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sexta-feira, 30 de abril de 2021

Arruaceiros ao Poder…os outros já dirigem o futebol!

(caricatura de Herman José à candidata Suzana Garcia)

Parece que o que está na moda na política já não é debater projectos e ideias, mas sim ver quem grita mais alto ou diz o maior disparate ou a maior alarvidade.

É isso que dá direito a comentários nas redes socias ou a aparecer em programas de reality show e nos debates televisivos, para aumentar audiências e ganhar votos.

Suzana Garcia, a candidata à Câmara da Amadora do PSD, é a prova mais recente do grau zero a que chegou o debate político.

Confesso que não me recordo, nas últimas décadas, de ouvir alguém em Portugal, candidato num partido com representação parlamentar, ou mesmo noutros, defender a “exterminação” de adversários políticos.

Foi isso que a candidata afirmou, numa entrevista a um programa de reality show: “Eu espero mesmo que o Bloco de Esquerda seja EXTREMINADO”.

Depois, questionada pelo entrevistador sobre se defendia o mesmo para o CHEGA, acabou por dar a resposta “politicamente correcta”, para parecer independente : “Também”.

Confesso que, desde o nazismo, não me lembro de alguém defender em público a “exterminação” de adversários ou de quem quer que fosse (o que não quer dizer que não se tenha feito, mas raramente assumindo).

O nível arruaceiro a que já estamos habituados no meio futebolista, como tivemos ocasião de assistir ainda na última semana, parece ter agora descido de vez ao mundo da política, tanto mais que não estamos a falar de uma candidata de um qualquer grupo marginal, da direita ou da esquerda, mas da candidata de um partido responsável, fundador da democracia.

Estranho também é o silêncio das redes socias, sempre tão indignadas quando o disparate vem da esquerda, revelando o grau de infiltração e influência, nesse meio, do extremismo de direita, de onde é oriunda a boçal Suzana Garcia.

A arruaça, dominante nos debates das redes sociais, parece estra agora preparada para tomar conta do poder do debate político.

sexta-feira, 23 de abril de 2021

Mais um “servicinho” do Expresso ao Chega


Este é mais um daqueles títulos falaciosos e tendenciosos, à “correio da manhã”,  a que o Expresso nos tem vindo a habituar nas últimas duas décadas.

Está feito para dar força à voz daqueles que não acreditam no regime democrático e que procuram todos os argumentos para o denegrir.

O título não é inocente, serve para alimentar o comentário fácil de cinco tipos de gente que convive mal com a democracia e os seus defeitos:

- os saudosos da “democracia orgânica” do Estado Novo;

- os saudosos das “democracias populares” de triste memória;

- os ultra neoliberais  que acham que a “verdadeira democracia” só existe com a total privatização da economia e sem direitos sociais;

- os defensores de uma “IV República” para os “portugueses de bem”;

- os anarcas de todas as tendências, estes talvez os únicos bem intencionados.

Para todos esses, por razões diferentes, não havendo uma “democracia plena”, então a democracia em que vivemos não merece ser defendida.

Contudo, olhando com atenção para os dados da sondagem em causa, os resultados não são exactamente aqueles que o título falacioso do Expresso pretende.

De facto, se me colocassem a  questão, eu responderia aquela que foi, de facto, a opção mais votada: “Portugal é uma democracia…apesar de ter pequenos defeitos” (47% dos inquiridos).

Não foi idêntica a essa a reposta de Churchill,  uma das figuras mítica da democracia liberal?

Aliás, não deixa também de ser estranho que o dito inquérito não inclua a possibilidade de uma resposta intermédia, entre o de a democracia “ter pequenos defeitos” e o de a democracia ter “muitos defeitos”.

Para mim, a mais correcto era, exactamente, a resposta intermédia, inexistente nesse inquérito algo tendencioso : “Portugal é uma democracia com ALGUNS defeitos”, e por isso é preciso lutar todos os dias por melhorá-la, em vez a denegrir.

O título correcto, se não houvesse intensão de  manipular a informação, era " 57% acreditam que Portugal é uma democracia plena ou com pequenos defeitos".

Mas isso pouco interessa aos responsáveis pelo tendencioso título do Expresso, mais um bom contributo para a “causa” do Chega e afins.

segunda-feira, 12 de abril de 2021

A Corrupção é “um lugar estranho”.

 


A leitura da decisão instrutória da “Operação Marquês”, ao contrário do que uma opinião apressada, ignorante, tendenciosa e cega pode fazer crer, foi uma autêntica lição sobre a forma como a grande corrupção em Portugal funciona e como a nossa lei e a  nossa justiça se mostram incapazes de a combater eficazmente.

Mostra também que aquilo que qualquer cidadão comum, gozando de plenas capacidades mentais, identifica como corrupção, está, muitas vezes, protegido pela lei ou pela impossibilidade da prova.

Muito do que consideramos como eticamente reprovável, vulgo “corrupção”, é “apenas” isso, eticamente reprovável, mas está  protegido pela lei ou pelo silêncio.

Aliás, a grande corrupção não é mais nem menos que a “ética do capitalismo” e da “economia de mercado”.

Como diz a voz popular, uma grande fortuna esconde um grande crime.

Olhando para a história do capitalismo, este desenvolveu-se, ao longo dos seus vários séculos de história, com base nos crimes mais hediondos: na pirataria e no saque da propriedade e dos recursos alheios, no esclavagismo, no genocídio, no crime organizado, na guerra, na destruição dos ecossistemas e, mais recentemente, no branqueamento de capitais, na fuga aos impostos, nos negócios de armamento e da droga.

A dificuldade em seguir as movimentações de dinheiro , obtido pela corrupção, agravou-se pela   forma como funciona a globalização e a circulação de capitais, e pela forma como o poder financeiro está, há muito, contaminado pela origem duvidosa da maior parte dos seu capital (branqueamento de capitais oriundo do crime organizado, da especulação financeira , da fuga de impostos, do negócio ilegal de armamento, alimento do terrorismo internacional e de regimes criminosos…), pela manutenção de paraísos fiscais, não deixando de ser “surpreendente” que a própria União Europeia, sempre pronta ao discurso “politicamente correcto” do “ataque à corrupção”, permita a existência, no seu seio, desses mesmos paraísos fiscais, como acontece, por exemplo, com a Holanda, cujos governos estão sempre prontos a defender a retirada de direitos socias aos países pobres da UE e a defender a austeridade dos outros, mas que é um país historicamente fundado nos lucros da pirataria, do esclavagismo e do colonialismo, devendo , actualmente, a sua prosperidade económica à forma como protege as grandes empresas de pagarem impostos no território onde operam, prejudicando países como Portugal. Mas não é caso único no seio da UE.

Infelizmente, as “alternativas” históricas ao modelo capitalista mostraram-se tão criminosas como este, nalguns casos ainda mais corruptas e desumanas.

Uma outra vantagem deste processo é mostrar que, apesar de tudo, a forma como a democracia enfrenta este tema da corrupção é sempre superior ao de qualquer ditadura. Pelo menos os cidadãos sabem agora com que justiça contam e podem agora exercer, com mais coerência, o seu direito de cidadania, que é o de exigir alterações na lei, principalmente no que respeita à obtenção de provas, na alteração ao escandaloso arrastamento dos processos e  ao ignóbil principio da “prescrição” da prova.

Acima de tudo, o cidadão tem o dever de não pactuar com a corrupção, que começa nos actos mais simples do dia a dia e termina no favorecimento de fortunas ilícitas.

Muitos dirão, do alto da sua ignorância e da sua intolerância, que na “ditadura” não havia corrupção.

“Não havia” porque não se podia falar nela, sob ameaça da censura ou de prisão, para além dos corruptos serem protegidos pelo poder, com leis, tribunais e uma polícia politica que obrigava ao silêncio

Mas a ditadura, qualquer uma, é a pior de todas as corrupções, que é a usurpação do poder sobre um país ou um povo, em benefício de uma pessoa, de uma elite, de uma religião, de uma ideologia, de  uma classe ou de um partido.

Por isso, apesar de a decisão instrutória da “Operação Marquês” poder não ser o que esperávamos, embora a história ainda não tenha terminado, ela teve o condão de nos alertar sobre os “caminhos da corrupção”, para as limitações da lei e da justiça no combate à grande corrupção, e para a necessidade de estarmos todos muito mais atentos ao que se passa à nossa volta.

Agora é a vez da cidadania.

sexta-feira, 9 de abril de 2021

Calma! Sócrates ainda não se safou! (...antes pelo contrário...ou ...aprendendo com Al Capone!)


Não tendo seguido em pormenor a sessão de hoje da leitura do  processo contra José Sócrates, houve duas ou três coisas que, mesmo assim, percebi e ficaram evidentes:

- a total incompetência do Ministério Público pela  forma como investiga os crimes de corrupção de colarinho branco. Já tinha sido assim como BPN e com o caso dos “Submarinos”, aconteceu agora com a “operação marquês”;

- a total incompetência do juiz Carlos Alexandre na forma como conduziu a acusação, acusando primeiro e procurando as provas depois e deixando escapar partes do processo para a comunicação social, que é o contrário do que uma investigação competente deve fazer. Claro que ia dar buraco, como ficou hoje evidente;

- Ivo Rosa fez aquilo que era possível fazer para salvar ainda alguma coisa do processo, que foi eliminar o que é impossível provar ou estava contaminado pela incompetência do Ministério Público e de Carlos Alexandre, mantendo as acusações com fundamento, mesmo que menos espectaculares. Foi assim que os Estados Unidos conseguiram apanhar Al Capone;

- Sendo quase impossível provar crimes de corrupção, Ivo Rosa, de forma inteligente, manteve a suspeita social desses crimes cometidos por José Sócrates, o que, aliás muito irritou o suspeito. Com isso, retirou a Sócrates qualquer hipótese de sair “limpo” e voltar à vida política. Desta forma, com subtileza, Ivo Rosa prestou um grande serviço ao país;

- Ficou provada a existência de crimes graves cometidos pelo arguido, mas que já prescreveram, devido, mais uma vez, à incompetência do Ministério Público e do juiz Carlos Alexandre, pela forma com este conduziu o processo, mas também devido a esse absurdo princípio da “prescrição”, usado por quem pode pagar a advogados astutos para arrastar processos. Neste campo, algo de urgente tem de mudar na justiça, se querem preservar a sua credibilidade.

Ao contrário do que uma opinião apressada e sectária pode julgar, José Sócrates não se safou e agora, perante a solidez da acusação, mesmo que seja menos espectacular e mais restrita, vai ter mais dificuldade em escapar à justiça.