Não é por acaso que um partido consegue sobreviver cem anos, ainda por cima sem nunca ter estado no poder, e num mundo como o deste seculo XXI, onde palavras como “solidariedade”, “igualdade” e “direitos” são violentamente esmagadas num dos períodos mais selvagens da história do capitalismo.
A razão dessa longa existência deve-se, quanto a nós, ao facto do PCP
ter feito a diferença, em relação a
outros partidos da mesma tendência e entre os partidos da esquerda, em vários
aspecto:
- desde logo, a sua formação estrutural de origem, um partido criado no
seio do movimento sindicalista e operário, em vez da habitual origem dos
partidos comunistas numa cisão em partidos socialistas ou social-democráticos;
- depois, foi um partido que construiu e consolidou a sua história na
luta contra uma das mais longas ditaduras do século XX, sofrendo perseguições e
violências várias, aos contrário dos partidos “irmãos”, muitos deles
construídos, pelo contrário, como violentas ditaduras ditas “socialistas”;
- ao contrário de outros partidos comunistas, arvorando-se
arrogantemente como uma “elite de iluminados”, contruindo-se de cima para
baixo, o PCP soube consolidar-se junto dos trabalhadores e das populações, não
hostilizando e respeitando os seus usos e costumes culturais e até religiosas,
mesmo os mais conservadores. É esta atitude que explica também que este
partido, ao contrário de outros congéneres, nunca tenha sido anticlerical;
- apesar da retórica ortodoxa de algumas teorias por si oficialmente defendidas,
o PCP teve sempre uma capacidade de agir, em democracia, com pragmatismo, moderação e responsabilidade institucional ;
- sem nunca ter exercido, pelo menos solitariamente, o poder central, soube
construir uma imagem de eficácia, de diálogo e abertura, nos locais onde
exerceu o poder, como aconteceu no exercício do poder autárquico, onde foi
pioneiro na defesa da cultura, do património e do ambiente, hoje realidade
normal, mesmo em autarquias dominadas por partidos adversários, mas que, com
raras excepções, não o era no início do poder autárquico democrático;
- soube desenvolver uma grande abertura cultural, imagem que se consolidou
na forma como organiza a Festa do Avante;
- soube afirmar-se como uma rara força política que se apresenta, de
forma coerente, como defensora credível de uma alternativa à afirmação do
neoliberalismo, na defesa intransigente do mundo do trabalho e dos seus
direitos, dos mais desfavorecidos e do Estado Social, e no combate às desigualdades;
- tem-se revelado impermeável à corrupção e às negociatas de bastidores,
sendo as possíveis excepções o “norma” noutros partidos;
Contudo, se estes são os pontos fortes que têm garantido o seu prestígio,
mesmo no seio dos adversários, e a sua excepcional longevidade, existem também graves
fragilidades que estão a provocar o seu crescente desgaste:
- continua a negar ou a desvalorizar muitos dos crimes perpetrados em
nome do “comunismo” e as razões da decadência e do fracasso do “socialismo
real”;
- mantem um discurso imobilista, fabricado com chavões datados e pouco
atractivos para as novas gerações;
- sofre de uma tendência revanchista em relação a ex-dirigentes,
importantes em certos períodos da sua construção, caídos em desgraça ou
dissidentes, ignorando-os ou banindo-os da sua história oficial;
- mostra uma grande dificuldade em renovar os seus quadros dirigentes,
revelando pouca abertura à diversidade de opiniões e ao funcionamento da
democracia interna, não se distinguindo, neste aspecto, aliás, da maior parte
dos partidos ditos “burgueses”;
Esperemos que este centenário tenha o condão de contribuir para que os
militantes e dirigentes desse partido reflictam sobre os seus valores e as suas
fragilidades.
O enfraquecimento do PCP seria grave, pela orfandade em que deixaria os
que vivem do seu trabalho e os sectores mais fracos e desfavorecidos da
sociedade, que encontram nesse partido o único defensor coerente na defesa dos
seus direitos.
Essa orfandade só beneficiaria os crescente populismo de extrema-direita.
Mas a sua sobrevivência depende muito da sua própria vontade e capacidade de abertura, de renovação e de transparência.
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