Não tenho opinião formada sobre a situação na Catalunha ou sobre o seu
direito à Independência.
Claro que, numa perspectiva histórica e cultural, a Catalunha tem
razões fortes para se considerar uma nação.
Contudo, na actual conjuntura política, quer a espanhola, quer a
europeia, as razões são mais complexas e menos visíveis.
O que me deixa perplexo na actual situação não é tanto o confronto
entre Madrid e Barcelona, mas a forma como esse acontecimento está a ser debatido
e tratado na comunicação social, nomeadamente na portuguesa.
A primeira perplexidade prende-se com a forma como essa mesma
comunicação social tem relegado para segundo plano a gravidade do que está a acontecer
na Catalunha. Se o mesmo acontecesse na Venezuela ou em Angola, tenho a certeza
que o destaque seria outro.
Em segundo lugar, fico perplexo pela diferença de pesos usada no debate
sobre o direito à independência da Catalunha.
Os mesmo que rejubilaram, e bem, com a independência dos Estados Bálticos
em relação à Rússia ou, e mal, com a desintegração da Jugoslávia, ou mudaram de
posição, após o Brexit, em relação ao
mesmo direito à independência da Escócia, classificam agora como uma ameaça a independência da Catalunha.
Em terceiro lugar, fico perplexo pela diferença de pesos usada quando a
mesma atitude antidemocrática é aplicada por Madrid contra a Catalunha ou por
Maduro contra a oposição venezuelana.
O acto irresponsável e arrogante ontem desencadeado por Madrid contra
as autoridades catalães não é muito diferente das atitudes que Maduro toma em
Caracas ou o MPLA em Luanda.
Em quarto lugar, fico perplexo quando se justifica a atitude de Madrid
de impedir um acto democrático e de livre escolha, através de um referendo,
como aquele que os catalães pretendem levar a efeito no próximo dia 1 de
Outubro, recorrendo ao argumento do “cumprimento da lei”.
Talvez seja bom recordar que os estados bálticos, os estados balcânicos
e quase todas as nações do mundo se construíram contra a “lei” de quem os
dominava.
Por outro lado, é em nome da “lei” que Maduro persegue os opositores
ou, num exemplo mais extremo, foi em nome da “lei” que os nazis cometerem todas
as suas atrocidades.
Num estado democrático, como é o espanhol, conflitos como este
resolvem-se democraticamente, isto é, com um referendo onde os catalães possam escolher. Aliás, se como dizem os detractores da independência da Catalunha, a maior parte dos cidadãos da Catalunha não concordam com a independência, então estão com medo de quê??.
Mas Rajoy, que conduziu irresponsavelmente todo o processo, nunca parando de dar tiros no pé e de extremar posições, já demonstrou várias vezes que a democracia só existe quando
serve os seus interesses ideológicos, ou não fosse ele, e o seu partido, os “legítimos”
herdeiros do regime franquista…
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