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quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Eleições Legislativas 2022 – uma análise

(fonte: Público)

Em 15 eleições legislativas, realizadas desde 1976, e uma constituinte, em 1975, só duas foram tão imprevisíveis como esta, e tão dramaticamente disputadas, as constituintes de 1975 e as legislativas de 1980.

A imprevisibilidade é grande e o que está em jogo é ainda maior.

Está a jogo o uso do ultimo grande pacote de investimento nacional, o célebre Plano de Recuperação e Resiliência, que pode condicionar o futuro económico e social do país nas próximas décadas.

O resultado final não é indiferente ao uso que se vai dar a esses fundos.

Existem três hipóteses:

- usar esses fundos para profundas e verdadeiras mudanças e investimentos estruturais na educação, na saúde, na habitação, nos transportes públicos (nomeadamente na renovação da ferrovia e na actividade portuária), no ambiente, nas energias renováveis, na planificação florestal e  na exploração  da nossa grande Zona Económica Exclusiva no Oceano Atlântico, com todas as aposta tecnológicas e de investigação que essas medidas exigem;

- repetir os erros do cavaquismo, agravados pelo socratismo e pelo passos coelhismo, de entregar o ouro o bandido, isto é, aos grandes interesses financeiros e às grandes empresas lideradas pelos boys do centrão, e aos lobbies do betão e do turismo de massas;

- gerir esses fundos “conciliando” os dois caminhos anteriores, uma situação que nos irá manter com os atrasos estruturais de sempre, mas agradando a alguns sectores, mantendo assim o status quo do regime do centrão, e dando uma falsa ilusão de “crescimento” económico, baseado no consumismo, o que garantirá a paz social.

A juntar a essas opções que estão em jogo, temos a necessidade de continuar a combater a pandemia e as suas consequências, provavelmente por muitos anos, pelo menos por mais tempo que uma legislatura.

Não é por isso indiferente o tipo de governação a sair do resultado destas eleições.

Mesmo que só existam dois partidos que as possam ganhar, o PS e o PSD, também não é indiferente a relação de forças que se venha a gerar, quer à esquerda, quer à direita desses partidos, quer o tipo de coligações e negociações políticas para formar um governo que será, para já a única certeza existente, um governo minoritário.

O regresso ao centrão é o pior que nos pode acontecer, levando-nos à segunda hipótese acima indicada, principalmente se for o PSD a liderar, ou à terceira, se esse centrão vier a ser liderado pelo PS.

A primeira hipótese só será viável com o PS a liderar, mas aliando-se à sua esquerda, já que o actual PSD, o mais centrista em muitos anos, não garante que não volte a acontecer o que sempre aconteceu, o “síndroma de Marcelo, o Caetano”.

O que é esse “síndroma”? Parte de uma anedota que se contava acerca do último ditador do Estado Novo. Dizia-se que Marcelo Caetano era o condutor mais perigoso do país, porque fazia sinal à esquerda e virava à direita. O PSD apresenta-se quase sempre em campanha eleitoral (menos com Cavaco Silva e Passos Coelho) com um programa social-democrata, mas acaba a governar com um programa antissocial, de cortes nos sectores sociais, de tipo neoliberal e em beneficio do sector financeiro e das grandes empresas.

À direita do PSD também não será indiferente quem se apresentará em condições para condicionar o PSD.

O CDS, partido que luta pela sua sobrevivência, é o único, dos partidos à direita do PSD, que tem preocupações socias, já que tem uma forte tradição democrata-cristã, recordando-se, aliás, que, se Passos Coelho não foi ainda mais “além da Troika”, destruindo ainda mais o sector social, tal se deveu à forma como o CDS conseguiu travar essa pretensão.

Já o Iniciativa Liberal, se surgir como principal partido à direita do PSD, pressionará este partido a continuar, com mais convicção e firmeza, a “ir ainda muito mais além da Troika”, entregando todo o ouro ao” bandido”.

O CHEGA é outra história, que não entra nesta equação, mas, se surgir como segunda força de direita, pode fazer estragos, a prazo, na direita democrática.

À esquerda, espera-se que o BE e o PCP aprendam a lição por terem insistido em continuarem presos velhos dogmas e, por preconceito ideológico e/ou tacticismo, continuarem numa senda de irresponsabilidade política, inviabilizando a concretização da única hipótese válida na utilização de fundos, que é a primeira que indicámos.

A única hipótese de o PS não optar pelo centrão e seguir o caminho da segunda e terceira hipótese que apontamos para desenvolver o país e utilizar correctamente os fundos do PRR, é  um fortalecimento do LIVRE e do PAN, de forma a viabilizar um governo do PS mais social, menos virado para as negociatas de tipo socrático ou “centralista”, havendo já alguns sectores do PS à espreta e a esfregar as mãos para prepara o uso desses fundos em proveito da sua clientela, num grande bloco central.

E é esperar que, quer o BE, quer o PCP, se abram às novas necessidades de desenvolvimento sustentável que a aplicação desses fundos pode representar. Pode ser, contudo, que um resultado que os castigue os obrigue a rever posições e opções, podendo entra na primeira equação que indicamos, até porque, mais o PCP que o BE, são partidos que continuam a ser necessários, no mínimo para vigiarem o uso desses fundos e para defenderem os sectores mais fracos dos excessos que mau uso desses fundos possam provocar na sociedade e no mundo do trabalho.

Mais do que nunca, nestas eleições joga-se o rumo do país para as próximas décadas.

 

 

 

 

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