Passam hoje 30 anos sobre a falhada tentativa de Golpe Militar em Espanha, que passou à história como o 23 F.
Nessa altura, nos inícios de 1981, a democracia, tanto em Espanha como em Portugal, dava ainda os primeiros e ténues passos.
Caso esse golpe vingasse era, não só a democracia espanhola que ficaria comprometida, mas também a democracia em Portugal.
Nunca, como ao longo do século XX, o caminho das duas nações ibéricas esteve tão ligado.
Quando foi proclamada a República portuguesa em 1910 a Espanha acolheu, nos primeiros tempos, os monárquicos que usaram o país vizinho como base para as suas incursões contra-revolucionárias, entre 1911 e 1914. Já no período final da república foi instaurada em Espanha uma das primeiras ditaduras de tipo fascista, a ditadura militar de Primo de Rivera, que durou entre 1923 e 1930, com a conivência da monarquia espanhola. Esta ditadura, principalmente a sua primeira fase do “Directório Militar” (1923-1925) serviu de inspiração à Ditadura militar instaurada em Portugal em 1926. Contudo, com o fim da ditadura de Rivera e com a consequente queda da monarquia espanhola, foi proclamada a IIª República Espanhola, em 1931 e de novo as duas nações seguiam caminhos divergentes.
Em Portugal consolidava-se o novo regime da ditadura militar, liderado por Salazar a partir de 1932 e que dá origem ao Estado Novo a partir de 1933, um regime que, apesar das nuances, bebia as influências orgânicas e ideológicas no fascismo italiano fundado em 1922. Salazar tinha, aliás, uma admiração especial por Mussolini.
Por sua vez, em Espanha a República desenvolvia as suas instituições democráticas e acolhia os opositores de Salazar. Quando, em 1936, a Frente Popular, coligação de republicanos de esquerda, de socialistas, comunistas e anarquistas, chegou ao poder, a situação no país vizinho torna-se uma questão de vida ou de morte para o Estado Novo português.
Quando se dá o pronunciamento militar de Julho de 1936, Salazar não hesita em colocar-se ao lado dos insurrectos que encontram no território português uma importante base de apoio.
A Guerra Civil de Espanha, que irá durar até Abril de 1939, une no mesmo campo de batalha Salazar, Mussolini e Hitler, naquele que foi considerado o ensaio geral para a Segunda Guerra Mundial, que teve inicio apenas 5 meses depois da vitória de Franco.
A partir daí os dois países partilhariam um destino político comum de mais de 35 anos e tornou-se evidente, depois do final da Guerra em 1945, que o destino dos dois ditadores estava ligado.
Salazar foi mais habilidoso, mantendo um papel ambíguo durante a guerra, facilitando a vida aos aliados quando, a partir de 1942, se tornou evidente que a derrota das forças do eixo seria uma questão de tempo e quando soube jogar em seu benefício o desencadear da guerra fria no pós-guerra, sendo premiado com a sua aceitação no sei da NATO.
Já Franco, que segundo alguns só não entrou na guerra ao lado de Hitler porque foi pressionado por Salazar nesse sentido, foi visto com maior desconfiança pelos aliados.
Quando se deu em Portugal o 25 de Abril, temeu-se a aplicação do Pacto Ibérico, assinado pelos dois ditadores, onde se previa o auxilio mútuo, em caso de perigo para os respectivos regimes. Contudo os tempos eram outros e o próprio Franco acabaria por falecer ano e meio depois da implantação da democracia em Portugal e apenas 5 dias antes do 25 de Novembro de 1975, que encerraria o conturbado período do PREC, que conheceu, entre outros episódios, um crescendo de tensão entre os dois regimes ibéricos quando a embaixada espanhola de Lisboa foi incendiada por manifestantes poucos meses antes do falecimento do “caudillo”.
Com a morte de Franco, a Espanha iniciou um período de transição democrática, aprendendo com os erros cometidos em Portugal e liderado pelo rei D. Juan Carlos, nomeado pelo ditador como seu sucessor.
A forma como o monarca agiu quando do Golpe de 23 de Fevereiro acabaria por ser decisivo, quer para a consolidação da democracia na Península Ibérica, quer para a própria consolidação e sobrevivência da monarquia espanhola.
O falhado golpe militar teve o condão de separar as águas em Espanha entre os que viam o regime democrático espanhol como um mero acto formal, de algum modo continuador do regime franquista, e os que tinham como convicção que, para se consolidar e sobreviver a democracia espanhola devia romper de vez com o passado franquista.
A vitória da democracia em Espanha nesse 23 de Fevereiro de 1981 acabou por contribuir para a aceitação plena das democracias ibéricas no seio das democracias ocidentais, acabando por aderir poucos anos depois, e em conjunto, à então Comunidade Económica Europeia.
Por tudo isso esse momento histórico da Espanha moderna foi também um momento decisivo para a jovem democracia portuguesa.
Podem consultar aqui a imprensa espanhola da época:
23-F: Las ediciones especiales de EL PAÍS (clicar para aceder aos documentos históricos)
O filme com o ataque dos golpistas ao parlamento espanhol e outras informações também podem ser lida AQUI, no dossier do El Mundo
Sem comentários:
Enviar um comentário