Acabei de tomar uma das mais importantes e dificeis decisões da minha
vida: entreguei ontem os papéis para a reforma antecipada…
Nunca pensei ter de tomar uma decisão como esta tão apressadamente
e , há uns cinco ou seis anos atrás, nada disso me passava pela cabeça.
Quando comecei a trabalhar, e apesar de ter trabalhado mais
de dez anos com contrato a prazo, sujeito a concursos anuais, com salário
baixo, a perspectiva era obter uma reforma por inteiro quando completasse trinta
e seis anos de serviços e de descontos.
Nos últimos seis a sete anos as mudanças legais tem sido
vertiginosas, passando por cima do respeito devido por quem desconta há longos anos
e que agora é “velho” para mudar de vida, e tomou muitas decisões que afectaram
a sua vida à luz da ideia que estava a lidar com um Estado de Direito e que sabia
honrar os seus compromissos.
Não deixa de ser curioso que a Comissão Europeia esteja
sempre pronto a evocar o Estado de Direito para por em causa, por exemplo, o
desejo de escoceses, flamengos e
catalães se tornarem Estados Independentes , ou para nada fazer para combater a
especulação dos mercados financeiros, mas, quando se trata do direito dos
cidadãos, estão sempre prontos a fazer “tábua rasa” desse Estado de Direito
(cujos direitos e deveres estão consignados nas Constituições e Tratados).
Por cá a situação é idêntica. A nossa classe política e o
seu “braço armado” de comentadores na Comunicação Social estão sempre prontos a
evocar o Estado de Direito quando se trata de justificar que nada se faça para
travar a ganância especulativa do sector financeiro, para travar o descalabro
das Parceria Público Privadas, para tomar medidas de fundo para travar os
desvarios do sector financeiro, para acabar com os privilégios das grandes
empresas que controlam em monopólio sectores estratégicos inteiro e para levar
à barra do tribunal políticos, banqueiros e empresários que levaram o país à
ruina. Mas quando se fala nos direitos de quem trabalha, nos direitos dos
cidadãos, aí já não existe Estado de Direito ou Constituição ou palavra de
honra, tudo em nome do deficit e da crise que aqueles provocaram.
Foi assim que a situação legal em relação às reformas tem
andado numa roda viva, sem rei nem roque, ao sabor das circunstância
conjunturais.
Por isso, e antes que a situação ainda pior, sujeito-me a ir
para a reforma alguns anos mais cedo do que aquilo que tinha programado, com
metade do rendimento, mas pelo menos salvaguardo a minha saúde mental.
Não ficarei de mão abanar, fui “acumulando” muitos livros,
revistas, e outros bens culturais que são suficiente para me ocupar o resto da
vida, vou ter tempo para retomar vários projectos de investigação histórica que
tiveram de ser interrompidos porque, nos últimos anos, apesar de uma redução
drástica no vencimento que trago para casa (ganho hoje menos que há seis anos
atrás), o tempo que passo na escola tem vindo a aumentar de forma drástica, sem
me permitir que sobre tempo para investigar, ler e reflectir sobre a área para
a qual me preparei para leccionar. Vou poder também dedicar mais tempo à
família e aos amigos e ocupar-me dos blogues e apostar mais na fotografia.
Claro que vou ter de cortar em muita coisa, nomeadamente vou
deixar de comprar tantos jornais, revistas e livros, vou viajar menos, vou ter
de aguentar o meu carro com 14 anos mais uns dez ou quinze anos, vou andar mais
a pé ou de bicicleta, comer menos fora, mas penso que ganho em qualidade de
vida.
Claro que agora vou ter de esperar cerca de um ano, mas,
sinceramente, estou farto de tanta indecisão e tanto desrespeito. Só tenho pena
dos colegas mais novos que vão ter de continuar a aguentar a situação, com
salários ridículos para as suas capacidade e funções e com um futuro incerto na
carreira e nas reformas.
Por esta via, o futuro deste país é o de um país de
reformados, desempregados, trabalhadores a prazo e com os mais capazes
emigrados.
…é caso para dizer que…o último a sair que feche a luz…
5 comentários:
Caro Venerando
Percebo o teu desencanto e frustração. Passei por isso há quatro anos - eu que dizia que queria trabalhar na Escola até aos 70 anos, porque gostava de ser professor.As condições de trabalho que entretanto nos foram impostas, com a ministra Mª de Lurdes Rodrigues a tratar os professores como gente desqualificada, "obrigaram-me" a tomar a decisão.
A situação actual ainda é pior. Diminuiram os professores e aumentaram o trabalho. Como em todo o lado, aliás.
Estou solidário contigo, caro amigo.
Abraço de amizade
J Moedas Duarte
obrigado amigo
Meu caro e estimado amigo VAAM(lembras-te(cosa nostra)? Odeio que tenhas tomado essa decisão, no entanto compreendo-a, a isso me sinto, infelizmente, obrigado. Quem respeita quem~??? Ao longo da minha vida profissional senti no "pêlo" e, claro, na carteira o peso (aligeirado) pelos ditos "Apparatchik" de todas as vertentes. Eu, ainda vou conseguindo manter alguma réstea de esperança, neste país completamente adiado...Há sempre outras "fotos" de Portugal e, tu, como sempre, vais fazê-las.
Abraço do,sempre amigo,
Manuel Vilhena
Eles roubam-nos o sorriso, mas jamais nos hão-de roubar a capacidade de pensar!
com amizade,
ass: cidadãindignadaemãeangustiada
Pois é, Venerando...
Nem imaginas o que o teu pedido de reforma antecipada me veio trazer de novo à tona...
Vejo os amigos e colegas de profissão a deixarem aquilo que sempre souberam e QUISERAM fazer...percebo a amargura, o desencanto, até mesmo a raiva de se sentirem traídos no mais fundo de si...
Olho em frente e não vejo a estrada que sonhei desde o primeiro dia em que comecei a dar aulas...
Mas desejo que consigas realizar TODOS os sonhos ainda possíveis.Fá-lo por ti, por todos nós.
FORÇA,VENERANDO!!!!
M.C.
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