Numa das minhas últimas visitas ao Barreiro, ao pavilhão do Ephemera, a “ephemerense” Rita Maltez ofereceu-me um livro da autoria de outro conhecido “ephemerense”, o Luís Pinheiro de Almeida.
Confesso que, no início, pensei : “mais um livro sobre os Beatles”!
Mas, sabendo que o Luís Pinheiro de Almeida é um “fanático” colecionador e conhecedor de tudo o que diz
respeito aos célebres músicos de Liverpool,
levado também pela curiosidade de saber quem era o “caro Jó” do título, peguei
no livro e levei-o comigo para Lisboa, num dia em que tive de levar a minha
filha à faculdade, para evitar os transportes públicos, e em que tinha de
esperar por ela no carro, umas duas horas, porque estávamos numa das fases
complicadas do confinamento, e acabei por ler, de uma assentada, o “com os
Beatles caro Jó”.
Ultrapassou todas as expectativas, pois o livro consegue transmitir o espírito
de uma época e todo o entusiamo adolescente na descoberta de novas realidades.
A vivência dessas descobertas remeteu-me para o meu próprio percurso, apesar de as ter vivido cerca de uma década depois do meu caro amigo Luís: a descoberta de novos grupos musicais, banda sonoro da nossa vida de adolescentes; a partilha, com os amigos, dessas descobertas; as gravações das musicas que passavam na rádio; as amizades para a vida, forjadas à volta de gira-discos partilhados em casa de uns de e de outros; as tentativas de imitar em guitarras, em congas e em tudo o que fizesse “barulho”, os grupos mais apreciados…
Apesar da década de diferença que me separa do autor, ainda sou do
tempo do vinil, de procurarmos nas casas onde eles se vendiam as últimas
novidades, a audição atenta das emissões de FM na (no meu tempo) Rádio
Comercial, muitas vezes com antenas improvisadas com fios de cobre, porque
existiam muitas interferências, culminando tudo, no meu caso, no movimento das
rádios piratas, onde participei activamente, fazendo programas, amadores e mal
feitos, em más condições técnicas, mas com muito entusiasmo e muita loucura,
isto, da minha parte, já nos anos 80.
A minha “banda sonora” não foi exactamente a do Luís Pinheiro de
Almeida, embora apreciasse os Beatles ( também colecionei as figuras das
pastilhas elásticas referidas no livro), mas comecei a ouvir rock com mais
frequência no final da década de 60, principio da de 70 (tinha 12 anos em
1968…), no quintal do meu amigo Mário Rui Hipólito, o único com algum poder económico para comprara as novidades, para além do seu pai possuir uma enorme colecção de "vinis".
Ainda apanhei os Beatles, mas já no final, sendo, contudo, mais
apreciador da irreverência dos Rolling Stones.
Os meus primeiros ídolos foram os super grupos do rock sinfónico
(Emerson, Lake and Palmer, Yes, Pink Floyd, Genesis..), depois, em tempo de
universidade ( e a descobrir Lisboa, tal como o o autor descreve…mas, o meu caso, uns
10 anos depois, a partir de 1976), o
punk e a New Wave, explorando muito a década de 80, quando já tinha algum poder
de compra e me envolvi nas rádios piratas. Mantenho-me actualizado, muito
graças à minha enteada e à minha filha, mas, para mim, a musica dos anos 80 foi
o mesmo que os Beatles e os grupos da época foram para amigo “ephemerense”.
Descobri, no seu livro, referências a muitos grupos dos quais nunca
tinha ouvido falar. Estou a pensar em explorar essa descoberta no Youtube com a
ajuda do livro.
Mas há outro facto curioso. É muito provável que, em 1959, nos tenhamos
cruzado, eu, o autor e o “célebre” Jó, numa das ruas do bairro Carmona em Coimbra.
Apesar de ter apenas 3 anos na altura, vivi aí com os meus pais durante uns 4
meses, na rua da Guiné, uma transversal à Rua de Angola, muito citada nas
cartas do livro, e lembro-me de um bairro de pequenas vivendas de 2 andares
(nós morámos num primeiro andar) e que, no andar de baixo, onde eu vivia, haver uma miúda com a minha idade, com quem brincava no quintal que rodeava essa
vivenda, assim como me lembro da proximidade do comboio que apanhávamos para ir
ao centro de Coimbra, acompanhando a minha mãe às compras e para visitar os
meus avós paternos, que viviam junto à Sé Velha.
Foi pouco tempo, mas foram das minhas mais remotas memórias.
Cheguei a ir mais vezes a esse bairro, para visitar um grande amigo do meu
pai, o sr. Eurico Serra Caetano , pessoa e família de quem perdi o rasto depois
do falecimento do meu pai.
Pois é, o mundo é mesmo pequeno.
Mas, já agora, quem é o célebre Jó? Nada mais, nada menos, do que o
amigo de infância do Luís Pinheiro de Almeida, que tinha ficado no tal bairro
de Coimbra, o destinatário das cartas que o autor lhe enviava, a partir
de Lisboa, contando-lhe as novidades e as descobertas.
Foi o “Jó” que, tendo guardado religiosamente ao longo doa anos essas
cartas, permitiu que este delicioso livro se escrevesse.
Como diz o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no
prefácio ao livro, referindo-se ao seu amigo e autor Luís Pinheiro de Almeida, “admiro
essa tua maneira de não envelheceres. Encontrando nos Beatles uma forma de continuar
a sonhar com sonhavas há meio século…”.
Todos nós temos as nossas estratégias para encarar o envelhecimento. Recordar as “bandas sonoras” da nossa vida e os sonhos a elas associados, é uma delas.
1 comentário:
lindo, lindo, lindo! obrigado, camarada ephemerense, belíssimo texto e já estou em campo para saber do sr. eurico serra caetano.
abraço amigo,
luís pinheiro de almeida
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