Uma campanha eleitoral devia ser uma oportunidade para esclarecer
convenientemente os cidadãos sobre as alternativas que os partidos e os candidatos
propõem para o país.
São raras as verdadeiras “sessões de esclarecimento” e a campanha vive
muito das picardias entre candidatos, das promessas apressadas, das discutíveis
previsões de sondagens, das “arruadas” folclóricas.
De vez em quando lá se fala num tema que interessa, mas sempre pela
rama, de forma apressada, com muita retórica e pouco esclarecimento.
Embora alguns dos temas que abaixo refiro, como sendo aqueles sobre os
quais gostaria de ser esclarecido, venham às vezes à baila, raramente são
tratados com a seriedade que mereciam.
Vamos então a eles:
AUSTERIDADE
Não sou um fundamentalista contra a austeridade. Penso que, à luz dos
desvarios da última década, ela até se pode justificar, com conta, peso e medida,
para garantir um Estado saudável e o futuro das nossas gerações.
Parece-me que é necessário controlar as contas públicas e pagar as
dívidas.
Contudo penso que não é através de cortes cegos nas funções sociais do
Estado, nos salários e nas pensões que se conseguem bons resultados.
A austeridade devia ser exercida através de uma gestão racional dos
recursos, que deviam passar por cortar nas verdadeiras gorduras do Estado.
E quais são, quanto a mim, as “gorduras do Estado” : as assessorias
governamentais, a maior parte das ajudas
de custo a gestores públicos e políticos , o recurso à “colaboração” de
gabinetes de advogados, a má gestão de PPP´s e dos “Swaps”, o financiamento das
comitivas governamentais, os apoios e benefícios a certas empresas privadas, grande parte dos
regulares perdões fiscais, o financiamento de institutos e fundações de
duvidosa utilidade, alguns privilégios fiscais, os “vistos dourados”, as obras
públicas desnecessárias (algumas auto-estradas, edifícios públicos, estádios de futebol...), o apoia ao sector financeiro, a criação de empregos
para os “boys” partidários, etc, etc, etc…
Um levantamento exaustivo das situações acima descritas podia
perfeitamente substituir muitos dos cortes nas funções essenciais do Estado,
nos salários e nas pensões.
A escolha dos cortes é uma questão ideológica.
FUNÇÕES DO ESTADO
Um debate que se faz de forma enviesada é o de esclarecer sobre aquilo
que cada partido pensa do que devem ser as funções do Estado.
Para mim essas funções são aquelas que garantam o bem-estar
generalizado das populações, isto é, o acesso à Educação, à Justiça , à Saúde e
à Segurança, nas suas diversas vertentes , sem esquecer uma intervenção activa
para garantir a Habitação, o Transporte, o Emprego e a Pensão.
Também acho que o Estado, em colaboração transparente com o sector
privado, deve garantir algumas obras públicas, como a modernização do
caminho-de-ferro, a construção de uma linha de TGV (ou Portugal fica em
definitivo afastado dos grandes centros de decisão), entre Lisboa e Badajoz, a
manutenção de portos, a recuperação urbana e do património histórico e melhorar as condições de habitabilidade de alguns edifícios públicos (hospitais,
escolas, tribunais…).
Não sou fundamentalista quanto à forma de exercer essas garantias. O
sector privado pode e deve ter um papel activo na garantia desses direitos, mas
de forma transparente e de acordo com a lei.
Não sou contra a privatização de
alguns serviços, mas existem alguns serviços que, podendo ser exercidos por
privados, devem funcionar como concessão e não devem ser privatizados ( como,
por exemplo, parte do sector dos transportes, da energia e da àgua ).
Além disso o Estado deve exercer um controle rigoroso sobre o sector
financeiro e garantir alguns serviços públicos em funções exercidas pelo sector
privado , e que devem obedecer a normas rigorosas, como o direito à informação,
à cultura e a um ambiente saudável.
IMPOSTOS
Sou daqueles que acham que os impostos devem ser altos, mas
proporcionais, tendo como objectivo principal garantir que todos os cidadãos
tenham acesso às principais funções que quanto a mim, e de acordo com o que
referi anteriormente, devem ser as funções do Estado.
Pelo contrário, os impostos não devem servir para salvar os desvarios
do sector financeiros ou de certos empresários privados.
O combate à fraude e à evasão fiscal deve ser uma das prioridades,
nomeadamente penalizando as empresas que recorrem sistematicamente aos paraísos
fiscais para fugirem à suas obrigações (como acontece com 19 da 20 empresas do
PSI20!!), mas deve ser exercido com conta, peso e medida. Perde-se muito tempo a
perseguir o pequeno infractor, como por exemplo o pequeno vendedor ambulante ou
de mercado de rua. Este, pelo contrário, devia ser despenalizado, já que muitas
vezes é um recurso de combate à pobreza
.
Igualmente as empresas que pagam ordenados de luxo aos seus gestores,
muito acima daquilo que o Estado paga para funções idênticas, não devia poder
recorrer a apoios estatais ou a outros benefícios.
O Capital especulativo devia ser fortemente taxado, pelo menos ao mesmo
nível, para os mesmos valores, do IRS.
Por último, as isenções fiscais e os escalões de IRS e IRC deviam ser totalmente revistos.
PENSÕES
A sustentabilidade das pensões tem-se vindo a agravar ultimamente,
muito por via das erradas medidas de austeridade tomadas nos últimos governos.
Quando cerca de 500 mil trabalhadores, a maior parte jovens qualificados, saíram do país nos últimos 4 anos, é
obvio que o problema se agrava, pois são menos 500 mil pessoas a descontar para
a segurança social em Portugal.
Quando o desemprego atinge, directa ou indirectamente, quase um milhão
de portugueses, não só temos menos de um milhão a descontar para a segurança
social, como temos vários milhares de pessoas que vão necessitar de ser
apoiados pela segurança social.
Quando temos dois milhões de portugueses a viver abaixo do limiar da
pobreza, muitos deles trabalhadores precários ou com salários baixo, temos mais
um problema.
Por sua vez, aqueles três problemas agravam a grave situação demográfica
do país, já que são um forte
desincentivo para inverter a trágica taxa de natalidade.
Por último, o Estado não pode pagar pensões de luxo a políticos,
gestores públicos e banqueiros, muitos deles com pensões que foram valorizada à
luz de leis excepcionais, diferentes daquelas que são aplicadas para calcular as pensões de todos os outros que descontaram toda a
vida.
EURO
A escolha para Portugal está, nos próximos 20 ou 30 anos, entre
continuar no euro, com austeridade permanente e cega, ou começar a pensar numa
alternativa ao euro, que implicaria a mesma austeridade e agravamento
conjuntural do nível de vida, mas, se bem pensada e negociada, podia dar aos portugueses
alguma esperança de futuro “já” daqui a uns dez anos.
Seria bom olhar para a Europa e reparar que os países do euro (tirando
a Alemanha, a Holanda e a Finlândia) estão todos pior, em todos os índices de
desenvolvimento e bem-estar humano, do que os países ocidentais que não estão
no euro.
Alguns deles, se passaram por situações de crise, saíram rapidamente
dela porque tinham moeda própria.
Países como a Dinamarca, a Suécia, a Noruega e a Islândia, (estes dois
últimos nem pertencem à União Europeia) são um bom exemplo do que afirmamos.
Por isso não é sério prometer acabar com a austeridade e continuar a
defender a manutenção no euro.
CONCLUINDO
Estas eram pois algumas das questões que gostávamos de ver aprofundadas
nesta campanha eleitoral.
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