Quase todos os anos terminados em 9, nos últimos 100 anos, foram
marcados, ora pela esperança, ora pela tragédia, muitas vezes pela esperança que
conduz à tragédia.
0 ano de 1919 foi o primeiro de paz, após a tragédia da Primeira Guerra
e marcou muito do destino do resto do Século. Em Junho seria assinado o Tratado
de Versalhes que, ao mesmo tempo que reafirmava a desagregação dos Impérios
Centrais (Alemanha e Austria-Hungria) e do Império Otomano, esteve na origem,
pela humilhação imposta aos vencidos, do desenvolvimento do fascismo e do
nazismo. Em Portugal foi o ano da última grande tentativa de restauração da
Monarquia, que desencadeou a última guerra civil registada até hoje no país, iniciando a segunda etapa da Primeira República, após o breve
interregno sidonista.
Dramático foi o ano de 1929, encerrando uma década de esperança (os
“loucos anos 20”) com o crash das bolsas de Nova Iorque , repercutindo-se na
vida económica e social de todo o mundo e marcando o inicio do fim do
liberalismo democrático em muitos países, contribuindo para fortalecer os
regimes ditatoriais já existentes.
A Segunda Guerra, iniciada em 1939, foi a principal consequência da
conjugação do Tratado de Versalhes com a Crise de 1929, e fez desse ano um dos
mais trágicos do século, marcado igualmente pela vitória de Franco na Guerra
Civil de Espanha, uma das mais sanguinárias ditaduras de sempre e que conduziu
ao poder um dos ditadores mais
sanguinárias de sempre.
O ano de 1949 é considerado um ano crucial para o inicio da Guerra
Fria, com a União Soviética a testar a sua primeira bomba atómica, a criação da
NATO e a divisão definitiva da Alemanha com a fundação de dois estados, a RFA e
a RDA.
1959 começa com a vitória da Revolução Cubana, ao mesmo tempo que o
General De Gaulle tomava posse como primeiro presidente da Vª República
francesa, sem esquecer a criação da República Popular da China, acontecimentos
que iriam marcar toda a década.
1969 é um ano cheio de acontecimentos esperançosos, marcados pela
afirmação de uma nova geração, reflexo do Maio de 1968. É o ano da chegada do
homem à Lua e do Festival de Woodstock, um dos anos marcantes na contestação à
Guerra do Vietname. Por cá a agitação estudantil conhece um dos seus momentos
decisivos com a Crise Académica iniciada pelos estudantes de Coimbra e que irá
ter um papel importante na consciencialização da geração que vai estar por detrás do 25 de
Abril. Este ano também é marcado por alguma abertura do regime, liderado desde
o final do ano anterior por Marcelo Caetano, culminando nas eleições legislativas,
com a presença de três movimentos da oposição e a eleição da chamada ala
liberal.
1979 é outro ano cheio de acontecimentos marcantes. Desde logo o
afastamento do poder, pelo exército do Vitname, do sanguinário regime dos Khmer
Vermelhos, que provocará uma curta invasão do Vietname por parte da China. O
Khmer vermelhos sobrevivem na clandestinidade graças a uma aliança entre o
Ocidente e a China no apoio a esse grupo terrorista, uma das muitas
contradições da Guerra Fria. É também o ano da chegada ao poder no Irão dos
ayatollahs, com o conhecido episódio da invasão e ocupação da embaixada dos
Estados Unidos em Teerão. Na América Latina dá-se a tomada do poder dos
sandinistas na Nicarágua. Em África morre Agostinho Neto e o sanguinário
ditador do Uganda, Adi Amin, é derrubado. Ao mesmo tempo que a Grécia adere à
União Europeia, Margaret Thatcher é eleita a primeira mulher a dirigir um
governo britânico. Também em Portugal toma posse aquela que vai ser, até hoje,
a única mulher primeira-ministra, Maria de Lurdes Pintasilgo, num governo
provisório de cem dias, até à realização das eleições legislativas ganhas em
Dezembro por aquela que foi até hoje a mais importante aliança da direita
portuguesa, a Aliança Democrática liderada por Sá Carneiro. Foi ainda um ano
fundamental para a musica popular com o lançamento do álbum The Wall dos Pink
Floyd e London Calling dos the Clash, marcando este o auge do movimento punk.
Grandioso foi também o ano de 1989, o ano da queda do muro de Berlim.
Antes já o movimento “Solidariedade” tinha tomado o poder na Polónia. Animados
pelo fim do Muro e aproveitando o clima de abertura soviética, os regimes
comunistas começam a cair no leste europeu, com destaque para a Revolução de
Veludo na Checoslováquia e para a Revolução Romena. Nesse mesmo ano os
soviéticos começam a retirar do Afeganistão. Menos festiva foram as manifestações da praça de Tiananmen na
China, que terminaram num banho de sangue. Nesse mesmo ano morre o Ayatola Khomeini
e o pintor Salvador Dali.
1999 é o ano do nascimento do euro, mas em Portugal segue-se com emoção
a situação em Timor Leste , cujo povo decide a independência em referendo,
sofrendo a repressão violenta das forças indonésias, ao mesmo tempo que a China
recupera a soberania sobre Macau. Emocionante será igualmente o funeral de
Amália Rodrigues, que morre nesse ano. O ano é marcado nos Estados Unidos pelo
massacre de Columbine.
Finalmente o ano de 2009 foi aquele em que a crise financeira, iniciada no
ano anterior, começou a fazer sentir os seus efeitos um pouco por toda a Europa,
mas com principal incidência na Grécia, na Islândia, na Irlanda e em Portugal. Em
Portugal tomava posse o 2º governo de José Sócrates, de tão má memória. Foi
também o ano da primeira pandemia do século XXI, a Gripe A. Num ano que marcou
o inicio do fim do clima de confiança que se vivia na Europa desde a queda do
Muro de Berlim, 20 anos antes, existem dois momentos de esperança, remando
contra a maré, mas, à luz dos nossos dias, uma esperança apenas conjuntural:
a tomada de posse de Barack Obama, primeiro presidente negro eleito nos Estados
Unidos, e de José Mujica como presidente do Uruguai.
E chegamos a 2019, num clima de grande pessimismo sobre o futuro da
humanidade e da democracia, por via do crescimento incontrolado de movimentos
de extrema-direita, situação simbolicamente representada pela tomada de posse
de Bolsonaro no Brasil e do previsível crescimento dos movimentos antidemocráticos
nas eleições para o parlamento europeu que se disputam este ano, sem esquecer o
agravamento do holocausto ambiental.
Mais uma vez este ano terminado em 9 promete ser um ano que vai marcar
a História com H grande, como aconteceu com os seus “antecessores”do último
século.
Se o fará como tragédia ou num clima de esperança renovada, vai
depender um pouco de todos nós.
Um Bom Ano para todos, desejando que cada um revele o melhor de si
próprio, sem se deixar dominar pelo ódio e pela intolerância que parecem marcar cada
vez mais as sociedades actuais.
Sem comentários:
Enviar um comentário