TODOS AO PRIMEIRO DE MAIO DO PINGO DOCE!
por Daniel Oliveira
In Expresso on-line 2 de Maio de 2012
“Dia 1 de maio. As imagens na televisão são o retrato de um
país que vive em degradação evidente. Milhares de pessoas invadem os
supermercados do Pingo Doce. Confusão, incidentes, cenas de pancadaria, polícia
de choque em algumas lojas, prateleiras vazias, saque de produtos alimentares.
A Jerónimo Martins ofereceu descontos de 50% para quem fizesse compras
superiores a 100 euros.
“Num dos feriados que ainda eram respeitados pelas grandes
superfícies, a filantrópica família Soares dos Santos, a que, nos intervalos de
lições de responsabilidade aos nossos governantes procura e encontra esquemas
para fugir ao fisco, a que, descobrindo que os seus mal pagos funcionários
estão na miséria lhes dá umas esmolinhas em géneros, assinala assim o Dia do
Trabalhador. É esta a nossa elite económica: tudo o que represente a dignidade
de quem trabalha merece dela um olímpico desprezo.
“No mesmo dia em que Passos Coelho tem, como única mensagem
a dar aos portugueses, o anúncio de que o desemprego, que já atingiu recordes
nunca vistos, vai continuar a aumentar, muitos portugueses dedicaram o seu dia
à corrida às compras. Não os condeno. Quando não há dinheiro um desconto
destes, com venda de produtos abaixo do preço de custo (dumping pago quase
sempre pelos fornecedores) faz diferença. E não é seguramente por consumismo
que alguém se planta, às 4 da manhã, à porta de um supermercado.
“Nada obrigava a Jerónimo Martins a fazer esta promoção
neste dia. Mas a pobreza tem mais força que a repressão. Enquanto as pessoas
lutam para comer não lutam por direitos. Nenhuma ditadura conseguia resumir um
dia de resistência àquelas imagens degradantes. O que ficará do 1.º de maio de
2012 em Portugal é isto: um povo a esbofetear-se por um desconto em comida. Uma
empresa que é incapaz de compreender qualquer ideia que se assemelhe a
"dignidade". Um poder político que nos atirou para este humilhante
retrato terceiro mundista”.
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