Ficou na memória de uma geração, mesmo na daqueles que não o viveram, ou
só souberam da sua existência anos depois, o que aconteceu naqueles dias a meio
de Agosto de 1969, perto da pequena cidade de Bethel, numa desconhecida quinta
de criação de gado.
Foi entre os dias 15 e 18 de Agosto de 1969 que teve lugar um dos
momentos mais importantes da geração de 60 e da história da musica rock, o
incorrectamente chamado Festival de “Woodstock”.
Anunciado para uma localidade próxima do município de Woodstock, esse
festival de musica esteve quase condenado ao fracasso ou a ser apenas mais um
festival de musica entre tantos que se realizaram por essa época em vários
locais dos Estados Unidos.
Anunciada a sua realização durante semanas em páginas de jornais, e já
com milhares de ingressos vendidos, à última da hora os habitantes da
conservadora cidade de Woodstock, sede do município da localidade de Walkill
para onde estava programada a realização do festival, conseguiu forçara as
autoridades locais a proibirem o evento, porque não queriam ver o sossego
provinciano da sua terra a ser abalado por hippies e jovens contestatários da
guerra do Vietname.
Os organizadores, liderados pelo visionário Michel Lang, tiveram de
encontrar um outro local para o festival, já não indo a tempo de tirar a
referência de Woodstock dos cartazes.
Graças ao “inconsciente” criador de gado Max Yasgur, acabaram por
montar o palco e o arraial do festival, apressadamente, na quinta deste, perto
da cidade de Bethel, no Estado de Nova Iorque, a 70 Quilómetros de Woodstock.
(uma das imagens icónicas do festival e os mesmos 40 anos depois)
Foi assim que Woodstock foi injustamente imortalizada como falsa sede
do evento, enquanto a pequena cidade de Bethel, onde o festival de facto se
organizou, acabou no esquecimento.
Ao contrário das expectativas iniciais, em vez dos 200 mil espectadores
previstos, surgiram de todo o lado cerca de meio milhão de jovens para
assistirem ao festiva, a maioria sem bilhete.
Alguns tinham adquirido o ingresso para três dias por 18 dólares, 24 dólares se
comprado no local (8 dólares um diário), mas rapidamente a organização, para evitar o caos, teve de
abrir as portas do recinto a todos os que apareciam, transformando o concerto
num festival gratuito.
Apesar do caos, dos vários imprevistos, da quantidade de gente, da
falta de tudo, alimentos, àgua, sanitários, do mau tempo que se abateu sobre o
local, pelo menos por duas vezes, dos engarrafamentos monstruosos, apenas se
registaram duas mortes (4 segundo outras versões).
A abertura do festival, na 6ª feira 15 de Agosto, coube a Richie
Heavens, embora o previsto fosse que esse momento coubesse aos SweetWater, que
não conseguiram chegar a tempo, retidos pela policia numa operação stop e no
trânsito infernal de ligação ao festival.
Nesse mesmo dia actuaram, entre outros, Ravi Shankar, Melanie, Arlo
Guthrie e Joan Baez, esta grávida de 6 meses.
No Sábado 16 de Agosto a abertura coube ao quase desconhecido Country
Joe McDonald, que também abriu esse dia contra a que estava programado, pois
eram os Santana que deviam iniciar a actuação do 2º dia, mas que não estavam
preparados para a sua actuação.
Além de Country Joe e de Carlos Santana, actuaram nesse dia os Canned
Heat, os Greatful Dead, os Credence Clearwater Revivel, Janis Joplin e os The
WHo.
Estes últimos começaram a actuar já pelas 4 horas da madrugada de
Domingo, tocando 25 temas, actuando os Jefferson Airplane, que encerravam o 2º
dia, já no inicio da manha do terceiro
dia.
O último dia do Festival, Domingo 17 de Agosto, ficou marcado pelo forte
temporal que se abateu sobre o recinto após a actuação de abertura de Joe
Cocker, interrompendo-se o concerto por 3 horas, após o qual se retomou o
alinhamento.
Actuaram antão, novamente, Country Joe McDonald, e, entre outros, os Tem
Years After, os The Band, Johnny Winter, Blood Swett & Tears e, um dos
momentos altos, os Crosby, Still & Nash, que passaram a crescentar Neil
Young, que aí iniciou uma curta ligação ao grupo.
Também actuaram na sessão de encerramento os Paul Butterfield Blues
Band e Jim Hendrix.
Quando Jimi Hendrix subiu ao palco já era a madrugada da 2ª feira de 18
de Agosto e já muita gente se tinha ido embora, restando apenas 30 mil
espectadores, que assistiram a uma das mais icónicas, e também a uma das
últimas aparições daquele talentoso guitarrista.
Apesar da fama do Festival, e apesar dos convites, este não contou com
a presença de algumas das mais importantes bandas ou cantores do momento, uns
por impedimento de calendário, como aconteceu com Simon & Garfunkel, a
gravar um álbum novo, os Chicago, os Moody Blues, com espectáculo em Paris, os
Rolling Stones (Mick Jagger estava na Austrália) e os Procol Harum, a recuperar
de uma cansativa digressão.
Os Beatles não compareceram porque estavam e digerir conflitos
internos, não actuando há 3 anos, os The Doors porque desvalorizaram o evento,
arrependendo-se depois, apesar do seu baterista, John Densemore, ter estado no
festival a acompanhado Joe Cocker na sua actuação.
Sem razões conhecidas, também não actuaram, apesar de convidados, os
Led Zeppellin, os Jethro Tull, os The Byrds, Frank Zappa e os Free.
Mas a maior desilusão foi a não comparência de Bob Dylan, que vivia em
Woodstock, e que preferiu apostar no Festival da Ilha de Wight, marcado para o
final desse mês.
Um dos casos mais paradigmático, entre as ausências, foi o de Joni
Mitchel que, desejando ir, foi impedida pelo seu empresário. Seguiu com
entusiasmo o festival pela televisão e através das descrições do seu namorado
da altura, Graham Nash, dos Crosby, Still & Nash, ficando-se a dever a ela
aquela que se tornou a canção-hino do Festival, “Woodstock”, escrita em casa
enquanto acompanhava o acontecimento à distância, canção essa que, apesar de
nunca ter sido tocada no festival, muito contribuiu para divulgar o evento.
Essa canção foi gravada por Joni Mitchell e incluída num álbum seu de 1970, mas
tornou-se mais conhecida pela interpretação que dela fizeram os Crosby, Still,
Nash & Young no álbum do mesmo ano “Dejá Vu”.
O mayor de Bethel perdeu as eleições no final de 1969 por causa de ter
deixado que o festival se tivesse realizado no seu município e, durante anos,
este tipo de festivais esteve proibido naquela localidade, o mesmo acontecendo
com Woodstock que, mais tarde , se aproveitou da fama que não lhe era devida.
O festival de “Woodstock” deu origem a um dos mais importantes
documentários de sempre, realizado por Michael Wadleight e que teve na produção
um então ilustre desconhecido…Martin Scorsese, e que venceu o Óscar para melhor
documentário.
Deu ainda origem a dois álbuns em vinil, um triplo e outro duplo, hoje
disputados no mercado de raridades.
“Woodstock” conseguiu fazer a síntese e a transição entre a musica
popular dos anos 60 e os novos caminhos do rock dos anos 70.
Aí se cruzaram o “latin rock” de Santana com o “rock blues” dos Tem Years After, o “rock
psicadélico” dos Grateful Dead, com o “proteste Song” de Joan Baez, ou o “Pop
inglês” dos The Who com o “country rock” dos Crosby Still, Nash & Young.
Nunca mais nenhum festival conseguiu a força mítica de “Woodstock”,
talvez apenas o “Live Aid” em 1985, que revelou a mesma força e o mesmo poder
de sintetizar uma época.
(cartaz do concerto comemorativo do 50º aniversário de "Woodstock" programado para este mês)
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