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quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

As tragédias e as esperanças dos anos terminados em 9



Quase todos os anos terminados em 9, nos últimos 100 anos, foram marcados, ora pela esperança, ora pela tragédia, muitas vezes pela esperança que conduz à tragédia.

0 ano de 1919 foi o primeiro de paz, após a tragédia da Primeira Guerra e marcou muito do destino do resto do Século. Em Junho seria assinado o Tratado de Versalhes que, ao mesmo tempo que reafirmava a desagregação dos Impérios Centrais (Alemanha e Austria-Hungria) e do Império Otomano, esteve na origem, pela humilhação imposta aos vencidos, do desenvolvimento do fascismo e do nazismo. Em Portugal foi o ano da última grande tentativa de restauração da Monarquia, que desencadeou a última guerra civil registada até hoje no país,  iniciando a segunda etapa da Primeira República, após o breve interregno sidonista.

Dramático foi o ano de 1929, encerrando uma década de esperança (os “loucos anos 20”) com o crash das bolsas de Nova Iorque , repercutindo-se na vida económica e social de todo o mundo e marcando o inicio do fim do liberalismo democrático em muitos países, contribuindo para fortalecer os regimes ditatoriais já existentes.

A Segunda Guerra, iniciada em 1939, foi a principal consequência da conjugação do Tratado de Versalhes com a Crise de 1929, e fez desse ano um dos mais trágicos do século, marcado igualmente pela vitória de Franco na Guerra Civil de Espanha, uma das mais sanguinárias ditaduras de sempre e que conduziu ao poder um dos ditadores  mais sanguinárias de sempre.

O ano de 1949 é considerado um ano crucial para o inicio da Guerra Fria, com a União Soviética a testar a sua primeira bomba atómica, a criação da NATO e a divisão definitiva da Alemanha com a fundação de dois estados, a RFA e a RDA.

1959 começa com a vitória da Revolução Cubana, ao mesmo tempo que o General De Gaulle tomava posse como primeiro presidente da Vª República francesa, sem esquecer a criação da República Popular da China, acontecimentos que iriam marcar toda a década.

1969 é um ano cheio de acontecimentos esperançosos, marcados pela afirmação de uma nova geração, reflexo do Maio de 1968. É o ano da chegada do homem à Lua e do Festival de Woodstock, um dos anos marcantes na contestação à Guerra do Vietname. Por cá a agitação estudantil conhece um dos seus momentos decisivos com a Crise Académica iniciada pelos estudantes de Coimbra e que irá ter um papel importante na consciencialização da  geração que vai estar por detrás do 25 de Abril. Este ano também é marcado por alguma abertura do regime, liderado desde o final do ano anterior por Marcelo Caetano, culminando nas eleições legislativas, com a presença de três movimentos da oposição e a eleição da chamada ala liberal.

1979 é outro ano cheio de acontecimentos marcantes. Desde logo o afastamento do poder, pelo exército do Vitname, do sanguinário regime dos Khmer Vermelhos, que provocará uma curta invasão do Vietname por parte da China. O Khmer vermelhos sobrevivem na clandestinidade graças a uma aliança entre o Ocidente e a China no apoio a esse grupo terrorista, uma das muitas contradições da Guerra Fria. É também o ano da chegada ao poder no Irão dos ayatollahs, com o conhecido episódio da invasão e ocupação da embaixada dos Estados Unidos em Teerão. Na América Latina dá-se a tomada do poder dos sandinistas na Nicarágua. Em África morre Agostinho Neto e o sanguinário ditador do Uganda, Adi Amin, é derrubado. Ao mesmo tempo que a Grécia adere à União Europeia, Margaret Thatcher é eleita a primeira mulher a dirigir um governo britânico. Também em Portugal toma posse aquela que vai ser, até hoje, a única mulher primeira-ministra, Maria de Lurdes Pintasilgo, num governo provisório de cem dias, até à realização das eleições legislativas ganhas em Dezembro por aquela que foi até hoje a mais importante aliança da direita portuguesa, a Aliança Democrática liderada por Sá Carneiro. Foi ainda um ano fundamental para a musica popular com o lançamento do álbum The Wall dos Pink Floyd e London Calling dos the Clash, marcando este o auge do movimento punk.

Grandioso foi também o ano de 1989, o ano da queda do muro de Berlim. Antes já o movimento “Solidariedade” tinha tomado o poder na Polónia. Animados pelo fim do Muro e aproveitando o clima de abertura soviética, os regimes comunistas começam a cair no leste europeu, com destaque para a Revolução de Veludo na Checoslováquia e para a Revolução Romena. Nesse mesmo ano os soviéticos começam a retirar do Afeganistão. Menos festiva foram  as manifestações da praça de Tiananmen na China, que terminaram num banho de sangue. Nesse mesmo ano morre o Ayatola Khomeini e o pintor Salvador Dali.

1999 é o ano do nascimento do euro, mas em Portugal segue-se com emoção a situação em Timor Leste , cujo povo decide a independência em referendo, sofrendo a repressão violenta das forças indonésias, ao mesmo tempo que a China recupera a soberania sobre Macau. Emocionante será igualmente o funeral de Amália Rodrigues, que morre nesse ano. O ano é marcado nos Estados Unidos pelo massacre de Columbine.

Finalmente o ano de 2009 foi aquele em que a crise financeira, iniciada no ano anterior, começou a fazer sentir os seus efeitos um pouco por toda a Europa, mas com principal incidência na Grécia, na Islândia, na Irlanda e em Portugal. Em Portugal tomava posse o 2º governo de José Sócrates, de tão má memória. Foi também o ano da primeira pandemia do século XXI, a Gripe A. Num ano que marcou o inicio do fim do clima de confiança que se vivia na Europa desde a queda do Muro de Berlim, 20 anos antes, existem dois momentos de esperança, remando contra a maré, mas, à luz dos nossos dias,  uma esperança apenas conjuntural: a tomada de posse de Barack Obama, primeiro presidente negro eleito nos Estados Unidos, e de José Mujica como presidente do Uruguai.

E chegamos a 2019, num clima de grande pessimismo sobre o futuro da humanidade e da democracia, por via do crescimento incontrolado de movimentos de extrema-direita, situação simbolicamente representada pela tomada de posse de Bolsonaro no Brasil e do previsível crescimento dos movimentos antidemocráticos nas eleições para o parlamento europeu que se disputam este ano, sem esquecer o agravamento do holocausto ambiental.

Mais uma vez este ano terminado em 9 promete ser um ano que vai marcar a História com H grande, como aconteceu com os seus “antecessores”do último século.

Se o fará como tragédia ou num clima de esperança renovada, vai depender um pouco de todos nós.

Um Bom Ano para todos, desejando que cada um revele o melhor de si próprio, sem se deixar dominar pelo ódio e pela intolerância que parecem marcar cada vez mais as sociedades actuais. 

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