Por Rui Tavares, in Público de 06/07/2015
“ Os gregos disseram “não”. Contra ventos e marés, com os bancos
fechados e as farmácias e supermercados já com problemas de abastecimento, esta
foi uma demonstração de coragem e firmeza perante todos os avisos e pressões,
chantagens e ameaças, temores e rancores.
“Que “não” disseram os gregos? Os gregos disseram “não” à aplicação de
mais um pacote de austeridade. Mas o “não” dos gregos não foi sobre a saída do
euro ou o afastamento da União Europeia. Só foi possível que o “não” ganhasse,
num país em que 80% das pessoas não quer sair do euro nem da União Europeia,
porque o Governo grego conseguiu fazer passar a mensagem de que um “não” no
referendo não era um “não” ao euro.
“Esta diferença é relevante porque nos próximos dias vamos assistir a
uma enxurrada de comentários dizendo que a Grécia voltou costas à Europa. Já
começaram, aliás: o social-democrata alemão Sigmar Gabriel afirmou que o
Governo grego queimou as últimas pontes com a Europa e o trabalhista holandês
Jeroen Dijsselbloem disse que o resultado do referendo condiciona a presença da
Grécia no euro. Pouco me surpreende a atitude deste dois porta-vozes da
arrogância institucional da zona euro. São eles, e gente como eles, quem voltou
as costas à Europa. São eles quem se apresta a sacrificar um país, primeiro, e
todo um projeto de paz e democracia para este continente, depois, no altar das
regras burocráticas e mecanismos cegos de uma união monetária mal concebida.
“É preciso fazer barragem a esta atitude revanchista e impedir que ela
deite a perder aquilo que, apesar de todas as dificuldades e erros, se
construiu na Europa das últimas gerações. Dijssebloem e Sigmar Gabriel perderam
uma batalha política contra o Governo grego mas não têm o direito de levar a
Europa para um buraco por causa disso. Vários governos europeus fizeram o que
fez o grego e vários referendos europeus já deram “não” — na Irlanda, na
Dinamarca, na França, na Holanda. Em todos os casos se voltou à mesa de
negociações e se fizeram concessões para que os países em causa pudessem
continuar no projeto europeu. Os gregos não merecem menos do que isso.
“Esta crise pode acabar amanhã se os mais inflexíveis dos governos
europeus entenderem que não é possível exigir mais austeridade a uma economia
deprimida e a uma sociedade exaurida. Mas é possível salvar a Grécia e a Europa
combinando uma moratória imediata do serviço da dívida grega para os próximos
dois anos, uma reestruturação das dívidas excessivas dos países da zona euro e
um plano de relançamento económico financiado pelo Banco Europeu de
Investimentos. Aí sim, será possível reformar o Estado grego — e o Syriza é
provavelmente o partido mais bem colocado para o fazer. Onde o eurogrupo dizia:
“Condições primeiro e alívio da dívida depois” é preciso dizer “alívio da
dívida já para dar condições de reforma depois”.
“Quem ama a democracia e a Europa não pode deixar a Grécia ser
empurrada para a porta de saída da União. Quem ama Portugal, já agora, também
não. Nas cimeiras extraordinárias que se seguirão nos próximos dias, o Governo
português não pode persistir numa atitude de confronto que, sem resolução desta
crise, se poderia voltar contra Portugal mais depressa do que se pensa”.
“Coragem
por VIRIATO SOROMENHO-MARQUES
in Diário de Notícias de 6 de Julho de 2015
“Confesso que não esperava um resultado como aquele que deu à posição
negocial do governo grego uma legitimidade tão reforçada. Sobretudo, depois de
o BCE ter quase fechado a torneira da liquidez, obrigando os gregos, incluindo
os mais idosos, a penarem nas filas dos ATM e dos bancos.
“Depois de todos os dirigentes das instituições europeias terem
incitado, com mentiras e ameaças, à votação num sim que decapitaria o governo
grego e atrelaria um povo inteiro à incerta clemência dos credores num ato de
compreensível, embora lastimável, servidão voluntária. Como Aristóteles nos
ensina, a coragem, a capacidade de resistir em vez de se render, é uma virtude.
Um bem moral superior.
“Numa Europa governada por gente tão pequena, moral e intelectualmente,
a coragem dos gregos - que não é a de um partido, ou de uma ideologia - é um
tónico ético e cívico que vai ter impacto em todos os países varridos pela
crise.
“ A resposta sobre o futuro da zona euro, e a sua integridade ou
fragmentação, está agora do lado do diretório que se reúne hoje em Paris.
Veremos se consegue digerir o azedume desta derrota da austeridade sem
desperdiçar os dias escassos que a Grécia tem pela frente.
“Se escolherem o caminho da expulsão da Grécia, pelo menos não haverá
dúvidas sobre quem fez vibrar o primeiro golpe, que fará desabar com estrondo
uma união monetária incapaz de se curar dos seus males genéticos.
“ Talvez tenha chegado a hora, como sugeria Habermas num texto recente,
de os povos salvarem a Europa do labirinto onde a cegueira dos atuais líderes a
meteu. Mesmo que seja demasiado tarde, um combate por uma causa nobre, que se
perde, é mais honroso do que uma vitória que nos rebaixa e envilece”.
"Assim não
por Miguel Esteves Cardoso
in Público de 6 de Julho de 2015
“A maioria dos gregos disse “não”. Não disse “não” ao euro nem “não” à
União Europeia. Foi “não” à maneira como os dirigentes democraticamente eleitos
pelos gregos têm sido tratados pela troika.
“A troika pode queixar-se da maneira como se têm comportado os
dirigentes gregos. Mas já não pode dizer que eles não têm defendido os
interesses da Grécia. A Grécia, numa democracia parlamentar, é uma coisa
simples: é a maioria dos eleitores gregos.
“A maioria dos eleitores gregos é a Grécia. E a Grécia disse
maioritaria e directamente “não” à troika como disse “sim” aos dirigentes do
Syriza que actualmente representa a Grécia.
“A austeridade é uma palavra mentirosa. Significa menos dinheiro e
menos serviços sociais para todos. Quanto mais pobre se é, mais se sofre. Na
Grécia todos os meses há cada vez mais pobres. A somar a todos os pobres que
sempre o foram, há todos aqueles que só recentemente deixaram de o ser.
“Os dirigentes da troika e dos governos da União Europeia têm de ter a
coragem e a clareza de deixar de culpar a Grécia e os dirigentes gregos e
passar a culpar os próprios eleitores gregos.
“Os eleitores gregos, quando elegeram o Syriza e disseram “não” neste
referendo, votaram na esperança de parar o empobrecimento. Não é heróico. Mas é
digno por ser humano.
“Claro que os eleitores de cada um dos outros países da União Europeia
têm a mesma importância do que os gregos. Os gregos não são nem podem ser
especiais. Mas têm de ser considerados iguais. E irmãos.”
O referendo viso por Paul Krugman:
In The New York Times (tradução para espanhol doEl País) , 6 de Julho
de 2015
“Tsipras y Syriza han logrado una gran victoria en el referéndum,
reforzándose para lo que quiera que venga después. Pero no son los únicos
ganadores: diría que Europa, y el concepto de Europa, han conseguido una gran
victoria y han esquivado una bala.
“Sé que la mayoría no lo ve igual. Pero pensémoslo así: acabamos de ver
a Grecia levantarse contra una campaña de acoso e intimidación, un intento de
meter miedo a los griegos no solo para que aceptaran las exigencias de los
acreedores sino para que se deshicieran de su Gobierno. Ha sido un momento
vergonzoso en la historia moderna de Europa y, de haber prosperado, habría
sentado un feo precedente.
“Pero no lo hizo. No tienes que amar a Syriza o creer que saben lo que
hacen —no está claro que así sea, aunque la troika lo ha hecho aún peor— para
considerar que ha redimido a las instituciones europeas de su peor yo.
"Si Grecia hubiese sido forzada por el miedo a las consecuencias financieras, Europa habría pecado de tal manera que mancillaría su reputación durante generaciones. Dentro de un tiempo posiblemente recordemos esto como una aberración.
"Si Grecia hubiese sido forzada por el miedo a las consecuencias financieras, Europa habría pecado de tal manera que mancillaría su reputación durante generaciones. Dentro de un tiempo posiblemente recordemos esto como una aberración.
“¿Y si Grecia acaba saliendo del euro? En este momento hay,
efectivamente, buenas razones para el Grexit pero, en todo caso, la democracia
importa más que cualquier acuerdo monetário”.
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