Os dias que rolam, numa visão plural, pessoal e parcial de um mundo em rápida mutação. À esquerda, provocador e politicamente incorrecto, mas aberto à diversidade...as Pedras Rolam...
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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014
quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014
DE QUE SE RI ESTA GENTE? :«Portugal passa a 9.º país mais pobre da UE»
De que ri esta gente?
Tiraram o futuro aos jovens deste país, convidando-os a emigrar ou ao
desemprego e à precaridade.
Perseguem, sem pudor, os velhos reformados, retirando-lhes as poupanças
e descontos de uma vida.
Vingam-se das decisões do tribunal Constitucional infernizando a vida
dos funcionários públicos.
Convidam quem trabalha a salários miseráveis ou ao desemprego de longa
duração, retirando direitos para salvar banqueiros e corruptos.
Arruínam pequenas e médias empresas, destruindo o mercado interno e
perseguindo-as com impostos e regulamentos estranguladores.
Destroem as conquistas de Abril na Educação e na Saúde.
Vergam-se às alarvidades da banca e da troika criminosa.
Talvez se riam das suas próprias afirmações ou da resposta de Passos Coelho à sua própria pergunta: “O país vive pior ou
vive melhor? Vive melhor!” (??????).
Sim há quem viva melhor, basta olhar à nossa volta para os sinais
exteriores de riqueza de alguns…
O país que ”vive melhor” é o dos salários e reformas de luxo daqueles, políticos,
banqueiros, (alguns)professores universitários, economistas, que aparecem todos
os dias a debitar opiniões na imprensa de “referência” ou nas televisões, a
defender as medidas de “ajustamento”, a retirada de direitos a quem trabalha, a
redução de salários, o empobrecimento do país que “vivia acima das suas
possibilidades”, as mesmas em que eles continuam a viver.
O país que “vive melhor” é o país onde aumentam as desigualdades
sociais, onde o desemprego continua escandalosamente alto e cada vez mais de
longa duração, onde as reformas são cada vez mais miseráveis (menos para os ex-
banqueiros,ex-ministros, ex-políticos do centrão e ex-“boys” da administração pública), onde
ganhar salários por um trabalho não é condição para escapar à pobreza.
O país que “vive melhor” é o país que sobe cada vez mais na
classificação dos países mais pobres da União Europeia, que conhece um
dramático declínio demográfico e onde a cultura e a ciência são mero negócio.
O grave é que toda esta política criminosa de “ajustamento” se faça á
sombra de elogios rasgados e alarves de uma Comissão Europeia, de um FMI e de
um BCE, de um Oli Rhen, de um Durão Barroso ou de um Cavaco Silva.
…ou talvez se estejam a rir do cinismo dessa outra proposta do
primeiro-ministro: um “programa para a natalidade”, quando são as mesmas
políticas por si praticadas que agravam a quebra da natalidade…um programa
sério par aumentar a natalidade e rejuvenescer o país implicava fazer
exactamente o contrário das malfeitorias que têm feito ao país e aos
portugueses, nomeadamente aos mais jovens: criar estabilidade profissional,
estancar a emigração dos mais jovens e mais qualificados, melhorar as condições
e os direitos do trabalho, acabar com a precarização do emprego, aumentar o
rendimento salarial…
Afinal, do que se ri essa gente?
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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014
Morreu Paco de Lucia
Paco de Lucia morreu ao 66 anos.
Considerado um dos melhores guitarristas de sempre, é considerado o responsável para renovação do flamengo.
Uma bibliografia detalhada pode ser lida na página do jornal espanhol Público:
Muere a los 66 años el genio de la guitarra Paco de Lucía - Público.es(clicar para ler).
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terça-feira, 25 de fevereiro de 2014
Retrospectiva de Henri Cartier-Bresson no Centro Pompidou (Paris)
Foi inaugurada no passado dia 12 de Fevereiro, no Centro Pompidou emParis, a exposição retrospectiva da obra de Henri Cartier-Bresson.
Revistas como o “Le Nouvel Observateur” ou o “L’Objet d’Arte”
dedicam-lhe duas excelentes edições, que podem ser encontradas nos quiosques
portugueses.
Nascido em 22 de Agosto de 1908, Cartier-Bresson começou por desejar
ser pintor, tendo recebido lições de pintura e participado em exposições.
Ainda nas décadas de 30 e 40 havia realizou alguns documentários
cinematográficos, um sobre os hospitais republicanos durante a Guerra Civil de
Espanha, e outro sobre os prisioneiros da Segunda Guerra.
Mas foi a fotografia que se tornou a sua principal paixão, muito por
causa das suas viagens durante a juventude por vários continentes, para
acompanhar os negócios da família (o seu pai era dono da fábrica de tecidos
CD).
Ao longo dos anos 30 foi consolidando a sua tendência política de
esquerda, a aprofundou a sua opção pela foto-reportagem comprometida, mas à
qual soube dar um cunho pessoal criativo, muito influenciada pela sua ligação
às vanguardas artísticas da época.
Mas foi a sua reportagem sobre a libertação de Paris em 1944,
encomendada pelos serviços secretos militares dos Estados Unidos, que o
tornaram um fotógrafo famoso.
Em 1947 junta-se a outros foto-repórteres que se formaram durante os
anos de guerra e cria a primeira agência fotográfica independente e
cooperativa, a Magnum, ao serviço da qual vai realizar várias reportagens na
Índia, no Paquistão, na China maoista, na Cuba castrista, no Canadá,
tornando-se o primeiro fotógrafo ocidental a entrar na União Soviética depois
da Segunda Guerra.
Colabora nas famosas revistas Vu, Life e Paris-Match.
A partir de 1974 dedica-se cada vez mais ao desenho e à pintura.
A sua maneira de fotografar tornou famosa a frase “instante decisivo”,
como referência ao momento exacto para captar uma foto interessante.
Falecido em vésperas de completar os 96 anos, em 3 de Agosto de 2004,
esta exposição agora disponível no Centro Pompidou recorda a sua obra e pode
ser visitada até ao próximo dia 9 de Junho, seguindo depois para Madrid, onde
será inaugurada em data ainda não anunciada.
sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014
Eduardo Lourenço: "Fomos invadidos por uma espécie de vampiros” (notícia da Agência Lusa):
No dia do "Congresso dos Vampiros" (ou de uma das suas "facções") é reconfortante e estimulante ouvir as palavras de Eduardo Lourenço:
Eduardo Lourenço lamentou que a política já não seja uma
“política real”
“O ensaísta Eduardo Lourenço disse hoje” (dia 20 de Fevereiro) “ que
houve uma invasão por “uma espécie de vampiros”, que são quem controla o
sistema inventado pela modernidade, vivendo-se agora um “apocalipse indireto”
em “estado de guerra permanente”.
“Durante a primeira mesa da 15.ª edição do Correntes d’Escritas, na
Póvoa de Varzim, sob o título “Pensamentos não são correntes de ninguém”,
Eduardo Lourenço disse: “Dá a impressão de que, de repente, fomos invadidos,
não por uns castelhanos arcaicos nossos vizinhos e que são nossos irmãos e
primos, mas por uma espécie de vampiros como aqueles que o cinema de Hollywood
ilustra. Não é por acaso que o tema dos vampiros se tornou um tema da moda, os
vampiros são emissários da morte, é como se estivéssemos a viver uma espécie de
apocalipse indireto”.
“O autor, que disse não acreditar que o tempo desta “espécie de
submissão mansa” vá perdurar, ressalvou não querer contribuir para algo como
uma “depressão de segundo grau, por conta dos outros”.
“Não sei se é um comportamento muito português dormir em cima daquilo
que nos ameaça profundamente e nos põe problemas que não podemos resolver
esperando que, com o tempo, com um pouco de sorte, acabemos por sair desta
espécie de atoleiro em que estamos mergulhados”, acrescentou.
“Os vampiros não são tão vampiros como isso, são pessoas reais. São as
pessoas que controlam o sistema que a modernidade foi inventando pouco a pouco,
com os seus novos meios de produção, que aumentaram efetivamente de maneira
fantástica a possibilidade que os homens têm de aceder a um certo número de
coisas que são importantes”, disse Eduardo Lourenço, já em resposta a questões
do público.
“O autor declarou que a televisão é hoje “o objeto mais importante”,
tendo o “espaço público desaparecido”, o que deu origem a um momento em que
“tudo se passa na televisão, as intervenções dos comentadores na televisão são
mais importantes do que a realidade”.
“Eduardo Lourenço lamentou que a política já não seja uma “política
real”.
“Passámos […] para um tempo em que aparentemente as guerras já não têm
lugar ou são guerras de uma outra espécie, são quase guerras virtuais como se
fossem cinema puro, embora os mortos não sejam cinema nenhum. Passámos para um
tempo em que estamos - não parece à primeira vista - num mundo em estado de
guerra permanente no interior do sistema, não há nenhuma grande produção que
não esteja em guerra com uma outra ao lado”, afirmou o vencedor do prémio
Camões de 1996.
“Eduardo Lourenço disse ainda não pensar nada sobre o futuro, uma vez
que “se pensasse no futuro era o dono do futuro”.
“Assim, o ensaísta, que constatou saber o que é estar “à beira do
abismo” por estar próximo do seu próprio, apelou a que se tenha paciência,
antes de entrar “enfim na terra da promissão".
“A 15.ª edição do festival literário Correntes d’Escritas decorre entre
hoje” (dia 20) “e sábado (amanhã)”.
"*Este artigo foi escrito ao
abrigo do novo acordo ortográfico aplicado pela agência Lusa".
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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014
Ucrânia : Venha o Diabo e escolha...
A violência generalizada que se vive nas ruas de Kiev não abona nada a
favor da oposição ucraniana.
Infiltrada por grupos nacionalistas de extrema-direita, a oposição
ucraniana, ao não se demarcar das atitudes violentas desses grupos, que incluiu,
nas últimas semanas, violência contra judeus, denunciada pela comunidade
judaica local, perde a razão que tinha no início da crise política.
Claro que, do outro lado temos um governo autoritário, corrupto, que
não respeita a vontade da grande parte da população em escapar à influência
russa e de se aproximar dos níveis de vida ocidentais….mas onde é que já vimos
isto?
Se a Rússia, liderada pelo pouco recomendável sr. Putin, joga na crise
ucraniana a sua tentativa de recuperar a influência que detinha nos tempos da
União Soviética, a atitude da União Europeia resvala a pura hipocrisia.
Antes de se preocupar com o autoritarismo do poder ucraniano, a União
Europeia tem muito para se preocupar no seu próprio seio, não sendo muito diferente
aquilo que se passa no governo ucraniano de aquilo que se passa em países do
leste europeu integrados na EU, como é ocaso da Hungria.
Ao incentivar a revolta da oposição ucraniana contra o governo, que
apesar de autoritário e corrupto foi legitimado por eleições livres, os líderes
da UE deviam primeiro explicar como é que se podem substituir à influência económica russa na Ucrânia, quando não conseguem apoia
convenientemente países da própria União em dificuldade, como Portugal,
Espanha, Itália, Grécia, Chipre…
Foi em grande parte a esperança de um apoio concreto por parte da União
Europeia aos seus protestos que incentivou os ucranianos a aumentar os actos de
violência generalizada a que estamos a assistir, apoio esse que irá pouco além
da retórica habitual.
E quanto às malfeitorias de um governo, como o ucraniano, legitimamente eleito, mas tomando decisões
contra o seu próprio povo, pela violência policial contra ao protestos
legítimos, pelo desrespeito em relação ao bem-estar económico-social dos seus
cidadãos, pela violação de promessas e programas eleitorais pelos quais foram
eleitos, tomando todas essas decisões nas costas dos cidadãos, a União Europeia
não tem muita legitimidade para criticar, pois esse tipo de decisões é o pão
nosso de cada dia, como bem o sabem os cidadãos portugueses, irlandeses,
espanhóis, franceses, italianos, gregos e chipriotas, entre outros.
O que está em causa, na crise ucraniana, não é uma luta entre o “bem”
(os pró-europeus) e o “mal” (os pró-russos), mas é mais uma vez o desenterrar
de velhos conflitos e jogos de poder que têm marcado a história do centro da
Europa.
A Ucrânia, na sua história recente, esteve quase sempre do lado errado
da história. Muitos ucranianos participaram no “Holodomor”, o genocídio
stalinista contra os camponeses daquele país na década de 30, através de uma
desastrosa política de colectivização forçada que provocou a morte pela fome de
milhões de ucranianos, ao mesmo tempo que 4/5 das elites ucranianas eram
massacradas por Stalin.
Quando da invasão nazi, em 1941, outros ucranianos, que receberam as
forças hitlerianas com “libertadoras”, colaboraram alegremente com os
nazis na repressão sobre a população de
origem russa e outras minorias, que custou entre 5 a 8 milhões de mortos, entre
os quais meio milhão de judeus.
A memória desses tempos, o peso da influência russa, a maior minoria
que representa quase 20% da sua população e a atitude irresponsável dos dois
lados, Rússia e União Europeia, pode
provocar uma tragédia de grandes dimensões no centro da Europa, uma espécie de
Jugoslávia em ponto grande.
No actual conflito é caso para dizer…venha o diabo e escolha.
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terça-feira, 18 de fevereiro de 2014
No Centenário de Charlot : recordar a vida de Charlie Chaplin
A propósito do
centenário do “nascimento” da personagem Charlot, que se comemora este mês,
aqui recordamos um trabalho da nossa autoria, publicado por ocasião da morte de
Charles Chaplin, em 25 de Dezembro de 1977(Ver AQUI o Site oficial de Charlie Chaplin) .
Este foi um dos
primeiros artigos da minha autoria publicados na imprensa local, neste caso no
jornal “Oeste Democrático”, que tinha sido fundado pelo meu pai em 1975 e desde o seu falecimento em Outubro desse ano era então
dirigido por António Augusto Sales (mais tarde por Manuel Candeias).
O trabalho que
agora divulgamos foi publicado ao longo de três edições daquele semanário, em
20 de Janeiro, 3 e 17 de Fevereiro de 1978, sob o título de “Charles Chaplin :
Vida e Obra”, incluído numa secção de divulgação de cultura popular que eu
mantinha nas páginas desse jornal, intitulada “Análise”.
Mantivemos o
essencial do texto, corrigido de algumas pequenas imprecisões e gralhas:
CHARLES
CHAPLIN – UMA VIDA
OS
PRIMEIROS PASSOS
Charles Spencer
Chaplin nasceu a 16 de Abril de 1889 em Lamberth, bairro pobre de Londres (“14
dias antes de Hitler”).
Os seus pais eram
artistas de «music-hall». Sua mãe, Hannah Hill, pianista e cantora com o nome
artístico de Lily Harley, passou grande parte da sua vida internada em casas de
saúde (faleceu em 1928), principalmente após a morte do seu marido, barítono de
variedades e alcoólico, falecido em 1894.
Neste mesmo ano,
apenas com 5 anos, Chaplin substituiu a sua mãe numa peça de teatro
Durante vários
meses Charles e Sidney (o seu irmão) viveram num asilo.
Em 1908 é
contratado por Fred Karno para trabalhar na companhia de teatro “London Comedians”,
onde veio a conhecer o famoso Stan Laurel (o “estica” da dupla “Bucha e
Estica”), fazendo ambos parte da equipa de hóquei em patins da Companhia.
Dois anos depois
vai a Paris e aos Estados Unidos numa digressão teatral, que se volta a
repetir em 1912 e onde teve oportunidade de conhecer Mack Sennett que o contrata
para a Sociedade Keystone de Hollywood.
Em 1914 estreia-se
no mundo do cinema, protagonizando 35 filmes e tornando-se o cómico mais
conhecido e mais bem pago do mundo. O primeiro filme onde aparece, “Making a Living”
é realizado em Janeiro e estreia-se no dia 2 de Fevereiro. A personagem de “Charlot”
aparece no filme seguinte, “Kid auto races at Venice”, realizado em Fevereiro.
Chaplin explicava assim a criação die Charlot:
“Não tinha a menor
ideia da maneira como havia de me apresentar. Mas, quando me dirigia para o
vestiário, disse para com os meus botões que ia vestir umas calças largas de
mais, pôr uns sapatos enormes e completar o conjunto com uma bengala e um chapéu
de côco. Queria que tudo estivesse em contradição: as calças exageradamente
largas, o casaco muito apertado, o chapéu pequeno de mais e os sapatos enormes.
“Devia ainda
resolver se assumiria um ar de jovem ou de velho, mas, lembrando-me de que
Sennett me tinha julgado mais velho, acrescentei à minha cara um pequeno bigode
que, segundo me parecia, dar-me-ia mais alguns anos, sem ocultar a minha expressão”.
Mas como explicar êxito
que desde logo aquele personagem conquistou? Um crítico de cinema explicava-o
do seguinte modo:
“Na América, o
chamado “novo mundo” da competição desapiedada da guerra, de todos contra
todos nas suas cidades babilónicas e desumanas, surge de repente um homem, um
homenzinho mal ajeitado, remendão e recalcitrante, que corre continuamente no
labirinto, cruza-se diante dos nossos olhos, desaparece, volta a aparecer,
sobe, desce, cai, levanta-se, apanha pancada, procura trabalho, barafusta, é
despedido, tem uma fome crónica de comida para o corpo e de ternura, de carinho
e de amor que não encontra por mais que procure (…).
“De quem ( do que) foge
Charlot? Dos seus perseguidores implacáveis, os guardiões do sistema que se
sentem ameaçados pela força daquele homenzinho fraco que, furtando-se à
engrenagem, procura incansavelmente a justiça, a verdade, o bem, no mundo da
injustiça, da mentira e do mal. Há sempre um polícia façanhudo, um patrão, um
proprietário, um dono de qualquer coisa, que corre atrás de Charlot e de quem
ele foge a sete pás. Mas não desanima”.
Ainda nesse ano de
1914, em Abril, Chaplin torna-se argumentista e realizador dos seus próprios
filmes, no 12.° filme da sua carreira, “Caught in Cabaret” (“Charlot Rapaz de
Cafés”).
Entre 1915 e 1918 a
sua actividade é cada vez mais intensa. Nesse período realiza cerca de 50 filmes,
dos quais há a destacar “The Tramp” (“Charlot Vagabundo”), “The Fireman” (“Charlot
Bombeiro”), ambos de 1915, “Easy Street” (“Charlot Polícia” ou “A Rua da Paz”)
em Janeiro de 1916 e “The Emigrant” (“Charlot Emigrante”) em Julho de 1917.
Em 1918 surge um
dos seus primeiros problemas na vida cinematográfica: a First National
recusa-se a distribuir a primeira versão de “Charlot nas Trincheiras”, cuja
versão inicial era de 5 ou 7 bobinas, sendo divulgada ao público apenas com 3
bobinas.
O negativo
original, desconhecido até hoje, encontra-se, entre outros segredos, num
fortim de cimento, na sua residência da Suíça, onde Chaplin costumava
guardá-los. Sobre este filme escreveu George Sadoul:
“Charlot nas
Trincheiras” começa por uma exposição dos seus motivos, por um libelo contra as
misérias da guerra. A primeira parte não é crueldade mas sim acusação. Chaplin
toca no fundo da miséria humana, na trincheira inundada onde o seu personagem
procura dormir entre ratos e piolhos, tendo por companheiros a solidão, a lama
e a água que o submerge.
“Depois, o disfarce
poético de um tronco de árvore fá-lo passar para o outro lado do mundo real...
O soldado encontra uma francesa, num cenário de ruínas e o amor empresta
calor à cena”.
“Uma comunhão se estabeleceu
desde 1915 entre Charlot e os soldados. “Charlot nasceu na frente”, escrevia,
num justo resumo,, o antigo combatente Blaise Cendrars.
“Os soldados tinham-lhe
falado de Charlot com tanto entusiasmo que ele julgou tratar-se de algum dos
seus colegas. Charlot era o irmão desses desgraçados, dentro dos quais subia a
revolta contra uma guerra para a qual tinham sido arrastados”.
Neste mesmo ano
Chaplin monta o seu próprio estúdio cinematográfico. Em Abril está pronto o
primeiro fruto deste novo período da sua vida : “A Dog’s Life” (“Vida de Cão”).
É ainda em 1918 que Chaplin se casa pela primeira vez, com Mildred Harris
(nessa altura com 16 anos), vindo a divorciar-se dois anos depois, sendo
acusado por ela de “crueldade mental” e obrigado a uma indemnização de 100 mil
dólares. Chaplin tem de fugir com o negativo do filme de “O Garoto de Charlot”,
pois os advogados de Mildred ameaçavam confiscá-lo. Deste casamento Chaplin
teve um filho ( nascido em 7 de Junho de 1919) que faleceu poucos dias após o
seu nascimento.
A partir de 1919
Chaplin torna-se produtor dos seus próprios filmes, fundando a Limited Artists
conjuntamente com Mc Adoroy, Mary Pickford, Douglas Fairbanks e David Griffith.
Em 1921 deslocou-se
a Londres para apresentar “O Garoto de Charlot”, sendo recebido
triunfalmente e, segundo uma testemunha da época, “O delírio da multidão é tal
que o chefe da polícia lhe pede para não atirar flores da janela do hotel pois
receia que alguém fique esmagado na disputa pela posse dessa frágil
recordação”. Perante tal delírio Chaplin interrogar-se-ia: “Mas tanto barulho
por um simples actor de cinema. Se ao menos, para lhes agradecer, eu pudesse
realizar qualquer coisa realmente valiosa: resolver o problema do desemprego,
por exemplo...”.
“O Garoto de
Charlot» foi a sua primeira Jonga metragem.
Em Fevereiro de
1923 realizou o seu 70º filme e a sua última média metragem: “O Peregrino”.
É
também desta época o falado romance com Pola Negri (1922-23) que mais uma vez
lhe virá causar alguns dissabores.
Em Outubro desse
mesmo ano realiza “A woman of Paris” (“Opinião Pública”) filme quase
desconhecido e no qual desempenha o papel secundário de um modesto funcionário
dos caminhos-de-ferro.
Ainda em 1923
inicia os preparativos para a realização de “A Quimera de Ouro”.
Em 24 de Novembro
de 1924 casa-se com Lilitta McMurray, mais conhecida pelo seu nome artístico de
Lita Grey, da qual teria dois filhos: Charles Jr. (28 Junho de 1925 -
suicidou-se em Hollywood no ano de 1968) e Sidney Jr. (30 Março 1926). Tal
como o anterior este casamento só durou dois anos, divorciando-se em 27 de
Agosto de 1927.
A 16 de Agosto de 1925
estreia-se em Nova Iorque “A Quimera de Ouro” (The Gold Rush), segundo Chaplin
a sua obra-prima. Este filme rende-lhe 5 milhões de dólares e em 1942 e 1956
são distribuídas versões sonoras e comentadas por Chaplin.
O ano de 1926 foi
mais um período difícil para Chaplin. Lita Grey arma um escândalo à volta do
seu caso com Chaplin e a imprensa conservadora aproveita-se do facto para fomentar
uma tremenda propaganda contra o homenzinho de chapéu de côco e bengala. Mas
os intelectuais mais esclarecidos de todo o mundo apoiam e defendem Chaplin do
puritanismo fascista em ascensão. É o caso de Louis Aragon que edita um manifesto
intitulado “Hand’s off Love” (“Tirem as mãos do amor”), denunciando a hipocrisia
sexual pequeno-burguesa (aderem a este manifesto grandes nomes do surrealismo
tais como Louis Breton, Paul Eluard, Max Ernest, Prévert e tantos outros).
Mais uma vez a tremenda
força de vontade e capacidade criativa de Chaplin serão postas à prova ao
desempenhar o seu papel no filme “The Circus” (“O Circo”) estreado em 1928.
Para desempenhar o seu papel nesse filme Chaplin tem de aprender a andar na
corda esticada como um profissional de circo.
Se até aqui Chaplin
tinha encontrado obstáculos de toda a ordem, os verdadeiros problemas, os
verdadeiros problemas e a verdadeira luta contra o obscurantismo vão surgir a
partir de 1929. Os Estados Unidos entravam em crise, levando os pequenos
produtores independentes à falência. Chaplin aguenta-se graças à sua grande
resistência e ao grande apoio do público europeu, à beira do desespero e com a
besta fascista à espreita. Mas talvez o facto mais importante para a industria
cinematográfica da época tenha sido o aparecimento do sonoro, nesse mesmo ano, que
se esteia no filme “O Cantor de Jazz”, pondo à prova a capacidade de adaptação
dos realizadores e actores do cinema mudo.
CHARLOT CONTRA O
FASCISMO
“É um judeu
desprezível, mesquinho e ávido” ( Goebbels, ministro da propaganda de
Hitler).
“É um comunista, e
ainda por cima um imoral” (Comissão de actividades anti-americanas).
“É o inimigo
declarado dos grandes empresários e da polícia” (cadeia de jornais Hearst-anos
30).
...Estas algumas
opiniões sobre Charles Chaplin dadas por “ilustres” personalidades e
organismos, cuja importância e ensinamentos na manipulação da opinião pública
não pode ser negada.
Pois foi de tais
personalidades e organismos e as suas influências que Chaplin teve de se
defender.
E claro que
Chaplin, inconformista e individualista de raiz, encontrava-se na lista negra de todos os
totalitarismos e conservadorismos que dominaram a primeira metade do século XX,
pronto a ser abatido ao mais pequeno deslize.
A primeira
tentativa para abater Chaplin surge quando este, em 1931, se recusa a assinar
um contrato de 600 mil dólares para fazer um filme falado. O filme “Luzes na
Cidade”, cuja realização se iniciara nesse ano, sofreu as consequências dessa
atitude, sofrendo um boicote sistemático à sua distribuição, levando Chaplin à
beira da falência.
Mais uma vez
Charles vem à Europa procurar salvar o filme e, deste modo, a sua independência
em relação às exigências dos produtores e distribuidores Americanos, cada vez
mais poderosos económica e politicamente. Percorre os principais centro
culturais da Europa - Londres, Paris, Berlim, Viena, Veneza, Florença, Roma e
Nápoles — partindo em seguida para o Japão, passando pela Índia, onde se
encontra várias vezes com Gandhi, e por Singapura. O filme “Luzes na Cidade” é
um êxito completo, saindo reforçada a independência pessoal e económica de
Chaplin.
No ano seguinte
escapa ileso de uma tentativa de homicídio perpetrada por William Randolph
Hearst, rei da imprensa americana, e é Thomas Ince, “pai” do “Western”, que
acaba por morrer por engano, em consequência desse mal esclarecido acto. Hearst
consegue subornar as testemunhas e o caso é abafado pela imprensa (ver
«Expresso» de 30 de Dezembro de 1977).
Em 5 de Fevereiro
de 1938 estreia-se em Nova Iorque “Tempos Modernos”, um dos filmes mais
importantes de Chaplin e no qual é violentamente criticado o capitalismo e
focada a desumanização do tipo de trabalho imposta por este sistema económico. O
filme obtém pouco êxito nos Estados Unidos devido à feroz campanha feita contra
ele, sendo acusado de propaganda comunista, enquanto, por outro lado, a
Alemanha e a Itália, já dominados pelo nazi-fascismo, proíbem a sua exibição. Porém,
este filme obtém um êxito fabuloso em Londres, Paris e Moscovo.
Nesse ano Chaplin
casa-se com Paulette Godard, em Cantão, na China, não tendo filhos deste
matrimónio que durou 5 anos. Paulette Godard, pseudónimo de Paulina Levy, tinha
interpretado um papel de garota em “Tempos Modernos” e o de Hannah em “O Grande
Ditador”.
Esta última
película começa a ser preparada em 1938, secretamente, e a sua realização
inicia-se no ano seguinte.
Em Hollywood e em
Washington, respectivamente o cônsul nazi e o embaixador alemão pressionam os
produtores americanos, ameaçando-os de um boicote total aos filmes
norte-americanos na Alemanha, se não impedissem Chaplin de fazer esse filme:
“Hollywood, receosa
da perder as suas posições na Alemanha, onde tinha investido importantes capitais
entes da subida de Hitler ao poder, não tardou em exercer forte pressão sobre
Chaplin (com a aprovação tácita das entidades oficieis e o apoio da imprensa de
Hearst) para que desistisse da realização da fita.
“Chaplin tentou
resistir, mas algum tempo depois foi forçado a interromper as filmagens em
virtude dos violentíssimos ataques dos isolacionistas de ambos os partidos,
republicano e democrático. A ofensiva isolacionista partia de uma comissão
parlamentar chefiada por Martin A. Dies, anteriormente criada para fiscalizar
as actividades dos grupos existentes nos Estados Unidos, mas que passou a
orientar a sua acção, declarada a guerra na Europa, contra todos os que
manifestassem simpatia pela causa aliada".
Só “depois da queda
da França, Chaplin retomou a realização de “O Ditador”, que concluiu em 1940”
(Alves Costa, in “Memória do Cinema”). “O Grande Ditador” foi, aliás, a
primeira película sonora de Chaplin, estreando-se em Nova Iorque em 16 de
Outubro de 1940, sendo proibida na Argentina e em vários países da América Latina,
mas obtendo grande êxito nos países anglo-saxónicos. É deste filme o célebre “discurso
do ditador”.
Chaplin recusa o
prémio da crítica concedido a este filme. Acerca desta película, e quando da
sua estreia em Paris após á guerra, Chaplin afirmaria: “Os Ditadores actuais
são fantoches que os industrias e financeiros manobram.
Após se ter divorciado
de Paulette Godard, Chaplin casa-se com Oana O´Neill, a 16 de Junho de 1943,
sendo esta, devido a este casamento, desertada pelo seu pai, o dramaturgo
Eugenfe O’Neill. Deste casamento nascem Geraldine (1944); Michael (1948);
Josephine (1949); Victoria (1951); Eugene (1953); Jane-Cecil (1957) e
Christoph-James (1962).
Em 1947 Chaplin
abandona a personagem tão característica de Charlot e metamorfoseia-se num
homem elegante, frio, calculista, o oposto em todos os sentidos a Charlot:
nasce “Monsieur Verdoux”, baseado numa ideia de Orson Welles. Neste filme Chaplin
desmascara uma sociedade hipócrita, dita defensora de certos valores de certa conduta social, tendo como único
feito, melhor levar a aceitar uma sociedade repressiva, autoritária, castradora
e frustrante, necessária à manutenção da desigualdade e da injustiça. Mais uma
vez Chaplin vê-se alvo das mais violentas campanhas contra este novo “Monsieur
Verdoux” (“o Barba Azul”), que vinha incomodar a consciência de muito “boa”
gente bem instalada na vida. Para além das ameaças recebidas de particulares a
quem os seus filmes perturbavam, Chapim teve de enfrentar a “Liga da Decência”,
os “trusts” financeiros e a “comissão contra as actividades antiamericanas»
numa altura em que o senador Mac Carthy lançava o terror entre os meios
intelectuais, com a sua campanha de “Caça às bruxas” e aos “comunistas” (e de
comunistas eram apelidados liberais como Chaplin).
No seu discurso
final Monsieur Verdoux afirmava: “Um assassinato faz um criminoso, milhões de
mortos podem fazer um herói. Se me sujei de sangue, o mundo encorajou-me: Não é
ele que fabrica as armas de destruição com que se exterminam os homens, matando
mulheres e crianças indefesas? Nós seremos destruídos pelo excesso do Bem ou do
Mal. E se me dizem que demasiado Bem não pode fazer mal, eu pergunto como
podemos sabê-lo, se do Bem nunca tivemos bastante”.
Com o terror maccarthyista
a expandir-se pelo na maior potência do ocidente, Chaplin apercebia-se do cerco
que se apertava sobre ele e todos aqueles como ele que não aceitavam um novo
tipo de obscurantismo e puritanismo neofascista. Afirmava Chaplin, nos inícios
da década de 50: “talvez um dia destes eu venha a ser declarado indesejável
neste país: para mim seria apenas a prova de que já vivemos numa democracia”.
Tal não demorou a
acontecer.
Quando em Setembro
de 1952 partiu no Queen Elizabeth para Inglaterra em gozo de férias recebe a
notícia de que o secretário da justiça lhe tinha retirado o seu visto de
regresso aos Estados Unidos. Para o rever tinha de se submeter a um inquérito
para provar a sua valia moral. A imprensa norte-americana acusa-o de comunista
por ele, durante a guerra, ter exprimido simpatia pelas forças soviéticas que
combatiam o nazismo. A tal acusação respondeu Chaplin: “durante a guerra senti
simpatia pelos russos que estavam a aguentar a frente. Devemos estar-lhes
gratos. Eu não sou um político e não sou russo, sou um cidadão do mundo”, acrescentando
: “Fui sempre um internacionalista, e apenas isso”.
Quando chegou à
Grã-Bretanha foi recebido entusiasticamente e o escritor católico Graham Green
dirige uma carta aberta ao famoso cineasta onde se podem ler as seguintes
passagens:
“...Com espanto e
pesar nosso, Chaplin rendeu a mais alta homenagem possível aos Estados Unidos
ao instalar-se dentro das fronteiras norte-americanas. Agora sentimos desgosto,
mas não espanto, por ver a paga que lhe é dada, não pelo povo americano em
geral, mas por aquelas autoridades que parece receberam ordens de homens como
Mac Carthy. Ao ser invadida a Rússia, o senhor falou em sua defesa numa reunião
pública, em San Francisco, a pedido do Presidente dos Estados Unidos. A ocasião
não era para meias palavras nem para frases de duplo sentido, e as suas
palavras foram tão claras como as de Churchill ou Roosevelt. Mas o senhor teve
o atrevimento — dizem agora — de se dirigir ao público empregando a palavra
“camarada”. Eis a maior acusação que lhe fazem. E eu pergunto: o que estaria
fazendo Mac Carthy naqueles dias?
“Recordando as
épocas de Titus Oates e do terror na Inglaterra, queria pensar que os católicos
norte-americanos, corpo poderoso, lhe concederão s sua simpatia e o seu apoio.
Sem dúvida, um semanário católico dos Estados Unidos não ficará calado.
Refiro-me ao “Commonwealth”. Mas...e o cardeal Spellman? E todo o resto? Agora
me recordo que Mac Carthy também é católico...”
“...A desgraça de
um aliado é a nossa desgraça, e ao atacá-lo a si os “caçadores de bruxas”
mostraram que não se trata de um assunto meramente nacional. A intolerância, em
qualquer parte, fere a liberdade em todos.”
No dia em que
completava 64 ano (16 de Abril de 1953), Chaplin apresentou-se perante o cônsul
dos Estados Unidos em Lausanne e diz-lhe: Chamo-me Charles Chaplin. Vivi quase
40 anos nos Estados Unidos, donde saí em Setembro passado. Deram-me um visto de
regresso, mas não penso utilizá-lo. Aqui o tem. Entrego-lhe pedindo que o envie
ao seu Governo. Passe V. Ex.‘ muito bem, Senhor Cônsul”.
E assim se
encerrava o capítulo mais agitado da vida de Charles Chaplin. Agora a idade
iria a começar a pesar na sua vida, na sua obra e mesmo no seu inconformismo.
CHAPLIN CEDE À
MORTE
Tudo o que é espontâneo,
criativo, inconformista, é vida. A vida é isso mesmo. A capacidade de
transformar, de ser consciente, de ser diferente e, ao mesmo tempo, solidário
para com os outros seres humanos e a
natureza. Tudo o resto não passa de sobrevida ou sobrevivência, de morte ao relanti.
Enquanto inconformista,
enquanto criador, Chaplin viveu, por isso foi tão importante para a humanidade,
por isso nunca será esquecido: “O que reste após a morte é a consequência dos
nossos actos”.
Mas os anos o a
glória pesam, a defesa da “prestígio” (mas o que é isso?) e o poder mágico do
dinheiro também. E o primeiro a ser atingido é o inconformismo. Com a perda
desse inconformismo mais facilmente se é devorado por esto tipo de sociedade
que não admite desvios ao seu quotidiano (reprodutor da determinado sistema
económico) tais como a criatividade, a espontaneidade ou a imaginação.
Como um último
grito de revolta contra essa tal sociedade a sufoca-lo e a engoli-lo, contra
esse quotidiano diariamente assumido e onde reina o consumo de objectos, de
homens e da natureza, Chaplin realiza em 1957, em Londres, “Um Rei Em Nova
Iorque”, o seu primeiro filme rodado fora dos Estados Unidos “ no qual ele
encarna o rei Shaklov. Este filme seria cortado pela Censura norte-americana e
estreado em Londres, em Setembro, num pequeno cinema de segunda categoria
devido a pressões norte-americanas.
Chaplin fecha-se
depois para o mundo, em Corsier-Sur-Vevey, na Suíça, escrevendo dois livros: “Autobiografia”,
editado em 1964, e “A Minha Vida em Imagems”, em 1974.
Entre estes dois livros,
dá-se a confirmação da “derrota” de Chaplin, perante a aproximação da morte, é-nos
dada com o péssimo filme “A Condessa de Hong-Kong”, estreado em Janeiro de
1967.
Este filme é o
pretexto para os senhores de Hollywood, muita “arrependidos” pela perseguição
que lhe tinham movido durante décadas, resolverem homenageá-lo, procurando
assim transformá-lo numa inofensiva peça de um museu do cinema.
Em Janeiro de 1972 Chaplin
declara aos Jornalistas: “Hoje nade há a perdoar (…). Hoje, sinto-me demasiado
velho para algo que me force a regressar à America”.
Mas Hollywood acena-lhe
com um “óscar” especial da academia.
Chaplin, de 83
anos, cansado e conformado não resistiu e compareceu em Hollywood em 4 de Abril
de 1972 para receber a estatueta, uma espécie de “óscar póstumo” à sua
criatividade.
“Tenho um grande
afecto pelos Estados Unidos. Afinal, foi um pais onde passei 45 anos da minha
existência e do qual possuo recordações muito agradáveis. Quanto às coisas
desagradáveis já nem as recordo. Aliás, deixaram de ter para mim qualquer significado
válido”, afirmou Chaplin nessa ocasião, acrescentando: “só posso dizer obrigado
pela honra que me deram ao convidar-me”.
Como se teria
divertido Charlot à custa das afirmações desse “velhinho” que dava pelo nome de
Charles Chaplin. Mas nem o próprio Chaplin conseguiria destruir Charlot e toda
a mensagem humana da sua obra de juventude.
E foi Já sem
qualquer surpresa que vimos Chaplin, ao festejar o seu 85º aniversário ao ar
livre, na sua casa de campo, com champagne, convidar o presidente do município
e o chefe da polícia da vila de Corsier-Sur-Vevey. Quantos pastéis de nata não
teria lançado Charlot à cara de tão ilustres convidados.
E foi num dia de
Natal, 25 de Dezembro de 1977, que a morte o veio buscar, aos 88 anos.
Quando do seu
enterro e segundo notícias dos jornais: “um dos raros visitantes admitidos na
vivenda foi um petiz de Çorsier, trazendo uma grande rosa que entregou, a
soluçar, ao guarda encarregado de atender os forasteiros”.
Não resistimos,
para terminar, em transcrever uma passagem do livro de Alves Costa “Memória
do Cinema” (uma das obra que nos serviu de referência para este artigo):
“Mais ou menos
Charlots todos nós somos. Mas Charlot não é só a nossa caricatura, é também e
nossa vingança (sobretudo desde Charlot no Music-Hall até ao “Peregrino”). Ele,
ao menos, no meio dos seus infortúnios, pode deitar um gelado no decote da
grande dama da “alta”; ele, ao menos pode retribuir os pontapés no rabo que todos
nos recebemos dos valentões, dos prepotentes e dos polícias. Não é muito mais
corajoso do que qualquer de nós. Mas o seu engenho, a sua malícia, a sua
argúcia, a sua irreverência dão-lhe uma ousadia que gostaríamos de ter. Na sua
solidão, na sua inadaptação ao meio, apesar dos maus tractos que a vida lhe dá,
tem artes a tem força pana deitar de cangalhas, pelo ridículo, convenções,
preconceitos, vaidades, hierarquias e todas as formas de felsa moral, de falsa
caridade, de falsa superioridade, de falso poder”
Morreu Charles Chaplin, viva Chartot.
Venerando António
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Memória pessoal
segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014
Memória de um tempo que tem de ser presente por Ana Paula Alexandre.
Saímos de casa e a rua tornou-se nossa e os heróis, em cima
de chaimites, eram iguais a nós, estavam ali e também eram nossos…
As fábricas, os campos, os barcos pertenceram-nos; homens e
mulheres, de rosto queimado pelo sol e pela geada do interior da nossa terra,
saíram das aldeias, vieram ver o outro lado do mundo e exclamaram: Olha o mar!
e ficaram encantados, porque o mar também lhes pertencia…
Correu um vento novo pelas planícies e pelas serras e mãos
calejadas sentaram-se pela primeira vez em bancos de escola e aprenderam a
escrever o seu nome em letras grandes e assumidas.
O futuro já tinha chegado e o impossível tinha-se cumprido.
Os vampiros refugiavam-se atrás do nevoeiro e as hienas
trabalhavam na sombra….
O amor, esse inventava-se, sem sinais proibidos, descia a
avenida de mãos dadas com o sol e até a liberdade tinha atracado no Tejo.
Hoje, as hienas estão aí, os vampiros escondem o céu do
nosso país e só o mar mostra a revolta…
Nenhum povo, depois de ter conhecido o sol, pode ficar
silenciado por um tempo de chuva!
Se somos um país de marinheiros, por que é que estamos a
deixar o mar sozinho?!
ANA PAULA ALEXANDRE
ANA PAULA ALEXANDRE
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Contra-situacionismo
quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014
No Dia Mundial da Rádio - A Minha Memória do tempo da Rádio:
Comemorando-se hoje o dia mundial da rádio, recordo o meio de
comunicação que mais me seduziu ao longo dos tempos.
Pertenço à primeira geração de portugueses que conheceram a televisão,
mas a rádio foi sempre uma presença mais assíduo nos dias da infância e da
juventude.
Foi através da rádio que segui os primeiros acontecimentos nacionais e
internacionais, desportivos, culturais e musicais, de que me lembro.
Já aqui escrevi que foi ao ouvir rádio que soube do assalto ao comboio
correio na Inglaterra, um dos mais rocambolescos assaltos de sempre, no verão
de 1963, ou da morte de Edith Piaf, em Setembro desse anos, e do assassinato de
Kennedy, em Novembro.
Foram as primeiras notícias do mundo de que me lembro.
Apesar de ter televisão em casa desde muito novo, esta só iniciava a
sua emissão no início da noite, e assim era através da companhia de um rádio
aceso na sala que íamos brincando, fazendo os trabalhos de casa e conversando
em família.
Lembro-me dos noticiários da Emissora Nacional ou dos Parodiantes de
Lisboa no Rádio Clube Português que nos acompanhavam à hora do almoço em família,
base de muitas conversas e comentários sobre o mundo e a vida.
Foi ainda através da rádio que todos seguimos avidamente as notícias do
25 de Abril.
O rádio portátil a pilhas veio revolucionar o meio, permitindo
transportar a musica e os acontecimentos do mundo para toda a parte.
Depois de Abril acompanhei as emissões do Rádio Clube Português em FM,
que foi onde muitos da minha geração tiveram contacto com a história do rock e
do pop, descobrindo as musicas que passaram pelas nossas vidas.
Tive o privilégio de ter conhecido por dentro os míticos estúdios do
antigo Rádio Clube Português, pois um projecto meu foi seleccionado para uma hora
de programação num programa do José Nuno Martins, isto no inicio da década de
80, tendo conhecido na ocasião outro mítico nome da rádio, o João David Nunes.
Pouco tempo depois envolvi-me nos projectos de lançamento das rádios
locais, andando de antena na mão, com microfone e gira-discos, com um grupo de
amigos, de casa em casa, a fazer as primeiras emissões de rádio pirata, actividade
formalizada depois em projectos como a Rádio Extremadura e a Rádio Oeste, ao
longo de mais de dez anos, acompanhando ainda, por afinidade pessoal, o
projecto da TSF, tendo conhecido os primeiros estúdios e alguns dos históricos
dessa rádio.
Ainda hoje prefiro a companhia da rádio à televisão.
Actualmente não começo o dia sem ouvir as notícias na Antena 1, aquele
que é actualmente o meu projecto de rádio preferido.
Apesar de todas as ameaças, nem o vídeo, nem os novos meios de
comunicação conseguiram “matar” o prazer de ouvir rádio.
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quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014
Enfim, a História Aproxima-se dos Povos - o século XVIII em Portugal visto por uma historiadora brasileira - um texto escolhido por Maria Laura Madeira.
Enfim, a História aproxima-se dos povos
por Maria Laura Madeira
A História vai-se aproximando dos povos e realizando o velho sonho de discretos investigadores, aos quais interessa sobremaneira, antes das ditas façanhas, entender e fazer entender os conceitos por que se pautaram...
Alguns povos, como o nosso, sofrem ainda hoje como vítimas dum conceito feudal da organização social, levado ao extremo, e até contando com a anuência servil dos povos. Afinal, já nos nossos dias, vemos como os deputados se auto-promoveram com vencimentos e regalias muito acima dos governados, sem lhes importar a miséria e a injustiça lançadas sobre a grande maioria deles. Entre outros escândalos, que vamos conhecendo. Esquecem um princípio fundamental da República: o exemplo.
Sem embargo de termos alcançado entretanto um nível cultural que já nos permitiria ser bem mais exigentes no cumprimento de princípios fundamentais. A Educação e a Cultura, como a Cidadania, deverão merecer-nos o maior dos cuidados, para que o sentido crítico e a liberdade de expressão efectivamente se exerçam e dêem frutos nas novas gerações.
Ou continuaremos pasmados, manipulados, fascinados como tolos diante do exibicionismo de alguns, perigosamente, como no tempo de D. João V e de suas frívolas cortes e ambições...(como exemplo).
Parabéns aos jovens historiadores e investigadores que enfim se debruçam e esmiúçam o testemunho suado e sofrido dos que sempre ficaram à margem da História...A civilização agradece.:
MLM/2014
P.S. A Globo passa pelas 20 horas uma novela notável, que já tem uns aninhos, acerca de como nasceu a cidade do Rio de Janeiro, logo a seguir à libertação dos escravos e ao aparecimento das actuais «favelas». A não perder, na linha do que atrás deixei dito.
Mlaura
Heranças de Portugal
Paço Real - Lisboa
(pintura a óleo do séc. XVIII)
"Apesar da forte influência inglesa na economia, e que aumentava cada vez mais a ponto do historiador britânico Eric J. Hobsbawn (1920-2012) se referir a Portugal como colônia não oficial do Império Britânico no século XIX, a França era o modelo em termos de moda, cultura e vida cortesã no Brasil Colonial. Após terminada a Unificação Ibérica, em 1640 (vista pelos portugueses como uma humilhante dominação que durou 80 anos), criou-se uma atmosfera de rejeição aos hábitos da Espanha, passando assim a França a ser a grande fonte inspiradora.
Dom João V
"Dom João V (1689-1750) sonhava em passar para a História como o Rei-Sol lusitano. O monarca e os nobres copiavam as roupas e os acessórios franceses, e sempre com grande ostentação. Vários viajantes relataram os excessos da elite lusitana. Lisboa, porém, não estava nem perto de se tornar Paris. Nem todos as sedas, rendas, joias e perucas conseguiam disfarçar a precária situação financeira de Portugal. Ainda assim, o ouro e os diamantes levados do Brasil alimentavam as manias da nobreza empobrecida.
Rainha Dona Maria Ana
"As atividades sociais e culturais em Lisboa eram poucas. O rei e a rainha não transformavam o cotidiano em um espetáculo, como era comum em Versalhes. As trocas de roupas não eram um ato público, o casal real fazia as refeições sozinho, o rei caçava com poucos acompanhantes. A rainha Dona Maria (1683-1754) era chamada de carola à boca pequena, só saindo para ir às missas. As construções também seguiam o estilo da corte. O Paço Real, o Rossio, os palacetes dos nobres mais importantes, todos apresentavam o mesmo ar pesado e sem imaginação (Lilia Schwarcz discute detalhadamente este tema em “A Longa Viagem da Biblioteca dos Reis”). O Convento de Mafra, era a mais grandiosa obra do barroco português e a menina dos olhos de Dom João V, mas era um Palácio-Convento considerado feio e faraônico (ver o belíssimo “Memorial do Convento”, de José Saramago).
Convento de Mafra
"Não havia praticamente vida social. Com exceção de alguns espetáculos teatrais e dos eventos religiosos (missas, procissões e autos-de-fé), os nobres não tinham muito o que fazer. As artes, como pintura, escultura, música, teatro, ópera e até literatura (terreno onde sempre floresceram grandes nomes lusitanos), enfrentavam uma fase de marasmo. Somente a religião vivia um furor cada vez maior. Diziam as más línguas que Dom João V era tão católico, que buscava as amantes entre as freirinhas dos conventos…A religiosidade exacerbada, nos moldes da Idade Média, era uma das peculiaridades da sociedade portuguesa. A Europa via os portugueses como supersticiosos e ignorantes.
Procissão portuguesa séc. XVIII
"O que aconteceu com as glórias e as conquistas lusitanas? Como explicar a penúria que convivia com abundância de ouro, diamantes, açúcar e escravos do Brasil? Além de apegado à Igreja, que é uma instituição essencialmente conservadora, Portugal sempre se manteve isolado em relação às novidades e ideias que transformaram o mundo. A Reforma Protestante, o Iluminismo, os ideais das Revoluções Francesa e Industrial, os conflitos dos Estados Unidos, tudo sempre parecia chega atrasado a Portugal, ou a nem mesmo interessar aos lusitanos (salvo a pequenos grupos da elite), que insistiam em olhar para o passado das grandes navegações. Na economia, Portugal se contentava em esbanjar o ouro brasileiro em projetos grandiosos e inúteis. Sem investimentos em infraestrutura, sem se preocupar em fortalecer as manufaturas e as indústrias incipientes, a economia portuguesa afundava rodeada de riquezas. Nem os esforços de Dom João V, nem a mão de ferro do Marquês de Pombal (1699-1782) conseguiram reverter a situação.
Sebastião José de Carvalho e Melo
"A vida na corte no Antigo Regime era um jogo complexo de aparências. Portugal tentava seguir este modelo mesmo com uma corte pobre e pequena. E continuou insistindo nestes hábitos cortesões, mesmo quando já estavam obsoletos. Sabemos que no Brasil as coisas foram muito semelhantes: uma elite sem título que vivia de aparências, investindo o que podia e o que não podia em tecidos, joias, roupas, sapatos, escravos, carruagens e liteiras.
Senhora brasileira do séc. XVIII
"A herança portuguesa é paradoxal e cheia de interrogações, sem deixar de ser também bela e rica. Conhecendo-a. podemos refletir bastante sobre a realidade brasileira e sobre alguns hábitos de tempos passados, que permanecem até hoje entre nós".
Texto do historiadora Márcia Pinna Raspanti
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século XVIII
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