Não vou falar dos “cromos vivos” que nos passam os dias a sarrazinar na política, no comentário jornalístico ou em tantas outras ocasiões da nossa vida terrena.
Davam uma bela colecção, mas ninguém compraria uma caderneta onde um
deles pudesse sair.
Refiro-me aos verdadeiros, aquelas pequenas imagens que saiam de um
pequeno invólucro que abriamos expectantes,
à espera que surgisse aquele raro ou aquele outro que nos faltava para
completar a colecção.
Dei por mim a pensar na minha infância a abrir saquetas, um momento
sempre mágico e cheio de surpresas, uma magia que apenas encontramos na
infância e que raramente conseguimos reproduzir na idade adulta, ao observar
alguns quiosques, onde vou comprar jornais e revistas, e uma ou outra
raspadinha, “forrados” a cadernetas de cromos, do futebol, à vida animal, dos
heróis dos vídeos jogos, à fórmula 1.
Pus-me a notar que este é um pequeno hábito da magia da infância que
continua a atravessar gerações, talvez o único.
As qualidades de impressão e a forma de os colar, mudou, para melhor.
Os temas não variam muito: os heróis do desporto, principalmente do
futebol, os heróis da infância (estes, sim, mudaram), a História ou o mundo
animal.
O entusiasmo é tal que até as grandes superfícies já aderiram ao
fenómeno, oferecendo aos clientes colecções de cromos, uma forma habilidosa de
os adultos se verem obrigados a comprar mais e no mesmo sítio para satisfazerem
a birra dos petizes.
Fui à procura dos álbuns que guardei da minha infância e lá encontrei
uma dúzia deles, alguns ainda incompletos, onde encontro a reprodução dos
filmes da Disney, da Bela Adormecida, à Alice no país das maravilhas, este o
mais antigo, herdado da minha mãe, uma colecção de cromos distribuída nos
primeiros chocolates da Regina.
Entre os temas que encontrei, lá está a História de Portugal, o
Património de Portugal, a Vida dos Animais, a História dos automóveis de
corrida…
Entre as preciosidades, uma colecção de 60 cromos, com muito texto,
intitulada O Homem no Espaço, cromos que eram incluídos nas sobremesas Royal, editada
pelos anos 60 do século passado, com texto de Eurico da Fonseca, a voz e o
rosto sempre associado à minha infância de espectador pasmado das emissões de
televisão sobre as viagens da missão Apolo e outras, naquela que foi (e ainda
é) a última grande aventura humana. Os desenhos dessa série são do consagrado
autor português de histórias aos quadradinhos (para usar o termo tradicional)
Vitór Péon.
Dessa dúzia de cadernetas que guardei, a maior parte foi editada pela
Agência Portuguesa de Revistas ou pelas edições Íbis e Bertrand, mas também as
há editadas por marcas de gelados, como
a Olá, ou pela revista Mickey.
Não encontrei uma colecção dedicada aos jogadores portugueses de hóquei
em patins, que colecionei na minha infância, ou as dos jogadores de futebol, as
mais populares.
Lembro-me, a propósito destas, que os cromos vinham embrulhados nuns
rebuçados, comprados num quiosque de uma velhota ( a mãe do Tavares da
Maçaneta, o pide mais “famoso” da vila), onde hoje está o da papelaria União,
na Avenida, dentro de uma grande lata metálica.
Rumor ou não, dizia-se que o último cromo da caixa oferecia uma bola de
futebol a sério. Isso levou um colega nosso a roubar dinheiro ao pai para
comprar a caixa inteira, com esperança de, assim, conseguir a bola. Não me
lembro se o conseguiu, lembro-me sim que levou uma valente tareia quando o pai
descobriu o feito.
Uma das mais antigas colecções de que me lembro, e da qual guardo ainda
3 ou 4 cromos, era uma dedicada aos Beatles, a cores, num papel grosso, impresso
na Inglaterra e que, antes das nacionais “Gorila”, eram distribuídos e incluídos
nas primeiras pastilhas elástica surgidas em Portugal, em pleno auge dessa
banda.
Para além da divertida troca de repetidos, entre amigos e colegas da
escola, havia ainda um jogo para arrebatar cromos às outras crianças que
passava por coloca-los numa superfície lisa, com a imagem para baixo, e depois,
com a mão, dar uma palmada. Os que se virassem eram conquistados pelo sortudo
que tinha conseguido o feito, uma situação que gerava, muitas vezes, conflitos,
que às vezes acabavam ao sopapo.
Não deixa de ser surpreendente que, depois da televisão, da internet e
dos jogos de computador, as velhas colecções de cromos tenham sobrevivido ao
tempo.
Que seja longa a vida desse pequeno prazer de infância!
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