Fixem esta data: Dia 25 de Outubro de 2021.
Este foi o dia em que a esquerda portuguesa fez haraquíri.
A história do suicídio da “esquerda” portuguesa não começa hoje.
Começou quando, no início desta legislatura, o PS resolveu dificultar
um acordo escrito com, pelo menos, um dos partidos à sua esquerda, jogando no
medo destes em serem penalizados por não deixarem passar orçamentos pouco
ambiciosos, do ponto de vista social, e com medo de confrontar os burocratas de
Bruxelas.
Ficou evidente que esta legislatura não chegaria ao fim quando o BE
resolveu colocar-se ao lado da direita para votar contra o anterior orçamento.
O PCP cedeu então na abstenção, convencido que iriam ser cumpridas algumas
das medidas com ele negociadas, mas que o governo se foi “esquecendo” pelo
caminho, ficando por cumprir muto desse orçamento.
Em relação a este orçamento para 2022, já se percebia que havia um impasse e uma
desconfiança mútua entre os partidos da esquerda, situação que culminou na
confirmação de que este orçamento não vai passar com os votos à sua esquerda.
A catadupa de medidas apressadas, apresentadas nos últimos dias pelo
PS, para tentar agradar à sua esquerda, mais não eram do que o início da
campanha eleitoral, por parte desse partido, para entalar os partidos à sua
esquerda, que ficam com o ónus de derrubarem o governo mais à esquerda que
tivemos desde o 25 de Abril.
Claro que, pelo meio, estava o desejo de alguns sectores do PS, a
tralha socrática, com o incendiário Carlos César à cabeça, de controlar a “BazuKa”
e de beneficiar, com esta, as suas habituais clientelas .
Mas, à esquerda, havia sempre a possibilidade da abstenção, quanto
a mim a única forma de saírem “airosos” desta situação.
Agora, mesmo que possam ter razão nas críticas ou em sentirem-se
enganados, os partidos à esquerda do PS vão ficar com o ónus, entre a maior
parte do eleitorado de esquerda, de terem optado por uma situação bem pior que
é a que vai resultar do chumbo deste orçamento.
Existem 3 alternativas, todas piores para a esquerda, para os
trabalhadores, para os pensionistas e para os cidadãos comuns em geral.
A primeira alternativa é as eleições darem um resultado ainda mais
complexo de ingovernabilidade, mas favorável ao malfadado centrão das
negociatas e da corrupção, com capacidade de desbaratar, a seu favor e da sua
clientela habitual, os fundos da “Bazuka”.
A outra alternativa é um PS com maioria absoluta, igualmente marcando o
regresso da tralha socrática, das negociatas e da corrupção, igualmente com
capacidade de desbaratar a favor da sua clientela os fundos da “Bazuka".
A terceira alternativa é o regresso da direita “além-da-Troika”,
revanchista, desejosa de retomar as medidas antissociais que foram
interrompidas pelo primeiro governo de Costa, a direita das negociatas e da corrupção,
desbaratando os fundos da “Bazuka”, desta vez apenas a favor do poder
financeiro e das grandes empresas, pois o que temos à direita não é, nem o PSD
liberal, a roçar alguns princípios da social-democracia, do tempo de Sá
Carneiro, nem o CDS, democrata-cristão, com preocupações sociais, do tempo de
Freitas do Amaral.
Pelo contrário, à direita o que vamos ter, muito provavelmente, é um
radical como Paulo Rangel, à frente do PSD, e um extremista, como Nuno Melo, à
frente do CDS, com um discurso para agradar à extrema-direita, com o desejo de
privatizar tudo, da escola pública à saúde, de agradar ao corrupto sistema financeiro
que rege a União Europeia, de agradar aos defensores das politica “austeritárias”
da União Europeia, que estão de volta, para continuar na senda, iniciada nos
tempos do “ir além da Troika”, de
destruir tudo o que lhes cheire a “Estado Social”, de combate às desigualdades
ou de serviço público.
Por isso, tudo o que vier, como resultado do chumbo deste Orçamento, é
sempre pior.
Infelizmente, ao contrário da direita, que se divide quando está na
oposição, mas se sabe unir, no essencial do seu projecto antisocial, quando
chega ao poder, a esquerda, que se une no “protesto” quando está na oposição,
tem dificuldade em unir-se, com pragmatismo, para executar as suas políticas
sociais, quando chega ao poder, como estamos a assistir mais uma vez.
Claro que nem tudo será negativo com a antecipação de eleições.
Em primeiro lugar, prevendo-se uma situação de grande instabilidade
económica e social que se vai viver, um pouco por todo o mundo, e na União
Europeia, nos próximos anos ( em resultado da tempestade perfeita, que combina
os trágicos efeitos socias da pandemia, com a degradação ambiental sem fim à
vista, motivada e acentuada pelos grandes interesses financeiros ligados ao
sector energético, com o agravamento da própria crise energética, com o
regresso das politicas orçamentais autotitárias da “troika” à União Europeia,
com as crescentes tensões político-militares entre a China e os Estados Unidos
e a Rússia e a União Europeia...) que vai provocar o aumento do descontentamento e
das desigualdades sociais, com um impacto muito maior em países com uma
economia frágil, como a portuguesa, o regresso de partidos, como o PCP e o BE à
oposição poderá evitar que todo esse descontentamento fique refém do populismo
e do oportunismo de extrema-direita, voltando alguma esquerda a absorver e a enquadrar esse
crescente descontentamento num combate mais consequente e positivo contra
aqueles males crescentes.
Em segundo lugar, em democracia, o voto é sempre soberano e, perante a
desagregação das relações entre os partidos à esquerda nos últimos dois anos,
nada melhor do que clarificar a situação com a força e a legitimidade do voto.
Lamento que a esquerda, mais uma vez, não se consiga entender no
essencial.
Lamento que, mais uma vez, a esquerda não se consiga unir no essencial para por em prática uma verdadeira política social, de combate aos salários baixos, às desigualdades sociais e de progresso que beneficie quem trabalha .
Provávelmente não voltaremos a ter oportunidade de ver aplicadas essas políticas sociais nas próximas décadas e, seja qual for o resultado eleitoral, vamos assistir à degradação de salários e de pensões, dos serviços de saúde e de educação, dos direitos socias e laboriais.
Mas, em democracia, não há que dramatizar.
Vá-se a voto, e clarifique-se a situação porque o voto é a arma do Povo!
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