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segunda-feira, 6 de junho de 2011

O DIA SEGUINTE....

Terminou ontem um dos períodos mais negros da política portuguesa nos últimos anos.

Mais do que a vitória da direita, fica para a história a pesada derrota sofrida por José Sócrates, arrastando o Partido Socialista para resultados avassaladores, só se encontrando algo comparável em 1991, nos tempos das maiorias absolutas de Cavaco Silva.

O primeiro equívoco em relação a José Sócrates começou logo quando, em 2005, ele levou o Partido Socialista a conseguir a sua primeira maioria absoluta, que muita gente acreditou e classificou logo como a primeira maioria absoluta da “esquerda”.

Foi o desejo de viragem à esquerda que levou muita gente a votar em massa no PS nessas eleições, fartos da retórica neo-liberal do governo de Durão Barroso e das trapalhadas de Pedro Santana Lopes. Mal adivinhariam esses que essa retórica do governo de Durão Barroso se tornaria realidade nos governos de Sócrates ou que as trapalhadas de Santana Lopes se tornariam pequenas notas de rodapé, face à dimensão nunca imaginada que seria atingida pelas trafulhices de Sócrates e dos seus “boys” .

José Sócrates começou a tomar medidas que levaram o país à estagnação económica e recessiva, ainda vinha longe a crise internacional. A arrogância apoderou-se da actuação dessa maioria absoluta, destruindo uma classe média ainda frágil, desestabilizando o mundo do trabalho e beneficiando os grandes grupos financeiros e empresariais.

A pouco e pouco começou a acentuar-se aquela que vai ser a imagem histórica do consulado socrático: o aumento do desemprego, o acentuar da precariedade do emprego jovem, os salários baixos, a desvalorização do factor trabalho, o aumento das desigualdades sociais, a emigração em massa de uma juventude qualificada, o acentuar da corrupção dos “boys”…

Muitos daqueles que apoiaram essas medidas “corajosas” contra as “corporações”, estão hoje, com a mesma verve, ao lado das intenções “reformadoras” neo-liberais do seu novo “herói”, Passos Coelho.

Aquelas eleições foram as últimas ganhas pelo PS com Sócrates no poder. A partir daí foi sempre a descer. Mesmo nas últimas legislativas de 2009 Sócrates teve uma “meia-vitória”, perdendo cerca de 500 mil votos e a maioria absoluta. Agora perdeu mais outros 500 mil votos. Perder um milhão de votos em seis anos é obra.

Mesmo em relação a Pedro Santana Lopes, Sócrates teve ontem menos cem mil votos do que o PSD em 2005.É caso para se dizer que a vingança se serve a frio…

Por isso não se percebe o modo como o PS continua a endeusar o seu agora ex-líder, como se viu ontem na conferência de imprensa onde ele anunciou a sua demissão.

A derrota não é apenas pessoal, é também de um PS que virou à direita e alinhou na deriva neo-liberal do seu líder, sem pestanejar, como se viu com a vitória obtida por Sócrates no ultimo congresso, uma vitória “à Coreia do Norte”, ou como se viu ainda ontem pela reacção agressiva e arrogante dos seus apoiantes face aos jornalistas que tiveram a coragem de colocar questões incómodas.

Se o PS quer regressar ao seu lugar, como um grande partido da esquerda portuguesa, vai ter de abandonar a herança de José Sócrates, feita de arrogância, autoritarismo e autismo.

À esquerda, O Bloco de Esquerda foi o segundo derrotado da noite, perdendo metade dos seus deputados. Percebe-se que o resultado obtido em 2009 foi meramente conjuntural. Não se percebe ainda para onde foram esses votos. Não foram nem para o PS, que perdeu centenas e milhares de votos, nem para a CDU que também perdeu cerca de 6 mil votos. Fica um mistério por esclarecer.

A CDU conseguiu aumentar ligeiramente a sua representação parlamentar, apesar de perder votos. A coligação liderada pelo PCP parece ter estancado a sua queda eleitoral , consolidando assim a sua posição eleitoral. Mas parece estar no limiar do seu crescimento.

À esquerda do PS, uma esquerda que é necessária para travar a deriva neo-liberal do PS, é importante fazer uma profunda reflexão sobre o seu futuro.

Se olharmos para os resultados distrito a distrito, dá para perceber que, se a CDU e o BE se tivessem coligado conseguiriam conquistar mais deputados. Assim, dispersando os votos à esquerda do PS, contribuíram para a subida da representatividade da direita, em especial do CDS/PP.

Se continuar acoitada na sua radicalidade e no seu sectarismo, a esquerda da esquerda irá perder influência em futuras eleições, a favor de um PS que, na oposição, consegue cativar muitos votos que perde quando está no poder.

Como maior partido da esquerda, o PS tem agora a responsabilidade de fazer um trabalho de médio prazo para recuperar o eleitorado de esquerda e para se aproximar da sua esquerda.

Aquilo que a direita consegue facilmente, que é a sua unidade nas questões essenciais, continua a ser a grande fraqueza da esquerda.

Se na liderança do PS viermos a ter um António José Seguro, ou um António Costa, talvez seja possível, a prazo, uma aproximação dos partidos da esquerda (embora estes também precisem de mudar de atitude e fazer o “trabalho de casa”). Se essa escolha for Francisco Assis talvez essa unidade também venha a ser possível. Já se a futura liderança recair em António Vitorino ou em qualquer dos “boys” de José Sócrates , essa aliança vai continuar a ser impossível e as opções mais radicais dos partidos à esquerda do PS vão continuar a dominar estes partidos.

O PS também tem de recuperar a classe média que perdeu para a abstenção e para o PSD (professores, médicos, funcionários públicos, quadros médios e qualificados) que tão maltratados foram por José Sócrates.

Pessoalmente a direita no poder já não me “assusta” como noutros tempos. Quando tivemos um governo de “esquerda” com o de José Sócrates, tudo que “vier à rede é peixe”. Em muitas coisas a direita parece revelar maior sensibilidade social e cultural do que o PS de Sócrates.

Além disso, para governar “à direita”, como vai ser imposto pelo memorando da “troika”, é preferível que o façam os partidos originais e não a caricatura em que se tornou José Sócrates.

A esquerda tem um longo caminho para percorrer, se quiser voltar ao poder nos próximo dez a vinte anos. O caminho faz-se caminhando. Assim o saiba fazer.

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