"Não é possível não ir às despesas com pessoal [na saúde e na educação] e às prestações sociais".
Esta é a frase que marcou a entrevista que Passos Coelho deu ontem à TVI.
Ficamos assim a saber o que é que o primeiro-ministro pensa daquilo que ele designa como "Reforma do Estado" e que nós chamariamos "Contra-revolução neoliberal".
A obsessão ideológica de Passos Coelho fica assim anunciada nessa entrevista.Fugindo à pergunta da entrevistadora sobre se vai cortar nas reformas abaixo do mil euros, essa fuga revela todo um programa. É óbvio que essas pensões vão sofrer cortes, é esta a lógica de todas as atitudes deste governo.
Também ficamos a perceber, pelos silêncios, que a educação e a saúde vão deixar de ser universais e até é provável que voltem as propinas ao ensino secundário, uma medida que, a concretizar-se, é contraditória com o alargamento do ensino obrigatório até ao 12º anos.
O mais grave das medidas fica adiado para Fevereiro, mas é evidente a obsessão deste governo contra os funcionários do Estado que não tenham chegado aí por nomeação política de "boys"e a voragem para entregar os serviços do Estado aos apetites dos privados.
1 comentário:
Viver entroikado, não ter o que pôr na mesa
Luciano Alvarez (in Público)
Os governantes deviam andar de transportes públicos. Não só pelo que poupavam ao país. As questões de segurança e as agendas apertadas impedem que o façam com frequência. Mas, uma vez por outra, far-lhes-ia muito bem apanhar uma carreira de autocarro, um cacilheiro ou o metro.
As visitas às empresas de sucesso, as idas ao Parlamento e as vernissages com as chamadas “forças vivas” mostram-lhes uma fotografia desfocada do país. Os transportes públicos, esses sim, são o espelho de Portugal. Uma janela para a realidade.
Não falo só dos rostos que não escondem desalentos. Das empresas que, através da janela de um eléctrico, se vêem a fechar todos os dias, dos milhares de cartazes de casas à venda, como se os portugueses estivessem em massa a fugir do país.
Os governantes deviam andar de transportes públicos. Nem que fosse só de vez em quando. Iam ver que o número de pedintes cresce dia a dia. Gente que não tem outra solução a não ser vir para a rua pedir esmola.
Nesta semana, uma mulher travou-me o passo num túnel do metro. Não teria mais de 40 anos. Olhou-me nos olhos e de uma forma serena disse-me: “O senhor desculpe-me, estou desempregada, não tenho qualquer apoio, vivo sozinha com dois filhos e não tenho o que lhes pôr na mesa. Pode-me ajudar com qualquer coisa?”
Aquela mulher que nada aparentava de pedinte não podia estar a mentir. O seu olhar não mentia. Era uma mulher desesperada que não tinha como dar de comer aos filhos. Vir para a rua pedir esmola foi, provavelmente, o seu último recurso, a única possibilidade de ter algo para pôr na mesa.
“É muito difícil ver aspectos positivos naquilo que é duro e difícil”, disse o primeiro-ministro na entrevista de quarta-feira, garantindo que o seu Governo está a conseguir resultados para tirar o país da crise.
Admito que sim, mas a preocupação primeira devia ir para aqueles que, à custa dos “aspectos positivos” que o primeiro-ministro canta, são empurrados para a miséria. A “missão histórica” que Passos Coelho diz estar a cumprir devia começar por garantir que todos os portugueses tivessem o que pôr na mesa.
Até lá, o messias político que o primeiro-ministro se julga não passa aos olhos dos muitos portugueses que vivem na miséria de um fraco charlador.
Os governantes portugueses deviam andar mais de transportes públicos.
http://www.publico.pt/politica/noticia/viver-entroikado-nao-ter-o-que-por-na-mesa-1575505
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