“ (…) E então olhei à minha volta
Vi tanta mentira andar à solta(…)
Vi tanta mentira andar à solta(…)
“ (…) E agora eu olho à minha volta
Vejo tanta raiva andar a solta (..)”
Vejo tanta raiva andar a solta (..)”
(José Mário Branco, extracto da canção “Eu vim de longe”)
Nunca pensei que a evidência das alterações climatéricas e a defesa da
tomada de medidas para travar o desastre climático, levantasse tanta controvérsia
entre comentadeiros e nas redes sociais.
Dos ataques pessoais aos ambientalistas, atingindo principalmente Greta
Thundberg, à difusão em larga escala de fake news que tentam desacreditar a
evidência cientifica da catástrofe ecológica que se avizinha (como umas fotos
que por aí circulam, que tentam desmentir a redução de glaciares ou da água a
correr em cataratas africanas, através da manipulação de imagens ou da
reprodução de fotos antigas como se fossem actuais, ou as tentativas de desvalorizar o efeito dos incêndios na
Amazónia), tudo serve como arma de arremesso em defesa do “status quo”
económico-social dominante.
Que à frente dessa campanha estejam os poderosos lobbies ligados às
empresas petrolíferas e outras poluentes (aviação, automóvel, criação de gado,
madeireiros, celuloses …), não é de admirar. Já nos anos 70, quando os
ecologistas eram vistos como meros lunáticos , alguns autores que estudavam o
tema alertavam exactamente para a forma como tais lobbies tentariam adiar as
medidas de protecção ambiental durante o máximo de tempo possível.
Sabe-se hoje que existem mais de duas centenas de lobistas dessas empresas (para
referir apenas os que estão legalmente registados) a actuar junto dos
burocratas de Bruxelas, e a influência dessa gente junto de Trump e Bolsonaro,
sem esquecer que noutros países poderosos, como na Rússia, na Índia e na China,
esses lobies funcionam no seio do próprio poder político.
Ignorar a evidência científica ou , até, a própria experiência dessas
alterações que qualquer um de nós já pode sentir no dia a dia, é um preocupante
sinal do fomento da ignorância, da raiva ideológica e da má fé que cresce à
solta, à nossa volta, principalmente nas redes sociais, cada dia que passa.
Sei que é difícil aceitar que a
catástrofe ambiental só pode ser travada com medidas drásticas, que vão
implicar mudanças profundas na nossa maneira de viver.
Essas medidas passam por alterar a forma como usamos os meios de
transporte, o uso de energias renováveis, alterações de hábitos alimentares, e,
principalmente, o que custa a engolir a muita gente, travar o desenfreado
consumismo em que todos caímos e que atinge uma dimensão desmesurada nesta
época do ano.
Tentar negar as evidências, recorrendo a uma argumentação reles e
desinformada, não vai evitar o que se anuncia.
Talvez alguns acreditem que isso vai ser um problema de outros países,
dos mais pobres e das gerações futuras.
Ainda posso perceber essa atitude egoísta de quem não tem filhos e é suficiente
velho para pensar que as consequências dos actos das últimas décadas não o vão
atingir. Mas as gerações mais jovens nunca poderão perdoar os desvarios, as
mentiras e a ignorância assumida das gerações que os antecederam.
Da velha sabedoria dos índios, recordo,
um velho ditado,que devia ser seguido por todos: “não são os nossos
filhos que herdam a Terra de nós, nós é que herdamos a Terra dos nossos filhos”.
Não sei se, no meio da cegueira raivosa , da ignorância presumida e da intolerância
ideológica em que navegam as redes sociais, alguns desses atingem a profundidade
dessa frase.
Mas se algum deles parar para pensar nela, talvez sirva de alguma coisa tê-la
recordado aqui.
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