30 de Julho de 1991.
De manhã, ainda antes de apanharmos o avião para Leninegrado, fazemos
ainda uma última visita por Minsk.
Vistamos um museu de pintura com obras de vários pintores russos desde o
século XVIII ao início do século XIX, e com uma sala dedicada à exposição dos
célebres ícones ortodoxos.
Á tarde partimos para o aeroporto para apanhar o avião para Leninegrado,
ou S. Petersburgo como começa a ser designada por aqui, onde chagámos após uma
viagem tranquila.
Por aquilo que deu para ver na viagem de autocarro do aeroporto até ao
hotel, esta parece ser uma bela cidade.
Leninegrado é formada por várias ilhas de uma espécie de delta do rio
Neva, entrada do Báltico. Parecendo que não, um rio dá outra graça a uma
cidade.
Antiga capital do Império, ex- S. Petersburgo, ex-Petrogrado, passou a
chamar-se Leninegrado depois da revolução de Outubro (ou Novembro no nosso
calendário), e foi aqui que ocorreram os principais acontecimentos históricos
desse período, antes de Moscovo se ter tornado a capital.
Tem cerca de 6 milhões de habitantes.
S. Petersburgo foi fundada por Pedro o Grande em 1703 e foi
a capital do Império até 1918. O imperador tentou imitar na cidade o estilo de
Amesterdão, embora muita gente compare a cidade com Veneza.
O Nosso Hotel fica na “ilha” de São Basílio, umas das 42 ilhas que formam
Leninegrado. Para ligar essas ilhas existem cerca de 600 pontes. Existem
igualmente na cidade cerca de 60 canais e afluentes do delta do rio Neva.
Com já era tarde, ficámos pela zona do Hotel, esta noite dei um passeio a
pé aos arredores do Hotel, que tem em frente o rio Neva e do outro lado a zona
histórica, vendo-se o Hermitage.
Às 22.30 ainda é quase de dia, e via-se a claridade no horizonte.
Dizem-me que há um mês a atrás o Sol quase não se punha por estas bandas.
No dia 31 de Julho iniciámos o dia com uma visita geral por Leninegrado, começando pelas célebres colunas dos almirantado, na ilha do nosso hotel, guiados pelo Dima, que tem sido o nosso guia desde o primeiro dia, mas que
conhece bem esta cidade, pois habita aqui.
O Dima tem 31 anos, é casado e tem um filho. Já lhe dei algumas cassetes
de musica que levava e duas camisolas. Em troca ele prometeu-me uma boa garrafa
de vodka.
Durante a visita parámos para tirar fotografias e passear por vários
locais, como a chamada Catedral do sangue Derramado, construída junto do lugar
onde o czar Alexandre II foi assassinado em 1881, uma catedral ortodoxa com as
célebres cúpulas em “cebola”.
Visitámos de seguida a Igreja da “Resina”, assim chamada porque era junto
dela que ficavam as fábricas de resina, simbolo da expansão marítima no Báltico
iniciada por Pedro o Grande.
Estivemos depois na “Laura” de Leninegrado, ou Convento Smolny, o título mais importante para
uma igreja ortodoxa, talvez o equivalente às nossas catedrais. Na União
Soviética só existem duas Igrejas com este título, esta e outra em Kiev, que
vistámos quando lá estivemos.
Tempo ainda para visitar uma espécie de feira da ladra, o equivalente
local à Rua Arbat de Moscovo, onde muitos jovens vendem artesanato e obras de
arte.
Leninegrado é uma cidade muito mais ocidentalizada, onde as pessoas
vestem melhor e parecem mais arejadas do que nas cidades que já visitámos.
Existem mais produtos e em maior variedade à venda e não se vêm as grandes
filas nas lojas com vimos noutras cidades.
Ainda durante a manhã visitámos o Couraçado Aurora, que deu o sinal para
a Revolução Russa, tendo combatido na Guerra contra o Japão, e nas duas Guerras
Mundiais.
À tarde visitámos o Museu Lenine, que expõe escritos originais e
vestuário daquele líder, assim como mobílias originais da sua casa.
Seguimos então numa viagem em Hovercraf pelo golfo da Finlândia até ao
Palácio de Verão de Pedro o Grande, "Peterhof", o “Versalhes russo” fundado em 1705, numa
viagem que levou cerca de meia-hora, a alta velocidade. Este lugar fica apenas
a 50 quilómetros da Finlândia, o lugar mais a norte onde estive até então.
Do palácio sobressaem as grandes cúpulas douradas e os grandes jardins,
por onde estão espalhadas várias estátuas douradas, sendo os seus repuxos a
grande atracção. Um espaço muito bonito mas que estava todo em obras de
restauro.
Regessámos de autocarro ao nosso Hotel.
À noite fui dar uma volta pelos arredores do Hotel e descobri, a cerca de
cinco minutos a pé, um Hotel flutuante com bar pago em dólares, onde se podia
ouvir jazz, com um pátio ao ar livre com vista para o Neva e de onde vimos sair
o famoso navio Odessa. Este bar é muito frequentado por finlandeses, e por isso
as indicações estão em russo e finlandês.
À noite a televisão do nosso Hotel fartou-se da dar reportagens da visita
de George Bush a Moscovo, para uma cimeira com Gorbatchev. Pelo meio vídeos
musicais, como o célebre tema de Sting “The Russian Love her children too”. No intervalo das reportagens sobre a visita, vão passando vários vídeo-clips sobre
a América e a Rússia.
Manhã de 1 de Agosto de 1991.
A manhã é para vistar o Hermitage, o museu mais famoso da Rússia, situado
no antigo Palácio de Inverno, um palácio construído na segunda metade do século
XVIII, de tilo barroco.
É um edifício quase mítico, cujo
assalto, imortalizado nas cenas do filme Outubro de Eisenstein, foi um dos
momentos da história mitificada da revolução Russa ( ao que parece esse assalto
não aconteceu na realidade, pelo menos nos moldes épicos do filme).
Muitas cenas desse filme foram filmadas nos imensos corredores e nas imensas salas e escadarias deste palácio,
hoje museu.
No museu do Hermitage visitei apenas algumas salas, pois, como no do
Louvre, é impossível visitar tudo de uma vez.
As salas mais importantes que visitei foram as dedicadas aos impressionistas e modernistas , onde se encontram alguns dos quadros mais
famosos dessas correntes e outras anteriores. Picasso e Matisse tinham duas
salas cada um. Cezanne tinha uma sala e Gauguin outra. Por outras salas encontravam-se igualmente várias obras de Delacroix, Renoir, Van Gogh, Degas e
tantos outros. Entre estes o célebre quadro de Delacroix, símbolo da Revolução
Francesa.
A tarde foi livre. Houve quem aproveitasse para regressar ao Hermitage.
Eu preferi ir deambular pelas ruas de Leninegrado.
Atravessei a grande praça que enquadra o palácio de inverno e fui até à
rua mais movimentada e famosa, a “Perspectiva Nevsky”. Uma enorme multidão
corre pelos dois lados desta enorme avenida, a perder de extensão, atravessada
por vários braços do rio e com edifícios monumentais de ambos os lados. A
Avenida está cheia de lojas de todo o género.
Almocei nesta avenida num pequeno café, um café com leite, um pastel de
carne e dois bolos…foi o meu almoço.
Aí a meio da avenida encontrei um grande armazém, uma espécie de centro
comercial, que percorri nos seus dois andares. É muito maior que o GUM de
Moscovo, com muita variedade de produtos, predominando o vestuário e calçado.
Comprei uma mala e tive vontade de comprar mais coisas, pois para mim os preços
são muito baixos, mas tive de resistir, porque já tenho a mala muito cheia.
Não cheguei ai fim da rua, voltando para trás, porque estava na hora de
regressar ao hotel.
Agora em sentido contrário, encontrei muitas livrarias, tendo entrado em
três, onde comprei um pequeno livro com mapas da União Soviética e uma colecção
de gravuras. Tive de resistir a comprar mais coisas, como catálogos sobre
pintores, porque o formato era muito grande, mas os preços eram muito baratos.
As livrarias tinham milhares de livros, mas tudo em russo.
Encontrando-me novamente junto ao Ermitage, caiu uma chuva torrencial,
durante uns 15 minutos. O tempo aqui tem estado muito quente, acima dos 30
graus. Quando acabou de chover era uma sensação estranha sentir o calor que
estava e a àgua da chuva que se evaporava rapidamente com o calor.
Daí até ao hotel levei mais uma hora, atravessando a grande ponte frente
ao Ermitage e deslocando-me pela margem do rio Neva., do lado contrário do
museu.
Cheguei estourado ao hotel, mas ainda fui ao bar da noite anterios.
Amanhã, depois de uma última vista à cidade, partimos para Moscovo.
2 de Agosto.
Último dia em Leninegrado.
De manhã visitámos a fortaleza de Pedro e Paulo, construída por Pedro o
Grande, e que foi uma prisão. Aí existe uma Igreja, espécie de penteão, onde
estão sepultados os czares mais famosos, como Pedro o Grande, Catarina I e
Catarina II, entre outros.
Estava patente ao público uma exposição sobre a dinastia dos Romanov,
derrubada pela Revolução.
Por aqui nota-se algum saudosismo em relação aos czares, pois Leninegrado
era a cidade do czares, uma forma de contestar o poder soviético, representado
pelo poder central de Moscovo. Entre Leninegrado e Moscovo existe uma grande
rivalidade, acima das querelas políticas, um pouco como entre o Porto e Lisboa
ou Madrid e Barcelona.
De tarde tivemos duas horas livres. O autocarro deixou-nos a meio da
Avenida Nevsky, perto do lugar onde tinha ficado ontem. Aproveitei para
percorre a outra metade dessa avenida que não tinha conseguido visitar na
véspera. Mesmo assim a avenida é tão grande que não consegui chegar ao fim.
Nesta avenida há muita gente a vender sorvetes, fruta, pepsi-cola,
jornais, livros….
Esta avenida é um autêntico formigueiro, como a Baixa de Lisboa à hora de
ponta, mas deve ter muito mais que o triplo de extensão desta.
Os prédios são muito bonitos, construídos quase todos depois da segunda
Guerra, pois Leninegrado esteve mais de 900 dias cercada pelos nazis,
conseguindo resistir-lhes, tendo parado aí o avanço das tropas de Hitler.
No regresso assisti a um meeting numa passagem subterrânea para peões. Um
homem dizia frases em forma de poema ou teatral, que percebi serem referências
à situação politica actual, e depois tocava baladas de intervenção acompanhado
por uma guitarra. Estava muita gente a assistir e as reacções eram positivas,
alguns riam com as graças, mas eu não percebi o que ele dizia.
Voltei ao armazém que tinha visitado na véspera e comprei um boné “à
Lenine” que me custou 14 rublos (cerca de 70 escudos […menos de meio euro].
Regressei à camioneta que nos aguardava no sitio combinado.
Ainda fomos visitar o Palácio de Verão de Pedro o Grande, muito diferente
dos outros que vistámos. O palácio parece uma pequena vivenda rodeada de um
jardim, com uma vista para o Neva.O anterior está mobilado como o deixou Pedro
o Grande.
Jantámos ainda no Hotel e partimos então para a estação de comboio, para
voltarmos a Moscovo.
De facto, S.Petersburgo é a designação mais adequada para a cidade de Pedro o Grande. A sua memória está por todo o lado.
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