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sexta-feira, 15 de março de 2024

O Respigo da Semana :

 

O milhão do contra

Por Miguel Esteves Cardoso

“Com que então o Chega obteve um milhão de votos?

Ficámos assim a saber que há um milhão de portugueses que são do contra.

É deprimente? É. Um milhão é muita gente. Mas é um erro tentar apanhar esses votos. São votos do contra. São votos anti-sistema. Só passarão para o PSD ou para o PS no dia em que o PSD ou o PS se transformem em partidos do contra. Que será nunca.

Para o milhão de portugueses que votou no Chega — e para o próprio Chega – os votos obtidos pelo Chega foram uma desilusão e uma derrota.

Queriam ganhar as eleições. Ou ser o segundo maior partido. Não queriam ter menos de 25 por cento. Queriam ir para o governo. Não queriam ficar de fora.

Não tiveram nem 25 nem 20 por cento: só tiveram 18. Desses 18, muitos são abstencionistas que, insatisfeitos com o mau resultado, voltarão para a abstenção e tão depressa não cairão noutra.

A verdade é que o Chega nunca mais terá uma oportunidade como esta. Ver-se-á aflito para segurar o milhão do contra.

São estas as contas que os partidos com inveja dos votos do Chega têm de fazer. É escusado ir atrás dos eleitores do contra. Eles não estão apenas zangados: são mesmo do contra. E agora estão mais zangados ainda: votaram para ganhar. E perderam.

Contra os 20 por cento do Chega, há os 80 por cento que votaram nos partidos que são contra o Chega. Todos os votos em partidos que não são o Chega são votos contra o Chega. E todos os votos do Chega são votos contra os outros partidos.

Contra esses 20 por cento, há os 60 por cento da AD e do PS: o bipartidarismo vale três vezes mais. A moderação vale três vezes mais. O centro vale três vezes mais.

Imagine-se se a AD e o PS se recusavam a formar governo e calhasse ao Chega tentar formar governo. Que poderia fazer um partido só com um milhão de votos, isolado e odiado pelos outros partidos e pelos outros eleitores?

Quem é que poderia querer aliar-se a um tal governo? Ninguém.

Os partidos do contra só sabem ser do contra. Não servem para mais nada”.

(in Público de 12 de Março de 2024)

segunda-feira, 11 de março de 2024

O Ressentimento dá votos


Em momentos como este, recordo-me muitas vezes de uma conversa com o meu saudoso amigo Carlos Cunha : numa dada ocasião, não me lembro qual, em que lamentava determinado resultado eleitoral, respondeu-me: “ Estás preocupado? Descansa, que a maior parte dos que votou neles vai sentir e sofrer mais na pele o que eles vão fazer, do que tu ou eu”.

Como dizia Paulo Raimundo em plena campanha, “não confundimos os eleitores desse partido com o dito partido”, ou, como afirmou ontem Pedro Nuno Santos, “não existem em Portugal 18% de portugueses racistas e xenófobos”.

O que aconteceu foi que esse partido explorou os sentimentos mais primários que cada um de nós sente perante as injustiças do mundo.

Usando a propaganda das redes sociais com eficácia, a demagogia do combate à corrupção (o pior cancro da democracia), o abandono de partes significativas da população à voragem das elites económico/politico/sociais, esse partido conseguiu federar todos os descontentamentos acumulados por governações desastrosas, num mundo onde as grandes decisões económicas e financeiras, que afectam a vida de cada cidadão, estão entregues a instituições não eleitas e sem controle pelos cidadãos, seja o BCE, a Comissão Europeias, ou…o Ministério Público.

Claro que esse partido não tem nada para oferecer ou gente capaz de ir além da propaganda demagógica e da exploração de ressentimentos e sentimentos de intolerância social.

Como partido que fez do combate à corrupção o principal tema da sua campanha, não deixa de ser curioso que tenha , entre os seus principais apoiantes e dirigentes, um “preso por violência Xenófoba”, um líder de uma “rede de tráfico de armas”, detido pela PJ, um “candidato que disparou para matar” acusado pelo Ministério Públio, um segurança do líder “julgado por agressão” e por “sequestro, falsificação de documentos e roubo”, agressões ocorridas numa discoteca nocturna de Torres Vedras, o responsável por uma imobiliária insolvente, com uma dívida de 300 mil euros, um vice-presidente de uma distrital condenado por pequenos furtos e burlas, entre os quais a caixa de esmolas de uma Sé Catedral, outro acusado por ameças a jornalistas e ainda um outro condenado por violência doméstica, sem esquecer um conhecido líder de uma extinta organização terrorista que cometeu crimes de sangue (leiam a reportagem de investigação “A Grande “família” do Chega” publicada no jornal Público de 25 de Fevereiro último).

Infelizmente, guiados pelas redes sociais, vivemos num mundo onde a boçalidade rende mais votos que o debate racional, onde a velocidade de imagens e textos decontextualizados influenciam mais uma opinião que umas horas de leitura atenta, onde o ter conta mais do que o ser, onde todos se atropelam pelos “15 segundos de fama”  e pelo exibicionismo balofo de pequenas vaidades pessoais, onde quem pensa de forma diferente da nossa não é um adversário com quem se dialoga de forma civilizada, mas passa a ser encarado como inimigo contra o qual devemos descarregar toda a nossa raiva intolerante, “valores” inteligentemente explorados para minar a democracia em proveito próprio (será bom recordar que Hitler chegou ao poder através do voto democrático).

Nuno Ramos de Almeida escreveu hoje no Diário de Notícias:

“Foram precisas muitas gerações a lutar, muitas centenas de pessoas presas e torturadas e muitos mortos para termos conquistado a liberdade de palavra e de votar livremente.

“Pela primeira vez, desde há quase meio século, temos um partido claramente contra a revolução democrática com uma grande votação. Não quer dizer que os seus eleitores sejam admiradores do fascismo, quer dizer que muitas promessas desta revolução, interrompida a meio, não foram cumpridas.

“Vivemos, há dezenas de anos, num sistema em que a maioria das decisões económicas estão fora da decisão democrática.

“As pessoas sentem necessidade de protestar contra um sistema que dá sempre quase tudo aos mesmos, embora o seu proteste falhe, no meu entender, o alvo: não são os imigrantes, os ciganos ou as populações dos subúrbios que são culpadas deste falhanço (…). Continuamos a precisar de um sistema mais justo e igualitário que dê a toda a gente o que merece e é necessário”.

Também nos merece a atenção a opinião de António Brito Guterres, nas páginas do mesmo jornal, analisando os “ressentimentos” que estiveram na base do resultado eleitoral da direita intolerante:

“O Chega é de extrema-direita, fruto da visão dos seus ideólogos, mas a maior parte dos seus votantes não o são (…). O ressentimento explorado pelo Chega é cúmplice das atuais hegemonias económicas e um aliado para a sua perpetuação. É um garante de que o bolo cada vez maior da precariedade entre nós não aja numa consciência colectiva que poderia ameaçar o poder instituído.

“A riqueza aumenta, mas concentra-se num grupo cada vez mais restrito de pessoas. Os lucros atingem valores recorde, mas o risco de pobreza sem transferências sociais mantém-se superior aos valores de 1994. O Chega não vai resolver esta décalage, é um aliado sistémico para a sua expansão.

“Querem verdadeiramente combater o Chega? Saiam dos gabinetes, criem saber político instalado, deixem a população participar verdadeiramente, e filiem as pessoas como comandantes de uma mudança social”.

O ressentimento, a intolerância, a desinformação, a xenofobia, não vão construir nada de novo para o país e para as pessoas, vão funcionar apenas como uma válvula de escape para as frustrações colectivas ou pessoais, que nos desviam da verdadeira resolução dos problemas importantes que  temos de enfrentar, na habitação, na educação, na saúde, na solidariedade social, num mundo cada vez mais violento e desigual.

Uma travessia no deserto, à esquerda, pode ser benéfico, se esta souber reflectir sobre os seus erros e conseguir responder aos verdadeiros anseios das pessoas, mesmo daquelas que votaram na extrema-direita.

A democracia tem essa vantagem, não acaba no dia das eleições, respeita as minorias e a liberdade e funciona para além do voto, todos os dias, na sociedade e, como se costuma dizer, existem mais marés que marinheiros, ou, rematando como Carmo Afonso na sua crónica de hoje no jornal Público, o “dia de hoje é de festa para alguns e de profundo pesar para outros (…). É o jogo da democracia. Digo-vos que nem a festa nem o pesar nos podem dispensar de pensarmos bem nisto tudo”.

 

 

 

 

 

 

quinta-feira, 7 de março de 2024

Eu, Indeciso, me confesso…vou votar à esquerda!


Pela primeira vez, em 50 anos de democracia, só vou decidir o sentido do meu voto quando estiver dentro da cabine de voto, frente ao boletim de voto.

Mas o facto de estar indeciso sobre esse voto, não quer dizer que não saiba qual a tendência onde vou votar.

Um dos problemas é viver num distrito que, elegendo 48 deputados, dá mais possibilidades a recorrer menos ao “voto útil” e escolher partidos mais pequenos. Estivesse eu num distrito que elege dois ou três deputados e já tinha feito a minha escolha, sempre à esquerda, mesmo que tivesse que engolir sapos.

E já agora, votar à esquerda porquê?

A ideia de uma educação para todos, de um SNS, de uma maior redistribuição da riqueza, dos direitos do trabalho e sociais, do direito à habitação e a transportes público, a defesa eficaz do ambiente, porque esta só se faz combatendo o lado mais selvagem do capitalismo, é de esquerda, mesmo que, na prática, esta cometa erros, indecisões, incoerencias na defesa desses princípios, e embarque em  negociatas menos claras.

Também é bom não esquecer que a única ditadura que tivemos nos últimos cem anos em Portugal foi de direita e que foi à esquerda que ela foi combatida, com uma ou outra excepção.

Sá Carneiro, que foi uma dessas excepções, já nada tem a ver com a actual direita que o diz representar, envergonhando a sua memória todos os dias (basta ler o muito que ele escreveu e ouvir os discursos e a práticas de um Passos Coelho, de um Cavaco ou de um Durão Barroso…).

O que a direita tem a oferecer é, uns saudosismo salazarista, xenofobia e intolerância, outros entrega de serviços públicos ao lucro privado, benefícios fiscais aos grande grupos económicos (reduzir o IRC beneficia principalmente os grandes empresários) e, embora não o digam hoje, mas sempre praticaram no passado, cortes nos direitos sociais e do trabalho e entrega dos serviços público à voragem dos privados.

Mesmo que agora venham com falinhas mansas, de que “vão aumentar salários e pensões e reduzir impostos”, diz a experiência que, à primeira oportunidade, lá estaremos todos a perder direitos sociais  e a sofrer cortes nas pensões e nos salários.

Claro que subscrevemos muitas das críticas que são feitas a cada um dos partidos de esquerda, que não estão isentos, cada um à sua maneira, de responsabilidades em muitas situações que estão mal na sociedade e na economia portuguesa, mas a solução não aquela que a direita preconiza.

Como se costuma dizer, “para pior já basta assim”.

Por isso eu, indeciso me confesso...mas vou votar à esquerda.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

Eleições 2024 - Evolução das Sondagens

 


 (Fonte : Marktest)
As Sondagens valem o que valem, mas deixamos aqui registado um gráfico que resume a evolução dos resultados obtidos pelas mais credenciadas agências de sondagens portuguesas.


terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

O Fascismo “nunca existiu”!??...ou existiu “apenas” num país!???...ou “ainda anda por aí”!??..

 


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Nunca, como nos últimos tempos, o debate sobre o fascismo e a utilização desse termo, para interpretar a situação actual, foi tão usado. Na verdade, a definição de “fascismo”, continua por esclarecer e clarificar e é, desde longa data, tema de debates acalorados envolvendo historiadores, politólogos (seja lá o que isto for) e sociólogos.

Nos anos 90 chegou-se a um relativo consenso entre investigadores.

O Fascismo, na “pureza” das suas características, "apenas existiu" na Itália de Mussolini.

Tanto o nazismo, à sua “direita”, e o franquismo e o salazarismo (entre outros) à sua “esquerda” não encaixavam nas características puras do fascismo teórico.

O nazismo, embora seguindo o modelo de Mussolini, era, acima de tudo, “totalitário”, um conceito que, embora defendido teoricamente pelo fascismo italiano, só se teria concretizado, sem qualquer controle (da Igreja ou do rei, como aconteceu na Itália) na Alemanha de Hitler.

Contudo, o conceito de “totalitarismo” foi-se tornando pouco operativo, por um lado porque podia ser igualmente aplicado a regimes diferentes, como ao estalinismo na União Soviética ou à China do tempo da “revolução cultural”, por outro, porque o seu termo se generalizou e vulgarizou como argumento da propaganda ocidental, durante o período da Guerra Fria, contra os regimes do “socialismo real” do leste europeu.

Por sua vez, regimes como o salazarista e o franquista não se encaixavam totalmente na classificação e no tipo de estrutura política e social do fascismo.

O regime salazarista era um regime autoritário, antiliberal e antidemocrático, mas faltava-lhe o caracter de movimento de massas do fascismo, embora recorresse a estas sempre que necessitava do apoio da rua (lembram-se das célebres “manifestações espontâneas?”).

Apesar disso, pelo menos a partir da Guerra Civil de Espanha até ao final 2ª Grande Guerra, principalmente até ao momento em que se tornou evidente a derrota dos nazis, o salazarismo exacerbou a retórica e o modelo do fascismo italiano (Salazar era grande admirador do ditador italiano), altura em que se fundaram movimentos de características fascistas, baseados em organizações do nazismo e do fascismo, como a Mocidade Portuguesa e a Legião Portuguesa. Esta última organização foi mesmo a única organização do Estado Novo que fez, abertamente, o elogio do nazismo.

A partir do final da guerra essas organizações perderam as suas características fascistas, muito por influência da Igreja e do Exército e, claro, para branquear a sua origem quando o antifascismo saiu vitorioso da Guerra, e o regime alterou habilmente a sua natureza dos anos 30/40 para poder sobreviver, tendo mesmo conseguido tornar-se fundador da NATO.

A definição do que é o fascismo enforma de duas dificuldades:

- se o resumirmos ao culto da violência contra os inimigos, ao governo autoritário e ditatorial e à rejeição da democracia e do liberalismo, teríamos de alargar o conceito a um universo mais vasto, que incluiria os regimes do “comunismo real”, as ditaduras militares de todas as cores e muitos dos regimes autoritários dos nossos dias (na Turquia, na Rússia, no Irão, na Arábia Saudita, na Hungria… e o que dizer do actual governo de Israel?);

- se desenvolvermos muito essas características, apenas o Fascismo Italiano e um certo número de movimentos nacionais, fixados nos anos 30, podem ser classificados como tal, com a agravante que, nem mesmo o fascismo italiano, pela sua evolução e adaptação, se encaixaria plenamente nessas características retóricas.

E quais são elas (resumidamente)?

Recorremos a Stanley Payne:

- “As negações fascistas”: antiliberal, anticomunista, anticonservador;

- “Ideologia e objectivos” : criação de um novo Estado nacionalista autoritário; organização de estruturas económicas nacionais integradas, reguladas e “pluriclassistas”, numa palavra, corporativista; a criação e a defesa de um Império que implicará uma relação de força com as outras nações; um novo credo idealista e voluntarista, impondo um novo tipo de cultura secular, moderna e "autodeterminada";

- “Estilo e Organização” : Importância estética dos símbolos, dos mitos e da coreografia politica; mobilização das massas, militarizando as relações sociais e da vida politica, através de organizações de massas; uso da violência contra os “inimigos”; dominação masculina; exaltação da juventude, fomentando o conflito de gerações, pelo menos na sua fase inicial de transformação politica; tendência para uma liderança pessoal, autoritária e carismática, mesmo recorrendo inicialmente à via eleitoral.

Conseguir o pleno destas características, só mesmo no Fascismo italiano de Mussolini.

Mas, para ser classificado como fascismo não é necessário fazer o pleno, basta a existência da maioria dessas características.

Assim, para Stanley Payne o fascismo, nos anos 30/40 do século XX, é uma das famílias daquilo que ele classifica como as “três caras do nacionalismo autoritário”, sendo as outras duas a “direita radical” e a “direita conservadora”.

Como “fascistas” classifica, entre outras, o Partido nacional-socialista alemão, o Partido Nacional Fascista Italiano, a Falange em Espanha e o Nacional-sindicalismo português.

Na “Direita radical” coloca, entre outros, a figura de Papen na Alemanha, os Integralistas em Portugal e os Carlistas em Espanha.

Na “direita conservadora” cabem, entre outros, o presidente Hindenburg na Alemanha,  o governo de Vichy em França, o presidente Horthy da Hungria, Pilsudski na Polónia, a União Nacional e Salazar em Portugal e a CEDA em Espanha.

Recorde-se que, em Portugal, a maior parte dos nacional-sindicalistas  e dos integristas, mais ou menos forçados, mais ou menos voluntariamente, acabaram por integrar o regime salazarista, sendo, por outro lado, significativo o caso de Rolão Preto, líder dos nacional-sindicalistas, que, depois de preso, veio a apoiar a candidatura de Humberto Delgado.

O caso espanhol também é peculiar. Franco conseguiu fundir as várias organizações acima citadas, durante a Guerra Civil, numa falange mais abrangente, que se tornou o partido único do regime e que, na transição para a democracia, se integrou, quase todo, no actual Partido Popular, ganhando novo alento no recém criado Vox.

O caso português tem sido muito estudado por vários historiadores, destacando os trabalhos, divergentes nalguns pontos, de Fernando Rosas, Manuel Loff, António Costa Pinto e de Irene Flunser Pimentel.

Contra a corrente vai a tese de Jorge Pais de Sousa, que defende o salazarismo como um “fascismo de cátedra”, ou seja, um fascismo sem movimento de massas.

De qualquer modo, toda a problemática referida coloca o fascismo como uma situação histórica “irrepetível”.

Não é essa a tese de Umberto Eco, no seu ensaio de 1997, mas mais actual do que nunca, “como reconhecer o fascismo”, que mostra até que ponto o fascismo “ainda anda por aí”.

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Nos anos 90, depois da derrota do comunismo real, e com o fim da Guerra Fria, parecia que a democracia e a liberdade iam vencer por todo o mundo.

Recorde-se que na década anterior se tinham desmoronado as ditaduras militares na américa latina e o apartheid na África do Sul.

Era o “fim da história” de Fukuyama.

Também por essa altura estudava-se afincadamente o fascismo, chegando a maior parte dos investigadores à conclusão que este regime estava datado histórica e geograficamente.

O fascismo puro só tinha existido em Itália.

Estabeleciam-se as diferenças entre os vários regimes que até aí tinham sido “misturados” sob a designação de “fascistas”: o Estado Novo português, o governo de Vichy em França e o franquismo espanhol, entre outros, não encaixavam no modelo fascista dos investigadores.

Mesmo o nazismo era uma excrescência totalitária do fascismo.

Não deixa de ser, contudo, curioso, que, encontrando-se tantas diferenças entre esses regimes, nunca ninguém tenha feito o mesmo exercício para distinguir os regimes e os movimentos comunistas, quer do ponto de vista cronológico, quer do ponto de vista sincrónico.

É que, na realidade, existem tantas diferenças, em termos práticos, em termos de violência ou em termos económicos e sociais, entre o Estado Novo português, o nazismo alemão ou o fascismo italiano, como entre a União Soviética de Lenin, de Stalin ou Gorbachev, ou entre Cuba e a Coreia do Norte, ou entre o chamado eurocomunismo e o Partido Comunista Português…

Mas a preocupação em fazer esta distinção não terá motivado da mesma maneira os investigadores dessa altura.

Era mais importante retirar certos regimes e certos partidos da família fascista, do que fazer o mesmo exercício em relação aos regimes ditos comunistas.

Não questiono a seriedade desses estudos. Apenas noto a diferença de prioridades.

Claro que pode haver uma situação que explica essas opções.

A maior parte dos regimes que se inspiraram, com maior ou menos convicção, no modelo do fascismo italiano, raramente se designaram ou classificaram como fascistas, ao contrário do que aconteceu com os regimes comunistas ou com os vários movimentos comunistas, mesmo quando se combatiam entre si.

A maior parte dos regimes autoritários de direita e os futuros partidos de extrema-direita, principalmente depois da 2ª Guerra, não se gabavam, pelo menos publicamente, de admirarem Mussolini ou Hitler, a não ser em casos muito marginais.

Pelo contrário, apesar de todas as suas diferenças, tão grandes ou maiores do que as que existiram ou existem entre regimes e partidos da direita autoritária e antiliberal, os regimes do “comunismo real” e os partidos assim designados, todos invocavam a mesma origem comum, mesmo que aplicada ou interpretada de forma diferente, como mínimo denominador comum, em Engels, Marx e Lenine.

Nos anos 90 o fascismo era considerado assunto histórico encerrado e irrepetível, ao contrário do “comunismo real” que continuou a sobreviver até hoje na China, no Vietname, na Coreia do Norte e em Cuba, e em Partidos Comunistas que continuam a ter um peso significativo em muitos países democráticos.

Contudo, houve um autor que remou contra a maré.

Esse autor foi Umberto Eco que em 1997 publicou um ensaio intitulado “O fascismo eterno”, publicado e traduzido em Portugal com o título “Como reconhecer o fascismo”.

Para Umberto Eco, o fascismo não estava morto e enterrado, ao contrário do nazismo.

Começava por desmentir que o fascismo, ao contrário do nazismo, tivesse uma filosofia própria, mas apenas “retórica”.

Demonstrou que o fascismo italiano não era fácil de classificar ou de caracterizar, pois, ao contrário do modelo coerente em que muito o tentavam encaixar, era um movimento pragmático, muitas vezes contraditório e incoerente.

Ora, essa capacidade camaleónica do fascismo, permitiu a sua sobrevivência e a capacidade de reaparecer em qualquer outro lado ou época sob outras “vestes”.

A partir destas premissas, Umberto Eco identifica um conjunto de características do “novo fascismo”, que ele apelida de “Ur-fascismo”, avisando, contudo, que essas “características não poderão ser ordenadas num único sistema: muitas contradizem-se reciprocamente, e são típicas de outras formas de despotismo ou fanatismo. Mas basta que esteja presente uma delas para fazer coagular uma nebulosa fascista”.

Hoje, esse ensaio, com mais de vinte anos, veio revelar-se mais actual do que nunca, quando assistimos ao renascimento de regimes, partidos e retóricas de extrema direita, pondo em causa a existência das democracias liberais que se julgavam eternas e em expansão naquela década.

Aliás, o próprio termo de “democracia liberal” é defensivo, como se a democracia não fosse liberal.

O que é um facto é que a maioria desses movimentos substituíram a rua e os golpes militares pela campanha em redes socias e pela participação democrática e, onde chegam ao poder, como na Hungria, por exemplo, criaram um novo conceito, o de “democracia ileberal”, ou seja, manipulam as regras democráticas, mantendo a fachada de actos eleitorais para se legitimarem e legitimarem o controle sobre a justiça e a comunicação social.

Vemos isso também na Turquia, na Rússia, na Índia, nas Filipinas…

Quais as são características do “Ur-fascismo” apontadas por Umberto Eco?

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Registámos as características históricas do fascismo e a forma como a investigação histórica dos anos 90 caminhou no sentido de demonstrar que o fascismo estava morto e enterrado.

Referimos a excepção de Umberto Eco que, remando conta a maré dominante, explicou num ensaio de 1997, que o fascismo podia ressurgir com novas roupagens.

Tentamos agora explicar quais eram as características, apontadas por Eco, desse “novo fascismo”, que ele designa com “Ur-fascismo”.

Depois de analisar o exemplo do fascismo italiano, mostra que o fascismo não era coerente do ponto de vista ideológica, “não era uma ideologia monolítica, mas uma colagem de diversas ideias políticas e filosóficas, uma amalgama de contradições”, ao contrário do nazismo.

Por isso considerava que, se o nazismo não iria reaparecer “como movimento que envolva uma nação inteira”, pelo contrário o fascismo mantinha condições para renascer sob novas roupagens.

Escreveu Eco que houve “um único nazismo”, mas, em” contrapartida, “pode-se brincar ao fascismo de muitos modos”, porque o “termo “fascismo” adapta-se a tudo porque é possível eliminar de um regime fascista um ou vários aspectos, e poder-se-á reconhecê-lo com fascismo”.

Apesar da confusão e da dificuldade em definir fascismo, é “possível indicar uma lista de características típicas do que poderei chamar o “Ur-fascismo” ou o “fascismo eterno”. Estas características não poderão ser ordenadas num único sistema: muitas contradizem-se reciprocamente, e são típicas de outras formas de despotismo ou fanatismo. Mas basta que esteja presente uma delas para fazer coagular uma nebulosa fascista”.

E quais são essas características apresentadas no ensaio de Eco?

Ei-las, de forma resumida:

-1. O culto da tradição, embora seja “mais velho do que o fascismo”;

-2. A rejeição do modernismo e do mundo moderno, que também se pode referir como “irracionalismo”.

-3. O culto da “acção pela acção”: “A acção é bela em si, e portanto, tem de ser realizada antes de e sem qualquer reflexão. Pensar é uma forma de castração. Por isso a cultura é suspeita na medida em que se identifica com comportamentos críticos”, atitude identificada com o “uso frequente de expressões como “Porcos intelectuais”, “Convencidos”, “Snobs radiais”, “As Universidade são covis de comunistas”(…)”.

-4. O desacordo “é traição”.

-5. O Medo da diferença. “O Ur-Fascismo é (…) racista por definição”.

-6. A exploração da “frustração individual ou social”, apelando “às classes médias frustradas, sentindo mal-estar por qualquer crise económica ou humilhação política, assustadas pela pressão dos grupos sociais subalternos”.

-7. O nacionalismo, com apelo à xenofobia e que procura inimigos externos e internos que “conspiram” contra a identidade nacional.

- 8 . A defesa face a um inimigo que humilha o “povo” pela “riqueza ostentada”.

- 9 . A critica ao pacifismo.

- 10 . O elitismo de massas e o “desprezo pelos fracos”. Quem se identifica com o “chefe” ou com “o partido” é o “melhor povo do mundo” e os que pertencem ao “movimento” são “os melhores cidadãos” (como os “portugueses de bem” do Chega).

- 11 . O culto do “herói”, “todos são educados para se tornarem heróis”.

-12 . o “machismo”, que implica o “desprezo pelas mulheres” e a “condenação” da homossexualidade.

- 13 . O “populismo qualitativo”, ou seja, “os indivíduos enquanto indivíduos não têm direitos” e é o líder que interpreta a vontade do povo. Já então Eco avisava que no “nosso futuro perfila-se um populismo qualitativo na Tv ou na internet, em que a resposta emotiva de um grupo selecionado de cidadãos pode ser apresentada e aceite como a “voz do povo”. Devido ao seu populismo qualitativo, o Ur-Fascismo tem de opor-se aos “putrefactos” governos parlamentares”. E conclui: “sempre que um político lança dúvidas sobre a legitimidade do parlamento por já não representar “a voz do povo”, já podemos dizer que cheira a Ur-fascismo”.

- 14 . “O Ur-Fascismo fala a “neolíngua”, um termo inventado por George Orwell para o seu romance “1984”, uma crítica ao stalinismo então dominante entre os movimentos comunistas, mas que, segundo Eco, tem elementos comuns “a formas diferentes de ditaduras”, referindo o léxico pobre, de frase feita, com fins propagandísticos e de doutrinação, que procura alterar o significado da palavra com o objectivo de “limitar os instrumentos para o raciocínio complexo e crítico”, avisando para a necessidade de estarmos preparados “para identificar outras formas de neolíngua, mesmo quando toma  a forma  inocente de um talk- show popular”.

Conclui Eco que o “Ur-fascismo ainda pode voltar sob as vestes mais inocentes . O nosso dever é desmascara-lo e apontar o dedo a cada uma das suas novas formas –diariamente, em todo o mundo”.

Aquilo que parecia então uma mera divagação intelectual, está hoje mais actual do que muito.

Muitos dos 14 pontos apontados por Eco estão aí mais do que presentes no discurso populista de líderes políticos e movimentos de várias vestes e cores, da Venezuela ao Brasil e à Argentina, da Coreia do Norte à Hungria, da Rússia à Ucrânia, da Turquia às Filipinas, da Grã-Bretanha aos Estados Unidos, da França à Itália, de Israel aos Estados do fundamentalismo Islâmicos (Irão, Afeganistão, Arábia Saudita)….

As redes sociais, que substituem a rua como lugar de manifestação da violência e do ódio de tipo fascista, estão cheias de um discurso acima identificado por Eco como o “Ur-fascismo” dos nossos dias :

-o apelo irracional ao ódio contra quem não pensa como nós;

- o discurso saudosista do “antigamente [leia-se por cá, no tempo de Salazar] é que era bom”;

- a diabolização e ridicularização das ditas questões fracturantes [a critica à modernidade];

- a disseminação das fake news  [a mentira várias vezes repetida para se tornar “verdade”];

- a criação de um clima de medo [exagerando, pela repetição e pelo destaque, à existência de uma sociedade “dominada pelo crime”];

 -a desvalorização do Estado de Direito, com apelos à judicialização da sociedade, renegando a presunção de inocência ou fazendo dos tribunais espectáculo, recorrendo à divulgação de processos em segredo de justiça, conduzindo à defesa de uma justiça popular e a uma justiça feita pelas próprias mãos, atitude potenciada pelos títulos de tablóides;

- a desvalorização de um pensamento crítico, atacando os “intelectuais”, o conhecimento cientifico (evidente na negação da alteração climática), o papel das universidades “tomadas pela esquerda”;

- o desprezo pelos fracos, que culpa pela sua fraqueza, “vivendo dos subsídios”, apenas tolerados como alvo de campanhas de caridade para limpeza de consciências;

- o nacionalismo exacerbado, cercado de “inimigos” [os “venezuelanos”, os “comunistas”, os “islâmicos”, os “terroristas”, os “emigrantes”, os “homossexuais”…];

- a superioridade “democrática” das redes sociais, a “verdadeira” “voz do povo”, como contraponto da democracia “corrupta” e “putrefacta” dos regimes parlamentares e dos políticos;

- etc., etc., etc….

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Uma actualização fundamentada  do perigo de um “novo fascismo” está presente na recente obra de Madelene Albright, “Fascismo um Alerta”.

Historiando a origem histórica do fascismo e mostrando o que este teve de comum com o comunismo real (na sua versão stalinista) no desdém pela democracia, encontra diferenças assinaláveis entre as duas ideologias.

Faz igualmente o historial do MacCarthismo e da forma como, durante a Guerra Fria, os regimes democráticos pactuaram com as mais criminosas ditaduras, mostrando a forma como, no seio de regimes democráticos sólidos, o perigo das pulsões fascistas está presente e se pode transformar a democracia numa “ditadura da democracia”.

Faz um historial recente da presença dessas pulsões fascistas em regimes actuais, que , mesmo quando de origem ideológica aparentemente diferente, transportam em si o vírus do fascismo: o recurso à mentira, o desdém pela liberdade e pela democracia, o carisma do líder, o recurso ou apelo ao genocídio, o combate à diferença e o nacionalismo exacerbado.

Percorre a história recente do chavismo venezuelano, do regime turco de Erdogan, da ascensão de Putin, da “democracia iliberal “ de Órban na Hungria, da liderança omnipresente da dinastia Kim na Coreia do Norte, entre muitas outras referências a outros regimes “proto fascistas” como o de Sissi no Egipto, o de Kaczynski na Polónia, o de Zeman na República Checa, o de Duterte nas Filipinas (só não falando em Bolsonaro porque ainda não era notícia à data da escrita do livro), chegando à principal preocupação para o seu alerta contra o fascismo, a situação que se vivia ( e se volta a viver) nos Estados Unidos com a vitória de Trump.

Claro que nenhum desses regimes é classificado por Albright com “fascista” ( apenas classifica como tal o da Coreia do Norte), mas todos transportam em si a semente de um novo fascismo, principalmente pela forma como banalizam um determinado discurso e uma determinada atitude que justifique as pulsões “fascistas”.

Em muitos desses governos e noutros movimentos de tipo populista por esse mundo fora, e citando Robert Paxton, da Universidade de Columbia, “ouvimos ecos de temas fascistas clássicos: medos da decadência e do declínio; afirmação de uma identidade nacional e cultural; uma ameaça à identidade nacional e à boa ordem social por parte de estrangeiros não assimiláveis; e a necessidade de maior autoridade para liderar com esses problemas” ( pág.222).

Em comum, Albright encontra nalgumas das atitudes daqueles governos o caminho para um novo fascismo:

“Rapidamente o Governo que silencia um meio de comunicação acha mais fácil silenciar um segundo. O parlamento que ilegaliza um partido político passa a ter um precedente para banir o seguinte. A maioria que priva determinada minoria dos seus direitos não para por aí. A força de segurança que espanca manifestantes e fica impune não hesita em voltar a fazê-lo” (pág.278).

Albright recorda-nos que, como aconteceu ao longo da história, os fascistas podem chegar ao poder por via eleitoral. Hoje em dia, aliás, não se atrevem a fazê-lo de outro modo. Geralmente chegados ao poder, vão dando passo a passo a estocada final na democracia, sendo o primeiro passo minarem “a autoridade de centros de poder que compitam com eles, incluindo o Parlamento”.

Deve-se a Albright uma definição simples e concisa do que é um fascista: “alguém que reclama falar em nome de uma nação ou de um grupo, que não se preocupa nada com os direitos dos outros e que está disposto a recorrer à violência e a quaisquer outros meios necessários para alcançar os seus objectivos” (pág.296).

Albright, que iniciou o seu livro com um conjunto de perguntas feitas aos seus alunos, cujas respostas esclarecem o que foi o fascismo em termos históricos, conclui a sua obra reformulando as perguntas, para responder onde podemos encontrar, nos líderes políticos de hoje, os novos arautos no novo fascismo:

“Vêm ao encontro dos nosso preconceitos, sugerindo que tratemos as pessoas de outra etnia, raça, credo ou partido como se não merecessem dignidade e respeito?;

“Querem que alimentemos a ira contra quem acreditamos que nos fez mal, esfreguemos os ressentimentos até ficarem em carne viva e ponhamos os olhos na vingança?;

“Encorajam-nos a sentirmos desprezo pelas instituições que nos governam e pelo processo eleitoral?;

“Procuram destruir a nossa fé em elementos essências à democracia, como uma imprensa independente e uma magistratura profissional?;

“Exploram os símbolos do patriotismo – a bandeira, o juramento – num esforço consciente  de nos virar uns contra outros?;

“Se forem derrotados nas urnas, aceitam o veredicto ou insistem sem provas de que foram eles os vencedores?;

“Fazem mais do que pedir os nossos votos e gabam-se da sua capacidade para resolver todos os problemas, acalmar todas as ansiedades e satisfazer todos os desejos?;

“Solicitam os nossos aplausos falando despreocupadamente e com entusiasmo machista sobre o uso da violência para aniquilar os inimigos?;

“Repetem a atitude de Mussolini: “A multidão não precisa de saber” , tudo o que tem a fazer é acreditar e “aceder a ser moldada”?” (pp.304-305).

Quem responder positivamente a estas questões trás consigo e alimenta a semente do novo fascismo.

Como se pode concluir do que nós escrevemos e citámos, não é fácil definir, nem ontem nem hoje, o que é o fascismo.

Nem o fascismo dos anos 30 é repetível na nossa época.

Mas o desprezo pela democracia, pela liberdade, pelo outro, pela verdade, pelas instituições sociais e democráticas, pelos direitos humanos e sociais, é uma carcteristica comum à extrema-direita populista, seja a dos anos 30, seja a actual, mesmo quando, como na Venezuela, se veste  de roupagens pseudo-esquerdistas.

Ao mesmo tempo o apelo à violência e ao ódio, físico ou verbal, a atitudes irracionais, ao que de pior existe no ser humano, é comum a tudo aquilo que, legitimamente, podemos classificar de fascismo.

Não vamos ver milícias nas ruas perseguindo judeus, negros, comunistas, socialistas ou democratas (ou será que vamos? Bolsonaro prometeu algo parecido no Brasil...). Hoje as redes socias prestam bem esse serviço.

Não vamos ver a destruição total do formalismo democrático, pois podem bem conciliar o acto eleitoral em sociedades manipuladas por uma comunicação social controlada pelo poder financeiro e político (Rússia, Turquia, Hungria, Argentina...).

Ao contrário dos anos 30, em que economicamente o que era viável aos poderes que financiaram o fascismo contra o socialismo, a democracia e os direitos sociais, era a estatização da economia, hoje esses mesmo poderes apostam no neoliberalismo que lhes permite escapar ao fisco, às regras ambientais, à legislação e os direitos laborais e ao controle democrático da sua acção pelos parlamentos.

Este “novo fascismo”, ou “ur-fascismo” ou “populismo”, não precisa hoje de recorrer ao aparato cénico propagandístico e espectacular dos anos 30. Basta manter-nos alienados, agarrados às redes socias e aos talk shows.

Ao contrário da esquerda, a extrema direita populista conseguiu adaptar-se aos novos tempos e renascer das cinzas, voltando a colocar o mundo á beira do abismo e da barbárie.

Bibliografia:

ALBRIGHT, Madeleine, Fascismo – um alerta, ed. Clube do autor, 2018;

ECO, Umberto, Como reconhecer o fascismo. Da diferença entre migrações e emigrações, ed. Relógio d’Àgua, 2017 (texto original de 1997, numa tradução de grande qualidade de José Colaço Barreiros);

PAYNE, Stanley G., El fascismo, Alianza Editorial , Madrid 1996 (1ª edição em 1980);

PINTO, António Costa, O Salazarismo e o Fascismo Europeu, ed. Estampa;

quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

Personalidades pedem compromissos à esquerda com "prazos e objetivos" : “Queremos ver as contas certas de medidas urgentes”


2024 é um ano perigoso. Preocupa-nos a banalização do mal em genocídios que vão escalando. Preocupam-nos as regressões em direitos humanos fundamentais, como o de asilo e de proteção contra as guerras. Preocupa-nos a ascensão da extrema-direita na Europa, nos Estados Unidos, na Argentina e noutras regiões. Preocupa-nos que a voz do Secretário-geral da ONU não seja ouvida para um combate poderoso por uma transição climática justa.

Olhamos por isso para as eleições de março como a exigência de um novo impulso para que Portugal seja um pilar da luta contra a desesperança. Para que, no 50º aniversário do 25 de Abril, seja mobilizada a confiança numa democracia dedicada a criar igualdade e qualidade na saúde e na educação, transparência na vida pública e uma estratégia económica e social inclusiva em que as pessoas não sejam apenas números.

Nesse sentido, apelamos aos partidos de esquerda para que apresentem as suas propostas e divulguem os compromissos que estão dispostos a fazer para resolver problemas que atormentam o país, da precariedade à corrupção, da degradação de serviços públicos à pobreza dos idosos e crianças, da educação aos cuidados de saúde, do funcionamento da justiça à estabilidade nas escolas, das desigualdades entre homens e mulheres e discriminação das minorias étnicas à liberdade da comunicação social e à criação cultural. E divulguem também os mecanismos de controlo que se propõem estabelecer para que nos seja permitido controlar a execução desses mesmos compromissos.

Queremos contas certas de prazos e objetivos desses compromissos, pois sabemos que a democracia não é um jogo político que se faz depois das eleições – a democracia é a decisão informada e exigente nas eleições. A democracia somos nós, o Povo, e só assim podemos vencer as ameaças deste tempo perigoso.

Pilar del Rio, presidente da Fundação Saramago (aqui a título pessoal, como todas as pessoas que assinam)
Eduardo Paz Ferreira, jurista, professor universitário jubilado

Adelaide Chichorro Ferreira, professora universitária
Adelino Gomes, jornalista
Alexandre Delgado, compositor
Alexandre Manuel, jornalista e professor universitário
Alfredo Caldeira, investigador
Álvaro Garrido, diretor da Faculdade de Economia de Coimbra
Álvaro Siza Vieira, arquiteto
Ana Benavente, socióloga
Ana Cardoso Pires, tradutora
Ana Garrett, inspetora do Ministério da Educação
Ana Godinho, professora do ensino secundário
Ana Gomes, diplomata, foi eurodeputada
Ana Maria Bettencourt, professora do ensino superior
Ana Maria Santa-Marta, bancária, reformada
Ana Parada Costa, técnica superior
Ana Paula Arnaut, professora universitária
Ana Paula Vicente, psiquiatra
Anabela Mota Ribeiro, jornalista, escritora
André Carmo, dirigente sindical e professor universitário
Antónia Coutinho, professora universitária FCSH-UNL
António Chora, operário, foi coordenador da CT da Autoeuropa
António Manuel Nunes dos Santos, professor jubilado na FCT-UNL
António Marçal, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Judiciais
António Valadas da Silva, jurista
Arminda Barbosa, secretária de direcção
Áurea Bastos, dirigente sindical
Baceló de Carvalho (Bonga), músico
Bárbara Bulhosa, editora
Bernardo Vilas Boas, médico, dirigente sindical
Carlos Bastien, economista, professor universitário aposentado
Carlos Branco, general
Carlos Costa Brito, engenheiro
Carlos Fino, jornalista
Carlos Fiolhais, professor universitário
Carlos Lobo, professor universitário, foi SE Assuntos Fiscais
Carlos Passos, diretor comercial
Carlos Reis, professor emérito da Universidade de Coimbra
Carlos Trindade, membro da Executiva da CGTP e presidente do STAD
Carlos Vargas, jornalista
Catarina Martins, foi deputada
Céu Gonçalves, técnica superior da FEUP
Conceição Antunes, professora universitária, FCUP
Constantino Sakellarides, médico
Cristina Branco, cantora
David Carvalho Martins, jurista
David Duarte, jurista, professor universitário
Diana Andringa, jornalista
Domingas Rocha de Vasconcelos, arquiteta
Domingos Machado, médico urologista
Eduardo Vera-Cruz Pinto, jurista, diretor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Eliana Madeira, técnica de projectos de intervenção social
Fernanda Henriques, professora emérita da Universidade de Évora
Fernando Alves, jornalista
Fernando Gomes da Silva, foi Ministro da Agricultura
Fernando Nunes da Silva, urbanista
Fernando Pires de Lima, dirigente sindical
Fernando Rosas, professor jubilado de história
Francisco Fanhais, músico
Francisco George, médico, foi DG da Saúde
Francisco Ramos, economista, foi SE da Saúde
Francisco Teixeira da Mota, advogado
Henrique Sousa, investigador social
Irene Lima, música/violoncelista
Isabel Allegro de Magalhães, professora universitária em literatura comparada
Isabel do Carmo, médica
Isabel Franco, professora
Isabel Soares, diretora de escola
Jacinto Lucas Pires, escritor
Januário Torgal Ferreira, bispo emérito das Forças Armadas e da segurança
Joana Bordalo e Sá, médica oncologista, dirigente sindical
Joana Espain de Oliveira, professora universitária na FCUP
Joana Lopes, professora universitária e gestora reformada
Joana Neto Mestre, jurista
Joana Pereira Leite, professora universitária, economista
João Cravinho, foi ministro das Obras Públicas
João Figueira, professor na Universidade de Coimbra
João Goulão, médico, especialista em toxicodependência
João Leal Amado, professor de direito do trabalho na U Coimbra
João Nabais, advogado
João Proença, médico, dirigente sindical
João Teixeira Lopes, sociólogo, professor universitário
Jorge Pinto, sindicalista, membro de uma comissão de trabalhadores
José António Santos, jornalista
José Aranda da Silva, farmacêutico, ex-bastonário da Ordem, foi DG no M Saúde
José Carlos Vasconcelos, jornalista, diretor do Jornal de Letras
José Feliciano Costa, professor, dirigente sindical
José Gil, professor de filosofia na FCSH-UNL
José Jaime, professor, diretor de escola secundária
José Luís Peixoto, escritor
José Manuel Pureza, professor universitário, foi vice-presidente da AR
José Rebelo, professor emérito do ISCTE
José Reis, professor universitário
José Teófilo Duarte, gráfico
José Vítor Malheiros, jornalista
Júlio Machado Vaz, médico
Leonor Caldeira, advogada
Luís Simões, jornalista, sindicalista
Luísa Cerdeira, professora universitária em ciências da educação
Luísa Costa Gomes, escritora
Luísa Teotónio Pereira, dirigente associativa
Manuel Alberto Valente, escritor e editor
Manuel Brandão Alves, economista, professor universitário aposentado
Manuel Carvalho da Silva, sociólogo, sindicalista
Manuel Sarmento, professor universitário em ciências de educação
Manuela Pereira Pinto, professora do ensino secundário, aposentada
Manuela Ribeiro Görtz, médica oncologista, aposentada
Manuela Goucha Soares, produtora
Manuela Vasconcelos, técnica superior da função pública, aposentada
Marcelo Teixeira, editor
Maria Adelaide Martinez, professora do ensino secundário, aposentada
Maria Amélia dos Santos Costa, professora do ensino secundário, aposentada
Maria Augusta Babo, professora da FCSH/UNL
Maria Conceição Lobo Antunes, professora aposentada da FC-UNL
Maria Edite Pereira, aposentada
Maria Emília Brederode Santos, membro do Conselho Nacional de Educação
Maria João Gonçalves, arquiteta
Maria do Loreto Couceiro, professora da FCT-UNL
Maria Natália Coelho, professora do ensino secundário, aposentada
Miguel Oliveira, arquitecto
Maria Rosário Gama, professora aposentada
Maria Teresinha Tavares, geóloga, trabalhadora do Graal
Miguel Gonçalves Mendes, cineasta
Miguel Oliveira, arquitecto
Miguel Real, professor, escritor
Patrícia Alexandra Correia Sousa, hematologista, dir. de serviço do IPO de Coimbra
Paulo Pedroso, sociólogo, foi ministro do Trabalho e da Solidariedade
Paulo de Sousa de Vasconcelos, professor do ensino superior
Pedro Abrunhosa, músico
Pedro Diniz de Sousa, investigador em ciências sociais
Pedro Messias, bancário, dirigente sindical
Pedro Pezarat Correia, general, militar de Abril
Regina Carmona, médica, foi diretora no M Saúde
Renato do Carmo, professor universitário
Rodrigo Sousa Castro, coronel, militar de Abril
Rogério Nogueira, trabalhador da Autoeuropa, coordenador da CT
Rogério Roque Amaro, professor universitário
Rosa Monteiro, foi SE da Igualdade
Rosária Martins de Campos, professora do ensino secundário
Sérgio Godinho, músico, escritor
Sofia Branco, jornalista
Tatiana Levy, escritora
Teresa Beleza, jurista, professora
Teresa Cadete, professora universitária na FLUL
Teresa Coelho Moreira, professora universitária
Teresa Paixão, diretora televisiva
Teresa Vasconcelos, professora do ensino superior
Teresa Veiga Furtado, professora de artes na Universidade de Évora
Ulisses Garrido, sindicalista
Virgínia Ferreira, professora universitária
Viriato Soromenho Marques, professor universitário de filosofia
Vítor Nogueira, economista
Vitorino, músico

 

quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

Um Cartoon de Natal (com desejo de Boas Festas).


Razões pessoais não me têm permitido anadar por aqui com mais assiduidade.

De qualquer modo, aqui deixo o desejo de Boas Festas para todos, sem esquecer os que vão continuar a passar estas "festas" no meio de bombardeamentos, seja na Palestina, seja na Ucrânia, os que vão continuar a viver na rua (como cerca de 17 mil portugueses) e os que vão continuar com fome ou presos por regimes ditatorias, um pouco por todo o mundo.


quarta-feira, 29 de novembro de 2023

ESPELHO MEU, ESPELHO MEU, há alguém mais criminoso do que eu? (sem esquecer o Hamas e o Batalhão Azov, entre outros)

 


As origens dos conflitos são diferentes, as histórias também. O Conflito Israelo-Palestiniano dura deste 1948 e o conflito na Ucrânia dura desde 2014.

Em 24 de Fevereiro de 2022 a Rússia invadiu criminosamente a Ucrânia, de forma ilegal, à luz das relações internacionais, com o pretexto de combater ao “nazis” e defender as populações de origem russófona,  alvo das perseguições e dos crimes por parte de bandos nacionalistas, que se digladiavam desde 2014, já tendo provocado entre 10 a 20 mil vítimas, a maioria civis, assistindo-se a massacres de parte a parte, o mais famoso o massacre de Odessa em que foram queimados vivos vários apoiantes da Rússia.

A Rússia tem destruído escolas, hospitais e outras infraestruturas civis ao longo da guerra, com o pretexto (nalguns casos comprovado) de que essas estruturas e os seus ocupantes são usado como escudo humanos por tropas ucranianas, ou foram atingidas acidentalmente por fragmentos de mísseis e drones atingidos pela defesa ucraniana.

Ao longo do mês de Outubro último Israel começou a bombardear, de forma desproporcionada e criminosa, a população civil de Gaza (e também a da Cisjordânia) com o pretexto de combater os terroristas do Hamas, que massacraram, num atentado sem precedentes,  mil e quatrocentos civis israelitas e fizeram reféns mais de 200.

Israel têm destruídos centenas de escolas e hospitais na Faixa de Gaza, sem se desculpar com erros de pontaria, mas com a desculpa da sua utilização militar ou logística por parte do Hamas, situação nunca comprovada por fontes independenetes.

A zona em guerra ou sob ocupação russa na Ucrânia tem a dimensão de grande parte da Península Ibérica.

A zona de guerra na Faixa de Gaza tem metade do tamanho do Algarve.

Segundo dados, já desactualizados (foram publicados pela revista Visão em 5 de Novembro), a invasão russa da Ucrânia que dura há quase 2 anos, provocou, entre a população civil do país, 9 614 mortos e 17 535 feridos, entre os quais 554 crianças mortas e 1180 feridas.

Segundo os mesmos dados, até aquela data, os bombardeamentos de Israel provocaram, na Faixa de Gaza, em cerca de 1 mês de guerra, 9 061 mortos e 24 mil feridos, entre os quais 3 648 crianças mortas e 9 600 feridas.

Nos violentos bombardeamentos da Rússia à Ucrânia, são reportadas, por dia, pelas próprias autoridades ucranianas, um número de vítimas raramente superior à 10, e muitas vezes “apenas” feridos, e sempre que isso acontece apontam para crimes de guerra, enquanto que nos bombardeamentos israelitas morrem centenas de civis por dia, número de que o próprio exército de Israel se gosta de gabar.

Qualquer morto civil numa guerra é sempre um crime de guerra. A violência das situações não se mede pelos números.

Mas, perante os dois pesos duas medidas como essas guerras têm sido comentadas ou divulgadas e os dois pesos e duas medidas da atitude dos responsáveis políticos “ocidentais” (será porque os ucranianos são louros de olhos azuis e os palestinianos são mais escurinhos?) é caso para perguntar: espelho meu, espelho meu, há alguém mais criminoso do que eu? (…eu sei que há, mas entre aqueles dois criminosos que lideram Israel e a Rússia é caso para dizer…venha o diabo e escolha. E já agora, que o Tribunal Penal Internacional tenha coragem para os levar, aos dois, à barra do tribunal para serem condenados como criminosos de guerra, que o são, e se deixe de usar, também, dois pesos e duas medidas).