A minha cultura, as minhas memórias, os meus valores e as minhas
convicções são todas “europeístas”.
Nasci num país que ligou a Europa ao mundo, nem sempre pelas melhores
razões e raramente da forma mais humana.
Nasci num país e fui criado num regime que copiou os tiques e os
métodos de uma ideologia que nasceu na Europa, o fascismo ( como nasceram na Europa o anarquismo, o liberalismo, a democracia, o comunismo, a social-democracia...).
Nasci num país e fui criado num regime que, na minha juventude, era ainda
a última encarnação de uma atitude europeia face a outros povos, uma regime
colonialista que sonhava com a preservação de um Império.
Nasci num país que tinha como religião oficial o cristianismo e onde a
Igreja, para o bem e para o mal, tinha um poder imenso sobre os valores
incutidos e o quotidiano de todo um povo.
Nasci e vivi num país outro que lutou pelo ideal democrático e liberal ou
partilhou ideologias alternativas ao Estado Novo, todas, para o bem e par o
mal, criadas e fomentadas no espaço Europeu.
Muito da cultura que me incutiram na infância e na juventude, ora como
modelo, ora com contraponto a esse modelo, foi toda ela uma cultura europeia ou
“ocidental”, na musica, na literatura, no cinema, na banda-desenhada, nas artes
plásticas…
Por isso não alinhei na euforia provinciana à volta da adesão a um dos modos possíveis de ser Europeu, pertencer à então CEE, como aconteceu em 1986.
Na altura existiam outros organismos parecidos, a EFTA, mais a norte e
dominada pela Grã-Bretanha, e da qual o Estado Novo salazarista tinha sido um
estado fundador e o COMECON, o equivalente económico nos estados do leste da
Europa, ditaduras ditas “democracias populares”, lideradas pela União Soviética.
Curiosamente a EFTA ainda existe, formado apenas por 4 países, mas que
são os países mais prósperos da Europa, a Noruega, a Islândia, a Suiça e o Liechtenstein.
Para mim sempre pertencemos, para o bem e para o mal, à história,
cultura e sociedade Europeias, um conjunto mais vasto e abrangente e
culturalmente mais diverso e rico do que a actual União Europeia.
Por isso também não embarco na actual confusão reinante de rotular toda
e qualquer crítica à deriva anti-democrática e anti-social reinante nas
decisões tomadas pelas instituições “europeias”, como sendo “populismo” ou “eurocepticismo”.
Criticar o modelo “austeritário” imposto pelo politburo de Bruxelas,
criticar a falta de democracia reinante nas instituições europeias, ou criticar
as desigualdades crescentes provocadas pela forma como o “euro” foi
implementado, não é ser “euroceptico” ou
“populista”, mas é, pelo contrário, alertar para os verdadeiros perigos que um
projecto, com uma origem generosa de defesa na abertura de fronteiras, no combate às desigualdades sociais e na garantia de
direitos sociais humanos e políticos, está a correr às mãos da actual elite que a
dirige, cativada pelo corrupto poder financeiro.
De facto, é essa mesma deriva “austeritária” e “financista” que leva a
fenómenos como o “Brexit” e está a gerar e a dar força ao verdadeiro populismo,
que tem um nome que muitos temem pronunciar: neo-fascismo.
Criticar e encontrar alternativas a essa deriva da União Europeia, protagonizada
por instituições burocratizadas e reféns
do poder financeiro, e pelas suas actuais elites coniventes
com esse poder, é a única maneira de
salvar um projecto que tem potencialidades para melhorar a vida dos cidadãos
europeus e para se tornar uma verdadeira alternativa que, como o fez noutras
alturas, combine a democracia e a liberdade com o combate às desigualdades
sociais e a manutenção de direitos sociais, universais e humanistas.
Continuar na deriva actual, isso sim é condenar o projecto europeu à
sua destruição e abrir caminho às derivas “populistas” xenófobas e
neo-fascistas, fazendo a Europa regressar às suas guerras fratricidas de sempre.
Por isso, parem de me chamar “populista” e “eurocéptico” cada vez que
defender uma Europa mais justa e humana, ou criticar a deriva “austeritária”
imposta pelo “politburo” de Bruxelas.
Ser Europeu é defender a democracia, a liberdade, a justiça social e os
direitos socias.
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