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terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

DIÁRIOS DE KIEV – (6-7-8) por Pedro Caldeira Rodrigues (Agência LUSA) -20 e 21 de Fevereiro

                                       


20 de Fevereiro de 2022

Ucrânia: Os tártaros da Crimeia, o povo ‘boomerang’

“Num mundo existe um pequeno povo que se considera "boomerang" porque, à semelhança desse objeto de arremesso, insiste em regressar às suas origens apesar das muitas tentativas para o dispersar e desenraizar, os tártaros da Crimeia.

No restaurante Mustafir (Convidado), não longe do centro de Kiev e transferido do tradicional reduto tártaro de Bakhchysarai para a capital ucraniana após a anexação da península pela Rússia, em fevereiro de 2014, Alim Aliev personifica esse peculiar instinto de resistência.

"Somos como um ‘boomerang’ porque o destino remeteu-nos para outro lugar, mas regressamos sempre. Os meus avós nasceram na Crimeia, os meus pais na Ásia Central, também nasci na Ásia Central, o meu irmão mais novo já nasceu na Crimeia e agora vivo em Kiev. Uma movimentação impressionante", contou à Lusa.

Esta ativista de 33 anos, cofundador da organização Crimeia SOS e vice-diretor do Instituto ucraniano, vocacionado para promover a visibilidade da Ucrânia no exterior, a interação profissional e a difusão da cultura do seu povo, nasceu tal como os seus pais no Uzbequistão, ex-província soviética da Ásia central, após toda a população tártara ter sido deportada em 1944 por ordem de Estaline sob a acusação de colaboração com o ocupante nazi durante a Segunda Guerra Mundial.

O "Surgun", como designam na sua língua a grande deportação dos 200.000 tártaros da Crimeia, também disseminados à força pelo Quirguistão, Cazaquistão, Sibéria ou Urais, prolongou-se durante décadas e até 1989, quando o então Presidente soviético Miklahil Gorbatchov, pouco antes da desintegração da União Soviética, permitiu o regresso deste povo às suas terras ancestrais.

O Mustafir, que preserva a traça original, é o mais recente testemunho desta odisseia. Nas paredes e almofadas com cores garridas e desenhos geométricos, candeeiros ornamentados, o Yantir, o prato nacional tártaro à base de carne de borrego envolvido por uma massa, e a tradicional bebida Ayran, são servidos com diligência por jovens homens e mulheres com as suas roupas tradicionais. As salas estão cheias, escuta-se uma suave música ambiente vinda dos confins da memória deste povo autóctone da península da Crimeia e de religião muçulmana.

Em 1989, tinha apenas um ano, a família mudou-se para a Crimeia de onde eram naturais os avós, numa primeira vaga de regresso dos tártaros às suas terras de origem. Aí viveu até 2010, estudou, colaborou num jornal local tártaro e mudou-se para Lviv (oeste da Ucrânia), onde foi consultor de comunicação e ‘media’.

Alim é um dos mais aguerridos opositores à anexação da Crimeia pela Rússia, a "nova colonização" como a designa, e a "terceira tentativa" de reforçar na península o predomínio de população russa.

"Monitorizamos a situação dos direitos humanos na Crimeia e detetámos mais de 3.000 casos de abusos dos direitos humanos após a ocupação de 2014. A maioria destes abusos são contra os tártaros da Crimeia. Mas é apenas o topo do iceberg. No fundo, existe esta colonização com várias tendências, em particular a militarização da península", assinala.

Os tártaros, que se exprimem numa língua com raízes turcófonas, são hoje cerca de 300.000, 15% da população total de uma península com 2,5 milhões de habitantes. Dos restantes, 21% dizem-se ucranianos e mais de 60% russos.

"Após a anexação, 30.000 tártaros saíram da Crimeia e instalaram-se na Ucrânia e agora apenas 3% da população da Crimeia pode aprender a nossa língua, que segundo a lista da Unesco está em vias de extinção. Nas escolas existem cada vez menos aulas de língua tártara e nos tempos da URSS apenas a aprendíamos no meio familiar".

Em simultâneo, registou-se uma vaga proveniente da Rússia. "Pelo menos 500.000 pessoas, entre eles militares, membros do FSB [os serviços de informações russos], funcionários administrativos, empresários, pensionistas. Há cada vez mais russos instalados na Crimeia".

Povo de agricultores e comerciantes, muitos tártaros optaram nos tempos soviéticos pela carreira médica ou de engenharia, por serem compulsivamente afastados da área das humanidades.

"Era um povo que se opunha ao regime e, por isso, não convinha que tivessem educação na área da política ou do jornalismo", afirmou Alim.

Até 1954, a Crimeia estava integrada na República socialista federativa soviética da Rússia, mas em fevereiro desse ano o ‘presidium’ do Soviete supremo da URSS, emitiu um decreto sobre a transferência da região da Crimeia para a República socialista soviética da Ucrânia. Na ocasião, era secretário-geral do PCUS o ucraniano Nikita Khrushchev e a medida, que não foi submetida a qualquer referendo ou consulta à população local, motivou muitas dúvidas sobre a sua legitimidade, sendo inclusive considerada um ato contrário à lei soviética.

E foi esse um dos pretextos que justificou a anexação da Crimeia pela Rússia de Putin em fevereiro de 2014 – na sequência da "revolta de Maidan" que impôs um Governo "pró-ocidental" em Kiev –, seguida de um referendo em março que confirmou a integração do território na atual Federação russa.

"Agora, a maioria das pessoas na Crimeia tem hoje dois passaportes, ucraniano e russo. Porque quem não possuir um passaporte russo tem muitas dificuldades em viver na Crimeia. Estão proibidos de comprar terrenos, construir casas, ter trabalho", indica o ativista.

O responsável do Instituto ucraniano, que mantém contactos regulares com as autoridades ucranianas da península agora "no exílio", está proibido de entrar na Crimeia, onde vivem os seus pais e irmão, que o visitam com regularidade.

"Atualmente estão detidos 130 tártaros na Crimeia e desde 2014 registámos 15 casos de rapto e sete casos de morte por motivos políticos. Além de 300 casos de buscas em casas promovidas pelo FSB", revela.

"Mas pretendemos garantir a nossa autonomia numa Ucrânia democrática e independente. Para nós é importante preservarmo-nos como nação e assumir mais responsabilidades na Crimeia. Seria um bom modelo, também para a Ucrânia", sustentou.

O militante mantém contactos com muitos dos tártaros, muitos deles jovens, que abandonaram a península há oito anos, num processo que designa de "limpeza de cérebros" e que abrangeu desde jornalistas a figuras políticas, artistas, estudantes, ativistas de ONG.

"Mas com os meus colegas e amigos estamos a lutar pela Crimeia, porque é a nossa terra-mãe. Quero regressar à minha terra-mãe livre", sublinha, com firme convicção, e num processo que define de resistência pacífica.

"Reivindicamos a desmilitarização e o fim da ocupação da Crimeia. Também é crucial a preservação da nossa identidade, língua, cultura, tradição, religião… E por cada ano que passa torna-se num desafio mais difícil. As minhas atividades focam-se na identidade dos tártaros da Crimeia", afirmou.

Além da atividade no Instituto ucraniano e no SOS Crimeia, uma organização não governamental (ONG), Alim Aliev também está envolvido no projeto de 2021 Plataforma Crimeia, uma iniciativa do atual Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky e um "mecanismo internacional" contra a ocupação da Crimeia com o objetivo de ser difundido por diversos países.

Organizam encontros políticos, culturais, cursos ‘online’ sobre a história da Crimeia, diversos projetos, a monitorização dos direitos humanos, a herança cultural da Crimeia.

A mais recente iniciativa é um projeto teatral designado 5 AM, com um livro editado em 2021 e focalizado em 11 tártaros da Crimeia que estão detidos, alguns condenados a pesadas penas e onde se incluem políticos e jornalistas.

"Designa-se 5 AM, porque as principais operações de buscas do FSB na Crimeia iniciam-se às cinco da manhã", explica. Na capa dois ponteiros negros sob fundo branco apontam para as cinco da manhã.

Um projeto que já tem confirmados espetáculos além-fronteiras, também em nome da reintegração desta região banhada pelo mar Negro na Ucrânia. Apesar de muitos dos seus cidadãos já terem migrado, e os novos residentes serem cidadãos russos”.

Pedro Caldeira Rodrigues (LUSA)

20 de Fevereiro de 2022

Ucrânia: Campanha “Punir Putin” lançada no dia das celebrações de Maidan

“ No praça Maidan, centro de Kiev, algumas dezenas de pessoas juntaram-se ao início da tarde de hoje para assistir ao lançamento da “Campanha Punir Putin”, que envolve diversos ativistas e pretende levar a julgamento o Presidente da Rússia.

Num palco improvisado, a referência em inglês "#Putin criminoso de guerra", ao lado a frase “Sim à Ucrânia”, num ecrã eletrónico, em rodapé, “Ucranianos resistirão”.

No painel colado ao palco surgem quatro fotos, lado a lado: Saddam Hussein, Slobodan Milosevic, Muammar Kadhafi, os três riscados com uma cruz vermelha, e Putin, com um ponto de interrogação no meio da face. Os promotores desta iniciativa parecem desejar ao líder russo o destino fatal dos defuntos dirigentes do Iraque, Sérvia e Líbia.

A ideia é criar um comité internacional que será dirigido por diversos membros da sociedade civil, incluindo um antigo juiz no Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia [TPIJ]”, o extinto organismo ‘ad hoc’ da ONU responsável pelo julgamento de crimes de guerra, indica um dos promotores da iniciativa.

Esta campanha terá sucesso, muitos países, muitas pessoas estiveram submetidas à agressão russa, a agressão de Putin, e quando unirem os seus esforços esta campanha vai reforçar-se”, prossegue o jovem, pleno de convicção.

No cimo da escadaria, onde se perfilavam vários homens fardados que filtravam as entradas para mais perto do palco, exibiam-se alguns dos despojos da “revolução de Maidan”, entre finais de 2013 e inícios de 2014. Escudos, capacetes, máscaras de gás, barras de ferro. Os jornalistas acotovelam-se, e o seu número quase rivaliza com os participantes.

Pelo microfone passou um representante da República Chechénia da Ichkeria [no exílio] que luta pela independência desta república russa do Cáucaso do Norte, um representante dos tártaros da Crimeia [a península anexada pela Rússia em fevereiro de 2014], um dissidente da ex-URSS  membro da sociedade civil e representante da comunidade judaica na Ucrânia”, precisa.

Na escadaria, um pequeno grupo de georgianos mostra a frase que escreveu num longo rolo de papel, “A Geórgia e a Ucrânia serão membros da NATO. Declaração da Cimeira de Bucareste 2008”. Ao lado, uma rapariga com um cartaz azul, “Os georgianos apoiam a Ucrânia”. Um país do Cáucaso onde, à semelhança da região do Donbas, leste da Ucrânia, também foram declaradas duas repúblicas separatistas, Ossétia do Sul e Abkházia, reconhecidas por Moscovo.

Um casal abandona a praça com a bandeira polaca, vermelha e branca, estendida pelas costas. Não longe, muitos cidadãos prestam homenagem aos caídos de Maidan, junto às suas fotos espalhadas pela cidade, em muros, em painéis, atadas a troncos de árvore.

A iniciativa na praça Maidan terminou com um pequeno comício, no dia do “início da agressão russa”, esclarece ainda o jovem, que também prestou tributo aos “Cem Celestiais”, os heróis da revolta desse inverno que mudou os destinos do país.

Desde o início da manhã que muitos habitantes da capital da Ucrânia celebraram o oitavo aniversário da “Revolução da Dignidade”, como também é conhecida a revolta pró-europeia de Maidan que depôs o Presidente “pró-russo” Viktor Yanukovich, mas em ambiente mais tranquilo.

Uma discreta cerimónia, com fanfarra, juntou o atual Presidente Volodymyr Zelensky e o seu arquirrival e ex-chefe de Estado, Petro Poroshenho, que por um momento esqueceram as dissensões políticas e participaram numa missa de domingo a céu aberto junto ao Templo do Arcanjo Miguel e Novos Mártires Ucranianos”.

Mas Alisa, uma fiel partidária de Maidan, revela um perspetiva muito particular do atual momento.

Penso que os países europeus esqueceram a verdadeira razão por que motivo aconteceu Maidan. Em França, por exemplo, podemos ver candidatos às presidenciais que tentam demonstrar as suas posições pró-russas apenas por considerarem que a Federação russa é mais forte. Consideram que se houver guerra com a Federação da Rússia, será ela a vencer”.

Também receia que Maidan comece a ser esquecido por muitos dos aliados que hoje juram fidelidade a Kiev no conflito com o grande vizinho.

Os países ocidentais deveriam recordar porque aconteceu Maidan. Após Maidan, muitas pessoas podiam ter deixado o país mas ficaram, foram para a guerra, proteger o território, desenvolver o seu país, e não se tornaram refugiados”, um fenómeno que considera decisivo nas relações com diversos países europeus.

Entendo as preocupações dos países ocidentais, julgo que têm medo de um novo grande fluxo de refugiados se houver guerra, talvez esteja errada… É importante lembrar-lhes que Maidan aconteceu porque não queríamos refugiados, antes viver no nosso país e desenvolvê-lo”.

Um dia no qual muitas famílias aproveitaram para passar nos amplos parques da cidade, almoçar em restaurantes, enquanto grupos de jovens se concentravam à saída dos centros comerciais ou de cafés para fumar, conversar, beber cervejas por garrafas de meio litro. Parecem muito longe dos sobressaltos provocados pelos tambores da guerra, que insistem em continuar a ecoar. Foi à sua vida, aos seus pequenos prazeres, que dedicaram este domingo”.

 por Pedro Caldeira Rodrigues (Agência LUSA)

21 de Fevereiro de 2022

ENTREVISTA (em 18 de Feverreiro): Putin pretende regresso a pensamento predominante na época do czarismo

“O pensamento de Putin sobre as relações entre a Rússia e a Ucrânia é contraditório com a ideologia bolchevique e pretende um regresso ao pensamento que predominava entre a elite do império czarista no século XIX, indicou à Lusa um académico e ativista ucraniano.

“Putin considera que não existe uma identidade específica ucraniana, quer um regresso à história do século XIX quando os russos diziam que existia uma nação russa composta por grandes russos, os moscovitas, bielorrussos, e pequenos russos, que para eles eram os ucranianos”, disse è Lusa Volodymyr Yermolenko, filósofo e professor associado na Universidade Kyiv-Mohyla.

 

“Devemos entender que Putin é muito mais arcaico que a própria ideologia soviética. Tentou ir além da ideologia soviética”, assinalou, numa referência a um longo texto assinado pelo Presidente russo em 16 julho de 2021, intitulado “Sobre a unidade histórica dos russos e ucranianos”, que suscitou ampla discussão nos meios académicos e políticos dos dois países.

Um documento que contesta “as ideias de um povo ucraniano separado do povo russo” e que percorre “uma longa história comum” de russos, ucranianos e bielorrussos, “herdeiros da antiga Rus', que foi o maior país da Europa”, um estado eslavo medieval, inicialmente centrado em Kiev, que remonta ao século IX.

Na sua reflexão, o líder do Kremlin também considera que a “verdadeira soberania da Ucrânia” apenas será possível “em parceria com a Rússia”, recorda as comuns ligações “espirituais, humanas, civilizacionais estabelecidas desde há séculos” e sublinha que “formamos um único povo”.

Putin acusa ainda os “atores ocidentais do projeto ‘antirrusso’” de terem elaborado um sistema político ucraniano “com uma constante orientação em direção à separação com a Rússia, à inimizade para com ela” – independentemente de quem ocupar o poder –, assegura que o seu país nunca será “anti-ucraniano” e frisa que “os dirigentes da Ucrânia moderna e os seus mecenas exteriores” apenas possuem um objetivo, “conduzir ao enfraquecimento da Rússia, que convém aos nossos adversários”.

Na perspetiva do académico, o chefe de Estado russo pretende “ir mais além da União Soviética”, onde a ideologia oficial considerava que russos ucranianos e bielorrussos constituíam “três nações diferentes”, mas com origens comuns.

“A abordagem do estalinismo era a de que provavelmente “se uniriam num único povo”, mas a construção original foi delineada por Lenine, e em torno de um projeto federal, explicitou.

“Uma federação de Estados soberanos, com as suas fronteiras, hinos, escudos de armas. Lenine fez isso porque havia uma história de independência da Ucrânia, de tentativa de independência da Geórgia, etc., e desde o século XIX diversos intelectuais ucranianos sugeriam a ideia de que o Império russo se deveria tornar num Estado federado”, prosseguiu Yermolenko, também diretor analítico na Internews Ukraine e chefe de redação da UkraineWorld.org.

“Os ucranianos sugeriam esta opção porque olhavam para o exemplo dos Estados Unidos. Tentavam aplicar essa espécie de modelo republicano ao império, republicanizar, tornar o império numa república de diferentes nações, numa federação”.

Perante este cenário, confrontados com diversos movimentos nacionais, os primeiros dirigentes bolcheviques tentam e conseguem integrá-los na União Soviética, fundada em 1922, mas permitindo que mantivessem a sua identidade, e uma estrutura interna de tipo estatal.

“Mas houve comunistas ucranianos que pretendiam mais poder, não queriam o estatuto de república autónoma, antes um Estado soberano. Foi uma interessante abordagem; em resultado disso a propaganda soviética aceitava praticamente a entidade separada ucraniana. Mas depois tentaram castrá-la, aproximar a língua ucraniana da língua russa”, recordou. “Mas a língua mais próxima do ucraniano é o bielorrusso, seguido do polaco”, e o russo apenas surge de seguida.

“Basicamente, Putin diz que tudo isso é falso, que Lenine é um traidor, mesmo se considera que o colapso da União Soviética constituiu ‘a maior tragédia geopolítica’ da época, mas quer recuar para um período anterior, para o império russo, para o século XIX”.

Para reforçar a sua tese, Volodymyr Yermolenko recorreu a um recente artigo de Vladislav Surkov (considerado o mentor do designado ‘putinismo’, a doutrina de Putin), no qual defende que a Rússia tem de regressar às fronteiras de 1918, “e da próxima vez poderão dizer que deve regressar às fronteiras do império russo em 1914, o que significa por exemplo um significativo território da Polónia”.

Ao prosseguir a dissecação do artigo de Putin, sustentou que o seu principal objetivo consiste em negar a identidade ucraniana.

Mas para o académico, escritor e ativista ucraniano, “Putin assiste à progressão para leste dos valores europeus de democracia e direitos humanos”, acompanhou o “exemplo da Bielorrússia”, apesar do recuo do movimento de contestação devido à repressão, e pretende com o seu homólogo de Minsk “erguer um muro face a estes valores democráticos que se deslocam para leste, por recearem que um dia atinjam território russo. E penso que num certo momento vão atingir”.

Ainda na sua interpretação, Putin quis sobretudo sublinhar no seu artigo – “e provavelmente acredita, o seu grande erro” – que os ucranianos são russos, que o poder em 2014 foi tomado por uma minoria de nacionalistas que impôs essa ideologia à população baseada no estigma do “anti-Rússia”, que a população comum rejeita em geral essa abordagem, que os russos serão apoiados quando regressarem.

“A realidade é totalmente diferente, cerca de 65% dos ucranianos pensa que a Rússia é a principal ameaça, a ameaça decisiva, e em comparação com outros. Por exemplo, apenas 15% considera os EUA a maior ameaça”, enfatizou.

“A maioria considera a Rússia a principal ameaça, os partidos russos estão a perder nas sondagens, o apoio à língua ucraniana por quem se exprime em russo está a aumentar, há quem fale russo mas considera-se ucraniano e preparado para defender a Ucrânia”.

Através destas observações, Volodymyr Yermolenko parece sugerir que o líder do maior país do mundo em extensão, e que pretende voltar a merecer o respeito dos seus grandes rivais internacionais, está de algum modo fora da realidade.

“Putin não entende o que se passa, se uma pessoa fala russo deverá aceitar a hegemonia russa, mas basicamente em cidades da Ucrânia toda a gente fala russo mas são muito anti-Kremlin, anti-Putin, antirrussos. É o paradoxo. Pode-se mesmo comparar com os EUA durante a guerra da independência, todos falavam em inglês, mas os patriotas eram anti-ingleses”.

PEDRO CALDEIRA RODRIGUES (Lusa)

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