Desesperadamente
procurando bodes expiatórios
Por Ana Sá Lopes
in Editorial do Público
de 1 de Julho de 2020
“Nunca, mas nunca, se
tinha visto Fernando Medina tão severo, tão rude, tão ríspido, tão
áspero. Foi na TVI24,
na segunda-feira à noite, e é uma peça política de inegável importância. Qual
foi o alvo relativamente ao qual Fernando Medina foi agreste de maneira nunca
antes vista? Foi o Governo, dirigido pelo seu pai político, António Costa, que
o escolheu para sucessor na CML.
“Ao pedir a cabeça das
“autoridades da saúde” por causa dos números de Lisboa, Medina está a pôr em
causa o seu Governo. Ele sabe-o, é inteligente, mas talvez não tão inteligente
como o homem de quem herdou a câmara: António Costa, esse, sim, o cúmulo
da sagacidade política, se houvesse cúmulo para isso. Ele que, antes desta
intervenção de Medina a pedir demissões na saúde, se irritou na
reunião do Infarmed da semana passada, pondo em causa a ministra
Marta Temido, que, de resto, não desmentiu a cena.
“Está António Costa,
com o apoio de Fernando Medina, a querer arranjar bodes expiatórios para o caso
dos números de Lisboa – um desastre
para aquele que outrora foi um país-modelo no combate à covid? A
oposição colaborante de Rui Rio já
identificou o problema: é Graça Freitas. Para Rio, não é Marta, é
Graça. Parece que se tem agora que arranjar um bode expiatório. Se não é dos
testes a mais, se não é da construção civil, se não é dos
transportes cheios, é da Marta (ou da Graça).
“As mulheres que
aguentaram os piores dias da pandemia que continuem a aguentar (ainda por cima,
já se sabe, são genericamente chatas e não percebem um avo de cerimónias
comemorativas da conquista da final da Champions, que obviamente
não se inclui naquilo que Fernando Medina tão bem criticou sobre sinais errados
do desconfinamento). Ah, Marta estava lá – a culpa é dela. Medina também, mas
isso não interessa.
“Fernando Medina não é
um comentador político qualquer. É presidente da Câmara de Lisboa, presidente
da Área Metropolitana de Lisboa, co-responsável pelo que se passa no terreno,
incluindo os maus números. Tem poder, a menos que o devolva nos momentos mais
infelizes, o que parece ser o caso.
“Não é bonito de se
ver. Quando a oposição foi tão saudada pela sua prestação durante a crise
epidémica – e, apesar de algum “desconfinamento”, não tem posto o governo em
causa –que seja o PS e alguns dos seus principais dirigentes a dar estes
tristes espectáculos, mete dó".
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