente “queixinha” dos “portugueses de bem” versa o tempo de espera na fila das vacinas.

Os mesmos portugueses, que são capazes de, alegremente e em festa,  acampar à porta e esperar em filas intermináveis junto de bilheteiras, para adquirirem ingressos, pagos com dezenas ou centenas de euro,  para os festivais ou para os jogos de futebol, são os mesmos que agora se insurgem, por terem de esperar uns dois pares de hora para levarem uma vacina que pode salvar a sua vida e a dos seus, e, a prazo, salvar a economia.

Ainda por cima, quando tivemos o vice-almirante Gouveia e Melo, antecipadamente, e com um pedido de desculpas, a explicar porque eram inevitáveis essas filas, neste momento, e que a alternativa seria atrasar o processo de vacinação.

Se é grave e indecente o aproveitamento político dos “queixinhas”, principalmente pelos mesmo que, em tempos, mandaram médicos e enfermeiros emigrar e cotaram nos serviços de saúde, sem se ouvir, então, um protesto de uma ordem profissional, é igualmente grave que, uma comunicação social, havida de audiências, promova os queixinhas em figuras públicas.

Entre “perder” umas horas numa fila, para ser vacinado, ou perder umas horas à porta da urgência de um hospital, ou dias em coma induzido nos cuidados intensivo, seria bom que os “queixinhas” pensassem duas vezes, antes…de fazerem “queixinhas”.

Mas...lá estou em, também...a fazer "queixinhas" dos "queixinhas" !!??

segunda-feira, 5 de julho de 2021

Ainda a propósito do “branqueamento da História” no Congresso do MEL (2)- As falácias de Nuno Palma.


O tão propagandeado “congresso das direitas”  (mais “fel do que MEL”), pouco mais serviu do que para revelar  a pobreza banal e bolorenta das ideias dessa família política portuguesa, incapaz de mobilizar  e inovar, mas revelador do seu desespero perante a possibilidade de se verem arredados do poder nos próximos anos.

Esse desespero terá contribuído para o radicalismo de algumas comunicações, destacando-se, no meio da pobreza geral,  pela retórica cuidada, inteligente e agressiva, a intervenção de Nuno Palma (ver reprodução em baixo).

Tratando de um tema interessante, “as causas míticas da divergência económica portuguesa”, apresentou algumas reflexões a considerar e que, caso orador não se tivesse deixado levar pelo ambiente revanchista dominante, até podiam ter enriquecido evento tão medíocre.

O problema foi quando começou a fazer comparações absurdas entre o Estado Novo e o Regime Democrático.

Partindo de uma verdade histórica, os níveis de crescimento económico observáveis na década de 60, até hoje inigualáveis, procurou extrapolar, de um simples gráfico estrutural, baseado no PIB, sem a devida contextualização, uma certa “superioridade moral” da economia do Estado Novo em relação ao actual regime.

Entusiasmado pela sua aparente “descoberta” e “novidade” (há anos que Fernando Rosa e outros historiadores falam do tema), e pela reacção da plateia, acabou a debitar uma série de falácias, meias-verdades e bombásticas frases propagandísticas, que fizeram estalar o verniz da aparente “objectividade cientifica “da sua “verdade”.

Sobre a correcta análise e contextualização desse gráfico, já outros fizeram a desmontagem do “mito” dessa comunicação de Nuno Palma ( José Pacheco Pereira , “A indústria de falsificação do Estado Novo”, in Público de 5 de Junho de 2021; Fernando Rosas, “O Milagre da economia sem política”, in Público de 20 de Junho de 2021;  Luís Reis Torgal, “E se só a Ciência for revolucionária”, in Público de 28 de Junho de 2021; António Barreto , “Sim, é verdade”, in Público de 3 de Julho de 2021).

Como escreveu Pacheco Pereira noutro texto, usando-se o mesmo estratagema também se conseguia facilmente demonstrar a “superioridade” do modelo de “desenvolvimento económica” do regime hitleriano em relação à República de Weimar ou do Stalinismo em relação ao regime czarista ou  da União Soviética em relação aos primeiros anos de democracia Russa.

Como se sabe, usar a evolução do PIB, a frio, sem contextualização, para comparar níveis de desenvolvimento, é falacioso e tem sido motivo de debate aceso entre economistas e historiadores. Hoje, aliás, têm sido ensaiadas outras formas de medir o desenvolvimento, que distinga o mero crescimento do verdadeiro desenvolvimento económico, que tem de ser também social, humano e cultural, como acontece com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)  ou como o índice Gini, que mede a desigualdade económica.

Ambos esses índices não estão isentos de críticas, como sucede com qualquer tipo de rating, que analise situações macroeconómicas, pois, não se pode resumir as complexas relações humanas e socias, a base do estudo histórico e social,  a meros “campeonatos” estatístico.

Muitas vezes o PIB compara economias que "produzem ricos" com economias que produzem riqueza, não distinguindo a desigualdade na distribuição dessa riqueza ou os métodos,muita vezes desumanos e antisocias como ela é alcançada, o que, aliás, acontecia no Potugal doa anos 60.

Mas o mais grave e falacioso da comunicação de Nuno Palma não foi só essa questão.

Uma das frases bombásticas do orador, levado provavelmente pelo ambiente favorável de uma plateia rendida ao radicalismo, foi a de dizer que “desde o 25 de Abril Portugal é um regime de Esquerda”, considerando que, mesmo “a única excepção duradoura é a década de Cavaco Silva com um programa até social-democrata” e que “a nível europeu isto até é centro-esquerda”.

E começa aqui o desfilar entusiástico e delirante de falácias.

Até Cavaco é de “esquerda” (“social-democrata”) e assim arrumam-se, sem hipótese de argumentar, 48 anos de democracia, ideia que pode ser facilmente desmontada consultando a lista e o tempo dos governos, democraticamente eleitos, convém recordar, desde o 25 de Abril.

Dando de barato que o PS sempre governou “à esquerda” e que todos os governos provisórios  liderados por Vasco Gonçalves (com ministros do PSD e PS) foram dominados pela esquerda, contabilizamos 286 meses de governo “à esquerda” e 272 à “direita”, mais 29 meses de governos “ao centro”, considerando como centrista o 1º governo provisório, com Sá Carneiro como ministro, o governo de Pinheiro de Azevedo, dominado pelo PSD  e pelo PS, e os governos de Nobre da Costa, Mota Pinto e Maria de Lurdes Pintasilgo, aquele argumento cai pela base.

Recorde-se, aliás, que o “esquerdista” Cavaco Silva chefiou o governo durante 120 meses, grande parte em maioria absoluta.

Recorde-se que a “direita”, coligação entre CDS e PSD, governou também em “maioria absoluta”, 40 meses com a AD e 77 meses com Passos Coelho…ah! mas esta gente, para Palma, é suspeita de governar em “social-democracia” ou ao “centro-esquerda”!!

A única maioria absoluta à “esquerda” aconteceu como o primeiro governo de Sócrates, cerca de 48 meses, um governo, aliás, muito bem recebido por alguns pensadores da direita neoliberal, exactamente por tomar muitas das medidas antissociais preconizadas pelos “Nunos Palma” da época…

A ideia de Palma é quase tão absurda como a cassete das “políticas de direita” do PCP.

Mas Palma vai mais longe nas suas atoardas. Em certo momento, tomado de delírio, vem em defesa do Chega. Porque ilegalizar o Chega? (nós também não concordamos com essa intenção). Segundo ele existem razões, sim, é para ilegalizar a “extrema-esquerda”, o BE ou o PCP, por exemplo, até porque, ao contrário do Chega, “o PCP é um partido anti-democrático” e insurge-se contra o museu do Forte de Peniche que , citando o programa da instituição, é “uma homenagem aos presos políticos que lutaram pela democracia” o que para Palma são “os tais do PCP que lá estiveram presos” (aplauso entusiásticos).

É provável que a maior parte dos presos políticos no Estado Novo, nomeadamente os que estiveram presos em Peniche, fossem do PCP, mas a afirmação ignorante e falaciosa de Palma ignora tantos presos políticos, das mais variadas tendências, que por lá passaram, bem como as razões do papel histórico do PCP no combate à ditadura, afirmação grave feita por um professor universitário que se diz objectivo e contra “as ideologias”.

A forma como ele enfatiza esta parte da sua intervenção, e o entusiasmo que ela provocou entre a assistência, demonstra que entre a assistência há muita gente que acha que, se eram “comunistas”, então até mereceram a prisão!!

Outra afirmação de Palma que mereceu aplausos entusiásticos da assistência: “a extrema-esquerda controla a educação”.

E “extrema-esquerda”, para ele, é o Bloco de Esquerda, o PCP e até sectores  do PS, classificação tão absurda, dita por um professor universitário, como classificar o PSD, o CDS  ou a Iniciativa Liberal como de “extrema-direita”.

E em que é que Palma fundamenta a sua argumentação? na citação cirurgica de uma parte do programa oficial de História do 12º ano : “…reconhecer que [o Estado Novo] …impediu a normalização económica e social do país” e, outra  falácia, como o demostrarei mais à frente, uma sugestão de trabalho sobre o Holocausto, “associando o Holocausto ao Estado Novo”, uma situação que, se fosse verdadeira, eu também consideraria absurda.

Insurge-se ainda com a bibliografia dominada por autores “marxistas”, como Hobsbawn e Fernando Rosas.

Fiz aquilo que Palma recomenda, fui consultar o programa disponível na página do Ministério da Educação e…até eu fiquei espantado com a falta de seriedade das afirmações de Palma!!!:

No Módulo 7, “Crises, embates ideológicos e mutação cultural na Primeira Metade do Século XX”,  o “conteúdo” 2.5 tem como título “Portugal: O Estado Novo” refere, entre outros, um conteúdo especifico sob a seguinte designação: “uma economia submetida aos imperativos políticos: prioridade à estabilidade financeira; defesa da ruralidade; obras públicas e condicionamento industrial; a corporativização  dos sindicatos; a política colonial”.

No final deste módulo refere como “aprendizagem a reter”, reconhecer “ que, no Estado Novo, a defesa da estabilidade  e da autarcia se apoiou na adopção de mecanismos repressivos e impediu a modernização económica e social”.

Esta “prendizagem” não se refere a todo o período do Estado Novo, mas à época antes do final da 2ª Guerra. Palma interpretou-a como uma “aprendizagem” mais generalista porque, ou lhe convinha a meia verdade, ou não reparou que o Estado Novo volta a ser analisado no Módulo 8, referente agora ao período do pós guerra, onde se estuda “Portugal do autoritarismo à democracia”, referindo-se no ponto 2.1 deste capítulo o “imobilismo político e crescimento económico do pós-guerra a 1974”. Repito : “CRESCIMENTO ECONÓMICO”!!!!

E neste ponto indicam-se como “aprendizagens relevantes”, relacionar “ a fragilidade da tentativa liberalizadora e da modernização económica do marcelismo com o anacronismo da sua solução para o problema colonial” e “reconhecer a modernização da sociedade portuguesa nas décadas de 60 e 70, no comportamento demográfico, na modificação de estrutura da população activa e na relativa aproximação a padrões de comportamento europeus”. Sublinho : “RECONHECER A MODERNIZAÇÃO (…) NAS DÉCADAS DE 60 e 70”.

Em relação à sugestão de trabalho sobre o Holocausto, esta, no documento, refere-se a outro tema do módulo 7, apesar de estar referido na mesma página do conteúdo 2.5, situação que se deve à organização das páginas, divididas em 3 tabelas, onde as duas primeiras, “conteúdos” e “conceitos”, estão relacionadas entre si e a terceira, com sugestões de trabalho, faz a listagem de todas as sugestões para todo o módulo. Um professor/investigador não ter reparado nisto e ter feito disto tema da sua comunicação é revelador da “competência” do mesmo em analisar documentos.

Pelo contrário, nesse documento, até surgem como sugestões de leitura, os discurso de Salazar.

Podemos discordar de certos conteúdos ou da ausência de outros, mas não existe no programa qualquer vestígio evidente do controle da educação pela "extrema-esquerda".

Por último, a infeliz referência ao “domínios marxista” da Bibliografia: de facto vem indicadas 3 obras de Hobsbawn, entre elas “A Era dos Extremos”, e 2 de Fernando Rosas, uma delas o “Dicionário de História do Estado Novo” por ele dirigido, mas com a colaboração de autores das mais variadas tendências, ao lado, aliás, dos 3 volumes do Dicionário de História de Portugal, relativos ao Estado Novo, coordenados por António Barreto e Filomena Mónica. Nas dezenas de sugestões de leitura também se incluem obras de “perigosos marxistas” como François Furet, José Mattoso, José Carlos Espada,Nuno Valério, José Hermano Saraiva, Joaquim Veríssimo Serrão, Braga da Cruz, A.H. de Oliveira Marques, Fátima Patriarca, António José Telo ou António Costa Pinto, entre outros.

Quanto muito, podemos criticar uma certa desactualização dessa bibliografia, mas não existe, na que é porposta, qualquer sinal de "domínio marxista".

Pela reacção do público de "direita" a esta comunicação, ficámos a "saber" que, na falta de um projecto económico para Portugal, alternativo ao mítico "modelo socialista", só têm para oferecer um "modelo económico" como o  do Estado Novo...sem Salazar (...eventualmente...sem ditadura!!), uma economia que "produz ricos", em vez de produzir riqueza, baseada na desigualdade na distribuição dessa riqueza, na perseguição aos sindicatos, na remessas da emigração provocada pela miséria das populações rurais, nos baixos salários e na negação de direitos sociais.

quinta-feira, 1 de julho de 2021

Ainda a propósito do “branqueamento da História” no Congresso do MEL (1).


 Dei-me, finalmente, ao penoso trabalho de assistir às duas intervenções do Congresso do Movimento “Europa e Liberdade” que mais polémica geraram, a de Maria Fátima Bonifácio e a de Nuno Palma.

A primeira, e menos interessante, a de Maria de Fátima Bonifácio, que numa comunicação indigente, “relatou”, em tom monocórdico e cansado, como se falasse para uma plateia de ignorantes,  a “história” da consolidação do “Estado” português, desde D. Afonso Henriques, uma história cheia de lugares comuns e de interpretações forçadas, para nos conduzir ao elogio de “um tirano duro e frio”, mas “inteligente e patriota”, que, mesmo “prendendo, deportando e perseguindo”, impusesse “à estima do mundo um povo”, libertando-o de políticos torpes e estúpidos, citando as palavras de Basílio Teles no final da monarquia,  palavras com as quais nos conduziu, desta vez citando Fernando Pessoa, para justificar, com elas,  “porque motivo o país estava a pedir um Salazar”, o “salvador desse país  cativado pelo Estado, e por um parlamento “eloquente e palavroso” , na “sua simplicidade, dura e fria”.

“Esqueceu-se”, a eminente historiadora, que Fernando Pessoa rapidamente se desiludiu com mítico “salvador”, ainda no início da construção do Estado Novo. Ao que parece, para a sua mal preparado comunicação, não leu a obra “Fernando Pessoa – Sobre Fascismo, Ditadura Militar e Salazar”, de José Barreto, editado em 2015 pela Tinta-da-China, de onde transcrevemos este esclarecedor poema:

“Poema sobre Salazar

 

António de Oliveira Salazar

Três nomes em sequência regular...

António é António.

Oliveira é uma árvore.

Salazar é só apelido.

Até aí está bem.

O que não faz sentido

É o sentido que tudo isto tem

 

Este senhor Salazar

E feito de sal e azar.

Se um dia chove,

A água dissolve o sal,

E sob o céu

Fica só azar, é natural.

 

Oh, c’os diabos!

Parece que já choveu...

... ... ... ... ... ... ... ... ...

 

Coitadinho

Do tiraninho!

Não bebe vinho.

Nem sequer sozinho...

 

Bebe a verdade

E a liberdade.

E com tal agrado

Que já começam

A escassear no mercado.

Coitadinho

Do tiraninho!

O meu vizinho

Está na Guiné

E o meu padrinho

No Limoeiro

Aqui ao pé.

Mas ninguém sabe porquê.

Mas enfim é

Certo e certeiro

Que isto consola

E nos dá fé:

Que o coitadinho

Do tiraninho

Não bebe vinho,

Nem até

Café

 

Fernando Pessoa

ANTOLOGIA in Sobre o Fascismo, a Ditadura Militar e Salazar,

de Fernando Pessoa 5-4-1935

Do painel onde participou a dita historiadora, salvaram-se as intervenções de Jaime Nogueira Pinto e de José Miguel Júdice que, de forma indirecta, irónica e respeitosa, desmontaram o essencial da comunicação de Fátima Bonifácio, facto que a mesma parece não ter percebido.

À segunda intervenção, a mais interessante,  a de Nuno Palma, voltaremos a em próxima ocasião.