Há nesta, como em todas as eleições, vencedores e vencidos, uns reais, outros presumíveis e alguns virtuais.
A Abstenção foi, para mal da nossa democracia e vergonha da nossa classe política, a maior vencedora, batendo em número todos os candidatos.
Excluindo as eleições europeias, foi a maior abstenção alguma vez registada em actos eleitorais depois do 25 de Abril.
Muitas podem ser as causas, desde o analfabetismo funcional da maior parte dos eleitores, os tais que acreditam que se estava melhor no salazarismo do que agora, a percentagem elevada dos chamados “eleitores fantasma”, que rondará os 10%, as trapalhadas informáticas que assinalaram o acto eleitoral de ontem e que devia levar à demissão do Ministro da Administração Interna e alguns altos funcionários da CNE, o descrédito total na actual geração de políticos, a falta de interesse da campanha eleitoral, o histórico de um presidente que se recandidata já ter meia vitória assegurada, talvez até o clima frio do dia.
Mais conclusões só se podem tirar depois de analisar em pormenor quem foram os abstencionistas.
Outro vencedor, o real, porque o que interessava era ficar em primeiro lugar e evitar uma segunda volta, foi Aníbal Cavaco Silva. Em eleições ganha-se e perde-se, nem que seja por um voto e Cavaco, não obtendo um resultado brilhante, acabou bem à frente do segundo candidato mais votado. Terá estragado a festa com o seu discurso inflamado e intolerante no final da noite, algo inadmissível em democracia e em que se arroga vir a ser, daqui para a frente o “Presidente de todos os portugueses”. Talvez Cavaco, mais do que muitos dos seus inflamados apoiantes, tenha reagido desse modo por se aperceber que é o Presidente que vai iniciar um novo mandato com o menor número de votos expressos desde sempre, com pouco mais de 20% dos eleitores portugueses, (nem Sampaio na sua recandidatura), que perdeu entre as duas eleições mais de meio milhão de votos e que teve uma percentagem modesta, muito aquém do que era anunciado por muitas sondagens, mesmo as feitas à boca da urna.
Temos depois alguns presumíveis vencedores.
Em primeiro lugar, Fernando Nobre que, sem qualquer apoio partidários e, apesar de uma campanha algo desastrosa, logrou um resultado acima dos 10%, batendo Alegre nalguns sítios, revelando que há espaço, em democracia para projectos independentes e que estes fazem cada vez mais falta. Representando o peso da cidadania, mostrou que pode existir muita vida política para além dos partidos. Correrá o risco de esvaziamento a breve prazo, como sempre tem acontecido noutras ocasiões com candidaturas do mesmo género, mas a democracia sai sempre reforçada quando esse tipo de candidaturas se manifesta. Não conseguiu, contudo, dois dos seus principais objectivos, contribuir com o seu resultado para levar Cavaco a uma segunda volta e ultrapassar a votação de Manuel Alegre.
Em segundo lugar, José Manuel Coelho, não tanto pelo seu resultado a nível nacional, mas principalmente pelo modo como abalou o feudo do PSD na Madeira. O Jardim que se ponha à tabela, até porque a principal característica do candidato Coelho é a de saber usar as mesmas armas que Jardim.
Em terceiro lugar Paulo Portas, o principal beneficiado político com o apoio que deu a Cavaco.
Existem depois os presumíveis vencedores que ainda não perceberam que saíram derrotados, como Pedro Passos Coelho. Com um Cavaco ferido na sua legitimidade, politica e ideologicamente mais próximo de Sócrates do que do neo-liberalismo de Passos Coelho, só por uma grande inabilidade política de Sócrates (o que seria uma surpresa) é que Cavaco terá condições ( e o desejará) para demitir e provocar eleições antecipadas. Pelo menos, para já, e até à discussão do Orçamento de Estado para 2012, não existem condições políticas para isso.
Mas também temos os vencidos que sabem que não saíram derrotados, como foi o caso de José Sócrates. Era ver o ar aliviado como Sócrates se apresentou à comunicação social e ouvir aquela frase assassina para Alegre, segundo a qual o povo português, ao dar a vitória a Cavaco na primeira volta, escolheu o que era seguro e a “estabilidade”. De facto, e como já o afirmei anteriormente, uma vitória de Cavaco, ainda por cima pouco brilhante, é um balão de oxigénio para Sócrates. Além disso a pesada derrota de Alegre anula qualquer veleidade de acção por parte da oposição de esquerda a Sócrates no interior do partido.
Depois existem os claramente derrotados.
Em primeiro lugar o próprio Alegre que, provavelmente, assinala aqui o seu fim político, pagando caro as contradições ideológicas da sua candidatura e os anti-corpos que criou na actual direcção do PS, que pouco se comprometeu com a sua candidatura. Estou convencido que muitos “socráticos” terão votado em Cavaco.
Em segundo lugar Francisco Lopes que conduziu o PCP a um dos seus piores resultados de sempre, embora segurando o eleitorado mais fiel.
Em terceiro lugar Defensor de Moura, que obteve um resultado pior do que aquele que se adivinhava, não tendo conseguido um dos seus objectivos que era o de “agarrar” os socialistas que não se identificavam com Alegre.
Em quarto lugar o Bloco de Esquerda que ficou “colado” a uma grande derrota eleitoral do candidato que apoiou.
A esquerda em geral é a grande derrotada deste acto eleitoral, pela forma como se apresentou dividida, pela falta de pragmatismo para ultrapassar as suas divergências e pela própria dificuldade em demarcar-se do projecto anti-social de José Sócrates.
Ao novo presidente eleito desejamos que as suas palavra no momento da vitória não tenham passado de um simples desabafo e, pelo contrário, venha a marcar este segundo mandato pelo diálogo com toda a sociedade, a tolerência pelos adversários políticos, a construção de alternativas ao actual modelo político-económco e a coragem de enfrentar os actuais “inimigos externos” do povo português.
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