Este era o grande momento esperado há vários anos. Mas, ironicamente, ao mesmo tempo ficou um sabor amargo na boca, sem vontade para abrir uma garrafa de champanhe, como sempre tinha imaginado fazer nesse dia.
É que só agora nos apercebemos que todos estes anos de “sócratismo” instalaram o vazio à nossa volta.
A alternativa a Sócrates é…mais e pior!
À esquerda o discurso continua preso nos anos 70 e, a não ser como voto de protesto ( e é isso que vou acabar por fazer mais uma vez), não vem daí nenhuma contribuição credível para ultrapassar a crise.
Entre o PSD de Passos Coelho e o PS de Sócrates “venha o diabo e escolha”.
Mas que não restem dúvidas: foi Sócrates que colocou o país e, por arrastamento o PS, nesta situação sem saída.
Tivéssemos nós um Presidente da República à altura, e não seria necessário novas eleições. Bastava usar a sua influência, se a tivesse ou a quisesse ter, para forçar um entendimento político no actual quadro parlamentar.
Mas também era preciso que Sócrates tivesse uma verdadeira dimensão de estadista, abandonando a chefia do governo e a liderança do PS, dando oportunidade a uma renovação deste partido. Ora ele já ameaçou que vai voltar a candidatar-se à liderança deste partido e voltar a apresentar-se às eleições.
Para além disso, uma solução dentro do actual quadro parlamentar precisava de alguém que soubesse negociar e cumprir com a palavra dada. Com Sócrates não é possível negociar ou estabelecer acordos, porque ele não é homem de palavra, a não ser para com a srª Merkel.
Assim voltamos ao princípio. A única saída é a realização de eleições e é muito possível que Sócrates regresse em força, pois, no combate político, ele sabe usar toda a demagogia e as armas da propaganda a seu favor. Agora vai fazer-se de vítima e os portugueses, geralmente de memória curta, gostam de vítimas.
Vai ainda tornar-se em defensor do “Estado Social”, que ele tanto contribuiu para destruir e desacreditar, contra o medo do, até agora não desmentido, “neo-liberalismo” de Passos Coelho e, mais uma vez a memória curta dos portugueses vai levá-los ao “voto útil”, que tão inútil se tem revelado para o destino político do país.
Vai beneficiar igualmente do aumento da abstenção e da falta de alternativas apresentadas por Passos Coelho, pelo menos se estas forem as que têm sido divulgadas, da autoria dessa gente sinistra do “Compromisso Portugal”.
Ou muito me engano, ou o próximo parlamento não vai ser muito diferente do actual, talvez com ligeiras nuances, podendo o PSD ser o partido mais votado, mas a pouca distância do PS, não chegando, nesse caso, para formar uma maioria com o CDS. A grande incógnita, da qual vai depender o peso da balança parlamentar, vai ser o resultado do Bloco de Esquerda. O papão da “direita” e do neo-liberalismo, que Sócrates vai usar até à exaustão, pode canalizar muitos dos votos dados anteriormente ao BE para o “voto útil” no PS.
Entretanto a situação económica vai-se degradando, muitos vão atribuir essa situação à queda do governo, mas na realidade foi este que a potenciou. Mas daqui a dois meses já todos estarão esquecidos disso e muitos irão atrás do discurso de vitimização de Sócrates.
Aliás, não deixa de ser curioso o discurso que começa a pegar de que o governo “foi demitido”, o que não é verdade. Sócrates demitiu-se porque não quis negociar com a oposição um acordo que estabeleceu com a srª Merkel nas costas dos portugueses e porque sabia que o BCE e União Europeia já tinham decidido, antes da crise política nacional, não comprar mais dívida a Portugal e obrigar o governo a recorrer ao fundo de resgate, com se ficou a saber pela imprensa espanhola.
Sócrates provocou esta crise porque assim passa a ideia que o agravamento da situação económica é a consequência da sua demissão, quando tudo isso já era previsível há algumas semanas e, a acontecer sem esta encenação, seria Sócrates a ser claramente responsabilizado pelo falhanço das suas políticas. E o PSD e toda a oposição deixaram-se cair nessa armadilha.
Por isso, quem estiver à espera do fim político de Sócrates, convença-se que este ainda vai estrebuchar muito e vender caro a sua pele, nem que tenha de por o país de rastos.
Por isso, o dia de ontem teve um sabor de “vitória amarga”.
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