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quarta-feira, 17 de setembro de 2014

"Reformar" a Democracia...ou quando os coveiros da dita se vestem de virgens imaculadas...


Sem partidos não há democracia.

Sem política não há cidadania.

Estas são duas verdades indesmentíveis.

O problema reside na forma não democrática como funcionam os partidos e no modo como a política se profissionalizou, afastando-se da cidadania.

Muitos daqueles que fizeram da política profissão e/ou que devem à política os  cargos, os rendimentos e a visibilidade que ocupam, cientes da velha máxima de  Abraham Lincoln segundo a qual podem “enganar toda a gente durante um certo tempo”, podem mesmo enganar “algumas pessoas todo o tempo”, não podem “enganar sempre toda a gente”, e apercebendo-se de que chegou o momento em que os cidadãos atingiram o seu limiar de tolerância par com as suas aldrabices, começam agora a movimentar-se no sentido de “reformar o sistema político”, tentando alijar as responsabilidades próprias na construção do sistema .

É assim que surgem propostas avulsas, aparentemente justas, para “reformar” os partidos e o sistema eleitoral e político, como a redução do número de deputados ou a criação dos círculos uninominais.

Contudo, a redução de deputados não altera nada, apenas reforça maiorias fictícias, beneficiando os grande aparelhos partidários e retirando a diversidade de opiniões representada pela presença de pequenos partidos.

O problema no parlamento passa por muita coisa, mas em especial, por duas situações: a falta de liberdade de voto dos deputados, sujeitos à disciplina partidária, e o facto de uma esmagadora maioria dos deputados estar no parlamento a representar lobbies financeiros, empresariais ou gabinetes de advogados, mantendo actividade extra parlamentar e beneficiando de um conjunto de privilégios muito para lá do razoável.

Sem se alterar essas situações, até podem reduzir para metade o número de deputados que os problemas de corrupção ética e oportunismo carreirista de uma grande parte dos deputados, não só se manterá, como se agravará, sem os pequenos partidos do “contra poder” presentes para fiscalizarem os excessos.

Quanto à outra proposta, a dos círculos uninominais, já aqui referimos ontem o que pensamos dessa proposta: apenas servirá para reforçar o caciquismo local e personalizar o vedetismo de "notáveis" fabricados pela visibilidade na comunicação social, vendidos como sabonetes.

Pelo contrário, os dois  aspectos cruciais para reforçar a democracia e aproximá-la dos cidadãos terão de passar, em primeiro lugar, pelo debate de ideias e projectos que os candidatos e os partidos devem apresentar aos cidadãos, sendo penalizados pelo incumprimento dos mesmos e, em segundo, pelo reforço da ética sobre a disciplina partidária.

Para além disso a política deve ser cada vez menos uma profissão e a garantia de uma carreira e cada vez mais um acto de cidadania. Para isso é necessário retira privilégios àqueles que exercem cargos políticos, seguindo alguns dos modelos existentes nos países nórdicos.

Um deputado deve ser um representante dos cidadãos, deve cumprir o programa e as ideias com que foi eleito e deve abandonar regularmente as funções políticas, regressando ao estatuto sócio-profissional que mantinha antes de exercer aquele cargo, tão rapidamente quanto possível, dando lugar a outros cidadãos, num sistema de rotatividade e inovação permanente.

Quanto aos partidos, estes não podem ter um discurso “anti-autoritário” e “liberal” para fora e funcionar como um micro sistema totalitário na sua organização e na escolha dos seus líderes.

Sem discutir estas situações, as “ideias” que andam aí a ser divulgadas por “notáveis” e profissionais da política não passam de meros discursos de circunstância, numa busca incessante para se manterem à tona  e disponíveis para cargos políticos no futuro, na esperança de não serem esquecidos no “novo” ciclo político que se avizinha, esperando, pelo contrário, que ninguém se lembre de indagar sobre a responsabilidade e os benefícios que a maioria deles teve no passado recente graças ao descalabro político-partidário que agora criticam e pretendem “reformar”.

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