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sexta-feira, 7 de setembro de 2018

CP : “crime” ou “desastre”?



O descalabro do transporte ferroviário em Portugal foi um dos temas em destaque este verão.

Que alguns só agora tenham acordado para o tema, não é mera coincidência.

Uns procuram esconder as suas responsabilidades politicas no desastre (como os cavaquistas e o CDS, com “agentes” seus nas sucessivas administrações da “coisa”).Outros, ao serviço do poder financeiro, como acontece com muitos jornalistas e comentadores, só agora se lembraram de uma triste realidade, que vem de longe.

Com raras e honrosas excepções (como a do jornalista do Público Carlos Cipriano que há longos anos denuncia a situação), esta é a sua forma de prestar o seu “servicinho” para justificar a anunciada privatização dos serviços ligados à CP.

Pode ser que ganhem um lugar de assessores de comunicação numa das “futuras” empresas privadas que se acotovelam para tomar de assalto a gestão dos transportes ferroviários (ficando o lucro para eles e os custos para os contribuintes e utentes, como tem sido prática nesta coisa das privatizações...).

O “crime” e o “desastre” da CP não é de agora. Vem de muito longe.

Pessoalmente, fui durante muitos anos utente regular da CP na linha do Oeste.

Ainda sou do tempo dos horários regulares e dos intercidades, que nos punham, aqui de Torres Vedras, a cerca de 1 hora do centro de Lisboa, quando a maior parte dos comboios terminavam o seu percurso no Rossio (hoje, com autoestrada e de automóvel, raramente alguém consegue chegar ao Rossio uma hora depois de sair de Torres, sem esquecer os gastos com portagens, gasolina e estacionamento…).

Fui assistindo, ao longo do tempo, à longa agonia da linha do Oeste e dos transportes ferroviários em geral, situação que se acentuou com a entrada de “fundos europeus” em barda e das autoestradas cavaquistas.

Ao mesmo tempo a empresa foi sendo dividida às fatias, criando-se várias empresas, uma para o transporte de passageiros, outra para a manutenção das linhas, outa para o transporte de mercadorias, etc, etc...Apenas se beneficiou o aumento de lugares nas administrações para os vários "boys"...

Resisti quase até à ultima, mas o fim das ligações directas com o centro de Lisboa, a redução do número de combóis em circulação e os horários cada vez mais absurdos, acabaram por me “empurrar” para a carta de condução, que tirei já depois dos 40 anos.

Toda a estratégia cavaquista de desinvestir nos transportes públicos visou apenas beneficiar os patrões de Paris e Berlim, os únicos a beneficiar pelo facto de terem quase o monopólio da industria automóvel na Europa. Outro dos grandes beneficiados foi o sector petrolífero, hoje cada vez mais enredado nos mais obscuros negócios financeiros e centro de emprego para ex-governantes. Muito do nosso deficit e da nossa divida tem origem nessa opção.

Tudo isto, claro, em nome de uma pretensa “modernização” do país. Ainda me lembro da argumentação de comentadores, políticos e economistas: o “comboio” era coisa do passado, de países subdesenvolvidos.

Muitos portugueses engoliram essa retórica. Eu próprio quase acreditei nessa mentira e só percebi o logro quando comecei a viajar mais vezes para fora do país, inclusive no “centro” da Europa. 

Aí descobri que o comboio é um meio de transporte muito popular, pelo preço, pelo conforto, pela rapidez, pela frequência e pelos horários, com ligações para quase todo o lado.

Hoje começa a ser evidente, até pelas razões ambientais, que o transporte automóvel, pelo menos como o conhecemos, está condenado a prazo.

Por outro lado, estamos também a perder o “comboio” do TGV, que neste momento se torna um concorrente sério à aviação, outro meio de transporte condenado a prazo, também por razões ambientais e até pelo aumento de tempo que se perde nos aeroportos e nas ligações.

Claro que o país não precisava de tanto TGV como se chegou a aventar. Bastava uma boa ligação de TGV entre Lisboa/Sines e Badajoz e entre o Porto e Vigo, melhorando os serviços do alfa pendular entre Lisboa e Porto.

É inconcebível que, tal como há 50 anos, a ligação ferroviária entre Lisboa e Madrid e Lisboa e Paris tenha o mesmo horário e se faça à mesma velocidade.

A aposta até teria custos reduzidos, já que era possível aproveitas o trabalho feito pelos homens do século XIX, que construíram as vias existentes , sendo possível, com as tecnologias de hoje, recupera-las rapidamente. E já agora, até podiam recuperar a industria de construção ferroviária (já tivemos industria que fabricava carruagens e maquinas de comboios, tudo destruído na voragem cavaquista…).

Para as mentalidade “ahistóricas”, e “presentistas” que dominam os nosso economistas, os nossos políticos e os nossos jornalistas, não me parece que seja credível que, de uma vez por todas, apostem forte no  investimento nos transporte públicos, e, em especial, nos transportes  ferroviários.

Assim, o “crime” e o “desastre” está cada vez mais à vista com a privatização da CP, mais uma negociata para alguns, com custos a prazo para todos nós e para os nossos filhos!

Esperemos que o que resta de "cidadania" não se tenha esgotado nos "futebois" e ainda se tenha força para travar o desastre, obrigando a que se aposte, de forma séria, no transporte ferroviário. 

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