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sábado, 31 de outubro de 2009

na despedida de José Manuel Fernandes da direcção do Público



José Manuel Fernandes não me conhece de lado nenhum, nem vai ler este texto, pois tem coisas mais interessantes para fazer na vida.


De qualquer modo quero aqui dedicar-lhe algumas palavras na hora da sua despedida como director do “Público”.
Devo confessar que muitas vezes as suas opiniões me irritaram e que discordei de mais de 90% daquilo que ele escreveu ou disse.
Mas confesso também que ouvi-lo ou lê-lo foi sempre bastante estimulante. É que a sua escrita é de uma clareza, tão bem fundamentada e culta que se torna difícil rebater as suas opiniões.
Ao lê-lo ou ouvi-lo ele obrigava-nos a pensar, principalmente em racionalizar a nossa discordância, o que implicava um esforço intelectual enorme.
Uma outra faceta importante da sua passagem pelo Público foi a forma como sempre contribuiu para o pluralismo de ideias que sempre caracterizou esse jornal. Não poucas vezes, a sua voz era uma voz isolada no conjunto de comentadores ou editorialistas, sem que uma única vez se tivesse notado que tenha usado o seu poder para impedir qualquer opinião ou notícia que desmentisse ou discordasse das suas idéias
Por tudo isso os seus editoriais vão fazer-nos falta, esperando que o Público continue na linha de pluralismo e independência, consolidada e reforçada pela direcção de José Manuel Fernandes.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Recordando o fotógrafo Roy DeCarava, falecido 3º feira


Foi ontem anunciado o falecimento, terça-feira, do Fotógrafo norte-americano Roy DeCarava.

Tinha 89 anos e foi o primeiro fotógrafo negro a receber uma bolsa da Fundação Guggenheim, em 1952.
Tendo começado como serigrafista e pintor, dedica-se exclusivamente à fotografia a partir de 1947.
Este fotógrafo, nascido em 1919, tornou-se conhecido por ter fotografado vida da população negra bairro de Harlem, sendo por isso considerado por muitos o “cronista desse bairro de Nova Iorque.
Ficaram igualmente famosos os seus retratos de muitas das estrelas do Jazz (como Duke Ellington).
Recordamos aqui alguns dos seus trabalhos.


























"Face Oculta"



Tenho por hábito desconfiar sempre daqueles que “começaram por baixo” e rapidamente chegam a cargos e funções de topo.

Não nego que existe muito boa gente que “começa por baixo” e, mercê do seu talento, do seu esforço, do seu estudo e do seu trabalho consegue, de forma honesta, “subir na vida”.
Contudo, estes últimos, geralmente, mantêm-se humildes, lidam humanamente com os seus subordinados, procuram ajudar o seu semelhante e, principalmente, não ostentam o seu poder e a sua riqueza, não procuram esconder as suas origens, e lidam de forma legal e honesta com a sociedade. Além disso o tempo da “subida” é uma vida inteira e não meia dúzia de anos.
Os tais que “começaram por baixo” e dos quais eu desconfio, correspondem ao perfil que hoje é descrito no “Público” sobre alguns dos arguidos no caso “Face Oculta”.
Estão lá as duas faces da mesma moeda:

o “empresário” que compra favores a políticos e a altos funcionários de Estado, começando por pequenos favores aqui e ali, ajudando instituições de caridade ou pessoas carenciadas, como forma de limpar consciências e ganhar apoios sociais, que contribui para colocar “amigos” em cargos políticos onde pode obter vantagens financeiras ou informações de valor acrescentado;

o “político” que se faz encostado a uma rede de clientela política, que faz favores em troca de uma “carreira de sucesso” em empresas pública, ocupando “cargos de nomeação política”, transferindo-se para o sector privado, geralmente para empresas que beneficiaram dos seus favores quando ocupava cargos políticos. Eça de Queirós já havia retratado essa gente no século XIX: está lá tudo no “Conde de Abranhos”.

Alguém se interrogava, procurando “limpar” a imagem desse político, como é que alguém se sujava por “10 mil euros, quando ganha cerca de 500 mil euros”. Não lhe ocorreu que este terá sido o único montante que a Polícia Judiciária conseguiu provar e de que , quem aceita uma vez 10 mil euros em troca de favores, já os terá aceite, com estes ou outros valores, muitas outras vezes, só que nada se consegue provar. Al Capone não foi preso pela negócios ilegais ou pelas mortes em que se envolveu, mas apenas por um descuido fiscal.
Se a PJ conseguiu provar aquele negócio de 10 mil euros, já conseguiu ir muito longe.
Aliás, parece ser este tipo de relação entre os “empresários” e o poder político que o representante dos patrões defende, como se depreende das afirmações ontem proferidas numa conferência pouco divulgada, mas reveladas na Antena 1, onde considerou que a compra de favores, a corrupção e fuga ao fisco e às leis, eram uma boa forma de obter vantagens económico-financeiras nos mercados da União Europeia (disse-o por outras palavras, mas o sentido era este).
Por último é sabido qual o destino desta investigação: por qualquer “erro processual”, por “prescrição dos crimes”, pela dificuldade em obter provas, pelo emaranhado do nosso sistema legal, todos os arguidos do caso vão-se sair airosamente, provavelmente no papel de vítimas, recebendo ainda alguma indemnização por “danos morais”.
Quanto muito talvez se condene simbolicamente um funcionário de segunda linha que aceitou uma almoçarada em troca de um pequeno favor, mas não tem o poder dos restantes para contratar bons advogados.
É esta a Justiça que temos …Diria mesmo mais… é este o país que temos .

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

NO PRIMEIRO ANIVERSÁRIO DE "PEDRAS ROLANTES"



Há um ano tinha início a edição de Pedras Rolantes.

Dois anos antes, em 2006, já tínhamos iniciado a edição de um blogue com essa designação, mas durou apenas dois dias. É que o choque tecnológico ainda não tinha chegado a esta casa, o computador era lento, com pouca capacidade de memória e, cada vez que queríamos ligar à internet lá tínhamos que desenrolar uma quantidade de fios e desligar o telefone, esperando que ninguém nos telefonasse nessa altura para a rede não ir abaixo.
Felizmente, tanto eu como a tecnologia evoluíram, e tornou-se possível criar um novo blogue, com a mesma designação, editado com regularidade (só não foi possível manter o endereço de URL).
O nome Pedras Rolantes foi repescado de um conjunto de crónicas por mim publicadas no jornal Área a partir de 1979. O título, numa tradução linear de um dos meus grupos musicais preferidos de então, pareceu-me adequado ao âmbito generalista e ocasional, escrito ao correr do tempo, que obedeceu à ideia da criação do blogue.
Desde então já publicámos 713 post’s que foram visitados por mais de 4000 visitantes e que percorreram mais de 8 mil “páginas” (não sabemos o número exacto, porque só começámos a fazer a contagem em Fevereiro deste ano, pouco mais de três meses depois do início da publicação de Pedras Rolantes).
Conquistámos 23 seguidores e 59 blogues “amigos” (que nos visitam, que nos sinalizam…). Fomos citados duas vezes no jornal “Público” e fomos escolhidos para um estudo realizado na Universidade Nova sobre o universo da blogosfera portuguesa. No conjunto de mais de 6 mil blogues registados no “Sistemer”, temo-nos mantido regularmente entre os mil mais visitados.
Hoje, por exemplo, na estatística do dia, o Pedra Rolantes ocupa o 879º lugar na média semanal de visitas diárias (22) e o 816ª lugar na média semanal de visita diária de páginas (39).

Sendo este um blogue de âmbito generalista, os dez temas mais “etiquetados” foram os seguintes:

1º - Fotografia (da minha autoria) – 168;
2º - Contra-situacionismo – 154;
3º - Torres Vedras – 122;
4º - Fotografia (Divulgação) – 74;
5º - História Contemporânea – 69;
6º - “Illustração Portuguesa” – 65;
7º - Fotografia Antiga – 63;
8º - 1909 – 58;
9º Anti-Sócrates – 58;
10º - Carnaval – 52;
11º - Banda Desenhada – 43;
12º - Centenários – 42.

Vemos assim que a Fotografia, o comentário político, a História Contemporânea e Torres Vedras, estão entre os temas mais abordados.

Entretanto, demos dois “irmãos” mais novos ao Pedras Rolantes.
Em Abril passado criámos um novo blogue só para divulgar a História, a cultura e o património de Torres Vedras , “VEDROGRAFIAS”.
Há pouco mais de uma semana criámos outro blogue para divulgar temas de História da Arte, “A FORMA E A LUZ”.

Um blogue é, acima de tudo, um espaço de liberdade, mas também um espaço experimental. Sabemos que as nossas opiniões podem não agradar a toda a gente. Procuramos, apesar de tudo, opinar com responsabilidade, assumindo aquilo que escrevemos, não nos escondendo no anonimato.

Neste nosso aniversário somos acompanhados por duas dois aniversariantes de “peso”:




Astérix e Óbelix que hoje comemoram o 50º aniversário e o Noddy, que faz…60 anos.

Este blogue, por razões naturais, nunca poderá comemorar aqueles aniversários (só se eu ultrapassasse os cem anos, em perfeitas condições de saúde mental), mas esperamos comemorar muitos mais aniversários na vossa companhia e continuar a merecer a confiança e o apoio daqueles que nos visitam.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

"Acordeões do Mundo" inicia-se hoje em Torres Vedras



Oficialmente o VI Festival Internacional de acordeão de Torres Vedras teve início a 24 de Outubro.
Na realidade é hoje que tem lugar o Primeiro espectáculo dos “Acordeões do Mundo”, com a actuação logo à noite, pelas 21.30, no Teatro-Cine, do grupo irlandês Buille.
Na próxima 6ª feira é a vez do grupo Argentino La Camorra.
Seguir-se-ão os grupos UM, de Portugal, terça dia 3 de Novembro, os Gurzuf, da Bielorrússia, 6ª feira 6, e, a encerrar, Maria Kalaniemi da Finlândia, 3ª feira 10.
Entretanto decorre todos os dias uma “Merenda de Acordeão”, em cafés, bares e tascas da cidade, com a presença de acordeonistas da região.
Carlos Mota é o mentor desta iniciativa original, apoiada pela Câmara local, que já vai na sua 6ª edição.
O programa completo desta iniciativa, que se integra nas festas da cidade de Torres Vedras, pode ser consultado AQUI.

O Respigo da Semana - a polémica de Saramago vista por Richard Zimler (Público - 27 de Outubro de 2009

De forma soberba, Richard Zimler coloca a polémica com Saramago na sua verdadeira dimensão.
Publicado hoje no Público, foi a nossa escolha para este "Respigo da Semana".




"Saramago e a insustentável leveza da ignorância


"Quando José Saramago decidiu espevitar o interesse pelo seu último livro afirmando que "a Bíblia é um manual de maus costumes", a minha primeira reacção - como escritor e como alguém de há muito tempo dedicado aos estudos de religião comparada - foi rir-me para comigo e murmurar "e depois?".

"São várias e de ordem vária as razões por que desvalorizei os comentários de Saramago. O Antigo Testamento, praticamente na sua totalidade, nunca teve como propósito constituir qualquer coisa de parecido com um manual de boas ou más maneiras. Ao ler a Bíblia, pouco que seja, ninguém pretende encontrar um modelo para o seu comportamento nos actos do Rei David, de Betsabé, de Noé, de Adão, de Eva ou de quaisquer outras pessoas referidas nas histórias bíblicas. Na tradição judaica, tal atitude pura e simplesmente nunca existiu. Nem o mais ortodoxo dos rabinos obedece hoje à maioria das regras de conduta doDeuteronómio, mais que não fosse por estarem de tal modo datadas que seriam irrelevantes para a vida dos nossos dias. Assim como ninguém no mundo judeu modela o seu comportamento pelo de Deus. Fazê-lo seria considerado ingénuo na melhor das hipóteses ou herético na pior. O Antigo Testamento é formado em grande parte por uma compilação de histórias, muito à semelhança de um romance. E o seu tema principal é a difícil e por vezes tumultuosa relação entre Deus e Israel, entre o criador transcendente de um universo e o seu povo escolhido. É uma história de sobrevivência, de como os israelitas usaram de todos os meios à sua disposição - incluindo a guerra - para defender aquilo que consideravam a sua particular aliança com o Senhor. Como qualquer romance ou outra forma de narrativa que intente descrever todos os cambiantes da conduta humana, dela fazem parte tanto a opressão intolerável, os crimes de guerra e os assassinatos, como também o amor, a dedicação e o heroísmo. Trata de seres humanos tal como eles são, e não como eles deveriam ser. Pegar no Antigo Testamento para criticar a brutalidade dos hebreus ou de outros povos da antiguidade é o mesmo que criticar Dostoievsky por escrever sobre um assassinato premeditado emCrime e Castigo ou criticar Anne Frank por descrever como a crueldade nazi afectou a sua família.

"Inclinava-me a pensar que qualquer escritor haveria de olhar como vital, tanto para ficcionistas como para ensaístas, a exploração de toda a gama das emoções e acções humanas, mas ao que parece enganava-me, pelo menos no caso particular de Saramago.

"Confesso que as palavras de Saramago me deixaram perplexo de um modo muito pessoal ao implicarem que não deveríamos escrever sobre os horrendos crimes cometidos por seres humanos, pois uma boa parte do que faço nos meus romances é explorar as vidas de pessoas cujas vozes têm sido sistematicamente silenciadas por ditadores, generais e inquisidores religiosos. Penso que escrever sobre a repressão violenta e sobre os tratamentos cruéis é essencial, sobretudo quando se busca a criação de um mundo de mais justiça e humanidade. E uma das coisas que mais respeito e valorizo no Antigo Testamento - apesar de não crer num Deus pessoal e de não praticar nenhuma forma de fé, nem sequer a religião dos meus pais, o judaísmo - é o facto de aí nada ser escamoteado ou escondido. Quem quer que deseje conhecer até onde pode chegar a abominação e a crueldade humanas e até que ponto Deus - ou o Destino - pode ser impiedoso bastar-lhe-á abrir o Antigo Testamento. Para quem nunca o fez, sugeriria que lessem o tratamento dado pelo Rei David a Urias, narrado no Segundo Livro de Samuel. Será difícil encontrar descrição mais poderosa da traição e da brutalidade humanas.

"Por outro lado, considerei que no fundo não valia a pena dar importância aos comentários de Saramago, pela ingenuidade e infantilidade da interpretação literal que ele (juntamente com os fundamentalistas religiosos) faz das histórias do Antigo Testamento. Uma das mais importantes lições que retirei do estudo da história das religiões e da mitologia é que as narrativas mitológicas são - na sua maior parte - poesia e não prosa. A história de Adão e Eva é poesia. Ou será que haverá alguém que acredite que Eva foi feita de uma costela de Adão? O autor desta narrativa do Antigo Testamento está a recorrer a uma linguagem simbólica - tal como poetas muito posteriores, como Shakespeare ou Camões, recorreram à linguagem simbólica para criarem as suas obras-primas. Ou será que algum leitor de Os Lusíadas pensa que os navegadores portugueses depararam com um temível gigante chamado Adamastor nas suas viagens da época das Descobertas? Ou, quando a narrativa bíblica conta que Moisés separou as águas do Mar Vermelho no Livro do Êxodo para que o seu povo pudesse fugir do Egipto, será que alguém com mais de dez anos acredita que ele possa ter murmurado algum abracadabra hebraico e produzido tal milagre? Espero bem que não. O Antigo Testamento pode ter como referência um acontecimento histórico - a libertação do povo hebraico -, mas a linguagem utilizada é poética e simbólica. Por assim ser, está aberto a diferentes interpretações. Pode acontecer que o que aqui se pretende é falar da viagem espiritual que cada um de nós pode fazer ao longo das nossas vidas, da escravidão para a liberdade. Nesse caso, a história de Moisés será sobre a nossa aspiração - como indivíduos e como povo - à segurança, a uma vida realizada e com sentido.

"Tomar à letra estas histórias é simplesmente não entender o Antigo Testamento e ignorar por completo dois mil anos da tradição poética ocidental.

"As palavras de Saramago pareceram-me ainda como o "much ado about nothing", o muito barulho para nada, com que soa qualquer coisa que nem remotamente é novidade. Há cerca de dois mil anos que os filósofos judeus vêm debatendo a brutalidade de Deus e da humanidade no Antigo Testamento, em tons bastante mais emocionados do que os usados no debate em causa. Talvez a história mais criticada do Antigo Testamento seja narrada no livro deJob. Depois de um Satanás céptico dizer a Deus que a piedade de Job se deve apenas à prosperidade de que goza, Deus põe à prova a fé e a dedicação de Job arruinando-lhe a vida da forma mais horrível. Podemos encontrar comentários sobre a interpretação a dar a esta história - assim como de qualquer outra história bíblica - em centenas de livros escritos por filósofos judeus - e também alguns cristãos - ao longo dos últimos dois mil anos. Como é possível que alguém que se considera instruído não tenha consciência desta herança cultural?

"As primeiras obras escritas analisando a natureza de Deus, tal como é descrita no Antigo Testamento, são o Talmude, um compêndio dos textos rabínicos sobre ética e cultura compilados entre os anos 200 e 500 da era cristã. Mais tarde, na época medieval, o tema da natureza de Deus foi explorado por dezenas de talentosos filósofos medievais, incluindo pensadores magníficos como Maimónides e Moisés de Leão, autor do século XIII, que escreveu o livro mais influente do misticismo judaico, oZohar. Mais recentemente, estudiosos como Walter Benjamin e Martin Buber acrescentaram facetas modernas ao debate. A natureza da relação de Deus com o homem - a Sua crueldade e, em particular, a Sua "surdez" face ao sofrimento humano - tornou-se num dos mais importantes tópicos de discussão no mundo judaico desde o Holocausto, pelo mais óbvio e terrível dos motivos. Simultaneamente, este debate filosófico foi sendo reflectido na literatura judaica desde os meados do século XIX, na obra de muitos escritores, de Sholem Aleichem e Shmuel Yosef Agnon - que recebeu o Prémio Nobel em 1966 - a Philip Roth.

"Concluindo, custa-me compreender como é que alguém, ainda que vagamente familiarizado com a filosofia e a literatura ocidentais, pode acreditar que erguer-se em 2009 contra a crueldade contida no Antigo Testamento tem alguma coisa de novo ou de chocante. Ou sequer interessante.

"O que é interessante é perguntarmo-nos por que razão exige Deus uma tão absoluta fidelidade aos israelitas e os castiga tão brutalmente por Lhe desobedecerem. Por que são outros povos, como os cananitas, olhados com tanto desprezo. O que diz tudo isto sobre as condições políticas e sociais em Israel em 500 a.C. E o que diz a relação de Deus com Israel sobre a "natureza tribal" das religiões da antiguidade.

"Estes, sim, são temas importantes a merecer respostas sérias dos estudiosos.

"Mas, naturalmente, nada disto mereceu a atenção de Saramago nem dos que reagiram às suas críticas ao Antigo Testamento. O que me traz ao aspecto mais perturbador e alarmante de toda esta tola controvérsia. Os jornalistas e os responsáveis religiosos portugueses de um modo geral trataram os comentários de Saramago como importantes! Graças a eles, os meios de comunicação deram-lhe mais tempo na televisão e mais espaço nos jornais do que a outras questões muito mais importantes. E alguns representantes da Igreja Católica atacaram-no com uma ferocidade emocional que revela bem que consideram tais opiniões sobre o Antigo Testamento como um obstáculo à fé. Mais uma vez, tal como salientei mais atrás, os comentários de Saramago não são nem chocantes nem novos. E apenas representam um obstáculo à fé para quem não tenha a menor ideia do que é e do que pretendia ser o Antigo Testamento. As críticas de Saramago são unicamente banalidades superficiais, que revelam uma profunda ignorância da filosofia e da religião ocidentais e uma total incompreensão da linguagem poética e narrativa de desde há mais de três mil anos. Só quem ignora tal herança, jornalistas e responsáveis religiosos incluídos, poderia tornar o patético desabafo do romancista numa tal polémica. E, para mim, essa foi a parte mais desanimadora e mais perturbante de toda esta "inventada" notícia: descobrir que na sociedade onde vivemos, entre os seus membros mais ilustres e cultivados, possa prolongar-se tão lastimosa ignorância de uma parte importantíssima do legado civilizacional da filosofia e da cultura ocidentais.

(Tradução de José Lima)

RICHARD ZIMLER

In Público 27 de Outubro de 2009

CENTENÁRIOS - 23 - A Feira de Agosto, em Caldas da Rainha (Agosto 1909)


("Nas Caldas : Vendedora de pinhões em dia de mercado - Cliché de Benoiel",in Illustração Portugueza nº 180 de 2 de Agosto de1909)


Na sua edição de 30 de Agosto de 1909 (depois de o anunciar na capa do dia 2), publicava a “Illustração Portugueza” uma reportagem fotográfica da autoria de Joshua Beneloiel, acompanhada de um pequeno texto descritivo, provavelmente da autoria desse fotógrafo, sobre a feira de Agosto das Caldas da Rainha, uma descrição que podia encaixar perfeitamente nas muitas feiras que então se realizavam na região Oeste, e cujo conteúdo não resistimos a transcrever:

“FEIRAS PORTUGUESAS – A FEIRA das Caldas



“A feira das Caldas é uma das mais interessantes do paiz pelo grande numero de pessoas que ali concorrem idas de Lisboa e de outros pontos próximos, principalmente porque ella se faz a 15 e 16 de Agosto, e sendo o primeiro d’estes dias de festa tradicional muita gente se dirige à feira da localidade. A physionomia d’essa feira é curiosa. Grande numero de excursionistas pelos arruados onde as vendedeiras apresentam os seus taboleiros de bolos e das saborosas cavacas que são productos da villa; há também logares de louças baratas e bugigangas do typo antigo que tornaram celebre a povoação onde Raphael Bordallo devia realisar uma renovação artistíca; montões de fructas expõem-se n’aquelle tumultuar do mercado no qual photgraphos ambulantes, pelotiqueiros e vendedores dos mais extravagantes objectos fazem o seu negocio. E nota dominante da feira são os varapaus ferrados, os marmeleiros nodosos e fortes que teem grande venda como as cestas e outros productos dos arrabaldes que toda a gente quer trazer como recordação d’esse passeio a uma das mais pittorescas localidades do paiz, próximo de Lisboa, famosa pelas suas louças e pelas suas aguas medicinaes”.













































segunda-feira, 26 de outubro de 2009

o "Zé Povinho" no seu pior



Portugal continua a ser notícia pelos piores motivos.

Desta vez é a forma indigna e saloia como muita gente bem pensante deste país continua a tratar José Saramago.
É o “Zé Povinho” no seu pior.
Para vergonha de nós todos, há duas horas o El Mundo publicava a seguinte notícia:

(vai em espanhol)



“En el olvido ha quedado para muchos portugueses el Premio Nobel de Literatura que José Saramago consiguió en 1998; el escritor luso se ha convertido en el "enemigo número uno" de su país natal.


"Este hombre es el diablo", repetía una mujer de edad avanzada que esperaba el comienzo de la misa dominical en una céntrica iglesia lisboeta. A raíz del lanzamiento de 'Caín', un libro en el que Saramago arremete contra los principales pilares del cristianismo -Dios, Biblia e Iglesia-, ésta es una opinión muy extendida entre los compatriotas del escritor.


Saramago -ateo y comunista confeso- definió la Biblia como "un manual de malas costumbres" en su último trabajo. Para el autor de 'Ensayo sobre la ceguera', el libro sagrado del cristianismo es "un catálogo de crueldades" sin el que probablemente la humanidad "sería mucho mejor".


Tampoco le han faltado arrestos al literato para negar la existencia de Dios y tildar su figura de "cruel, mala persona y vengativo", por no ser "alguien de fiar", ya que "fue creado por los hombres a su imagen y semejanza".


Estas declaraciones han suscitado reacciones airadas de gran parte de la sociedad portuguesa que ya ha convocado manifestaciones públicas de protesta, la primera el pasado sábado en Penafiel, cerca de Oporto.


Al rechazo popular se han sumado figuras representativas de la vida política y social del país ibérico. El eurodiputado socialdemócrata Mario David ha instado a Saramago a abandonar la ciudadanía portuguesa "lo más rápido posible", mientras que el ex subsecretario de cultura, Sousa Lara comparó al autor de 'El viaje del elefante' con el primer ministro italiano Silvio Berlusconi.


Saramago sabía seguro que sus palabras iban a provocar el rechazo de las principales agrupaciones religiosas del país, que no han tardado en mostrar su descontento; la Conferencia Episcopal y la Comunidad Islámica se han sentido muy ofendidas y el líder judío Eliezer di Martino ha asegurado que el escritor "no conoce la Biblia".


Esta nueva polémica ha servido para revivir la antipatía con la que cuenta el escritor de 86 años en su país de origen. Miguel sousa Tavares -autor del 'best-seller' 'Ecuador' opinó este fin de semana en su columna en el rotativo 'Espresso' "que todo en Saramago es vanidad y autopromoción".


También la edición portuguesa de la revista 'GQ' se ha unido a las críticas contra el dramaturgo, al que ha tachado de "ignorante y "blasfemo", "amargado" y "loco por publicidad". "Es el tipo más desagradable de la Península Ibérica".


Pocos son profetas en su tierra, pero la hostilidad que existe entre Portugal y Saramago, Saramago y Portugal, ha llevado al novelista a instalarse "en el exilio" en la isla de Lanzarote, donde vive hasta hoy con su esposa Pilar del Río.”

Embora Saramago se tenha posto a jeito, esta é mais uma situação que nos devia envergonhar a todos.

O Regresso do Lince



Chama-se Azahar, é uma fêmea de lince nascida em cativeiro na Serra Morena em 2004 e é o primeiro de 16 linces que vão ser cedidos por Espanha a Portugal.


A fotografia foi divulgada no El País, e foi tirada hoje, por volta das 13.30, quando iniciava a sua viagem com destino ao centro de criação de Silves, no Algarve.

O lince é considerado extinto em Portugal há três décadas e viagem de Azahar destina-se a iniciar uma tentativa de repovoamento dessa espécie em terras lusas.

Ordens do Dia de Beresford (6) Agosto de 1809




AGOSTO 1809


Numa das primeiras Ordens do Dia (OD) apelava-se para “que todos os Cirurgiões tanto dos Hospitaes, como dos Corpos, ou outros quaesquer que tiverem recebido do Governo caixas de Instrumentos em qualquer tempo que fosse, ou que as tenhão em seu poder pertencentes ao Governo, informem sem demora ao Fysico-Mór residente em Lisboa, dando-lhe conta do estado actual dessas caixas” (OD, 2/8/09).

Entretanto, visitando Beresford “hontem o Acampamento, ficou extremamente desgostoso por ver, que os Soldados vagavão por todo o Paíz sem Passaporte, e mesmo os Officiaes, e Officiaes Inferiores; e porque isto pode ter consequências muito tristes, pois que todos os Regimentos devem sempre estar promptos para pegar em Armas a cada instante. Ordena, que nenhum Soldado saia do Campo sem Passaporte por escripto, e que indo buscar Viveres fora do Campo, a totalidade dos Soldados, que for necessária para este, ou outro qualquer objecto de serviço vá regularmente formada, e marche debaixo das Ordens de Officiaes, e Officiaes inferiores conforme o numero de Soldados, e que volte formada do mesmo modo para o Acampamento. Determina igualmente (…) que nenhum Official dê licença vocal de sahir do Acampamento a Soldado algum” (OD, 3/8/09).

A indisciplina que Beresford encontrava frequentemente, era evidente até no abastecimento, quiexando-se do facto de “que distribuindo-se aos Soldados pão para três dias, alguns o vendem, e ficão impossibilitados por este modo de marchar segundo a necessidade o exigir: em consequência do que determina (…) que todas as manhãs se averigúe se cada Soldado tem a quantidade de pão, que deve ter, e que todo aquelle, que dispozer delle debaixo de qualquer pretexto seja rigorosamente castigado” (OD, 3/8/09).

Mais ainda, sendo informado “da irregularidade, com que alguns Corpos procedem, no recebimento dos víveres, mandando-os tomar das Justiças das Povoações, sem que seja pelos respectivos Comissarios das Brigadas; “ determina “que de hoje em diante se ponha termo a este abuzo, advertindo aos Snr.es Coroneis, ou Commandantes dos Corpos, que fará pagar-lhes todo aquelle mantimento, que para o futuro se receber, sem que seja pelo Commissario competente” (OD, 14/8/09).

Constando-lhe ainda que “alguns Soldados vão a casa das padeiras tirar o pão que apromptão para a Tropa e mesmo aos fornos tirar aquelle que se esta cozendo, o que vem a ser causa essencial da Tropa experimentar falta de pão pois que isso faz que não se fabrique tanto quanto podia ser e daquelle que se fabrica se aproveita só a pequena parte dos Soldados maos e fica privada delle grande parte dos Soldados bons, manda declarar que não deixará de fazer hum exemplo, punindo com pena Capital semelhante desordem” (OD, 16/8/09).

Ao longo do mês outra preocupação evidenciada foi com o vestuário das tropas: “(…) sem a menor demora(…) os Snr.es Commandantes dos Regimentos, e dos Batalhões que se achão actualmente em Campanha remetterão ao Snr. Marechal hum Mappa do Fardamento, e mais objectos de Vestuario que faltão ao respectivo Regimento ou Batalhão. Advertindo que deve ser o preciso, para vir a ter cada homem hum capote, huma farda, hum colete, hum par de pantalonas, hum par de polainas curtas, dois pares de çapatos, duas camisas, dois pares de meias curtas, huma barretina, ou chapeo, e huma gravata de couro preto” (OD, 21/8/09).

A falta de hábitos de higiene dos soldados portugueses é evidenciada na seguinte OD: “O Snr. Marechal não somente recommenda, mas insiste que se tenha a maior attenção á limpesa dos diferentes Corpos pois que a falta de aceio he a causa das muitas moléstias que tem sofrido o Exercito, e Ordena por tanto que se obriguem os Soldados a lavarem-se frequentemente, e com particularidade os pés, pernas, cabeça, e mãos (…).Sem limpesa he impossível o conservar-se a saúde, e o estarem cançados não póde servir de desculpa, porque depois de huma marcha longa, e fatigante nada refresca tanto como o lavar” (OD, 21 /8/09).

Ao longo do mês foram ainda decididas várias condenações por deserção, algumas à morte, com o intuito de “fazer hum exemplo” (OD de 15 /08/09)

LOCALIZAÇÃO DO QUARTEL-GENERAL EM AGOSTO DE 1809:

1 a 5 de Agosto – Almeida
6 de Agosto – Cidade Rodrigo
7 a 9 de Agosto – Fuente Grunaldo
10 e 11 de Agosto – Acebo
12 de Agosto – Moraleja.
13 de Agosto – Los Hoyos.
14 e 15 de Agosto – Moraleja
16 e 17 de Agosto – Sarza.
18 de Agosto – Salvaterra.
19 a 31 de Agosto – Castelo Branco.

No 40º aniversário das eleições de 1969

Há 40 anos encerrava-se uma página da chamada "Primavera Marcelista", com as "eleições" de 26 de Outubro de 1969. VER MAIS NO BLOGUE VEDROGRAFIA, clicando aqui.

domingo, 25 de outubro de 2009

A Foto da Semana - Propaganda Eleitoral no Afeganistão (Reuters)

.
Um velho afegão descansa, indiferente à profusão de cartazes eleitorais, nas ruas de Cabul. A fotografia é da autoria de Ahmad Massood, para a Reuters (publicado pelo Libération em 20 de Outubro último.

Um Grande Espectáculo de Mariza, ontem à noite em Torres Vedras



Ontem foi dia de Mariza, em Torres Vedras.

Com o Pavilhão da Expotorres esgotado, o espectáculo começou com quase meia hora de atraso, mas valeu a pena a espera.
Com uma presença em palco arrebatadora, a actuação de Mariza teve por base o seu último trabalho, “Terra”, e o fado foi apenas o som que serviu de pretexto para percorrer variados estilos musicais, desde o mais popular até quase a raiar o rock (um excelente baterista, Vicky, deu o mote para este som).
Por lá passaram, não só alguns dos êxitos mais conhecidos da cantora, mas também interpretações de temas Amália, Florbela Espanca ou Zeca Afonso, ou musicas de co-autoria com Rui Veloso e Carlos Tê ou Tito Paris.
Na sua musica misturam-se os ritmos africano, jazzisticos e roqueiros, num fundo de fado, por vezes algo de flamengo e sons de sonoridade árabe .

Já em período de encores, Mariza arrebatou-nos com a sua a sua interpretação do Bairro nego do Zeca e do seu tema “Cavaleiro Monge”.
Num permanente diálogo com o público, Mariza confidenciou vários momentos da sua vida, como a sua origem moçambicana e as suas actuações, apenas com cinco anos, na taberna dos seus pais, na Mouraria, onde se apaixonou pelo fado e pela guitarra portuguesa.
Para além do baterista Vicky, acompanharam-na neste espectáculo um trio de excelentes guitarristas, Ângelo Freire na guitarra portuguesa, Diogo Clemente na viola de fado e Marino de Freitas no baixo, bem como Simon James no piano e trompete.
Percebe-se porque é que o seu último trabalho aqui apresentado, “Terra”, mereceu duas nomeações para os Grammy Latinos "Melhor Álbum Folk" e "Melhor Produtor" para Javier Limon e foi também considerado um dos 10 melhores discos do ano de 2008 pelas publicações "Uncut" , "The Times" e "Songlines".
Mariza é mais do que fado, mais do que voz, mais do que espectáculo
Uma forma de começar em grande as festas da cidade de Torres Vedras.

sábado, 24 de outubro de 2009

No 80º aniversário do "crash" da bolsa de Nova Iorque (24 de Outubro de 1929)

No dia 24 de Outubro de 1929, então uma 5ª feira, a bolsa de Nova Iorque entrava em colapso.


Os sinais já vinham detrás, com superprodução, falências e despedimentos, mas esse foi o dis mais negro, daí ficar também conhecido pela “5ª feira negra”.

A situação económica desencadeou uma “bola de neve”, potenciando a falência de bancos e empresas, deflacionando os preços agrícolas, levando milhares de lavradores à miséria, repercutindo-se depois no congelamento das ajudas norte-americanas à reconstrução da Europa do pós Primeira Guerra, com especial impacto na Alemanha.

Algumas das principais consequências políticas foram a vitória eleitoral de Roosevelt nos Estados Unidos, introduzindo o chamado New Deal, uma política de grandes investimentos públicos e de apoios sociais que salvou esse país e o tornou uma referência do mundo capitalistas até aos anos 80, quando Ronald Reagan destruiu todo o equilíbrio traçado por Roosevelt, com as consequências que se agravaram na era Bush.

A subida de Hitler ao poder, embora tivesse origens muito mais complexas, foi outra das consequências dessa crise.

O pior de tudo viria entre 1939 e 1945, com a Segunda Guerra Mundial.

Nos Estados Unido Roosevelt apoiou a criação da Farm Security Administration (FSA), com o objectivo de fazer o levantamento da condição social do mundo rural norte-americano.Com esse objectivo essa instituição convidou alguns dos maiores fotógrafos de então para acompanharem os seus agentes nessa tarefa, deixando registado para a posteridade a gravidade da situação que então se vivia e os dramáticos movimentos migratórios de camponeses e desempregados que se deslocavam, literalmente com a família às costas, á procura de trabalho temporário.

Dorothea Lang e Walker Evans são apenas os dois fotógrafos mais conhecidos dessa equipa, que percorreu 22 estados norte-americanos.

Evocando essa 5ª feira negra de há 80 anos, aqui vos deixamos com algumas das fotografias que resultaram desse trabalho da FSA.



“Lavradores com os filhos…empoeirados pela tempestade”, em Cimarron County, Oklahoma, 1936. Fotografia de Arthur Rothstein.



“Casota lavada…”, em Hale County, Alabama, 1935 ou 1936. Fotografia de Walker Evans.


Floyd Burroughs.., Hale County, Alabama, 1935 ou 1936. Fotografia de Walker Evans.



 Bud Field e a sua família, Alabama, 1935 ou 1936. Fotografia de Walker Evans.



A caminho de Los Angeles, California, 1937. Fotografia de Dorothea Lang.



Loja  numa estrada perto de Birmingham, Alabama, 1936. Fotografia de Walker Evans.



trabalhadores filipinos apanhando alfaces, Salinas, Califórnia, 1935- Fotografia de Dorothea Lange.


A crise de 1929 vista pela objectiva de Dorothea Lenge