"Pete Seeger em Lisboa, numa noite febril de 1983
"Foi no dia 2 de Dezembro de 1983 e havia uma enorme ansiedade para ver
Pete Seeger. Sim, vê-lo a cantar de perto, porque ouvi-lo já todos o
tinham ouvido. Dos discos, da rádio, da lenda que ele nobremente tecera
numa mistura de brio e humildade. Não era uma vedeta nem queria sê-lo,
era um porta-voz de ansiedades, de histórias, de poemas, de vidas
alheias, de alegrias e de imperativos de justiça.
"No Pavilhão dos Desportos (mais tarde Carlos Lopes) a gente era muita e
o som era mau, mas ninguém se importou com isso. Quando Seeger, então
com 64 anos, chegou ao palco, foi recebido com uma tempestade de
aplausos. “Faltava-nos Pete Seeger”, declarava por escrito a comissão
encarregada de organizar o concerto, como se fosse uma cimeira ou
convénio. E deixou de faltar.
"No palco, ele fez o que melhor sabia: cantar histórias. De vida, de
esperança, também de morte – uma outra forma de reacender a esperança.
Cantou canções dele próprio e de Woody Guthrie, José Martí, Carlos Mejía
Godoy ou de Nazim Hikmet (por sinal o poema onde o poeta turco dá voz
ao fantasma de uma menina morta em Hiroxima).
"Ouvimos Guantanamera, Union maid, Wasn’t that a time, Christo ya nasció, Well may the world go, We shall overcome
e muitas outras canções feitas hinos. E nunca ao longo da noite na sala
se fez silêncio, fosse com palmas sincopadas ou coros desafinados,
todos queriam participar. Afinal, estava ali Pete Seeger. E que outra oportunidade haveria de voltar a cantar com ele? Nenhuma.
"Dessa noite ficou um bom disco (LP, mais tarde reeditado em CD) e um
bom livro. E ficou a memória de uma noite de festa, ansiosa, febril, por
algo indistinto a que poderíamos chamar futuro. E era já passado".
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