Literalmente a minha geração é a geração da TV.
No ano em que nasci foi efectuada a primeira experiência de emissão
televisiva em Portugal, durante a feira popular de Lisboa e, no ano seguinte, passam
hoje 60 anos, começaram as emissões regulares da RTP.
Mesmo assim, a minha geração foi muito mais marcada pela companhia da
rádio do que pela televisão, já que, pelo menos até ao 25 de Abril, as emissões
da RTP só se iniciavam pelas 19 horas da tarde e encerravam às 24 horas,
excluindo os Domingos.
As vozes da rádio estão assim muito mais presentes na minha memória de
infância do que as “vozes” da TV e, ainda hoje, passo muitas mais horas a ouvir
rádio do que a ver televisão.
No início, lembro-me de irmos nas tardes de Domingo para a cervejaria
Sagres, na Avenida 5 de Outubro, assistir aos programas da RTP.
O meu avô Aspra foi o primeiro membro da família a ter televisão em
casa e foi também aí que vi os primeiros programas de TV.
Não tardou muito até que um televisor fosse instalada em minha casa,
mas ao longo do dia era a rádio que se ouvia, nomeadamente durante o almoço.
Os primeiros grandes acontecimentos de que me lembro, quase todos em
1963, acompanhei-os pela rádio, como a morte de Edith Piaf ou o assassinato do
presidente Keneddy.
Geralmente só víamos TV até à hora de jantar, pois os meus pais tinham
a preocupação de evitar que víssemos séries para “adultos” ou “violentas” como “O
Santo” ou o “Bonanza”.
Muitas vezes, depois de nos deitarmos, eu e o meu irmão escapávamo-nos
à socapa e escondíamo-nos atrás da porta da sala para ver, pela frecha, alguns
programas que passavam à noite, embora fossemos quase sempre descobertos.
Ao longo da década de 60 lembro-me de alguns momentos “importantes” em
frente da televisão, como os festivais da canção, os de Portugal e os da
Europa, a entrega dos óscares (transmitidos em diferido, facto que só vim a
saber mais tarde), alguns dos grandes momentos do futebol nacional, que teve o
seu auge no mundial de 1966, os Jogos Olímpicos, a partir de 1964, as míticas
provas de fórmula 1 dessa década, e, religiosamente, porque o meu pai era um
entusiasta, a conquista do espaço que culminou com chegada do homem à Lua em 1969, sem esquecer
as “célebres” “conversas em família” de Marcello Caetano que, inicialmente,
geraram alguma esperança de abertura do regime.
Isto sem esquecer algumas séries, como o “Rin Tin Tin”, a “Lassie”, “Casei
com uma Feiticeira”, o “Mister Ed” e muito desenho animado, da Disney, mas
também da Warner Bros, como os célebres “Bip Bip”, “Pernalonga”, “Tom e Jerry”….
Além disso, foi na RTP que tive a minha iniciação cinematográfica ,
vendo muito “lixo” mas também coisas interessantes, o que escapava ao crivo da
censura, mas que muito contribui para gostar de cinema, como as comédias
portuguesas dos anos 40 e 50 exibidas até à exaustão, os lacrimejantes filmes
espanhóis de Joselito, as comédias francesas de Fernandel, sem esquecer grandes
filmes como o “O Feiticeiro de Oz”. Claro que tudo a preto e branco.
Assisti também a programas de grande qualidade, como os de João
Villaret, o “Museu do Cinema” ou, mais tarde, o célebre Zip Zip.
Para a minha geração, falar da história da televisão em Portugal é,
assim, falar da nossa própria memória histórica.
Por isso, hoje não se celebra apenas o aniversário da RTP, mas também o
aniversário da minha geração.
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