Com raras e honrosas excepções, tem sido confrangedor ver,
ler e ouvir a reacção ao referendo britânico, da direita à esquerda, dentro da
Grã – Bretanha e na União Europeia, de comentadores e políticos.
Essas reacções revelam o clima de pânico e desorientação por
parte de uma geração de políticos e comentadores que sempre ignorou ou
esqueceu, por má-fé na maior parte das vezes, não só a história da Europa, como
os objectivos da criação da União
Europeia.
Enredados que andam nos seus negócios com o corrupto poder
financeiro que representam, e em proteger a sua carreira e a dos amigos, não se
aperceberam da tempestade que se aproximava como consequência das suas
políticas e das suas decisões financeiras e políticas.
Agora colocaram-nos a todos à beira do abismo, mas claro, no
fundo no fundo, também nada farão, a não ser o recurso à retórica habitual,
porque sabem que o seu futuro e o dos seus próximos está garantido, na
administração de um banco, de uma grande multinacional ou de uma empresa
pública, mesmo que a catástrofe se abata sobre a generalidade dos cidadãos
europeus.
Essa gente, à frente dos destinos da Europa, não oferece
qualquer confiança ou credibilidade para dirigir as reformas profundas de que a
União Europeia precisa para se salvar.
O “Brexit” foi apenas uma consequência de decisões e
atitudes que esses burocratas, assessorados pelos seus gobelzinhos da
comunicação social, têm vindo a tomar aos longo das duas últimas décadas,
situação que se agravou desde que Durão Barroso foi nomeado para dirigir a
Comissão Europeia ou desde que o euro foi introduzido, de forma apressada e
mal-amanhada.
Também foi essa gente que legitimou o discurso xenófobo e
ultranacionalista que esteve por detrás da campanha do “Brexit”, ao incluírem
na acção governativa própria, muitas das “preocupações” da extrema-direita, por
puro oportunismo político e eleitoral, ou quando “deram” a Cameron, de forma
cobarde e vergonhosa, um acordo que absorvia tudo o que os xenófobos britânicos
pretendiam.
Como se viu, esta última manobra manhosa dos líderes
europeus para “salvarem” o referendo não resultou, o que nos devia levar a
pensar que o “Brexit” afinal não venceu por causa do discurso xenófobo dos
defensores da saída, já que, o que eles pretendiam , tinha sido dado de bandeja
pelos burocratas de Bruxelas, mas principalmente porque funcionou aqui um
grande sentimento de revolta contra medidas de austeridade e anti-socias que
destruíram a sociedade britânica e que tinha, na União Europeia, o principal
bode expiatório, por via da cobardia dos políticos britânicos.
Por sua vez, as ameaças e a arrogância do costume, usadas
pelos burocratas do “politburo” de Bruxelas, terão também funcionado ao
contrário, reforçando o voto de protesto.
Ainda mais vergonhosas têm sido as análise “sociológicas” de
taberna usadas por alguns, onde vêem, de um lado, os “puros” europeus, defensores da
permanência, os “jovens”, os “instruídos”, os “cosmopolitas” e, do outro, do
lado do “mal” e da saída, os “velhos” ,
os “incultos” e os “rurais”.
É uma simplificação que mostra que nada perceberam do que
aconteceu, mas que, mais grave ainda, mostra que nada vão mudar e vão mesmo
conduzir a União Europeia para o desastre.
Foi essa técnica de dividir para reinar que o “politburo” de
Bruxelas usou para impor a sua austeridade, para destruir o Estado Social e
para tirar os direitos de quem trabalha, lançando desempregados contra
trabalhadores, precários contra os que têm emprego garantido, quem recebe
salários de miséria contra quem recebe salários justos, trabalhadores do
público contra trabalhadores do privado, abrindo assim caminho ao populismo e à
extrema-direita.
Os que agora tentam “salvar” a Europa pelo mínimo,
justificando-a como um projecto de “paz” , à preservação da qual tudo se deve submeter e justificar, como a
perda de direitos sociais, aumento do desemprego e da precariedade e aumento das desigualdades, esquecem-se,
por um lado, que essa paz só foi preservada graças à inclusão dos direitos
socias como bandeira da construção europeia e, por outro, à existência de uma
NATO e da coexistência pacífica entre “leste e oeste”.
Aliás, o que aconteceu após o fim da União Soviética, nada
abona a favor da capacidade das lideranças europeias em preservar esse projecto
de paz, pois, em grande parte por iniciativa ou inércia de alguns países da
União Europeia, a Europa conheceu nos últimos anos duas terríveis guerras no
seu solo, na ex-jugoslávia e, recentemente na Ucrânia, sem esquecer a
responsabilidade das políticas externas do “politburo” de Bruxelas nas guerras do
Iraque,da Líbia e da Síria, com as consequências que agora estão a atingir
gravemente a Europa através do drama dos refugiados, sem que esses líderes se
entendam na resolução desses problemas para a paz europeia.
O generoso projecto da União Europeia precisa urgentemente
de se renovar, pegando no seu projecto fundador: mais democracia, mais
liberdade, mais cidadania, mais igualdade, mais desenvolvimento, mais
subsidiariedade, mais inovação, mais respeito pelas identidades e pelos
cidadãos.
São necessárias verdadeiras “reformas estruturais” , não
aquelas que apregoam e executam os burocratas do “politburo” de Bruxelas, que
estendem essas reformas como mais cortes salariais e nas pensões, nos direitos
socias, com destruição do Estado Social e aumento de impostos aos cidadãos para
salvar o sector financeiro, os seus privilégios, em nome dos “mercados” que
eles temem, mas nos quais participam como executantes, gestores ou accionistas.
Com “Brexit” ou sem “Brexit” esta Europa já estava condenada
e só se pode salvar com a democratização das instituições, com um verdadeiro
combate à corrupção, com harmonização fiscal, com o fim dos paraísos fiscais no
seio do espaço Europeu, com o combate ao dumping social e político praticado à
sombra da “Globalização” e na criação de condições para melhorar o bem-estar
dos seus cidadãos.
Tudo isto é o contrário do que fazem e defendem as actuais
lideranças do “politburo” de Bruxelas e por isso o “Brexit” é apenas mais um
momento nesta caminhada de autodestruição do projecto Europeu.
Espero estar
enganado.
2 comentários:
Não! Não me parece que estejas enganado!
..infelizmente. O Juncker já começou hoje a dar espectáculo...triste..
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