O acto hediondo e cobarde perpetrado pelos terroristas em Paris na
passada 6ª feira tem de ser, no imediato, esclarecido, combatido e condenado.
Mas, paralelamente, é importante que se procure perceber a origem e o
desenvolvimento da combinação explosiva que gerou esta situação, sem esquecer
as conivências directas e indirectas, os erros militares e políticos, as
ligações financeiras e económicas que geraram o ovo da serpete do terrorismo islâmico
internacional.
Ao mesmo tempo também, há que procurar uma solução imediata para um
problema imediato que é a propagação do autoproclamado “Estado Islâmico” (para saber mais sobre o "Estado Islâmico" leiam AQUI).
Não chega um encadeado de adjectivações na conversa de políticos e
comentadores para condenar o acto de Paris (seguido aliás de muito outros actos
recentes do mesmo teor como o abate de um avião russo de passageiros no Egipto
ou o sangrento atentado no Líbano, que, hipócrita e cinicamente, não mereceram
a mesma veemente condenação que o atentado de Paris).
É preciso ir à origem do problema e apontar responsáveis, pelo menos
para que esses não escapem impunes à veemente e legitima condenação do terrorismo
islâmico que tem marcado este século.
O “ovo de serpente” foi sendo chocado desde a década de 80, com o apoio e financiamento do
Presidente norte-americano Ronald Reagan, que não teve então problemas em
receber no seu gabinete os líderes talibans da época, aos radicais islâmicos do
Afeganistão para combater os soviéticos, tendo dado origem ao nascimento da Al-Quaeda, financiada inicialmente pelo principal aliado dos Estados Unidos na
região, a Arábia Saudita, e treinados e armados pela CIA.
Na Palestina, perante a crescente credibilidade da OLP, o governo de
Israel apostou também no apoio clandestino a radicais islâmicos, que deram
origem ao Hamas, para tentar retirar protagonismo à OLP e para descredibilizar
a causa palestiniana.
Com o tempo, os criadores perderam o controle do monstro que criaram e
o feitiço virou-se contra o feiticeiro.
Na década de 90 um novo conflito, a Guerra da Jugoslávia, voltou a
fortalecer o radicalismo islâmico, com o apoio do ocidente, nomeadamente da
NATO, à Bósnia e ao Kosovo, base do treino militar dos veteranos islamitas, ainda hoje um dos principais focos
de fornecimento clandestino de armamento aos radicais islâmicos na Europa, para
além da guerra da Tchetchénia na Rússia que este país teve de resolver sozinho e
com a desconfiança ocidental.
Mas o pior estava para vir, com os atentados do 11 de Setembro de 2001,
ainda hoje com zonas por esclarecer e com a irresponsável reacção a esses
terríveis atentados.
Um conjunto de líderes mundiais, que se reuniram nos Açores em 15 de
Março de 2003, George W. Bush, Aznar, Durão Barroso e Tony Blair resolveram, de
forma irresponsável, aproveitar a situação para , passando por cima da ONU,
organização que a partir de então perdeu capacidade de intervenção, invadir o
Iraque e lançar a ideia de impor a “democracia” pelas forças das armas.
O que seguiu no Iraque é de todos conhecido: centenas de milhares de
mortos civis, crescimento e disseminação do terrorismo islâmico, que encontrou
no Iraque uma base de recrutamento e onde nasceu o “Estado Islâmico”.
Mas os erros do ocidente não se ficaram por aqui. Embandeirando em arco
com a chamada Primavera árabe que teve início em 2010, não se limitaram a
apoiar e fortalecer a revolta legítima na Tunísia e no Egipto, mas ganharam
freio nos dentes e de forma irresponsável, resolveram intervir militarmente para impor a
vitória artificial desse movimento na Líbia e na Síria, mais preocupados em
derrubar artificialmente dois ditadores de estimação, do que em saber quem
ajudavam ou armavam.
E foi assim que teve origem o Estado Islâmico, em Junho de 2015, com
acesso a armamento e financiamento do ocidente, de forma directa ou indirecta (
neste caso através do apoio da Arábia Saudita aos fundamentalistas sunitas da Síria).
Aliás, uma das questões que mais me intriga e para a qual até hoje
ainda não vi resposta credível, é saber quem financia e quem arma esse
autoproclamado Estado Islâmico.
Leio que eles conseguem financiar-se com a venda do petróleo e do saque
de obras de arte e que se armam através de grupos “moderados” que se opõem a Assad na Síria, “ingenuamente” armados
pelo ocidente com o material mais moderno e sofisticado, e que acabam por cair
nas mãos do ISIS.
Se houvesse vontade política era fácil, com os actuais e sofisticados meios tecnológicos de espionagem, descobrir
como funciona essa rede de financiamento. Por isso, e perante o silêncio sobre
essa dúvida, só posso desconfiar que existe algo que se esconde por detrás do
apoio ao ISIS.
Em primeiro lugar, parece-me que o ocidente visa , com essa falta de esclarecimento, proteger o seu
aliado na região, nomeadamente a Arábia
Saudita, que se desconfia ser o principal financiador desse bando bárbaro de
terroristas .
Em segundo lugar, parece-me que os compradores de arte saqueada estão
sedeados no ocidente, pois só estes terão meios financeiros e interesse nessas
aquisições.
Em terceiro lugar, se houvesse vontade , também seria fácil seguir o
rasto do petróleo vendido pelo ISIS, mas , para isso, era preciso atingir um
dos principais lobbies da economia mundial, o energético.
Em quarto lugar, tocar no tráfico de armamento é pôr em causa um dos
maiores negócios à escala mundial , que envolve muitos estados e políticos do
ocidente .
Em quinto lugar, e por detrás de tudo isto, está um poder financeiro,
cada vez mais poderoso, que vive da lavagem de dinheiro sujo, que, como se vê
na Europa, controla o poder político e não tem uma réstea de humanidade.
Sem se tocar no negócio de armamento, no corrupto poder financeiros,
nos interesses que movem a economia do petróleo, não se vai conseguir erradicar
a influência do ISIS, mesmo que se consiga expulsá-los dos territórios ocupados.
Se juntarmos a tudo isto a situação económico-social explosiva em
bairros de imigrantes , principalmente na França e na Bélgica, situação que se
tem agravado nos últimos anos como reflexo da crise financeira, nomeadamente
entre os jovens, onde grassa um
desemprego que, nesses bairros, atinge 40% desses jovens, o ISIS vai continuar a poder contar, na Europa, com um
vasto campo de recrutamento para o seu campo e a sua estratégia de terror.
Para não agravar a situação, seria bom que, paralelamente à condenação
firme do terrorismo, se combatesse o crescimento da xenofobia, que se vai
aproveitar do medo para espalhar a sua mensagem de ódio.
Para já é necessário não confundir a situação dos refugiados da Síria,
com o terrorismo. Aliás, esses refugiados estão na linha da frente como vítimas do terrorismo islâmico e fogem daquilo
a que assistimos agora em Paris e que, nas suas cidades ,nas suas ruas e nas
suas aldeias, são uma realidade diária.
Por último é necessário que a comunidade internacional, no imediato,
reactive o poder da ONU, destruído pela quarteto do Açores, e se una para
combater o ISIS, distinguindo o inimigo principal , o “Estado Islâmico” , do
inimigo secundário, o ditador Assad.
Aqueles que gostam tanto de citar Churchill em defesa do derrube de
ditadores como Assad, melhor fariam se percebessem a estratégia desse líder
britânico, que, na sua época, percebeu que o inimigo principal a abater era
Hitler e, para isso, não hesitou em aliar-se a Stalin.
O radicalismo islâmico é o “nazi-fascismo” do nosso tempo.
Aprendam com a história!
(este texto foi escrito de memória, sem consulta a fontes, mas
esperemos que sirva de base para uma reflexão sobre o que está em causa na resposta que
se der a estes bárbaros actos terroristas,
para além da retórica do momento).
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