Os dias que rolam, numa visão plural, pessoal e parcial de um mundo em rápida mutação. À esquerda, provocador e politicamente incorrecto, mas aberto à diversidade...as Pedras Rolam...
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sábado, 22 de dezembro de 2018
“Coletes Amarelos” – quem são os derrotados.
Do total fracasso, a roçar o ridículo, da manifestação dos “coletes
amarelos”, não saíram apenas derrotados os seus promotores.
Em primeiro lugar saiu derrotada a extrema-direita portuguesa, ficando
à mostra a sua verdadeira dimensão.
Em segundo lugar, saiu derrotada a bazófia de utilizadores das redes
sociais, (tão caladinhos agora) que pensavam que bastava destilar ódio, intolerância
e demagogia, em doses cavalares, para conseguir mobilizar os portugueses.
Em terceiro lugar saíram derrotados os que andavam a apregoar a
decadência da mobilização sindical, acreditando que bastava gritar contra tudo
e contra todos para conseguir mobilizar manifestantes.
Em quarto lugar saiu derrotada a comunicação social, sempre tão pronta
a desvalorizar reivindicações sindicais, profissionais e sociais, mobilizando
desta vez grande parte do seu espaço para amplificar uma manifestação de dimensões
ridiculas, mostrando-se quase tão desesperada com o resultado da manifestação
como os próprios promotores.
Mas sairão igualmente derrotados, a prazo, aqueles que, perante o
fracasso desta manifestação, pensam que tal desaire significa que muitas das
reivindicações e protestos, usados de forma demagógica e oportunista pelos
promotores, não têm um fundamento de verdade.
A democracia ganhou esta batalha contra a demagogia, mas tem muitas
outras batalhas pela frente.
A democracia é frágil e, se quer sobreviver, tem de combater eficazmente
as desigualdades, a corrupção, a pobreza e todo o tipo de injustiças sociais,
ou a demagogia ganhará espaço para voltar com mais força.
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sexta-feira, 21 de dezembro de 2018
quinta-feira, 20 de dezembro de 2018
“Portugal Grande de Novo”??
Este é o título do manifesto de convocação da manifestação “apartidária”
que está prevista para esta 6ª feira:
A primeira pergunta a colocar é…, para além do título cheirar a “trumpismo”
ou “bolsonarismo”, sem esquecer a sua origem numa frase dos nacionalismos
fascistas dos anos 30, quando é que Portugal
foi “grande”? A época dos descobrimentos já lá vai e as razões pelas quais
Portugal foi pioneiro (tese também discutível) estão mais que escrutinadas nas
mais variadas teses históricas. Depois disso, só se estiverem a pensar na
propaganda colonial do Estado Novo, um mítico Portugal “do Minho a Timor”!!
Para disfarçar a origem da convocação dessa “manifestação silenciosa” (
mas que desta vez pretende ser ruidosa, cortando estradas e vias de acesso
num dia de trabalho…), usam depois um conjunto de reivindicações que qualquer pessoa pode subscrever, mas que são contraditórias entre si.
Propõem, justamente, o aumento do salário mínimo para 700 euros e das
pensões mínimas para os 500 euros, cortando as pensões para ( primeira
contradição) ora 2 mil, ora 5 mil euros. (provavelmente algum
dos proponentes assustou-se com a própria proposta e lançou a confusão…). Mas,
porquê 700 ou 500? Com base em que critério? Pela nossa parte já aqui
demonstrámos várias vezes que não devia haver salários abaixo do 800 euros, que
podiam ser acima de mil euros se não se tivesse negociado tão mal a adesão ao
euro, um euro que veio a acentuar as desigualdades na Europa, mas para cuja manutenção se
exige o cumprimento de regras a uns (os países do sul) e se fecha os olhos a
outros (França e Alemanha)…mas isto é outra história!
Propõe, por outro lado, uma atabalhoado conjunto de medidas sociais
(para além do aumento das pensões mínimas), como a reforma do SNS e, por outro, contraditoriamente,
a baixa dos impostos!!
Mas não um imposto qualquer: o IVA e o IRC. É revelador
do tipo de interesses económicos que podem estar por detrás desta
manifestação!.
Também é revelador que, quando falam na justa redução da taxa de
electricidade, estraguem tudo quando especificam a taxa sobre emissão de
dióxido de carbono! Então os manifestantes são daqueles que acham que não existem alterações
climatéricas, não sendo, por isso, necessário tomar medidas para as combater, como a contenção no
consumo energético?
E podíamos ir por aí fora!
Para quem duvida que a origem da convocatória parte de grupos de
extrema-direita, basta consultar o histórico do conteúdo da maior parte dos
site e das páginas dos promotores mais activos dessa manifestação.
Historicamente o populismo de extrema direita sempre se caracterizou
por uma propaganda contraditória, misturando justas reivindicações sociais, a
denuncia, politicamente selectiva, da corrupção politico-partidária que mina as
democracias, embrulhado numa mítica retórica nacionalista.
Claro que toda a gente tem direito de manifestação, nem este é um
direito exclusivo da esquerda, e que existem muitos e bons motivos de
descontentamento popular.
Mas esta não é um manifestação normal, convocada com hora e local, para
desfilar ordeiramente pelas ruas do país.
Ela apela de imediato para o corte de estradas e vias, atitude que,
apesar do hipócrito apelo que fazem à “não violência”, só se pode concretizar
com violência, violência essa que está no gene dos mais entusiastas apoiantes e
organizadores dessa manifestação (basta consultar o histórico das páginas dessa
gente nas redes sociais).
Partindo de pretextos justos, estamos perante um demagógico aproveitamento politico de forças anti-democráticas.
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quarta-feira, 19 de dezembro de 2018
“Crescimento”
É a palavra mais usada por políticos e economistas.
É de tal modo uma palavra “mágica” que existe um exército de técnicos e
de instituições só para o estudar e o prever.
Interrogo-me muitas vezes se “crescer” em termos económicos e em
quantidade é mesmo o grande objectivo civilizacional da humanidade, uma
justificação para um desordenado crescimento do consumo que alimenta a máquina
“capitalista”, onde somos alegremente triturados.
Pergunto-me também se é possível continuar a “crescer” sem destruir
definitivamente, não só os equilíbrios sociais, como, e principalmente, o
ambiente e a natureza.
Para mim “crescer” pode ser aceitável se tiver como objectivo melhorar
a nossa saúde, a nossa educação, a nossa compreensão dos outros e do mundo, a
nossa cultura e o nosso conhecimento, combater as desigualdades, melhorar as
nossas condições de vida e, principalmente, acentuar o urgente e necessário
equilíbrio entre nós e o ambiente natural que nos rodeia.
Ora, não me parece que seja isso que está na base do uso conceito de
“crescimento” saído da boca e da pena de economistas, políticos e comentadores
, conceito usado apenas para defender os apelos cada vez mais selvagens ao
consumo desenfreado (tão comum nesta descaracterizada época “natalícia”), para
o saque descontrolado de recursos naturais, e para acentuar desigualdades
socias, desrespeito todas as formas de vida humana ou animal que não se
enquadrem no modelo económico neoliberal.
E assim, em contínuo “crescimento” cá vamos alegremente caminhando e
consumindo para o abismo ambiental e
civilizacional...
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terça-feira, 18 de dezembro de 2018
As “previsões” do Banco de Portugal…e outras!
O mundo económico e financeiro vive hoje de previsões.
Ditas “científicas”, é com base nessas previsões que se tomam decisões
de gestão e programação.
Até qui, nada a reparar, a não ser que, verdade de La Palice, previsões
são previsões e um bom gestor ou um bom economista, servindo-se delas, não as
encara como uma verdade absoluta e tem em consideração a sua própria
experiência e uma dose de perspicácia e bom senso.
O problema é quando essas “previsões” servem de desculpa para tomada de
decisões politicas de efeito estrutural ou como arma de arremesso de propaganda
politica e ideológica, que é o que se vê, cada vez mais, por essa Europa fora,
com os resultados conhecidos.
E aqui entram os “comentadeiros” do costume, sempre cheios de certezas,
ainda maiores se servidas por bem elaborados gráficos estatísticos com base nas
ditas “previsões” de instituições “credíveis”.
Sempre ouvi dizer que uma estatística “bem torturada” dá sempre o
resultado que pretendemos.
Não deixa de ser curioso que a maior parte de tão “credíveis” instituições
não conseguiram prever a crise financeira de 2008 nem, por cá, a situação da
banca portuguesa que levou à falência fraudulenta de alguns desses bancos e à
intervenção “salvadora” nos que sobreviveram, à`custa do bem estra de todos os
cidadãos.
E, porque uma previsão é…uma previsão, ainda menos se entende o
desvarios dos “comentadeiros” quando o Banco de Portugal faz uma previsão
diferente da do governo em….2 décimas!!!!
Uma previsão, porque é uma previsão, tem sempre uma margem de erro.
Uma coisa é falarmos numa diferença de um ou dois dígitos…outra é falar
em diferença de décimos ou milésimos.
E outra coisa é falarmos em “previsões”, outra de dados reais e
definitivos.
É como aqueles “comentadeiros”
em noite eleitoral que, principalmente quando isso lhes convém ideológica e
politicamente, passam a noite a comentar sondagens à boca das urnas, mesmo
quando já se começam a conhecer resultados reais e definitivos, que muitas vezes desmentem ou se
afastam significativamente do resultado de tais sondagens…
Penso que, assim como se paga, e bem, a instituições para fazer
previsões financeiras e económicas, se devia penalizar fortemente essas instituições
pelos erros de previsão, pelo menos quando esses erros justificam medidas
politico/ideológicas que têm repercussão negativa na vida das pessoas.
Também devia existir uma entidade independente que comparasse as
previsões feitas por essas instituições com os resultados reais,
classificando-as de acordo com a sua credibilidade.
Talvez, assim, as “previsões” deixassem de ser arma de arremesso ideológico
ou politico e fossem, na sua maioria, encaradas como a quilo que muitas vezes
são, simples actos de …bruxaria!
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segunda-feira, 17 de dezembro de 2018
4 Heróis... e um bandido
Portugal está cheio de heróis anónimos de quem só se fala em caso de
desgraça.
Foi o que aconteceu com a equipa do INEM que encontrou um fim trágico
este fim-de-semana.
Dois pilotos, um médico e uma enfermeira, depois de salvarem mais uma
vida, encontraram a morte num voo em condições climatéricas muito adversas ao
chocarem contra um poste encoberto pelo nevoeiro.
Todas as palavras são poucas para enaltecer o trabalho de tantos homens
e mulheres que todos os dias arriscam as vidas, em terra, no ar e no mar, para
salvar tantas vidas.
Essa gente merece todo o nosso respeito e, numa tragédia como aquela, que
atingiu quatro desse heróis, era importante palavras ainda mais respeitosas.
Infelizmente, a unanimidade dessas palavras de agradecimento e pesar e
a contenção merecida por respeito para com as vítimas foi mais uma vez rompida pelo oportunismo
execrável de um canalha que dá pelo nome
de Marta Soares.
As suspeições lançadas por tão abominável oportunista devem ser rapidamente
desmascaradas por um rápido e transparente relatório sobre o acidente.
Por aquilo que se sabe até agora, o acidente foi provocado pelas más
condições atmosféricas e de visibilidade, e a sequência dos contactos para se
iniciar as buscas obedecem aos critérios em vigor na aeronáutica.
Mas mesmo que o socorro fosse rápido, já não havia nada a fazer perante
a violência do acidente.
Quanto muito, a haver falhas de comunicação, talvez tenham sido
provocadas pelo boicote levado a cabo pela Liga de Bombeiros dirigida por
aquela execrável criatura, daí talvez a pressa com que veio para a comunicação
social a lançar bitaites sobre a tragédia, eventualmente para disfarçar uma
eventual responsabilidade que aquele boicote teve no atraso ao socorro!!???
É uma vergonha o oportunismo serôdio de tão infame personagem, uma
vergonha até para os digno e respeitáveis profissionais que ele diz
representar.
Espero que os bombeiros, que merecem o máximo respeito de todos os
portugueses, se libertem rapidamente de tão infame “representante”.
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sexta-feira, 14 de dezembro de 2018
terça-feira, 11 de dezembro de 2018
A “Mensagem” de Macron (com o aval da UE): “Querem redução de impostos e aumento de ordenado? Partam montras e incendeiem carros”!!!
O “populista” do
“centro”, Macron, deu ontem uma machadada final no que restava da sua
credibilidade ao anunciar subidas de salários na ordem dos…cem euros!
Recordo aqui o
“escândalo” que foi (e ainda é), no seio de toda a burocracia de Bruxelas e no
pessoal do sector financeiro europeu, e entre comentadores de serviço, quando
em Portugal o governo anunciou um misero aumento num misero salário mínimo, que
ronda agora os 600 euros.
Em França, um país
que tem a mesma moeda que Portugal e que está sujeita às mesmas “obrigações”
impostas por Bruxelas, o “populista do centro” Macron, ao “estilo Maduro”,
anuncia uma subida de 100 euros no salário mínimo (que por lá ronda uns
1 400 euros) e as anteriormente virgens ofendidas de Bruxelas mantêm-se em
total silêncio.
Além disso, todas as
medidas anunciadas por Macron, e que vão ser financiada pelo Estado francês,
vão fazer disparar o deficit e a dívida francesa para níveis que vão ultrapassar
as imposições do PEC.
A credibilidade de
Bruxelas fica assim, igualmente posto em causa.
Com que autoridade
podem agora exigir cumprimento de deficits a países com salários, pensões e direitos
miseráveis como em Portugal, face às promessas de Macron?
Poro outro lado, com
que credibilidade se podem manifestar contra o orçamento italianos, se se
mantiverem em silêncio face ao anuncio de Macron?
A mensagem de Macron,
com o aval do silêncio das instituições financeiras da União Europeia , só quer
dizer uma coisa: quando os cidadãos europeus quiserem salários justos, pensões
acima do miserável e manter direitos “devem ir para a rua partir montras e
queimar carros”, pois só assim é que os burocratas de Bruxelas aceitam aumentar
o deficit e a dívida.
Afinal, ao que
parece, para salvar “amigos” é possível desrespeitar o deficit e até há
dinheiro para aumentar salários e pensões, ao mesmo tempo que se baixam
impostos!
É caso para dizer: “Força
Itália”!
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segunda-feira, 10 de dezembro de 2018
70º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos
Passam hoje 70 anos sobre a aprovação da Declaração Universal dos
Direitos Humanos.
Num mundo cada vez mais dominado por mensagens de ódio e intolerância e
por uma economia predadora do homem e da natureza, é importante recordar a
existência dum documento como esse, hoje mais actual do que nunca.
O documento surgiu como tentativa de responder a um novo paradigma de
convivência humana, depois de terminado um período de guerras devastadoras e de
genocídios que puseram em causa principio civilizacionais.
Esse documento esteve igualmente na base da construção da ONU.
Infelizmente em muitos casos a sua aprovação não passou de pura
retórica.
São raros, ainda hoje, os países onde se aplica a totalidade desses princípios.
Alguns aplicam apenas as partes que lhe convém, esquecendo tudo o
resto.
Esse documento alia princípios básicos e históricos de Direitos Humanos
(Igualdade, democracia e liberdade) com Direitos Sociais (como o direito ao
trabalho e a um salário justo, por exemplo, ou o direito à saúde, à educação e
à habitação).
A actualidade desse documento, que devia ser ensinado nas escolas e
integrado nas Constituições de países democráticos (como, aliás, acontece na
Constituição Portuguesa), reside, por um lado em serem ainda raros os casos em
que é aplicada na integra e de forma
consequente e, por outro, no de vivermos um período histórico em que as
lideranças das nações mais poderosas estão entregues a gente que desrespeita
todos os dias os princípios consignados nesse documento.
Existe, aliás, um crescente movimento que defende a revisão desse documento,
que, pesem as boas intenções de alguns, só pode resultar na redução e no
desvirtuar dos seus principio, principalmente quando temos na liderança de
países que dominam o conselho de segurança da ONU uma maioria de lideres que
não oferecem qualquer garantia na preservação e concretização daqueles
direitos.
Além disso, as actuais lideranças mundiais estão sobre forte pressão de
sectores financeiros que desprezam os valores democráticos, de liberdade e os direitos
sociais, sempre que isso põe em causa os seus interesses, como se viu durante a
crise de 2008 (o célebre TINA).
Não tenhamos dúvida que qualquer revisão que saísse das mãos dessa
gente ia no sentido de limitar os valores democráticos, a liberdade e os
direitos sociais.
Sendo aquele um documento de valor universal, a melhor forma de o celebrar é, em primeiro lugar conhecê-lo e estudá-lo e, em
segundo, defendê-lo face a esses lobbies que o procuram desvirtuar e apaga-lo
da memória colectiva.
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sexta-feira, 7 de dezembro de 2018
Ecologia, transportes, Macron e ..."cavaquismo"!
Aparentemente, nada
tem a haver com nada e tudo tem a haver com tudo!
Mas, hoje em França,
Ecologia, Transportes e Macron tem tudo a haver com tudo!
Vamos por partes:
Em 1976 foi editado
em Portugal o livro “Ecologia e politica” de Michel Bosquet, hoje considerado precursor na
defesa da ecologia.
O que retive da
leitura desse livro, mais ou menos por essa altura, foi a sua denuncia do papel
das grandes empresas petrolíferas no agravamento das condições de vida das
populações, quer nos territórios de onde o ouro negro era extraído, principalmente
no Médio Oriente, quer no agravamento das condições ambientais a nível global,
pela promoção do transporte automóvel movido com derivados do petróleo.
Já então, os piores
conflitos mundiais e as piores situações de miséria estavam associadas aos
interesses financeiro e económicos ligados ao petróleo e ao sector energético.
Infelizmente, o tempo
mostrou que, por um lado Bosquet tinha razão, por outros toda a geração de políticos
que governaram o mundo nas décadas seguintes pouco se preocupou com a questão,
ou revelou apenas uma preocupação retórica.
O neoliberalismo, que
se tornou dominante como prática e pensamento económico a partir dos anos 80,
agravou a situação, gerando a ilusão de um capitalismo popular, com convite a que
se usufruísse do transporte individual em detrimento do transporte público.
Quem não caiu nessa
armadilha que atire a primeira pedra.
Hoje, quando já
começa a ser tarde para alterar o desastre ambiental para onde caminhamos, a
situação agrava-se, com o mundo governado por políticos cada vez mais
incompetentes e com a chegada ao poder, nos países decisivos para o ambiente,
de ignorantes e arrogantes que põem em causa, não só o que os cientistas dizem
sobre o clima, como o que os cidadãos já começam a percepcionar, no seu dia a
dia, sobre o agravamento das condições de sobrevivência.
Em Portugal, o
paradigma desse capitalismo popular, que levou os cidadãos a investir nos transportes
privados em detrimento dos transportes público foi o chamado “cavaquismo”, que
contaminou toda a população e toda a classe politica, promovendo a idéia de um
enriquecimento rápido, à custa dos fundos europeus e da corrupção politica
generalizada, à custa de grandes obras públicas que promoviam o uso do
automóvel em detrimento do comboio e do transporte público.
Aliás, promoveu-se
igualmente a idéia que o transporte público e o comboio era coisa de gente
pobre e atrasada, de gente que não tinha aproveitado as “oportunidades” e que
não era “competitiva” ou “empreendedora” e o uso do automóvel passou a ser uma
questão de estatuto social e exibição.
Com isso agravaram-se
as contas públicas, com a importação em massa de automóveis (beneficiando
alemães e franceses) e com o aumento da
nossa dependência energética face aos grandes interesse petrolíferos que
geraram esquemas de corrupção politica em larga escala, com ligações suspeitas
a grupos angolanos, brasileiros e venezuelanos, situação ainda hoje mal
esclarecida.
Hoje percebe-se que
destruir, não só o sector produtivo nacional em nome dos fundos europeus e dos
interesses financeiros dos países que dominam a Europa (França e Alemanha), mas
também todo o sector de transportes públicos, em especial o ferroviário, foi um
erro catastrófico, quer do ponto de vista ambiental, quer do ponto de vista
financeiro, que vamos pagar durante décadas.
A aposta nos
transportes públicos, mais eficientes do ponto de vista energético, ambiental, económico e em rapidez, é a única com futuro na Europa.
Alguns países já
perceberam isso e investiram em força no TGV e nas energias alternativas para o
transporte automóvel.
Anuncia-se, por
exemplo, que o Luxemburgo vai tornar gratuito o transporte público.
Infelizmente, as
medidas radicais na área dos transportes que são necessárias tomar para travar
o desastre ambiental, pecam por tardias e por falta de alternativas credíveis.
Depois de décadas a
empurrar os cidadãos para o uso do transporte individual, agora é difícil convencer
esses mesmos cidadãos a mudar de rumo.
Para os convencer era
necessário tomar as decisões há muito tempo adiadas, como a radical substituição
da gasolina e do gasóleo por energias limpas, situação que é tecnicamente
viável, mas que tem sido travada pelos grandes interesses da industria
automóvel e, principalmente, da industria petrolífera, ou a criação de uma rede
de transportes públicos viáveis, capaz até de concorrer com o transporte aeronáutico.
Foi isso que,
atabalhoadamente, Macron tentou fazer em França, aumentando os impostos sobre o
gasóleo e o uso do automóvel, mas esquecendo-se de antes, por um lado criar
alternativas viáveis, como, por exemplo, a que vai ser seguida no Luxemburgo, e,
por outro lado, saber fazer pedagogia em defesa do ambiente.
Ao lançar um fósforo
( o aumento do imposto sobre o gasóleo) sobre a “gasolina” ( o descontentamento
crescente pelas suas medidas antissociais para agradar ao sector financeiro que
domina em Bruxelas) Macron, não só comprometeu o seu futuro politico ( e provavelmente
o da Europa), como “queimou” uma medida justa, que é a de limitar o uso do
transporte privado e dos derivados do petróleo.
Aliás, Macron só
cedeu naquilo em que não podia ceder, o imposto sobre energias poluentes, e com
isso já perdeu.
Os políticos e o
sector financeiro podem adiar decisões urgentes, mas o ambiente não vai
esperar.
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quarta-feira, 5 de dezembro de 2018
A extrema-direita à nossa porta.
A Andaluzia é uma das regiões espanholas que partilha uma grande parte
da nossa fronteira com a Espanha e é uma das regiões que, a par da Galiza, mais
contactos mantém com Portugal.
A população dessa província espanhola , 8 milhões de habitantes, é
quase tanta como a totalidade da população portuguesa e elegeu um número inédito
de deputados da extrema-direita, do partido Vox, para o parlamento local, dando
assim um forte incentivo ao crescimento nacional desse partido, recém criado, e
que dá voz à extrema direita espanhola, até agora muito marginal ou dissolvida
no PP.
Para os comentadores que, até há pouco tempo, juravam a pés juntos que
a Península Ibérica não seria contaminada pelo fenómeno do populismo da extrema-direita,
argumentando como justificação para isso a vacina dos povos ibéricos contra essa
mesma extrema direita, por causa de se terem livrado recentemente de duas
ditaduras dessa área política, o resultado do Vox destruiu esse argumento.
O crescimento da extrema direita por cá só espanta quem anda mal
informado e afastado das “massas”.
Basta ouvir as conversas de rua e ler os comentários das redes sociais
para se perceber que o caminho está aberto para o aparecimento de um qualquer “salvador”
e populista da extrema-direita.
Em Espanha foi o descalabro do PSOE e do PP que muito contribuíram para
o “fenómeno”.
Na Andaluzia os socialistas, que dominavam a região há 36 anos,
apesar de ganharem as eleições, perderam centenas de milhares de votos,
principalmente par a abstenção, e não têm maioria para governar, face à soma
dos partidos da direita (“Cidadanos”, PP e Vox), estando o caminho aberto para
uma “geringonça” de direita, com o Vox a crescer em protagonismo e a lançar-se
para um bom resultado a nível nacional já nas eleições para o parlamento europeu.
O PSOE da Andaluzia representa o que há de mais corrupto nesse partido
e apresentaram uma candidata que é uma espécie de equivalente local de José
Sócrates!
Por sua vez a facção liderada pela candidata local, a principal
adversária interna de Pedro Sanchez, representa a tendência socialista que, um
pouco por toda a Europa, abdicou dos seus princípios para se render ao poder
financeiro e ao neoliberalismo, com o resultado que todos conhecemos.
Fartos dessa gente, os eleitores da Andaluzia quiseram varrer o PSOE,
dando assim aval ao crescimento do extrema-direita.
Mas também o PP e o “Cidadanos” saíram derrotados da contenda, o
primeiro deixando fugir grande parte do seu eleitorado para a extrema-direita.
O Vox tem, aliás, origem numa cisão do próprio PP, que deixou cair a máscara
democrática, mostrando que a origem do próprio PP enraíza na falange franquista.
O “Cidadanos” que nunca se demarcou do próprio PP, mostrando que não
passa de um PP.2, ficou também muito aquém do seu objectivo, que era o de
ultrapassar o PP, começando provavelmente aqui o esvaziamento de um projecto “cheio
de nada”!
Claro que o Vox ficou longe dos três mais votados, mas o simples facto
de conquistar 12 lugares no parlamento andaluz vai dar-lhe uma visibilidade
nacional que o irá catapultar para outros voos.
A corrupção que tem minado os regimes democráticos, devido à rendição
dos partidos históricos aos mais obscuros interesses financeiros, a forma como
a União Europeia lidou com a crise financeira, lançando no desespero milhões de cidadãos só para salvar esse mesmo sector financeiros e os “mercados”, e o
grave problema da emigração, despoletado pela forma como o ocidente lidou com
África e o Médio Oriente nas últimas décadas, contribuindo para a miséria do
continente negro e as guerras no mundo de maioria muçulmana, contribuíram para acordar
o monstro adormecido que era até há pouco tempo o populismo de extrema-direita.
Portugal passa a ser um caso isolado, até na Península Ibérica, mas o vírus
que já anda à solta nas redes sociais, não demorará muito a espalhar-se pela
frágil democracia portuguesa.
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terça-feira, 4 de dezembro de 2018
"Coletes Amarelos" em cartoon
BêDêZine: "Coletes Amarelos" em cartoon (clicar para ver):
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segunda-feira, 3 de dezembro de 2018
Nem Macron, nem Le Pen…nem, muito menos, os mais extremistas “coletes amarelos”!
Costuma-se dizer que é nas
curvas apertadas que se destacam os bons condutores.
Frase que se pode aplicar aos políticos: é nas curvas apertadas da
história que se revelam os grandes políticos.
Existem alguns grandes exemplos: Churchill na 2ª Guerra, De Gaulle no
Maio de 68, Mandela na África do Sul, ou Gorbachev na União Soviética…e não me
lembro de muitos mais.
Infelizmente para a França, e a prazo para a Europa, Macron revelou-se
um politico incapaz de enfrentar os graves conflitos sociais que o seu país
enfrenta.
Ao querer tornar-se o menino bonito da Europa da austeridade, dominada
pelo poder financeiro, sonhando substituir Merkel como líder do projecto
europeu, revelou-se, pela forma como tem lidado com os “coletes amarelos”, um
politico medíocre e incapaz, uma ténue sombra da líder alemã.
Macron domina na retórica, mas revelou-se incapaz de perceber que a França
vive, há décadas, uma grave crise social e de identidade, que explodiu agora em
violência com base numa reivindicação quanto a nós injusta: contestar o aumento
de impostos sobre o uso do gasóleo (quando outros países, com a Alemanha, anunciaram
a proibição, a prazo, do uso desse combustível, uma das formas de travar o
desastre ambiental para onde caminhamos a passos largos).
Essa reivindicação é injusta, mas Macron mostrou-se incapaz de explicar
a necessidade de travar o uso do gasóleo e até, a prazo do automóvel a gasolina
e, em vez de se revelar um politico hábil, regou o fogo com gasolina, e o
resultado, lamentável, está à vista.
Não percebeu que, por detrás do pretexto do aumento de impostos sobre o
gasóleo, está uma realidade social cada vez mais perigosa.
Os próprios “coletes amarelos” conseguiram aproveitar o destaque dado
ao seu movimento para juntar 41 reivindicações, todas de grande justiça do
ponto de vista social, mas Macron não respondeu a uma única delas, mantendo-se
fiel ao programa “austeritário” e anti social com o qual pretende agradar aos
burocratas de Bruxelas e ao corrupto mundo financeiro europeu.
Rapidamente o moribundo movimento de Le Pen encontrou neste movimento o
colete de salvação e colou-se à revolta, como se alguma vez, chegada ao poder,
pudesse garantir as 42 reivindicações dos “coletes amarelos” (hoje reveladas no
jornal “Público”) todas elas contrárias aos princípios e ideologia da
extrema-direita francesa.
Por isso não será de estranhar que, por detrás da violência vivida
Sábado em Paris, estivessem conhecidos elementos da extrema-direita, dando
assim um grande contributo para desviar as atenções para as legitimas
reivindicações dos “coletes amarelos”, colando-os à violência gratuita habitual
nas manifestações, em França, da extrema-direita, que contaram com o apoio
irresponsável de grupúsculos de extrema-esquerda, para permitir a Macron
aparecer como o equilibrista, que afinal não é.
Deixando-se infiltrar por provocadores extremistas, o justo movimento
dos “coletes amarelos” corre o risco de se descredibilizar junto da opinião
pública e de reforçar o discurso de “ordem” da extrema-direita.
As próximas manifestações dos “coletes amarelos” terão de ser uma
esmagadora manifestação cívica, isolando os provocadores. Caso contrário ficam
à mercê da estratégia da extrema-direita francesa e contribuem para reforçar
Macron na aplicação das medidas antissociais que ele preconiza, conduzindo a
França, e a prazo o que resta do “europeísmo”, para um abismo sem saída.
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sexta-feira, 30 de novembro de 2018
Eu e os impostos.
Parece que caiu “o Carmo e a Trindade” com a notícia do “Expresso”
segundo a qual a ”carga fiscal em Portugal é mais baixa que na zona euro”, até
porque desmonta o argumentário das fake news em circulação nas redes sociais
Claro que as contas contabilizam o total de impostos e cotizações
sociais. Se formos ao pormenor vemos que o IVA que se paga em Portugal é
superior à média.
Pessoalmente, por principio, não tenho nenhum problema em pagar
impostos.
Até não me importava de pagar mais se soubesse que os impostos eram
aplicados no combate às desigualdades sociais, na garantia de um sistema justo
de segurança social e na manutenção de serviços de qualidade na educação, na saúde,
nos transportes, na justiça, no apoio ao
património e à cultura e na gestão ambiental.
Ou seja, pagava de bom grado os impostos pagos nos países nórdicos e
outros para ter os serviços desses países.
Para mim, contudo, o problema reside em saber como são cobrados e
utilizados esses impostos.
Fugir aos impostos e usar outros estratagemas, como o recurso a
subvenções estatais ou registos em paraísos fiscais é um crime que deve ser
combatido e travado.
Usar o dinheiro dos impostos para salvar bancos e grandes empresas, que
continuam a pagar chorudos salários aos seus administradores e lucros aos seus
accionistas, é outro crime contra os contribuintes.
Aplicar os impostos para garantir privilégios, pensões chorudas e salários
de luxo a administradores de empresas estatais, a assessores, a cargos de
nomeação politica e a escritórios de advogados é outra prática que deve ser
travada e, no mínimo, devidamente explicada.
Só aceito que os impostos que me cobram sejam aplicados para cumprir as
obrigações constitucionais de um ensino, uma justiça, uma saúde, uma rede de
transportes de qualidade e uma gestão ambiental e patrimonial adequada, e os direitos
de soberania, culturais e sociais de forma racional.
Também não me choca, por exemplo, o aumento de impostos sobre bens que
provoquem problemas de saúde pública ou que aumentem a poluição ambiental, como
forma de fomentar a procura de soluções alternativas, que, estas sim, devem ser
apoiadas pelo Estado, isto é, pelo dinheiro dos contribuintes, até se tornarem
rentáveis ( como, por exemplo, a substituição da gasolina e do gasóleo pela
energia eléctrica ou outra menos poluente), já que, nos nossos dias, as
questões ambientais carecem de soluções urgentes e são questões de
sobrevivência civilizacional.
Claro que, na visão neoliberal, há quem ache que os impostos se devem
reduzir ao mínimo e que cada um se deve salvar com puder, vigorando a lei do
mais forte ou capacitado, substituindo o apoio social pela caridade e os
direitos pela lei da selva.
É uma opinião .Mas não é a minha.
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segunda-feira, 26 de novembro de 2018
Morreu Bernardo Bertolucci, para quem o tempo não existia
Numa entrevista concedida para ao “Expresso” à jornalista Cristina
Margato, Bertolucci despediu-se com uma frase enigmática: “o tempo não existe”.
Para cineastas como Bertolucci o tempo, de facto não existe, pois o
cinema, o grande cinema, é mesmo o melhor meio para eternizar o tempo, onde a
vida dos actores, as paisagens, os espaços, se tornam eternos.
É essa, talvez, a grande magia do cinema, até aos nossos dias a única
máquina do tempo que nos leva a viajar por todas as épocas e espaços.
Bertolucci, ontem falecido aos 77 anos, em Roma, no país onde nasceu em
16 de Março de 1940, era um desses mágicos do tempo, do espaço e das épocas.
“1900”, a grande saga em duas partes que realizou, em 1976, sobre a
história da Itália e da Europa da primeira metade do século XX, foi uma dessas
obras que nos levou a viver e sentir uma época de grandes transformações socias
e politicas, através da humanidade das suas personagens.
“1900” tornou-se um filme maldito para a crítica pós-modernista e
neoliberal, pois desmontava muitos dos argumentos e mitos antissociais e revisionistas em que estes movimentos, hoje dominantes na ideologia politica, no discurso
economicista e cultural, se baseiam.
Não me admiraria hoje de ler muitos dos que quiseram desvalorizar esse
filme, por meros preconceitos ideológicos, a escrever loas a essa obra.
Mas essa não foi a única grande obra do cineasta, nem a única a abordar
a temporalidade histórica, não podendo deixar de recordar “O Último Imperador”(1989),
um dos filmes que até hoje recebeu mais óscares, uma grande saga sobre o fim da
China imperial e o inicio da sua caminhada para se tornar a potência dos nossos
dias.
Bertolucci começou como assistente de Pasolini e estreou-se com uma
obra pouco conhecida, “La Commare Secca”, realizado em 1962.
Em Itália foi mensageiro de “Nouvelle Vague”, embora seguindo um
percurso original, e a consagração
chegou com “Antes da Revolução”, realizado em 1964 e, principalmente, “A
Estratégia da Aranha” de 1970, o mesmo ano do “Conformista”.
Os seus filmes procuram sempre explorar o lado humanos dos personagens,
sem nunca esquecer o enquadramento histórico das suas atitudes, sendo este um
dos lados mais característicos da obra do realizador italiano, que continuou a
sua actividade nos Estados Unidos, seguindo o caminho de outros grandes
cineastas italianos da sua geração, como Copolla, Scorsese e Sergio Leone.
Para este último escreveu o argumento daquele que é até hoje um dos
melhores “Western’s” de sempre, “Aconteceu no Oeste”.
A poesia, na humanidade dos personagens e na forma como filmava os
grandes espaços, foi uma característica que herdou da sua juventude, onde,
antes do cinema, quis ser poeta.
E se há filme que representa o lado poético da sua obra é esse
magnifico “Um Chá no Deserto”, de 1990, para além do anterior “La Luna” de
1979, obra um pouco esquecida.
O erotismo esteve, igualmente, presente em toda a sua obra, com
destaque para o mais polémico dos seus filmes, “O Último Tango em Paris”, filme
que perseguiu o cineasta ao longo da sua vida, nunca tendo ultrapassado a forma
como Maria Schneider ficou marcada por essa obra, erotismo que marcou igualmente
um dos seu filme mais recente, passado no ambiente do Maio de 68, “Os
Sonhadores” de 2003.
Em 2012 realizou o seu último filme, “Eu e Tu”, uma viagem aos
fantasmas da adolescência.
A morte de Bertolucci, o cineasta que fazia filmes “para perceber o
mundo, os outros e a mim mesmo”, deixa um grande vazio no panorama
cinematrográfico mundial, mas a sua obra é eterna.
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sexta-feira, 23 de novembro de 2018
quinta-feira, 22 de novembro de 2018
Voltando às touradas.
Já aqui me manifestei sobre o que penso das touradas: um degradante
espectáculo onde se tortura um animal encurralado.
Também já o disse: a desculpa da tradição em defesa desse triste
espectáculo não pega. Por esse ponto de vista, manter-se-iam muitas tradições
que incluem maltratar animais por puro prazer “tradicional” ou, indo ainda mais
longe, muitas “tradições” que maltratam e humilham seres humanos.
Mas, o mais incrível de toda esta questão é o facto de o que está em
causa não é qualquer proibição desse triste e degradante espectáculo, mas
apenas mantê-lo a pagar o IVA de 13%, situação que era aquela que existe até à
aprovação do próximo orçamento, continuando, mesmo assim, a beneficiar de uma
redução de 10% de IVA em relação a muitos produtos e actividades muito mais
importantes e essências do que a manutenção do degradante espectáculo das
touradas.
Ou seja, quando a maior parte das actividades e produtos pagam um IVA
de 23%, as touradas já beneficiam de uma redução de 10%, pagando 13% de IVA e
agora queriam ir à boleia de artes como a musica, a dança, o teatro e o circo e
passarem a pagar IVA de 6%.
Ou seja, não contentes por já beneficiarem de um subsidio indirecto do
Estado, por pagarem menos 10% de IVA do qua aquele que deviam pagar, queriam
ver esse “apoio” aumentar, pagando ainda menos do que muitos de nós pagamos por
bens essenciais.
Se me explicarem onde está a “arte” de torturar animais, talvez até
venha a aceitar tal redução. Caso contrário, “podem” (!!??) continuar a divertir-se a
torturar animais, mas não me atirar areia para os olhos.
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quarta-feira, 21 de novembro de 2018
O Fascismo “nunca existiu”!??...ou existiu “apenas” num país!???...ou “anda ainda por aí”!?? -3º parte
Registámos, em dois posts anteriores, as características históricas do
fascismo e a forma como a investigação histórica dos anos 90 caminhou no
sentido de demonstrar que o fascismo estava morto e enterrado.
Referimos a excepção de Umberto Eco que, remando conta a maré
dominante, explicou num ensaio de 1997, que o fascismo podia ressurgir com
novas roupagens.
Ficámos de explicar quais eram as características, apontadas por
Eco, desse “novo fascismo”, que ele
designa com “Ur-fascismo”.
Depois de analisar o exemplo do fascismo italiano, mostra que o
fascismo não era coerente do ponto de vista ideológica, “não era uma ideologia
monolítica, mas uma colagem de diversas ideias politicas e filosóficas, uma
amalgama de contradições”, ao contrário do nazismo.
Por isso considerava que, se o nazismo não iria reaparecer “como movimento
que envolva uma nação inteira”, pelo contrário o fascismo mantinha condições
para renascer sob novas roupagens.
Escreve Eco que houve “um único nazismo”, mas, em” contrapartida,
“pode-se brincar ao fascismo de muitos modos”, porque o “termo “fascismo”
adapta-se a tudo porque é possível eliminar de um regime fascista um ou vários
aspectos, e poder-se-á reconhecê-lo com fascismo”.
Apesar da confusão e da dificuldade em definir fascismo, é “possível
indicar uma lista de características típicas do que poderei chamar o
“Ur-fascismo” ou o “fascismo eterno”. Estas características não poderão ser
ordenadas num único sistema: muitas contradizem-se reciprocamente, e são
típicas de outras formas de despotismo ou fanatismo. Mas basta que esteja
presente uma delas para fazer coagular uma nebulosa fascista”.
E quais são essas características apresentadas no ensaio de Eco?
Ei-las, de forma resumida:
-1. O culto da tradição, embora seja “mais velho do que o fascismo”;
-2. A rejeição do modernismo e do mundo moderno, que também se pode
referir como “irracionalismo”.
-3. O culto da “acção pela acção”: “A acção é bela em si, e portanto
tem de ser realizada antes de e sem qualquer reflexão. Pensar é uma forma de
castração. Por isso a cultura é
suspeita na medida em que se identifica com comportamentos críticos”, atitude
identificada com o “uso frequente de expressões como “Porcos intelectuais”,
“Convencidos”, “Snobs radiais”, “As Universidade são covis de comunistas”(…).
-4. O desacordo “é traição”.
-5. O Medo da diferença. “O Ur-Fascismo é (…) racista por definição”.
-6. A exploração da “frustração individual ou social” , apelando “às classes médias frustradas , sentindo
mal-estar por qualquer crise económica ou humilhação política, assustadas pela
pressão dos grupos sociais subalternos”.
-7. O nacionalismo, com apelo à xenofobia e que procura inimigos
externos e internos que “conspiram” contra a identidade nacional.
- 8 . A defesa face a um inimigo que humilha o “povo” pela “riqueza ostentada”.
- 9 . A critica ao pacifismo.
- 10 . O elitismo de massas e o “desprezo pelos fracos”. Quem se
identifica com o “chefe” ou com “o partido” é o “melhor povo do mundo” e os que pertencem ao
“movimento” são “os melhores cidadãos”.
- 11 . O culto do “herói”, “todos são educados para se tornarem
heróis”.
- 12 . o “machismo”, que implica o “desprezo pelas mulheres” e a
“condenação” da homossexualidade.
- 13 . O “populismo qualitativo”, ou seja, “os indivíduos enquanto
indivíduos não têm direitos” e é o líder que interpreta a vontade do povo. Já
então Eco avisava que no “nosso futuro perfila-se um populismo qualitativo Tv ou
internet, em que a resposta emotiva de um grupo selecionado de cidadãos
pode ser apresentado e aceita como a “voz do povo”. Devido aos seu populismo
qualitativo, o Ur-Fascismo tem de opor-se aos “putrefactos” governos
parlamentares”. E conclui: “sempre que um politico lança dúvidas sobre a
legitimidade do parlamento por já não representar “a voz do povo”, já podemos
dizer que cheira a Ur-fascismo”.
- 14 . “O Ur-Fascismo fala a “neolíngua””, um termo inventado por
George Orwell par o seu romance “1984”, uma crítica ao stalinismo então
dominante entre os movimentos comunistas, mas que, segundo Eco, tem elementos
comuns “a formas diferentes de ditaduras”, referindo o léxico pobre, de frase
feita, com fins propagandísticos e de doutrinação, que procura alterar o
significado da palavra com o objectivo de “limitar os instrumentos para o
raciocínio complexo e crítico”, avisando para a necessidade de estarmos
preparados “para identificar outras formas de neolíngua, mesmo quando toma a forma
inocente de um talk- show popular”.
Conclui Eco que o “Ur-fascismo ainda pode voltar sob as vestes mais
inocentes . O nosso dever é desmascara-lo e apontar o dedo a cada uma das suas
novas formas –diariamente, em todo o mundo”.
Aquilo que parecia então uma mera divagação intelectual, está hoje mais
actual do que muito.
Muitos dos 14 pontos apontados por Eco estão aí mais do que presentes
no discurso populista de líderes políticos e movimentos de várias vestes e
cores, da Venezuela ao Brasil, da Coreia do Norte à Hungria, da Rússia à
Turquia, das Filipinas à Polónia, da Grã-Bretanha aos Estados Unidos, da França
à Itália….
As redes sociais, que substituem a rua como lugar de manifestação da
violência e do ódio de tipo fascista, estão cheias de um discurso acima
identificado por Eco como o “Ur-fascismo” dos nossos dias :
-o apelo irracional ao ódio contra quem não pensa como nós;
- o discurso saudosista do “antigamente [leia-se por cá, no tempo de
Salazar] é que era bom”;
- a diabolização e ridicularização das ditas questões fracturantes [a
critica à modernidade];
- a disseminação das fake news ( a mentira várias vezes repetida para
se tornar “verdade”);
- a criação de um clima de medo ( exagerando, pela repetição e pelo
destaque, a existência de uma sociedade “dominada pelo crime”);
-a desvalorização do Estado de
Direito, com apelos à judicialização da sociedade, renegando a presunção de
inocência ou fazendo dos tribunais espectáculo, recorrendo à divulgação de
processos em segredo de justiça, conduzindo à defesa de uma justiça popular e a uma justiça feita pelas
próprias mãos, atitude potenciada pelos títulos de tablóides;
- a desvalorização de um pensamento crítico, atacando os
“intelectuais”, o conhecimento cientifico, o papel das universidades “tomadas
pela esquerda”;
- o desprezo pelos fracos, que culpa pela sua fraqueza, “vivendo dos
subsídios”, apenas tolerados com alvo de campanhas de caridade para limpeza de
consciências;
- o nacionalismo exacerbado, cercado de “inimigos” ( os “venezuelanos”,
os “comunistas”, os “islâmicos”, os “terroristas”, os “emigrantes”…);
- a superioridade “democrática” das redes socias, a verdadeira “voz do povo”, como contraponto da
democracia “corrupta” e putrefacta” dos regimes parlamentares e dos políticos;
- etc., etc., etc….
Uma actualização fundamentada do
perigo de um “novo fascismo” está presente na recente obra de Madelene
Albright, “Fascismo um Alerta”.
Historiando a origem histórica do fascismo e mostrando o que este teve
de comum com o comunismo real (na sua versão stalinista) no desdém pela
democracia, encontra diferenças assinaláveis entre as duas ideologias.
Faz igualmente o historial do MacCarthismo e da forma como, durante a
Guerra Fria, os regimes democráticos pactuaram com as mais criminosas
ditaduras, mostrando a forma como, no seio de regimes democráticos sólidos, o
perigo das pulsões fascistas está presente e se pode transformar a democracia
numa “ditadura da democracia”.
Faz um historial recente da presença dessas pulsões fascistas em
regimes actuais, que , mesmo quando de origem ideológica aparentemente
diferente, transportam em si o vírus do fascismo: o recurso à mentira, o
desdém pela liberdade e pela democracia, o carisma do líder, o recurso ou apelo ao
genocídio, o combate à diferença e o nacionalismo exacerbado.
Percorre a história recente do chavismo venezuelano, do regime turco de
Erdogan, da ascensão de Putin, da “democracia iliberal “ de Órban na Hungria, da
liderança omnipresente da dinastia Kim na Coreia do Norte, entre muitas outras
referências a outros regimes “proto fascistas” como o de Sissi no Egipto, o de
Kaczynski na Polónia, o de Zeman na República Checa, o de Duterte nas Filipinas
(só não falando em Bolsonaro porque ainda não era notícia à data da escrita do
livro), chegando à principal preocupação para o seu alerta contra o fascismo, a
situação que se vive nos Estados Unidos com a vitória de Trump.
Claro que nenhum desses regimes é classificado por Albright com “fascista”
( apenas classifica como tal o da Coreia do Norte), mas todos transportam em si
a semente de um novo fascismo, principalmente pela forma como banalizam um
determinado discurso e uma determinada atitude que justifique as pulsões
“fascistas”.
Em muitos desses governos e noutros movimentos de tipo populista por
esse mundo fora, e citando Robert Paxton, da Universidade de Columbia, “ouvimos
ecos de temas fascistas clássicos: medos da decadência e do declínio; afirmação
de uma identidade nacional e cultural; uma ameaça à identidade nacional e à boa
ordem social por parte de estrangeiros não assimiláveis; e a necessidade de
maior autoridade para liderar com esses problemas”( pág.222).
Em comum, Albright encontra nalgumas das atitudes daqueles governos o
caminho para um novo fascismo:
“Rapidamente o Governo que silencia um meio de comunicação acha mais
fácil silenciar um segundo. O parlamento que ilegaliza um partido politico
passa a ter um precedente para banir o seguinte. A maioria que priva
determinada minoria dos seus direitos não para por aí. A força de segurança que
espanca manifestantes e fica impune não hesita em voltar a fazê-lo” (pág.278).
Albright recorda-nos que, como aconteceu ao longo da história, os
fascistas podem chegar ao poder por via eleitoral. Hoje em dia, aliás, não se
atrevem a fazê-lo de outro modo. Geralmente chegados aos poder, vão dando passo
a passo a estocada final na democracia, sendo o primeiro passo minarem “ a autoridade de centros de poder
que compitam com eles, incluindo o Parlamento”.
Deve-se a Albright uma definição simples e concisa do que é um
fascista: “alguém que reclama falar em nome de uma nação ou de um grupo, que
não se preocupa nada com os direitos dos outros e que está disposto a recorrer
à violência e a quaisquer outros meios necessários para alcançar os seus
objectivos” (pág.296).
Albright, que iniciou o seu livro com um conjunto de perguntas feitas
aos seus alunos, cujas respostas esclarecem o que foi o fascismo em termos
históricos, conclui a sua obra reformulando as perguntas, para responder onde
podemos encontrar, nos lideres políticos de hoje, os novo arautos no novo
fascismo:
“Vêm ao encontro dos nosso preconceitos, sugerindo que tratemos as
pessoas de outra etnia, raça, credo ou partido como se não merecessem dignidade
e respeito?
“Querem que alimentemos a ira contra quem acreditamos que nos fez mal,
esfreguemos os ressentimentos até ficarem em carne viva e ponhamos os olhos na
vingança?
“Encorajam-nos a sentirmos desprezo pelas instituições que nos governam
e pelo processo eleitoral?
“Procuram destruir a nossa fé em elementos essências à democracia, como
uma imprensa independente e uma magistratura profissional?
“Exploram os símbolos do patriotismo – a bandeira, o juramento – num esforço
consciente de nos virar uns contra
outros?
“Se forem derrotados nas urnas, aceitam o veredicto ou insistem sem
provas de que foram eles os vencedores?
“Fazem mais do que pedir os nossos votos e gabam-se da sua capacidade
para resolver todos os problemas, acalmar todas as ansiedades e satisfazer
todos os desejos?
“Solicitam os nossos aplausos falando despreocupadamente e com
entusiasmo machista sobre o uso da violência para aniquilar os inimigos?.
“Repetem a atitude de Mussolini: “A multidão não precisa de saber” ,
tudo o que tem a fazer é acreditar e “aceder a ser moldada”?” (pp.304-305).
Quem corresponder à resposta positiva a
estas questões trás consigo e alimenta a semente do novo fascismo.
Como se pode concluir do que nós escrevemos e citámos, não é fácil
definir, nem ontem nem hoje, o que é o fascismo.
Nem o fascismo dos anos 30 é repetível na nossa época.
Mas o desprezo pela democracia, pela liberdade, pelo outro, pela
verdade, pelas instituições sociais e democráticas, pelos direitos humanos e
sociais, é uma carcteristica comum à extrema-direita populista, seja a dos anos
30,seja a actual, mesmo quando, como na Venezuela, se veste de roupagens pseudo-esquerdistas.
Ao mesmo tempo o apelo à violência e ao ódio, físico ou verbal, a
atitudes irracionais, ao que de pior
existe no ser humano, é comum a tudo aquilo que, legitimamente, podemos classificar
de fascismo.
Não vamos ver milícias nas ruas perseguindo judeus, negros, comunistas, socialistas ou democratas (ou será que vamos? Bolsonaro já prometeu algo parecido no Brasil...). Hoje as
redes socias prestam bem esse serviço.
Não vamos ver a destruição total do formalismo democrático, pois podem
bem conciliar o acto eleitoral em sociedades manipuladas por uma comunicação
social controlada pelo poder financeiro e politico (Rússia, Turquia, Hungria...).
Ao contrário dos anos 30, em que economicamente o que era viável aos
poderes que financiaram o fascismo contra o socialismo, a democracia e os
direitos sociais, era a estatização da economia, hoje esses mesmo poderes
apostam no neoliberalismo que lhes permite escapar ao fisco, às regras ambientais,
à legislação e os direitos laborais e ao controle democrático da sua acção pelos parlamentos.
Este “novo fascismo”, ou “ur-fascismo” ou “populismo”, não precisa hoje
de recorrer ao aparato cénico propagandístico
e espectacular dos anos 30. Basta manter-nos alienados, agarrados às redes
socias e aos talk shows.
Ao contrário da esquerda, a extrema direita populista conseguiu
adaptar-se aos novos tempos e renascer das cinzas, voltando a colocar o mundo á
beira do abismo e da barbárie.
Bibliografia:
ALBRIGHT, Madeleine, Fascismo – um alerta, ed. Clube do autor, 2018;
ECO, Umberto, Como reconhecer o fascismo. Da diferença entre migrações
e emigrações, ed. Relógio d’Àgua, 2017 (texto original de 1997, numa tradução
de grande qualidade de José Colaço Barreiros);
PAYNE, Stanley G., El fascismo, Alianza Editorial , Madrid 1996 (1ª
edição em 1980);
PINTO, António Costa, O Salazarismo e o Fascismo Europeu, ed. Estampa;
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