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quarta-feira, 24 de junho de 2009

Ordens do Dia de Beresford (3) - Maio de 1809


Ao longo do mês de Maio o conteúdo da maior parte das Ordens do Dia (OD) continua a revelar uma forte preocupação com a indisciplina que grassava no Exército Português sob o seu comando, agravada por hábitos seculares que os soldados traziam para as fileiras do Exército.
Um dos actos de indisciplina mais gravosos foi protagonizado pela Brigada do Algarve.
Enaltecendo a conduta da maior parte do exército nos combates contra o inimigo, o marechal não deixou de contrastar essa atitude com a dessa Brigada do Algarve, composta pelos regimentos nº 2 e nº14, os quais, depois de Amarante, “á medida que se aproximavão ao inimigo, era menor o seu desejo de avançar, e hontem não fazião mais do que demorar a Brigada da retaguarda, e impedila de avançar”.
Como castigo ordenou que “até nova determinação em toda a parte, onde se achar esta Brigada, a facha marchar todos os dias que chover a duas legoas do seu Quartel, e voltar para o mesmo Quartel, não permittindo aos Soldados nestas marchas, que se cubrão com os seus capotes”. E porque o Marechal “não póde pôr huma grande confiança em Soldados, que não sómente temem molharem-se, mas que absolutamente não se atrevem a expor-se a isto”, estes dois regimentos não serão “mandados contra o inimigo”.
Contudo o Marechal “faz a justiça de dizer, que em quanto fazia, Sol, elles mostravão bastante ardor para se medirem com o inimigo” (OD, 21 de Maio 1809).
Ou seja, a recusa em combater por parte daquela Brigada não se devia a qualquer acto de cobardia, mas ao facto de não querer combater com chuva e mau tempo!
O costume de atrasar a marcha parece que estava bem arreigado entre as tropas, como o revela uma outra ordem: “tendo observado que nas Tropas Portuguezas hum grande número de indivíduos se atrazão ás marchas, sendo sem dúvida a causa hum máo habito, e negligencia dos Officiaes: Ordena, que a todo o individuo, que se atrazar á marcha do seu respectivo Corpo, sem ser por moléstia, ou outro motivo legitimo, lhe seja descontado o soldo daquelle dia, em que se atrazar á marcha, bem como de todos os mais dias, que estiver sem se apresentar no seu Corpo” (OD, 20 de Maio de 1809).
Será mesmo estabelecido um horário para a marcha: “no Verão a hora da partida das Tropas, que houverem de marchar, seja sempre às quatro horas precisas da manhã, para que chegando ao lugar onde hão de pernoitar, se faça de tarde a revista do armamento; e em caso algum deve o Soldado deitar-se, sem que se tenha conhecido se o armamento está em bom estado” (OD , 1 de Maio de 1809).
A conservação do armamento era outra preocupação revelada em diversas Ordens do Dia.
Numa delas recomendava-se aos “Sr.es Officiaes, que empreguem todos os meios possíveis para que os Soldados conservem as suas Armas em bom estado” ordenando “ que se a pezar de todas as medidas, acontecer que appareção Armas quebradas, estas se consertem immediatamente à custa dos Soldados, que as tiverem quebrado”, ordenando assim “que por cada cartuxo, que achar falto ou arruinado, se desconte ao Soldados 70 réis” (OD 6 de Maio de 1809).
Também se ordenou aos “ Commandantes das Brigadas, e dos Corpos terão cuidado de não consentir, que soldado nenhum ponha a sua arma em algum carro, ou besta, a não ser que esteja por causa de moléstia absolutamente impossibilitado de a levar, porque aquelle costume he a causa de haverem tantas armas quebradas” (OD 8 de Maio de 1809).
“O Marechal também observou Cabos demasiadamente moços em alguns Regimentos, e alguns mesmo crianças, ignorando as suas obrigações como Soldados” (OD 8 de Maio 1809)
Beresford mostrou-se igualmente “supp rendido (sic)” ao tomar conhecimento que “Officiaes, e mesmo Soldados nas marchas tomam dos Magistrados , e d’outras pessoas palha, e feno, grão e mais espécies de rações, e impedem a distribuição regular destes Artigos: em consequência prohibe em primeiro lugar, que se tomem, ou peção etapas, eforragens por outro canal, que não seja o Commissario annexado á Brigada,ou Divisão. (…) Prohibe também o Marechal,que daqui em diante os Officiaes, ou qualquer outros indivíduos (…), recebão individualmente as suas etapas, e forragens de qualquer outro modo, que não seja por via do seu Quartel-Mestre, ou Official (…). O Marechal faz saber ao Exercito, que todo o individuo, qualquer que elle seja, que for convencido de ter recebido mais viveres, e forragens do que lhe pertencem, será considerado como indigno, e será no mesmo instante punido, ou inforcado, segundo a gravidade do caso” (OD 12 de Maio de 1809).
O mesmo hábito de saquear as populações indefesas, era referido noutra OD, onde refere que “tem tido queixas de que as Tropas tomão arbitrariamente sobre a marcha carros, cavallos, machos, e outras bestas; mas elle mesmo tem sido testemunha disto, e sabe bem os abusos, e vexames, que soffrem os Paizanos, durante a marcha das Tropas; e para remediar, e pôr fim a hum procedimento tão indigno, que impede o acharem-se carros, e bestas, quando” é verdadeiramente necessário, que nenhum oficial ou soldado “tome no caminho carros, bestas ou forragens”. Quando necessário, tais artigos devem ser pedidos com “justa causa”. (OD,26 de Maio d 1809).
Para disciplinar o acesso das tropas ao alimento, um bem precioso em época de guerra, estabeleceu que o “ pão, que se dá aos Soldados, deve ser de trigo, quando se poder achar; e quando não for possível, será da melhor qualidade de farinha, depois da de trigo; mais em caso nenhum se deverá dar mais de arrátel e meio, seja o pão da qualidade que for, poisque aquella porção he quanto elles podem precisar; e o dar mais, será hum desperdício muito prejudicial, por consumir os meios de qualquer Paiz, em que possa haver muita Tropa” (OD 8 de Maio 1809).
Quase em desespero de causa, Beresford queixava-se de que “até ao presente só tem ouvido desculpas de ignorância, e de má percepção a respeito de todas as faltas, que tem achado; elle declara, que não as admittirá mais” (OD de 12 de Maio de 1809).
Ainda nesse mês, a OD de 5 de Maio dá a conhecer a carta régia de 29 de Abril que confere a Arthur Wellesley o cargo de “Marechal General” do exército português, mantendo-se o comando na pessoa de Beresford.

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