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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Ucrânia : Venha o Diabo e escolha...


A violência generalizada que se vive nas ruas de Kiev não abona nada a favor da oposição ucraniana.

Infiltrada por grupos nacionalistas de extrema-direita, a oposição ucraniana, ao não se demarcar das atitudes violentas desses grupos, que incluiu, nas últimas semanas, violência contra judeus, denunciada pela comunidade judaica local, perde a razão que tinha no início da crise política.

Claro que, do outro lado temos um governo autoritário, corrupto, que não respeita a vontade da grande parte da população em escapar à influência russa e de se aproximar dos níveis de vida ocidentais….mas onde é que já vimos isto?

Se a Rússia, liderada pelo pouco recomendável sr. Putin, joga na crise ucraniana a sua tentativa de recuperar a influência que detinha nos tempos da União Soviética, a atitude da União Europeia resvala a pura hipocrisia.

Antes de se preocupar com o autoritarismo do poder ucraniano, a União Europeia tem muito para se preocupar no seu próprio seio, não sendo muito diferente aquilo que se passa no governo ucraniano de aquilo que se passa em países do leste europeu integrados na EU, como é ocaso da Hungria.

Ao incentivar a revolta da oposição ucraniana contra o governo, que apesar de autoritário e corrupto foi legitimado por eleições livres, os líderes da UE deviam primeiro explicar como é que se podem substituir  à influência económica russa  na Ucrânia, quando não conseguem apoia convenientemente países da própria União em dificuldade, como Portugal, Espanha, Itália, Grécia, Chipre…

Foi em grande parte a esperança de um apoio concreto por parte da União Europeia aos seus protestos que incentivou os ucranianos a aumentar os actos de violência generalizada a que estamos a assistir, apoio esse que irá pouco além da retórica habitual.

E quanto às malfeitorias de um governo, como o ucraniano,  legitimamente eleito, mas tomando decisões contra o seu próprio povo, pela violência policial contra ao protestos legítimos, pelo desrespeito em relação ao bem-estar económico-social dos seus cidadãos, pela violação de promessas e programas eleitorais pelos quais foram eleitos, tomando todas essas decisões nas costas dos cidadãos, a União Europeia não tem muita legitimidade para criticar, pois esse tipo de decisões é o pão nosso de cada dia, como bem o sabem os cidadãos portugueses, irlandeses, espanhóis, franceses, italianos, gregos e chipriotas, entre outros.

O que está em causa, na crise ucraniana, não é uma luta entre o “bem” (os pró-europeus) e o “mal” (os pró-russos), mas é mais uma vez o desenterrar de velhos conflitos e jogos de poder que têm marcado a história do centro da Europa.

A Ucrânia, na sua história recente, esteve quase sempre do lado errado da história. Muitos ucranianos participaram no “Holodomor”, o genocídio stalinista contra os camponeses daquele país na década de 30, através de uma desastrosa política de colectivização forçada que provocou a morte pela fome de milhões de ucranianos, ao mesmo tempo que 4/5 das elites ucranianas eram massacradas por Stalin.

Quando da invasão nazi, em 1941, outros ucranianos, que receberam as forças hitlerianas com “libertadoras”, colaboraram alegremente com os nazis  na repressão sobre a população de origem russa e outras minorias, que custou entre 5 a 8 milhões de mortos, entre os quais  meio milhão de judeus.

A memória desses tempos, o peso da influência russa, a maior minoria que representa quase 20% da sua população e a atitude irresponsável dos dois lados, Rússia e União Europeia,  pode provocar uma tragédia de grandes dimensões no centro da Europa, uma espécie de Jugoslávia em ponto grande.

No actual conflito é caso para dizer…venha o diabo e escolha.

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