NO TEMPO EM QUE NÓS PERDÍAMOS EM TUDO E APARECEU O EUSÉBIO
Por José Fanha
“Nós somos mesmo bestiais!” Era o que dizíamos quando eu era mais
pequeno.
“Nesse tempo eu queria pertencer a qualquer coisa. Queria pertencer,
por exemplo, ao meu país.
“É claro que eu já pertencia ao meu país que tinha um passado glorioso
cheio de Descobrimentos e Vascos da Gama e Mouzinhos de Albuquerque e coisas
assim. Mas isso era antigamente e, no tempo em que eu tinha 10 anos o meu país
já não descobria nada há muito tempo e era muito pequenino comparado com outros
países e, ainda por cima, passava o tempo a perder com todos.
“Nós, lá na minha escola, ficávamos muito tristes sempre que o nosso
país perdia. E o pior é que perdia quase todos os dias.
“Depois, para ficarmos satisfeitos inventávamos umas coisas em que o
nosso país era muito bom porque eram coisas que mais nenhum país sabia. O
hóquei em patins, o jogo do pau, os matraquilhos, o abafador… Nessas coisas,
era canja ganhar. Mas ficávamos tristes à mesma porque sabíamos que nunca
ganhávamos nas outras coisas.
“De repente apareceu uma equipa de futebol que ganhava aos outros, aos
grandes do estrangeiros. Uma equipa onde jogava o Coluna, o Germano, o Simões,
o Águas, o José Augusto e aquele rapazinho chamado Eusébio que era uma força da
natureza e marcava golos como mais ninguém.
“Eu era um miúdo e vi-o jogar no velho Estádio da Luz contra o Real
Madrid, o Santos, o Feyenord, o Ajax e sei lá mais quê. E vi-o na televisão em
66 a marcar 4 golos à Coreia do Norte e a chorar quando perdeu com a
Inglaterra.
“E de repente era bom pertencer àquele Portugal que tinha uma bela
equipa de futebol e um grande, um imenso jogador chamado Eusébio.
“É claro que não tínhamos muito mais por que nos orgulharmos. Só
depois, com o 25 de Abril, é que esse orgulho de ser português saiu para a rua
com toda a força. (Agora tão apagado, esse orgulho, com esta gentinha vendida
ao estrangeiro das troikas e baldroikas).
“Mais tarde conheci pessoalmente e cruzei-me váras vezes com o Eusébio.
E fiquei fascinado com a sua simplicidade, a sua humildade, a grandeza doce da
sua dimensão humana.
“Nunca lho disse mas acho que ele soube ler nos meus olhos o
agradecimento por ter tornado um bocadinho maior e mais largo o país da minha
primeira juventude.”
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